Decisão Arbitral
1. Relatório
Em 04-09-2017, A…, contribuinte n.º…, com morada fiscal na Rua …, n.º…, …, …-… Póvoa de Varzim, doravante designado por Requerente, submeteu ao Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) o pedido de constituição de tribunal arbitral com vista à declaração de ilegalidade do ato de indeferimento do recurso hierárquico n.º …2017… .
O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Ex.mo Senhor Presidente do CAAD em 04-09-2017 e notificado à Requerida na mesma data.
A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 6º n.º 2 alínea a) do RJAT, foi designado como árbitro a Sra. Doutora Suzana Fernandes da Costa, pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, em 08-11-2017, tendo a nomeação sido aceite, no prazo e termos legalmente previstos.
Na mesma data foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos do disposto no artigo 11º, nº 1, alíneas a) e b) do RJAT, conjugado com os artigos 6º e 7º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c), do nº 1, do artigo 11º do RJAT, o Tribunal Arbitral foi constituído em 28-11-2017.
Em 29-11-2017, foi proferido despacho a ordenar a notificação da Requerida para, no prazo de 30 dias, apresentar resposta e, caso quisesse, solicitar a produção de prova adicional e remeter ao tribunal arbitral cópia do processo administrativo dentro do prazo de apresentação da resposta.
Em 04-12-2017, a Requerida apresentou a sua resposta e juntou requerimento a informar que não se opunha à dispensa da realização da reunião prevista no artigo 18º do RJAT, nem à dispensa de alegações.
Em 22-12-2017, foi proferido despacho no sentido de notificar o Requerente para, em 10 dias, se pronunciar sobre a dispensa da reunião prevista no artigo 18º do RJAT e sobre a dispensa de alegações. Uma vez que o Requerente não se pronunciou no prazo estabelecido, foi proferido novo despacho em 25-01-2018, a ordenar a sua notificação para se pronunciar sobre a dispensa da reunião e de alegações, em 10 dias.
Em 13-03-2018, foi proferido despacho a decidir pela dispensa da reunião prevista no artigo 18º do RJAT e pela dispensa de alegações. Designou-se então o dia 11-05-2018 para a prolação da decisão arbitral e advertiu-se o Requerente para, até àquela data, juntar ao processo o comprovativo do pagamento da taxa arbitral subsequente. Na mesma data, o Requerente juntou aos autos o comprovativo do pagamento da taxa arbitral subsequente.
Em 09-05-2018, foi proferido novo despacho a dar sem efeito o despacho de 13-03-2018 na parte em que dispensava as alegações, tendo em conta que da resposta da AT constava matéria de exceção e o Requerente não se tinha pronunciado sobre o despacho de 25-01-2018. Neste despacho ordenou-se a notificação do Requerente para responder à exceção no prazo de 15 dias e apresentar, querendo, as suas alegações escritas, podendo a AT apresentar as suas alegações no mesmo prazo, contado de forma sucessiva. No mesmo despacho foi ainda prorrogado o prazo para a decisão para o dia 14-06-2018, atenta a complexidade da questão e de forma a permitir a observância do princípio do contraditório.
Em 10-05-2018, veio o Requerente pronunciar-se quanto à matéria de exceção e apresentar as suas alegações. A AT apresentou alegações em 23-05-2018.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (artigos 4º e 10º n.º 1 e 2 do RJAT e artigo 1º da Portaria n.º 112-A/2011 de 22 de março).
O pedido arbitral é tempestivo, nos termos do artigo 10º n.º 1 alínea a) do Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de janeiro e do artigo 102º n.º 1 alínea a) do Código do Procedimento e do Processo Tributário.
O processo não enferma de nulidades e não foram suscitadas questões prévias, com exceção da incompetência do Tribunal Arbitral para apreciação do pedido do Requerente que adiante se decidirá.
2. Causa de pedir
O Requerente começa por referir que é agente de execução designado no processo de execução comum n.º …/12…TBGMTR, que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Braga – Guimarães – Instância Central –… Secção de Execução – J1. E no âmbito do referido processo, o Requerente requereu autorização judicial, ao abrigo do disposto no artigo 749º do Código de Processo Civil (CPC), para levantamento do sigilo fiscal, no sentido da AT prestar as seguintes informações: identificação dos herdeiros (nome, contribuinte e morada) associados ao número de identificação fiscal de determinada herança indivisa, e identificação dos bens que foram identificados na relação de bens para efeitos de Imposto de Selo ou Imposto sobre Sucessões e Doações. Sobre o referido pedido foi proferido despacho judicial a conceder a autorização requerida.
O Requerente refere ainda que remeteu, em 30-01-2016, ao Serviço de Finanças de …, uma mensagem de correio eletrónico com um ficheiro pdf em anexo, a solicitar informação relativa à herança com o NIF…, em que consta como herdeiro o executado no processo judicial supra referido, informação essa que seria a identificação dos herdeiros e cabeça de casal e a relação de bens que integram a herança.
O Requerente alega que recebeu uma mensagem de correio eletrónico, em 31-01-2017, do Serviço de Finanças de …, a solicitar o envio, em 15 dias, de cheque endossado ao IGCP, E.P.E., no valor de 15,36 €, para pagamento de certidão. A mesma mensagem informava ainda que a certidão podia ser levantada ao balcão do Serviço de Finanças ou remetido um envelope selado para a devolução da mesma.
O Requerente alude ainda que enviou, em resposta à mensagem anterior, uma mensagem de correio eletrónico alegando que não foi requerida a emissão de certidão, mas apenas a disponibilização de informação ao abrigo do artigo 749º do CPC, uma vez que os dados em causa estão disponíveis através de consulta direta eletrónica. Na mesma mensagem, o Requerente referiu que o artigo 749º n.º 5 do CPC refere que “quando não seja possível o acesso eletrónico, pelo agente de execução, aos elementos sobre a identificação e a localização de bens do executado, os serviços referidos no n.º 1 devem fornecê-los pelo meio mais célere e no prazo de 10 dias. O Requerente transcreveu ainda o artigo 3º da Portaria n.º 202/2011 de 20-05, que refere que “a remuneração devida pelos serviços prestados na identificação do executado e na identificação e localização dos seus bens às instituições públicas e privadas que prestem colaboração à execução nos termos do artigo 749º do Código do Processo Civil, corresponde a metade de 1 unidade de conta processual (UC) pelo conjunto das pesquisas efetuadas”. O Requerente terminou o requerimento a pedir que lhe fosse disponibilizada a informação solicitada nos termos e condições previstas no n.º 5 do artigo 749º do CPC, e que, caso se mantivesse o propósito de exigir pagamento pela informação prestada, fosse emitida decisão fundamentada com expressa referência ao normativo habilitante.
O Requerente refere, que em resposta a esta mensagem de correio eletrónico, recebeu nova mensagem do Serviço de Finanças a informá-lo que a prestação das informações em causa, quando requeridas sem que seja invocada a indisponibilidade do sistema/acesso eletrónico, ou as que se encontram previstas no n.º 7 do artigo 749º do CPC, estão sujeitas a tributação, nos termos do Regulamento das Custas dos Processos Tributários e da Tabela de Emolumentos, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 29/98 de 11-02.
Em 08-02-2017, o Requerente apresentou recurso hierárquico daquele despacho que foi expressamente indeferido em 28-08-2017, na sequência do qual o Requerente interpôs o presente processo arbitral.
Para fundamentar o seu pedido arbitral, o Requerente transcreve o disposto no artigo 749º do CPC, e refere que resulta da conjugação dos seus diferentes números que o agente de execução acede a dois tipos de dados:
a) Os de acesso direto e eletrónico, não sujeitos a prévia autorização judicial;
b) Os demais dados que “o agente de execução considere úteis à identificação ou localização de bens penhoráveis”, mas cuja “consulta … fica sujeita a despacho judicial de autorização”.
Para o Requerente, a condição prevista no nº 5 (quando não seja possível o acesso eletrónico) não está limitada aos dados previstos no nº 3 (os de acesso direto), mas sim a toda e qualquer informação que o agente de execução entenda necessária para identificar o património do executado, cabendo ao serviço detentor dos dados disponibiliza-los “pelo meio mais célere e no prazo de 10 dias”.
No entendimento do Requerente, quanto à remuneração das entidades que disponibilizam informação ao agente de execução, é evidente que o nº 8 do artigo 749º do CPC fixa o regime de remuneração para todos aqueles que “prestem colaboração à execução nos termos deste artigo”, seja por via da consulta direta eletrónica ou por qualquer outra via.
Assim, para o Requerente, não pode ser exigido o pagamento de emolumento pela emissão de certidão evocando o “Regulamento das Custas dos Processos Fiscais e Aduaneiros e a Tabela dos Emolumentos dos Serviços da Direcção-Geral dos Impostos (DGCI)”, pois este não seria aplicável às consultas realizadas por agente de execução no âmbito dos processos de execução cíveis.
Termina o Requerente afirmando que a disponibilização de informações nos processos de execução cíveis, nos termos do artigo 749º do CPC, que não estejam disponíveis por acesso direto e eletrónico, sujeitas ou não a prévia autorização judicial, não são tributadas nos termos do Regulamento das Custas dos Processos Fiscais e Aduaneiros e a Tabela dos Emolumentos dos Serviços da Direcção-Geral dos Impostos, mas sim de acordo com as regras prescritas pelo Código Processo Civil.
3. Resposta da Requerida
A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta, começando por alegar a exceção de incompetência em razão da matéria do tribunal arbitral para apreciar o ato de liquidação de emolumentos, e que ocorre, assim, a exceção dilatória prevista no n.º 1 e no n.º 4 alínea a) do artigo 89º do CPTA, aplicável por força do artigo 29º n.º 1 alínea c) do RJAT, o que obsta ao conhecimento do pedido e conduz à absolvição da AT da instância, por força do n.º 2 do referido artigo 89º do CPTA.
De seguida, apresenta a AT defesa por impugnação, defendendo a improcedência do pedido.
A AT começa por referir que, nos termos do n.º 3 do artigo 9º da Lei n.º 32/2014 de 30-05, que aprovou o procedimento extrajudicial pré-executivo, as consultas realizadas pelo agente de execução são realizadas pelo SISAAE (sistema informático de suporte à atividade dos agentes de execução), não sendo necessário que a informação seja prestada pelos serviços de finanças.
A AT refere que o pedido do Requerente versa sobre dados protegidos pelo dever de sigilo fiscal e que sobre eles recai ainda a proteção devida pela Lei n.º 67/98 de 26-10 (Lei da Proteção de Dados Pessoais), e que para serem disponibilizados é necessário despacho judicial de autorização, de acordo com o n.º 7 do artigo 749º do CPC. Despacho esse que foi obtido pelo Requerente.
A AT alega que, de acordo como artigo 749º n.º 8 do CPC, é devida uma remuneração pelos serviços prestados pela AT na identificação do executado e na identificação e localização dos bens, remuneração essa definida no artigo 21º da Lei n.º 32/2014 de 30-05, sendo a associação pública profissional representativa dos agentes de execução que centraliza a cobrança e a distribuição de todos os valores devidos nos termos do procedimento previsto na lei.
A AT elenca os dados disponibilizados pela plataforma e que se encontram descritos no n.º 3 do artigo 2º da Portaria n.º 331-A/2009 de 30-03, e refere que esses dados que são de acesso direto pelos agentes de execução, são gratuitos para os referidos agentes, uma vez que, de acordo com o artigo 20º da Lei n.º 32/2014 de 30-05, são pagos pelo Requerente detentor do título executivo.
Quanto aos dados protegidos pelo dever de sigilo, a AT alega que não são gratuitos por não se encontrarem no elenco do n.º 3 do artigo 2º da Portaria n.º 331-A/2009 de 30-03.
A AT refere ainda que o artigo 2º da lei que define o procedimento extrajudicial pré-executivo estabelece que este procedimento é de aplicação para os processos de execução suja disponibilização ou consulta de informação às bases de dados de acesso não dependa de prévio despacho judicial.
Conclui a AT afirmando que deve considerar-se procedente a exceção dilatória da incompetência material do Tribunal Arbitral para apreciar o ato de liquidação de emolumentos. E caso assim não se entenda, pede a improcedência do pedido e a absolvição da AT da instância.
4. Matéria de facto
4. 1. Factos provados:
Analisada a prova documental produzida e a posição das partes constante das peças processuais, consideram-se provados e com interesse para a decisão da causa os seguintes factos:
1. O Requerente remeteu, na qualidade de agente de execução designado no processo de execução comum n.º …/12…TBGMR, que corria termos no tribunal judicial da comarca de Braga – Guimarães, ao ex.mo juíz do processo, um requerimento onde pedia, ao abrigo do n.º 7 do artigo 749 do CPC, autorização para o levantamento do sigilo fiscal no sentido da AT prestar as seguintes informações: identificação dos herdeiros (nome, morada e contribuinte) associados ao número de identificação fiscal…, de herança indivisa, e identificação dos bens que foram indicados na relação de bens apresentada para efeitos de Imposto de Selo ou Imposto sobre Sucessões e Doações relativos ao mesmo NIF.
2. O juiz do processo supra identificado concedeu a autorização judicial para levantamento do sigilo fiscal, conforme requerido pelo agente de execução.
3. O Requerente solicitou ao Serviço de Finanças de … em 30-01-2016 a prestação da seguinte informação, na sequência da autorização judicial: identificação dos herdeiros e cabeça de casal da herança com o NIF … (contribuinte e moradas), herança essa da qual consta como herdeiro B…, NIF…, assim como a relação de bens que integram a herança.
4. Em 31-01-2017, o Serviço de Finanças de … enviou ao Requerente uma mensagem de correio eletrónico, onde afirma que “em cumprimento do solicitado através do pedido de certidão para o processo n.º …/12..TBGMR, (…) referente ao Executado B…, solicito a V. Ex.a o envio de cheque endossado ao IGCP, E.P.P., Instituto de Gestão da Tesouraria e do Crédito Público, entidade pública empresarial, no valor de 15,36 €, no prazo de 15 dias, findo os quais o pedido de certidão será arquivado”
4. em 02-02-2017, o Requerente enviou uma mensagem de correio eletrónico ao Serviço de Finanças de …, declarando que não requereu emissão de certidão mas sim disponibilização de informação ao abrigo do artigo 749º do CPC, e onde requereu disponibilização da informação anteriormente solicitada nos termos do art.º 749.º, 5 CPC, com expressa referência ao normativo habilitante.
5. Em 06-02-2017, o Serviço de Finanças de … notificou o Requerente por correio eletrónico, de despacho do chefe do Serviço de Finanças, Sr. C…, do qual consta que a prestação das informações solicitadas sem que fosse invocada a indisponibilidade do sistema/acesso eletrónico ou as que se encontrem previstas no n.º 7 do artigo 749º do CPC, estaria sujeita a tributação nos termos do Regulamento das Custas dos Processos Tributários e da Tabela de Emolumentos.
6. Em 08-02-2017, o Requerente apresentou recurso hierárquico da decisão proferida pelo chefe do Serviço de Finanças de … no referido despacho, onde se requer a revogação da decisão e, em substituição dela, requer que seja ordenada a disponibilização dos dados solicitados sem pagamento dos emolumentos solicitados.
7. Em 28-08-2017, o Requerente foi notificado da decisão de indeferimento do recurso hierárquico apresentado, assinada pela Sub-Diretora Geral da Direção de serviços da Justiça Tributária, D… .
Não se provaram outros factos com relevância para a decisão da causa.
4.2. Factos não provados
Inexistem outros factos com relevo para apreciação do mérito da causa que não se tenham provado.
4.3. Fundamentação da matéria de facto provada:
A convicção da juíz-árbitro fundou-se na posição assumida pelas partes e nos documentos juntos aos autos pelo Requerente.
5. Da exceção de incompetência em razão da matéria do tribunal arbitral
Cumpre, antes de mais, conhecer da questão da competência do tribunal arbitral, uma vez que a infração das regras de competência em razão da matéria determina a incompetência absoluta do tribunal, a qual é de ordem pública e o seu conhecimento procede o de qualquer outra matéria, de acordo com as decisões arbitrais dos processos n.º 17/2012-T e n.º 736/2014-T.
De acordo com Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2ª edição revista, 2007, Almedina, página 117, “(…) a única questão para que em tribunal incompetente é competente é para apreciar a sua incompetência. Verificada essa incompetência, ele fica naturalmente impedido de entrar na apreciação quer dos restantes pressupostos processuais, quer, obviamente, do mérito da causa”.
A AT alega, na sua resposta, a verificação da exceção de incompetência em razão da matéria do tribunal arbitral para apreciar o ato de liquidação de emolumentos. Para a AT, resulta do disposto no artigo 2º do RJAT que, face ao pedido arbitral e à causa de pedir, é manifesta a incompetência em razão da matéria do Tribunal Arbitral para apreciar a pretensão do Requerente.
O Requerente, notificado para se pronunciar sobre a matéria de exceção, veio dizer que dispõe o artigo 2º do RJAT que a competência dos tribunais arbitrais compreende a apreciação da legalidade de atos de liquidação de tributos. O Requerente refere o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 18-02-2009 do processo n.º 0947/08, e transcreve a seguinte parte do mesmo acórdão: “a distinção constitucional e legal entre conceitos de imposto e de taxa tem por base o caráter unilateral ou bilateral e sinalagmático dos tributos, sendo qualificáveis como impostos os que têm aquela primeira caraterística e como taxas os que têm as últimas”. Para o Requerente, um emolumento é uma taxa, e estão reunidas as condições para que o Tribunal Arbitral apreciar o pedido, carecendo de fundamento a exceção de incompetência do Tribunal.
Vejamos:
O n.º 1 do artigo 2º do RJAT dispõe que a competência dos tribunais arbitrais compreende a apreciação das seguintes pretensões:
-
a declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta;
-
a declaração de ilegalidade de actos de fixação da matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, de actos de determinação da matéria coletável e de atos de fixação de valores patrimoniais”.
Por sua vez, o artigo 4º n.º 1 do RJAT, determina que “a vinculação da administração tributária à jurisdição dos tribunais constituídos nos termos da presente lei depende de portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça, que estabelece, designadamente, o tipo e o valor máximo dos litígios abrangidos”.
A portaria em questão é a Portaria n.º 112-A/2011 de 22-03 que dispõe, no seu art.º 2.º, que “os serviços e organismos referidos no artigo anterior vinculam-se à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD que tenham por objeto a apreciação das pretensões relativas a impostos[1] cuja administração lhes esteja cometida referidas no n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro)”.
Imposto, segundo Casalta Nabais, num sentido objetivo, é uma “prestação pecuniária, unilateral, definitiva, coativa” sem carácter sinalagmático” (Direito Fiscal, Almedina, 6ª edição, 2010, pág. 11)
De acordo com Alberto Xavier, in Manuel de Direito Fiscal, I, 1981, página 42, as taxas têm “caráter sinalagmático, não unilateral. O qual por seu turno deriva funcionalmente da natureza do facto constitutivo das obrigações em que se traduzem e que consiste ou na prestação de uma atividade pública ou, na utilização de bens do domínio público ou na remoção de um limite jurídico à atividade dos particulares”.
A prestação exigida ao Requerente – emolumento pela prestação de uma informação escrita ou pela emissão de uma certidão – ainda que mal interpretada pelo Serviço de Finanças de … e até atentatória dos direitos atribuídos por lei aos agentes de execução, não tem a natureza de um imposto. Isto porque tem uma contrapartida, não podendo ser entendida como uma prestação unilateral.
Por sua vez, como afirmam Sérgio Vasques e Carla Castelo Trindade no artigo “O âmbito material da arbitragem tributária”, Cadernos e Justiça Tributária Abril/Junho 2013, página 24, uma das consequências a assacar da redação do RJAT e da portaria de vinculação é que “o âmbito material da arbitragem se resume à análise de questões relativas a impostos, não sendo, portanto, suscetíveis de recurso a arbitragem, porquanto fogem aos termos de vinculação da administração tributária questões relativas a taxas e contribuições especiais”.
Também Conceição Gamito e Teresa Teixeira Mota, na revista Arbitragem Tributária n.º 2, no artigo “arbitrabilidade das taxas”, pág.21, referem que “não obstante a ampla designação como arbitragem tributária e a constante referência a tributos no que aos atos arbitráveis respeita, as taxas e contribuições encontrar-se-ão, prima facie, excluídas do âmbito material de competência dos tribunais arbitrais”.
Também Serena Cabrita Neto e Carla Castelo Trindade, in Contencioso Tributário, volume II, 2017, pág. 154, escrevem que “no âmbito da arbitragem tributária (…) a competência material do tribunal arbitral dependerá do ato impugnado em causa”. E continuam dizendo que “os tribunais arbitrais já não serão materialmente competentes para apreciar a legalidade de atos de liquidação, de autoliquidação, de retenção na fonte ou de pagamento por conta de taxas e contribuições”.
A questão que aqui cumpre apreciar é a de saber se o ato de liquidação de emolumentos pelo Serviço de Finanças de … pela emissão de uma certidão e/ou pela prestação de uma informação pro escrito pode ou não ser objeto de pronúncia arbitral.
Pelo que acima se referiu, não restam dúvidas que estamos perante uma taxa pela prestação de um serviço, seja ele a prestação de informações por escrito ou a emissão de uma certidão pelo Serviço de Finanças.
Entendemos, assim, que a requerida não se encontra vinculada à jurisdição do CAAD quanto a esta matéria e que se verifica a exceção de incompetência em função da matéria.
Ainda que se entendesse que não estaremos perante uma incompetência em razão da matéria mas antes perante uma exceção dilatória inominada (como ocorre no processo 324/2016-T) a consequência seria a mesma: a absolvição da instância.
Do objeto da decisão do recurso hierárquico
O pedido arbitral recai, de forma imediata, sobre a decisão que pôs fim a um recurso hierárquico e, de forma mediata, uma despacho do serviço de finanças de … que não contém a liquidação de um imposto.
A decisão que pôs termo ao recurso hierárquico não aprecia a legalidade da liquidação de um imposto.
Pelo que, também por aí não, tem o CAAD competência para apreciar o pedido arbitra formulado pelo Requerente
7. Decisão
Em face do exposto, determina-se:
- julgar procedente a exceção dilatória de incompetência do CAAD em função da matéria.
- Absolver a Requerida da instância (artigos 96.º e 278.º do Código de Processo Civil, ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT)
8. Valor do processo:
De acordo com o disposto no artigo 306º, n.º 2, do CPC e 97º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 3º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se o valor da ação em 15,36€.
9. Custas:
Nos termos do artigo 22º, n.º 4, do RJAT, e da Tabela I anexa ao Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em 306,00 €, a cargo do Requerente.
Notifique.
Lisboa, 14 de junho de 2018.
Texto elaborado por computador, nos termos do artigo 138º, n.º 5 do Código do Processo Civil (CPC), aplicável por remissão do artigo 29º, n.º 1, alínea e) do Regime de Arbitragem Tributária, por mim revisto.
O árbitro singular
Suzana Fernandes da Costa