Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 476/2017-T
Data da decisão: 2018-03-27  IRS  
Valor do pedido: € 3.685,39
Tema: IRS - Medidas de protecção das uniões de facto - Lei 7/2001, de 11 de Maio - Artigo 14º do Código do IRS.
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Decisão Arbitral

 

Partes

Requerentes: A…, NF … e B…, NF… .

Requerida: AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (AT)

 

  1. RELATÓRIO

 

  1. Em 21 de Agosto de 2017 os Requerentes entregaram no CAAD um pedido de pronúncia arbitral (PPA) solicitando, ao abrigo do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), a constituição de tribunal arbitral singular (TAS).

 

O PEDIDO

 

  1. Os Requerentes pedem a anulação das liquidações de IRS n.ºs 2017 … e 2017…, relativas ao ano de 2014, das quais resultou a obrigação de entregar ao Estado, respectivamente, as importâncias de 327,79 € e 57,60 €, valores que, entretanto, pagaram.
  2. Liquidações que resultaram do facto da AT considerar existir divergência na declaração apresentada, com fundamento no facto de os sujeitos passivos, tendo invocado o instituto de “unidos de facto”, não terem a mesma morada registada no “sistema de cadastro de contribuintes” há pelo menos dois anos.

 

 

 

 

A CAUSA DE PEDIR

 

  1. Os Requerentes invocam a ilegalidade das liquidações impugnadas, por dissonância com o artigo 14º do Código do IRS e com os nºs 1 e 2 do artigo 2ºA da Lei nº 7/2001, de 11 de Maio que adoptou as medidas de protecção das uniões de facto.
  2. Discordam do facto da AT considerar que o requisito “identidade de domicílio fiscal”, a que se refere o n.º 2 do artigo 14.º do Código do IRS, só estarem preenchidos, se ocorrer o seu registo prévio no “sistema de cadastro de contribuintes”.
  3.  Invocam decisões do TCA Sul e do CAAD, adoptadas em situações idênticas, para sustentar que “... para além do cumprimento atempado da obrigação declarativa a que se alude nos números 3 e 4 do artigo 19.º da LGT, os contribuintes podem socorrer-se de outros meios de prova para demonstrar que vivem em condições análogas às dos cônjuges, há mais de dois anos e, consequentemente, residem habitualmente no mesmo local”. 

 

DO TRIBUNAL ARBITRAL SINGULAR (TAS)

 

  1. O pedido de constituição do TAS foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT no dia 21-08-2017.
  2. Pelo Conselho Deontológico do CAAD foi designado árbitro o signatário desta decisão, tendo sido disso notificadas as partes em 31.10.2017. As partes não manifestaram vontade de recusar a designação, nos termos do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
  3. O Tribunal Arbitral Singular (TAS) encontra-se, desde 21.11.2017, regularmente constituído para apreciar e decidir o objecto deste dissídio (artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 30.º, n.º 1, do RJAT).
  4. Todos estes actos se encontram documentados nos registos constantes do Sistema de Gestão Processual que aqui se consideram reproduzidos.
  5. Logo em 21-11-2017 foi a AT notificada nos termos e para os efeitos do artigo 17º-1 do RJAT. Respondeu em 18.12.2017, juntando o Processo Administrativo (PA) composto por um ficheiro informatizado, aqui designado por PA, com 20 folhas.
  6. Por acordo implícito das partes não se realizou a reunião de partes do artigo 18º do RJAT. Por despacho de 18.12.2017 foi fixado prazo para apresentação de alegações escritas e sucessivas. Em 11.01.2018 os Requerentes apresentaram as alegações. Em 22.01.2018 contra-alegou a Requerida. Ambas as partes pugnaram pela posição já assumida no pedido de pronúncia e na resposta, respectivamente.

 

PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS

 

  1. Legitimidade, capacidade e representação – As partes são legítimas, gozam de personalidade jurídica e de capacidade judiciária e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março). 
  2. Princípio do contraditório - Foi notificada a AT nos termos da alínea k) deste Relatório. Todas as peças processuais e todos os documentos juntos ao processo foram disponibilizados à respectiva contraparte no Sistema de Gestão Processual do CAAD. Da sua junção foram sempre notificadas ambas as partes.

Muito embora o TAS não tenha convidado a AT a pronunciar-se sobre os documentos nºs 1 e 2 juntos com as alegações dos Requerentes, o certo é que exerceu esse direito, como se retira dos nºs 22º e 23º das contra-alegações.

  1. Excepções dilatórias - O procedimento arbitral não padece de nulidades e o pedido de pronúncia arbitral é tempestivo uma vez que foi apresentado no prazo prescrito na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do RJAT, como resulta do facto dos Requerentes terem apresentado o pedido de pronúncia em 22.08.2017 e a data limite de pagamento das liquidações de IRS constante da demonstração de liquidação, ser 22.05.2017.

 

SÍNTESE DA POSIÇÃO DOS REQUERENTES

 

  1. Alegam os Requerentes que “... vivem em união de facto desde 01.01.2012”. Que “em 30.05.2015, ... apresentaram declaração Modelo 3 de IRS, tendo optado, nos termos do artigo 14.º, n.º 1 do CIRS, pelo regime de tributação dos sujeitos passivos casados e não separados judicialmente de pessoas e bens”, mas em Julho de 2017 foram notificados “...de divergências na declaração apresentada, com fundamento no facto de os dois sujeitos passivos não terem a mesma morada registada no “sistema de cadastro de contribuintes” há pelo menos dois anos”, e “... apesar de a requerente ter alterado a sua morada fiscal para a Rua…, … -…, …, …-…Matosinhos, em Dezembro de 2012, o requerente tardou a fazê-lo” tendo no entanto, quando notificado pela AT, prontamente facultado “prova de que a referida morada era residência habitual de ambos desde 01.12.2012, juntando vários documentos datados de Dezembro, nomeadamente, o contrato de arrendamento sobre a referida casa, contratos de fornecimento de água e de energia por si celebrados e declarações emitidas pela sua entidade patronal, para efeitos de IRS”, além de “... um documento expressamente previsto no artigo 2.º-A da Lei n.º 7/2001, de 11/05, como meio de prova da união de facto: uma declaração emitida pela Junta de Freguesia de …, acompanhada de declarações de ambos, sob compromisso de honra, de que vivem em união de facto desde 01.12.2012 e de declaração escrita de duas testemunhas”. 
  2. Mais referem que “não obstante todos os esclarecimentos e meios de prova apresentados, em 30.01.2017, os requerentes foram notificados de um despacho proferido em processo de correcção de erros, em que a AT insiste no argumento de que não estão verificados os pressupostos previstos no n.º 2 do artigo 14.º do CIRS para a apresentação de declaração conjunta”, o que determinou a “... eliminação da declaração submetida em 30.05.2015 e a elaboração de um documento de correcção único para cada um dos requerentes” e nessa sequência “... em finais de Março de 2017, os requerentes foram notificados das liquidações de IRS n.º 2017… e 2017 …” aqui impugnadas, “das quais resultava a obrigação de entregar ao Estado, respectivamente, as importâncias de 327,79 € e 57,60 €, que ... já pagaram”.
  3. E concluem: “A fundamentação da AT baseia-se, contudo, numa interpretação errada das disposições legais aplicáveis, nomeadamente do artigo 14.º do CIRS, na redacção anterior às alterações introduzidas pela Lei n.º 82-E/2014, de 31/12”, porquanto “... entende erradamente ... que a identidade de domicílio fiscal a que se refere o n.º 2 do artigo 14.º se equipara à morada registada no “sistema de cadastro de contribuintes””, uma vez que “... de acordo com o artigo 19.º, n.º 1, alínea a) da LGT, o conceito de domicílio fiscal das pessoas singulares é equivalente ao lugar da sua residência habitual”, “sendo entendido que, “para efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 14.º do CIRS, [se] verifica identidade de domicílio fiscal dos sujeitos passivos quando estes tenham a mesma residência habitual, independentemente do cumprimento da comunicação prevista do n.º 3 do artigo 19.º da LGT.” (Acórdão Tribunal Central Administrativo Sul, de 5/03/2015, processo n.º 05655/12)”.
  4. Invocam ainda várias decisões do CAAD no sentido do acórdão do TCAS e ainda a posição do Sr. Provedor de Justiça contida na recomendação nº 1/A/2013, dirigida ao Sr. Diretor-geral da AT.
  5. Terminam referindo que “… DEVEM SER ANULADOS OS ACTOS DE LIQUIDAÇÃO DE IRS N.º 2017 … E 2017 …, RELATIVOS AO ANO DE 2014, COM TODAS AS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS”.
  6. Em alegações sustentaram o que já tinham referido em sede de pedido de pronúncia e acrescentaram: “Encontrando-se assente, por acordo, que a requerente B… tem a sua residência habitual na Rua…, … - …, desde 18.12.2012, a questão em debate refere-se apenas à residência habitual do requerente A… no fim do ano 2012, uma vez que este apenas comunicou à AT a alteração de morada em meados de 2015. Contudo, foram inúmeras as provas apresentadas que demonstram que o requerente, em fim de 2012, vivia em união de facto com B…, tendo também residência habitual na Rua…, …º, em…”.

 

SÍNTESE DA POSIÇÃO DA REQUERIDA

 

  1. A Requerida propugna por uma leitura diferente da lei. Começa por referir que é dever fundamental dos contribuintes actualizar o domicílio no Sistema de Gestão de Registo de Contribuintes (SGRC), nos seguintes termos:
  • Em causa está o dever fundamental de actualizar o domicílio no Sistema de Gestão de Registo de Contribuintes, de acordo com o disposto no artigo 19º da Lei Geral Tributária (LGT) e os imperativos de combate à fraude e evasão fiscais que lhe estão associados”, tendo “em consideração o que dispõe, a respeito da matéria controvertida, o artigo 19.º da LGT”.
  • Ou seja, a comunicação do domicílio fiscal é obrigatória e só com esta o domicílio fiscal declarado pelo sujeito passivo goza de eficácia perante a AT”.
  • Da consulta à informação constante no sistema informática da Autoridade Tributária, verifica-se que o Requerente A… alterou, em 2015-06-11, a sua residência para a Rua … n.º …, …, em…, tendo até essa data a sua morada na Rua … n.º…, …, na Maia
  • Relativamente à Requerente B…, a mesma alterou a sua residência para a Rua … n.º…, …, em …, em 2012-12-18” “donde se conclui que existe a obrigação de comunicar a alteração do domicílio à administração tributária e o Requerente A… não o fez”. “Como o Requerente não o fez, tal facto é ineficaz, por força do n.º 3 do artigo 19.º LGT para efeitos do disposto no n.º 5 do artigo 10.º Código do Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares”.
  • Conclui questionando “se não foi feita a alteração do domicílio, como poderia a administração fiscal ter conhecimento dos factos alegados pelo Requerente se o mesmo não os comunicou, incumprindo a obrigação legal prevista no artigo 19.º LGT?”, esclarecendo que “a aplicação da Lei Geral Tributária à relação jurídica tributária em causa nos presentes autos arbitrais, é absolutamente peremptória” por força do seu artigo 1º nºs 1 e 2, como resulta do que refere Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, em comentário a “Lei Geral Tributária”, encontro da escrita editora, 4ª edição, 2012, páginas 61, 64 e 65, pelo que “assim sendo, é inequívoco que o disposto no artigo 19º da LGT a respeito do domicílio fiscal é plenamente aplicável no caso em apreciação”.
  • Concluindo que “... a falta de comunicação traria necessariamente abusos, como na situação em apreço, que por ausência de comunicação, beneficiaria indevidamente do regime da união de facto”, pelo que no caso concreto “... os Requerentes não poderiam beneficiar do regime da união de facto, uma vez que não houve por parte do Requerente A… a comunicação atempada da alteração da sua residência, para que pudessem em 2014 beneficiar desse regime”. 
  1. Depois expressa o seguinte quanto à aplicação das normas do artigo 14º do Código do IRS:
  • “... a diferença básica face ao regime fiscal aplicado aos casados é que, para poderem optar, dado que o estatuto de uniões de facto para efeitos tributários é uma faculdade e não uma obrigação, exige alguns pressupostos de facto para o seu reconhecimento legal, sendo estes a identidade de domicílio fiscal e a assinatura comum da declaração”. “É que, estabelece o nº 2 do artigo 14º do CIRS, os requisitos de natureza formal de que depende a aquisição do estatuto de união de facto para efeitos estritamente tributários e que consistem na “(…) identidade de domicílio fiscal dos sujeitos passivos durante o período exigido pela lei para verificação dos pressupostos da união de facto e durante o período de tributação, bem como da assinatura, por ambos, da respectiva declaração de rendimentos.””
  • Para além da situação de união de facto não poder ser encarada como uma consequência típica da mera identidade de domicílio fiscal, por se tratar de uma realidade bem mais complexa, que implica uma comunhão de vida em condições análogas às dos casados não separados judicialmente de pessoas e bens, a que acresce a não verificação de quaisquer circunstâncias impeditivas dos efeitos da união de facto, elencadas no artigo 2º da Lei nº 7/2001, de 11/05, com as alterações introduzidas pela Lei nº 23/2010, de 30/08”.
  • Também em causa está o dever fundamental de actualizar o domicílio no Sistema de Gestão de Registo de Contribuintes, de acordo com o disposto no artigo 19º da Lei Geral Tributária e os imperativos de combate à fraude e evasão fiscais que lhe estão associados”.
  • O sentido do segmento da norma em análise, apoiado no espírito do legislador e suficientemente expresso na letra da lei, é o de que o estatuto tributário da união de facto, incorpora nos seus pressupostos aquisitivos, o requisito formal de cumprimento tempestivo da obrigação declarativa de inscrição ou actualização do domicílio no Registo de Contribuintes, requisito que acresce à identidade de residência habitual, não se bastando com esta”.
  • Uma vez que o estatuto tributário da união de facto tem subjacente quer a conformidade dos factos materiais com a lei que protege as uniões de facto (nº 1 do artigo 14º CIRS), quer o ónus de declarar em tempo o domicílio para efeitos fiscais (nº 2 do artigo 14º CIRS), os dados comunicados à Administração Fiscal para constarem do SGRC adquirem, por esta via, um valor qualificado em sede de pressupostos aquisitivos daquele estatuto”.
  • A identidade de domicílio fiscal dos sujeitos passivos, durante o período legalmente exigível, enquanto pressuposto formal do estatuto tributário da união de facto, fundamentando-se no dever de actualização dos dados do número de contribuinte, afigura-se adequada às funções de controlo da Administração Tributária, sem violar os limites constitucionalmente impostos, nomeadamente o princípio constitucional da proporcionalidade ...”
  • E termina concluindo: “Por outro lado, ao abrigo do princípio da igualdade tributária, assente na capacidade contributiva, a medida legislativa, ínsita no artigo 14º do CIRS, aditado com a Lei nº 30-G/200, de 29/12, revela-se uma medida adequada e não excessiva, destinada a combater a criação artificiosa de uniões de facto, fazendo corresponder à invocabilidade de um direito, o cumprimento imprescindível no seio das políticas fiscais, pelo que, quando não exista comunicação atempada ou não tenha mesmo existido comunicação, por parte de ambos ou de um dos membros da união de facto, da alteração do domicílio, para efeitos de registo no número de contribuinte, deixa de se verificar o pressuposto formal aquisitivo do estatuto tributário das uniões de facto, previsto no artigo 14º do CIRS”.
  1. Relativamente aos requisitos da Lei 7/2001 de 11 de Maio, com as alterações introduzidas pela Lei nº 23/2010 de 30 de Agosto, refere o seguinte:
  • “...perante a obrigação da comunicação de mudança de domicílio, sob pena de ineficácia da mesma, enquanto tal não for comunicado (nºs 1, 3 e 4 do artigo 19º da Lei Geral Tributária), não é aplicável para efeitos de regime de tributação em sede de IRS, o estatuído no artigo 1º, nº 2 da Lei 7/2001 de 11 de Maio “pessoas que, independentemente do sexo, vivam em condições análogas às dos cônjuges há mais de dois anos””.
  • No caso em apreço, os domicílios dos Requerentes são os seguintes:

 

A…

B…

2012

Rua …

– Maia

Rua … -

Leça da Palmeira

2013

Rua …

- Maia

Rua …

Leça da Palmeira

2014

Rua …

- Maia

Rua …

Leça da Palmeira

2015

... - Leça da Palmeira

Rua …-

Leça da Palmeira

  • Concluindo: “Pelo que se conclui que só existiu identidade de domicílio fiscal entre os Requerentes em 2015, pelo que só após essa data é que começam a contar os dois anos de identidade de domicílio, aliás comos os próprios Requerentes assumem no artigo 5 do pedido arbitral”. “Se não existe identidade do domicílio entre os Requerentes, então não podem os mesmos beneficiar do regime da união de facto”. 
  1. Relativamente aos elementos de prova juntos pelos Requerentes refere o seguinte:
  • Quanto ao contrato de arrendamento “...apenas consta que o imóvel se destina, exclusivamente, à habitação permanente do agregado familiar do Requerente, não havendo qualquer identificação dos elementos que o compõem”.
  • Quanto ao contrato de fornecimento de água, datado de 27 de dezembro de 2012, celebrado entre o Requerente e a empresa C… refere que “... apenas prova que a partir daquela data, a habitação sita na Rua … passa a ter água e não prova que os Requerentes nela habitem”,
  • Quanto ao contrato de fornecimento de energia elétrica e gás natural, datado de 18-03-2013, celebrado entre o Requerente e a D…, refere que “... apenas prova que a electricidade e o gás só foram ligados em março de 2013, e não prova que os Requerentes ali residiam desde 2012”, acrescentando “será que os Requerentes foram residir naquela morada antes de a mesma possuir as condições normais de habitabilidade necessárias como luz e gás?”.
  • Quanto à declaração de rendimentos da entidade patronal emitidas por E… S.A., emitidas em nome do Requerente, ambas datadas de 31 de dezembro de 2012, refere que em “... numa das declarações consta como morada do Requerente, a Rua…, n.º…, em Leça da Palmeira”.
  1. Termina nos seguintes termos: “deve ser corrigido o valor da presente acção para o valor de € 385,39, referente à liquidação que os Requerentes pretendem ver anuladas. Deve ser julgado improcedente o presente pedido de pronuncia arbitral, por não provado, mantendo-se na ordem jurídica os actos tributário de liquidação impugnados, absolvendo-se, em conformidade, a entidade requerida do pedido
  2. Em contra-alegações sustentou o que já tinha afirmado em sede de resposta.

 

II - QUESTÕES QUE AO TRIBUNAL CUMPRE SOLUCIONAR

 

As questões que se colocam são duas, a saber:

  1. O requisito “identidade de domicílio fiscal” (a que se alude no nº 2 do artigo 14º do Código do IRS) apenas se considera preenchido se ambos os unidos de facto comprovarem, pelo prévio registo no Sistema de Gestão de Registo de Contribuintes (SGRC) nos termos do artigo 19º da LGT, que no biénio que antecede a opção de tributação, viveram efectivamente em união de facto? Ou, ao invés, essa prova pode ser feita quando ambos ou um dos unidos de facto não tenha(m) cumprido essa obrigação fiscal?
  2. Caso seja possível provar a existência de “identidade de domicílio fiscal” (a que se alude no nº 2 do artigo 14º do Código do IRS), por forma diversa do prévio registo no SGRC, aduzindo os elementos que comprovam a efectiva união de facto subsequentemente, a prova apresentada pelos Requerentes neste processo e no procedimento de gestão de divergências, deverá ser considerada suficiente?

 

Por último, cumpre ao TAS fixar o valor a atribuir à causa, uma vez que é tema de dissídio.

 

III.      MATÉRIA DE FACTO PROVADA E NÃO PROVADA.

FUNDAMENTAÇÃO

 

Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de seleccionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (conforme artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).

 

Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de direito (conforme anterior artigo 511.º, n.º 1, do CPC, correspondente ao actual artigo 596.º, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).

 

Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes e a prova documental junta, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos abaixo elencados, indicando-se os documentos respectivos (prova por documentos), como fundamentação.

 

Factos provados

 

  1. A Requerente B… tem a sua morada fiscal, desde 01.12.2012, na Rua…, Leça da Palmeira, …-… Matosinhos – conforme artigo 5º do pedido de pronúncia arbitral (ppa) e artigo 57º da resposta da AT;
  2. O Requerente A… alterou, em 2015-06-11, a sua residência para a Rua … n.º…, em Leça da Palmeira – conforme artigo 5º do ppa e artigo 16º da resposta da AT;
  3. Em 30.05.2015, os requerentes apresentaram uma declaração Modelo 3 de IRS relativa aos rendimentos de 2014, tendo optado pelo regime de tributação dos sujeitos passivos casados e não separados judicialmente de pessoas e bens, assinalando no campo reservado ao estado civil “unidos de facto” – conforme artigo 2º do pedido de pronúncia arbitral (ppa), artigo 2º da resposta e documento nº 1 em anexo ao ppa;
  4. Por correio electrónico de 01.07.2015 foi o Requerente informado do seguinte:
    “... a sua declaração de rendimentos Modelo 3 com a identificação …/…, foi selecionada para análise pelo que brevemente lhe será remetida, via CTT, uma notificação dando-lhe conhecimento da(s) situação(ões) a ser(em) verificada(s) pelos serviços da Autoridade Tributária e Aduaneira bem como dos procedimentos a adotar tendo em vista a resolução da(s) mesma(s). Mais se informa que a(s) referida(s) situação(ões) se encontra(m) desde esta data já perfeitamente identificada(s) na sua área pessoal do site do Portal das Finanças, disponível em www.portaldasfinancas.gov.pt, na opção Consultar/Divergências. Através desse site poderá substituir a declaração ou enviar por via eletrónica os esclarecimentos que entenda serem oportunos tendo em vista a eventual resolução da(s) questão(ões) em análise”, mensagem que foi depois confirmada, por notificação 07.08.2015, com o seguinte teor:

 

 

- conforme artigo 4º do pedido de pronúncia arbitral (ppa), artigo 3º da resposta, documento nº 3 em anexo ao ppa e folhas 4 e 12 do PA;

  1. Em Julho de 2015 o Requerente, com a finalidade de sanar a divergência, juntou vários documentos, incluindo um contrato de arrendamento habitacional, um contrato de fornecimento de água, um contrato de fornecimento de luz e gás, duas declarações de entidade patronal sobre os rendimentos anuais de 2012 auferidos pelo Requerente, um atestado emitido pela Junta de Freguesia sore a residência do Requerente na Rua…, nº … em Leça da Palmeira desde 01.12.2012, em união de facto com a Requerente e duas declarações dos Requerentes, sob compromisso de honra, alegando viverem em união de facto um com o outro, desde 2012-12-01 -  conforme artigo 6º a 8º do pedido de pronúncia arbitral (ppa), artigo 4º da resposta e documentos nº 4 a 9 em anexo ao ppa;
  2. Por ofício de 02.10.2015 e de 05.10-2015 foram os Requerentes notificados do seguinte:

            - conforme folhas 10 e 17 do PA;

  1. Em 30.01.2017 foram notificados os Requerentes do despacho proferido no procedimento de correcção de erros, constando a seguinte decisão:

 

 

  1. Em Março de 2017 os requerentes foram notificados das liquidações de IRS nºs 2017… e 2017…, aqui impugnadas, onde constam 21 611,66 euros e 57,60 euros, de colecta líquida de IRS, respectivamente para o Requerente e para a Requerente e a que corresponderam 327,79 euros e 57,60 euros a pagar, respectivamente, valores que foram pagos - conforme artigo 11º do ppa, documentos nº 11 e 12 juntos com o ppa e artigo 6º da resposta da AT;
  2. Em 21 de Agosto de 2017 os Requerentes entregaram no CAAD o presente pedido de pronúncia arbitral (ppa) – registo de entrada no SGP do CAAD do pedido de pronúncia arbitral.

 

 

 

Factos não provados

 

Não existe outra factualidade alegada que não tenha sido considerada provada e que seja relevante para a composição da lide processual.

 

IV. APRECIAÇÃO DAS QUESTÕES QUE AO TRIBUNAL ARBITRAL SINGULAR (TAS) CUMPRE SOLUCIONAR

 

Como já referimos em anterior decisão sobre esta matéria não pode o TAS deixar de aderir ao que se decidiu v.g. no acórdão citado nas alegações dos Requerentes (Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 5/03/2015, processo n.º 05655/12) “para efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 14.º do CIRS, verifica-se identidade de domicílio fiscal dos sujeitos passivos quando estes tenham a mesma residência habitual, independentemente do cumprimento da comunicação prevista do n.º 3 do artigo 19.º da LGT”.

 

Em bom rigor o que é referido nos artigos 60º a 79º da resposta da AT, não pode considerar-se como fundamentação do acto recorrido (liquidações com a fundamentação constante em 7. da matéria provada), porquanto a AT, em sede de decisão final sobre o procedimento de divergências não se pronunciou sobre a prova aí apresentada pelos Requerentes, pelo que o Tribunal nem deveria debruçar-se sobre essa factualidade, entendida como “fundamentação” posterior da decisão em sede de procedimento (acto mediatamente impugnado pelo Requerente), ou seja, será irrelevante a fundamentação a posteriori, tendo os actos cuja legalidade é questionada de ser apreciados tal como foram praticados, não podendo o tribunal, perante a constatação da invocação de um fundamento ilegal como suporte da decisão administrativa, apreciar se a sua actuação poderia basear-se noutros fundamentos (vide acórdãos do STA de 10-11-98, do Pleno, proferido no recurso n.º 32702, publicado em Apêndice ao Diário da República de 12-4-2001, página 1207, de 19/06/2002, processo n.º 47787, publicado em Apêndice ao Diário da República de 10-2-2004, página 4289, de 09/10/2002, processo n.º 600/02, de 12/03/2003, processo n.º 1661/02).

 

Desde já se diga que se configura que será na falta de apreciação crítica, de valoração crítica, por parte da AT, deste acervo documental em sede de procedimento de divergências de IRS, que reside o cerne do dissídio entre as partes. Ou seja, nunca a AT se pronunciou, salvo na resposta da AT (pelo menos isso não consta do processo) sobre este acervo documental e ainda sobre outros factos do seu conhecimento oficioso susceptíveis de instruir (o contrato de arrendamento manifestado às Finanças), de fundamentar, uma decisão criteriosa (princípio do inquisitório).

 

É que, o que interessa apurar é a verdade material quanto à “situação em que as pessoas vivem em comunhão de leito, mesa e habitação (tori, mensae et habitationes) como se fossem casadas, apenas com a diferença de que não o estão”.

 

Não são colocadas em causa quaisquer excepções que obstem à existência de união de facto entre os requerentes, a que se alude no artigo 2º da Lei 7/2011, de 11 de Maio.

 

Na sequência do decidido pelo TCAS, ao admitir-se a premissa de que “a união de facto pode ser provada por qualquer meio de prova legalmente admissível, nomeadamente por declaração emitida pela junta de freguesia competente, sendo que tal declaração deverá ser acompanhada por uma declaração de ambos os membros da união de facto, sob compromisso de honra, de que vivem nessas circunstancias há mais de dois anos, e de certidões de cópia integral do registo de nascimento de cada um deles”,

 

não parece curial que depois se deva concluir o contrário, ou seja, que a união de facto só é atendível, em termos fiscais, após ter sido comunicado o domicílio fiscal em identidade com o respectivo (a) companheiro (a) pela forma dos n°s 1, 3 e 4 do artigo 19°, n°1, da Lei Geral Tributária, parecendo pretender dizer-se que não existindo esta comunicação, não pode levar-se a efeito a prova da união de facto “por qualquer meio de prova legalmente admissível”, o que não parece ser sustentável.

 

A questão da ineficácia perante a AT da não comunicação do domicílio fiscal em identidade dos companheiros unidos de facto, pode levar a que a liquidação seja feita como não unidos de facto e obrigará os contribuintes, caso queiram inverter essa situação, a impugnar a liquidação e provar no procedimento gracioso ou contencioso subsequente os elementos do referido estado pessoal.

 

Será, pois, de concluir que o regime estatuído no artigo 14º do Código do IRS, pode ser aplicado no caso de existir a comunicação prévia do domicílio fiscal (o que fará presumir a identidade de domicílios com a pessoa que também o tenha feito) e ainda no caso dos contribuintes provarem os elementos exigíveis da união de facto por qualquer meio de prova legalmente admissível (requisitos da lei civil e da lei fiscal), se não tiverem cumprido a obrigação de alteração de domicílio.

 

Está assim resolvida a primeira das questões que ao Tribunal compete dirimir. Vejamos, então, se a prova apresentada é suficiente para cumprir o ónus que recai sobre os Requerentes.

 

Como se pode ver em 5. da matéria de facto provada o Requerente apresentou, em sede de procedimento de divergências:

  • um contrato de arrendamento habitacional;
  • um contrato de fornecimento de água;
  • um contrato de fornecimento de luz e gás;
  • duas declarações de entidade patronal sobre os rendimentos anuais de 2012 auferidos pelo Requerente;
  • um atestado emitido pela Junta de Freguesia sore a residência do Requerente na Rua …, nº…, desde 01.12.2012 em união de facto com a Requerente; e
  • duas declarações dos Requerentes, sob compromisso de honra, alegando viver em união de facto um com o outro, desde 2012-12-01.

 

Afigura-se-nos que este conjunto de documentos, apresentados à AT em sede de procedimento de verificação de divergências, permitiam logo que apresentados, levar a efeito a instrução do processo, nomeadamente a recolha de outras provas, se é que a AT entendia que não era suficiente.

 

Na leitura conjugada dos vários documentos e tendo em conta o nº 2 do artigo 2ºA da Lei nº 7/2001 de 11 de Maio, considera este TAS que a prova apresentada pelos Requerentes é suficiente para permitir que se conclua pela verificação dos requisitos legais e fiscais da união de facto entre ambos (artigo 2ºA-2 da Lei nº 7/2001 e nºs 1 e 2 do artigo 14º do Código do IRS).

 

De facto, o contrato de arrendamento foi celebrado apenas pelo Requerente como inquilino, mas conjugado com o atestado de residência emitido pela Junta de Freguesia, percebe-se que aí vive a Requerida também, incluindo porque aí seria o seu domicílio fiscal, desde 2012.

 

O contrato de fornecimento de água mostra que, desde Dezembro de 2012, existe fornecimento de água, não sendo documento destinado a provar que ambos os Requerentes habitavam efectivamente a casa, mas se dúvidas existissem sobre se aí viviam permanentemente os Requerentes, nada impedia a AT de notificar v.g. o senhorio e ouvi-lo em declarações escritas ou orais.

 

O facto do contrato de fornecimento de electricidade e gás apenas ter sido celebrado e supostamente ligados os fornecimentos em 18 de Março de 2013 (artigos 65º a 68º da resposta) não quer senão significar que existiria certamente - como é do senso comum -  outro contrato anterior, pelo menos de electricidade (em nome do construtor se o prédio foi construído de novo ou em nome do anterior inquilino, se antes esteve arrendado). Esta dúvida podia e devia ter sido esclarecida pela AT em sede de instrução do procedimento de verificação de divergências, quer perante os Requerentes, quer perante a empresa que fornece gás e electricidade. Nenhuma prova se fez de que antes não existiam contratos de fornecimento em nome de outras entidades.

 

Quanto às cópias das declarações de rendimentos do Requerente emitidas pela entidade patronal – o que o Requerente terá pretendido provar, foi que uma delas terá sido emitida com a anterior morada, porque certamente não tinha comunicado a sua alteração à entidade patronal, o que terá feito posteriormente, tal como perante a AT.

 

Todos estes documentos, conjugados com o atestado emitido pela Junta de Freguesia local, só podem levar este TAS a julgar demonstrada a existência de união de facto entre os Requerentes, desde, pelo menos, 01.01.2012.

 

Desta feita, procede o pedido de pronúncia arbitral.

 

 

Fixação do valor da causa

 

No pedido de pronúncia os Requerentes referem o seguinte:

  1. Em 30.05.2015, os requerentes apresentaram declaração Modelo 3 de IRS, tendo optado, nos termos do artigo 14º, nº 1 do CIRS, pelo regime de tributação dos sujeitos passivos casados e não separados judicialmente de pessoas e bens ... sendo que da simulação realizada no simulador informático da Autoridade Tributária, resultava um valor a receber, pelos requerentes, de cerca de 3.300,00 €” (artigos 2º e 3º do ppa);
  2. Nessa sequência, em finais de Março de 2017, os requerentes foram notificados das liquidações de IRS n.0 2017 … e 2017 …  ... das quais resultava a obrigação de entregar ao Estado, respectivamente, as importâncias de 327,79 € e 57,60 €, que os impugnantes já pagaram”;
  3. Terminam pedindo: “TERMOS EM QUE DEVEM SER ANULADOS OS ACTOS DE LIQUIDAÇÃO DE IRS Nº 2017 … E 2017 …, RELATIVOS AO ANO DE 2014, COM TODAS AS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS”.
  4. Em alegações referem: “O que os requeridos pretendem com a presente acção arbitral é, enquanto sujeitos que vivem em condições análogas às dos cônjuges há mais de dois anos, ver anuladas as liquidações de IRS n.º 2017 … e 2017 …, relativas ao ano de 2014, sendo estas, em consequência, substituídas por outra que respeite a sua opção pelo regime de tributação dos sujeitos passivos casados e não separados judicialmente de pessoas e bens, conforme lhes é permitido pelo artigos 14º do CIRS e 3º, alínea d) da Lei nº 7/2001, de 11/05. Os requerentes entenderam, portanto, em face da simulação realizada no simulador informático da Autoridade Tributária, que o valor da utilidade económica do pedido é substancialmente superior ao valor liquidado pela AT. O que é certo é que o RJAT não dispõe de qualquer norma que regule o valor da causa, pelo que, caso se entenda que o artigo 97º-A, n.0 1, alínea a) do CPPT é aplicável por força do artigo 29º, n.º 1, alínea a) do RJAT, deverá o valor da causa ser rectificado em conformidade”.
  5. E atribuem na parte final do ppa o seguinte valor processual: “3.685,39 € (três mil, seiscentos e oitenta e cinco euros e trinta e nove cêntimos)”.
  6. Por seu turno a AT refere o seguinte: “Os Requerentes atribuem ao pedido arbitral o valor de € 3.685,39.  Ora, nos termos do artigo 97.º-A do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), aplicável por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alínea a) do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), quando seja impugnada a liquidação, o valor do processo é o da importância cuja anulação se pretende.  Verifica-se que os Requerentes pretendem a anulação das liquidações de IRS n.ºs 2017… e 2017…, referentes ao ano de 2014, com o valor global de € 385,39, valor este que deverá ser o indicado para os presentes autos, devendo como tal ser rectificado o anteriormente indicado” (artigos 8º a 10º da resposta);
  7. Em contra-alegações refere a AT: “Relativamente ao valor do pedido, estranha-se que os Requerentes desconheçam o disposto no artigo 29.º, que dispõe sobre o direito subsidiário a aplicar, nos casos omissos, do RJAT. A AT reitera tudo o que consta nos artigos 9º a 10.º da Resposta, devendo á situação em causa, ser aplicada a norma prevista no artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT, pelo que o valor do pedido arbitral deve corresponder ao valor da liquidação da qual os Requerentes pretendem a anulação.  Os Requerentes indicam como valor do pedido arbitral, o valor que obtiveram numa simulação, o qual não deve ser atendido, uma vez que não passa de uma simulação e não de um apuramento concreto de valores.  Reitera-se assim que o pedido arbitral deve ser rectificado para o valor de € 385,39, valor que corresponde á liquidação da qual os Requerentes pretendem a anulação” (artigos 2º a 5º das contra-alegações).

 

O artigo 97ºA do CPPT, sob a epígrafe “valor da causa” refere que: “1 - Os valores atendíveis, para efeitos de custas ou outros previstos na lei, para as acções que decorram nos tribunais tributários, são os seguintes: a) Quando seja impugnada a liquidação, o da importância cuja anulação se pretende.

 

Em anotação ao artigo 97ºA no CPPT, Volume II, 6ª Edição, 2011, de Jorge Lopes de Sousa refere-se: “Em face da regra da alínea a) do n.º 1 deste artigo 97.º-A, tem de se concluir que, quando é impugnado um acto de liquidação, o valor do processo é apenas o da importância cuja anulação se pretende, que será o da própria liquidação, se for pedida a anulação total, ou o valor da parte impugnada, se se pretender uma anulação apenas parcial”.

 

Naturalmente os valores a reembolsar ou a pagar (que a AT considera, implicitamente, como sendo o resultado de uma liquidação, enquanto acto de aplicação de uma taxa sobre uma matéria colectável), numa liquidação de IRS, não reflectem o valor da liquidação, entendida como o produto da aplicação de uma taxa a uma matéria colectável, acrescida eventualmente dos juros compensatórios.

 

Foi dado como provado que “Em Março de 2017 os requerentes foram notificados das liquidações de IRS nºs 2017 … e 2017 …, aqui impugnadas, onde constam 21 611,66 euros e 57,60 euros, de colecta líquida de IRS, respectivamente para o Requerente e para a Requerente e a que corresponderam 327,79 euros e 57,60 euros a pagar, respectivamente, valores que foram pagos” – ponto 8 da matéria de facto assente.

 

A Requerente vem impugnar a liquidação não tendo referido expressamente e taxativamente que o fazia parcialmente, sendo certo que pela forma como se expressou pretende que seja anulada a liquidação, pelo menos até ao valor que indica como sendo resultado da simulação que levou a feito (3 300,00 euros) ou até ao montante que na parte final indica como sendo o valor da utilidade económica (3.685,39 €).

 

Em face do exposto, fixa-se o valor da utilidade económica em 3.685,39 euros, valor indicado pelos Requerentes, considerando-se que apresentaram um pedido de anulação parcial, uma vez que, pela forma como o apresentaram pretendem ver anulados os valores totais das colectas líquidas de IRS (que resultaram das operações de liquidação do IRS = actos impugnados) constantes das notas de liquidação, colocadas globalmente em causa pela Requerente, mas apenas até ao montante global que indicaram como sendo o valor da utilidade económica.

 

 

 

V - DISPOSITIVO

 

Nos termos e com os fundamentos acima expostos:

 

  1. Julga-se procedente o pedido de pronúncia arbitral visando a anulação parcial das liquidações de IRS n.ºs 2017… e 2017…, relativas ao ano de 2014, uma vez que, pela prova produzida, estão em desconformidade com o nº 2 do artigo 2ºA da Lei 7/2001, de 11.05 e do artigo 14º do Código do IRS.
  2. Nesta conformidade anulam-se parcialmente as liquidações de IRS n.º 2017 … e 2017 …, relativas ao ano de 2014, devendo, em consequência, proceder-se à sua substituição por outras que respeitem a opção pelo regime de tributação dos sujeitos passivos casados e não separados judicialmente de pessoas e bens, na condição de vivência em “união de facto”, conforme artigos 14º do Código do IRS e 3º, alínea d) da Lei nº 7/2001, de 11/05.

 

Valor do processo: de harmonia com o disposto no artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (e alínea a) do nº 1 do artigo 97ºA do CPPT), fixa-se ao processo o valor de 3.685,39 € euros.

 

Custas: nos termos do disposto no artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 612.00 segundo Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerida.

 

Notifique.

Lisboa, 27 de Março de 2018

Tribunal Arbitral Singular (TAS),

 

Augusto Vieira

 

 

 

 Texto elaborado em computador nos termos do disposto no artigo 131.º, n.º 5, do CPC, aplicável por remissão do artigo 29.º do RJAT.

A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990.