Acordam os Árbitros José Pedro Carvalho (Árbitro Presidente), Leonardo Marques dos Santos e Paulo Ferreira Alves, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem Tribunal Arbitral, na seguinte
DECISÃO ARBITRAL
I – RELATÓRIO
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No dia 18 de Abril de 2017, A…, S.A., NIPC …, com sede na Rua …, n.º…, …, …-… Lisboa, apresentou pedido de constituição de tribunal arbitral, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, com a redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro (doravante, abreviadamente designado RJAT), visando a declaração de ilegalidade do acto tributário consubstanciado na liquidação de IRC n.º 2015…, de 23-11-2015, na demonstração da liquidação de juros compensatórios n.º 2015 … e n.º 2015… e na demonstração de acerto de contas n.º 2015…, todas de 25-11-2015, no valor total de € 107.260,00 bem como a anulação da decisão de indeferimento parcial da reclamação graciosa n.º …2016…, e consequente reembolso dos montantes indevidamente pagos, acrescidos dos respectivos juros indemnizatórios.
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Para fundamentar o seu pedido alega a Requerente, em síntese, o seguinte:
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Não podem ser tributadas autonomamente as ajudas de custo, facturadas aos clientes, ainda que não estejam discriminadas na factura;
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Compete à Administração Tributária a prova de que existia fundamento para a correcção às tributações autónomas;
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O acto tributário tem subjacente um manifesto erro imputável à Administração Tributária, pelo que lhe são devidos à Requerente juros indemnizatórios;
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No dia 20-04-2017, o pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite e automaticamente notificado à AT.
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A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os signatários como árbitros do tribunal arbitral colectivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
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Em 12-06-2017, as partes foram notificadas dessas designações, não tendo manifestado vontade de recusar qualquer delas.
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Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral colectivo foi constituído em 28-06-2017.
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No dia 13-09-2017, a Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou a sua resposta defendendo-se unicamente por impugnação.
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No dia 08-11-2017, realizou-se a reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, onde foram inquiridas as testemunhas, no acto, apresentadas pela Requerente.
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Tendo sido concedido prazo para a apresentação de alegações escritas, foram as mesmas apresentadas pelas partes, pronunciando-se sobre a prova produzida e reiterando e desenvolvendo as respectivas posições jurídicas.
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Foi fixado o prazo de 30 dias para a prolação de decisão final, após a apresentação de alegações da AT.
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Tendo em conta a complexidade do processo, a tramitação processual verificada, e as suspensões de prazo derivadas do regime do art.º 17.º-A do RJAT, nos termos e para os efeitos do art.º 21.º/2 do RJAT, prorrogou-se por dois meses o prazo para emissão e notificação da decisão final, a que se refere o n.º 1 do mesmo artigo.
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O Tribunal Arbitral é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5º. e 6.º, n.º 1, do RJAT.
As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.
O processo não enferma de nulidades.
Assim, não há qualquer obstáculo à apreciação da causa.
Tudo visto, cumpre proferir
II. DECISÃO
A. MATÉRIA DE FACTO
A.1. Factos dados como provados
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A Requerente é, e era em 2012, uma sociedade anónima à qual corresponde o CAE – 43210 e tem por objecto o projecto, construção, execução, manutenção, condução e exploração de todo o tipo de edifícios, infra-estruturas industriais e urbanas e respectivas instalações técnicas especiais, nomeadamente, instalações eléctricas, mecânicas, telecomunicações, segurança, climatização, entre outros.
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A Requerente está, e estava em 2012, enquadrada no regime geral de determinação do lucro tributável.
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A actividade da Requerente inclui, e incluía em 2012, uma forte componente de serviços realizados fora das suas instalações, obrigando a deslocações dos seus colaboradores, quer em Portugal, quer no estrangeiro.
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Os serviços prestados pela Requerente no exercício em questão, foram antecedidos de um orçamento que estimou todos os custos previsivelmente associados à obra, que, após aprovação por parte do cliente conduziu à celebração de contratos de empreitada ou outros.
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Os contratos celebrados pela Requerente com os seus clientes regulam os termos e condições em que assenta a prestação do serviço por parte daquela, incluindo em matéria de preço, o qual, dependendo do cliente em questão, assentou num valor fixo para toda a obra, num valor variável em função do grau de execução da obra ou num valor fixo para cada tarefa contemplada numa determinada obra.
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Entre os referidos custos encontrava-se, sempre que a obra implicasse deslocações, as ajudas de custo, referidas como “deslocações maiores”.
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Os preços acordados pela Requerente com os seus clientes contemplou os vários custos que a Requerente previu incorrer com a execução da obra, como custos dos materiais, equipamentos e custos com deslocações, e a respetiva margem associada.
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A facturação foi efectuada nos termos dos contratos a que respeitavam, tendo geralmente por base autos de medição, havendo casos em que ocorreu durante o período de garantia da obra.
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Os preços unitários facturados aos clientes da Requerente incluíram o custo por esta suportado com as ajudas de custo, mas não foi feita uma referência expressa aos encargos com as ajudas de custo nas facturas emitidas àqueles.
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No exercício de 2012, a Requerente apresentou um prejuízo fiscal de €2.112.964,62 e apurou o valor de €181.805,60, a título de tributações autónomas.
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No período referido, a Requerente fazia parte, a título de sociedade dominante, de um grupo de sociedades, enquadrado no Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades.
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A Requerente foi alvo de um procedimento de inspecção externa, de âmbito parcial e com incidência no exercício de 2012, através da Ordem de Serviço nº OI2014…, que teve por objectivo esclarecer situações, identificadas pela AT como sendo de risco, no âmbito da verificação prévia efectuada à informação disponível no sistema informático da AT, relativamente aos contribuintes abrangidos pela metodologia do Acompanhamento Permanente.
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No âmbito da acção inspectiva, em resultado da análise efectuada ao balancete analítico reportado a 31-12-2012, a AT verificou a contabilização na conta 632310 – Ajudas de custo não sujeitas a IRS, do montante de €652.879,86, respeitante ao pagamento das ajudas de custo aos trabalhadores da empresa, o qual inclui deslocações dentro do território nacional e no estrangeiro.
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As referidas ajudas de custo estão suportadas por mapas itinerários, os quais incluem o nome do trabalhador, a data e o local da deslocação, o tempo de permanência, bem como o montante atribuído.
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No âmbito do procedimento inspectivo, foi solicitado à Requerente que justificasse o motivo pelo qual os montantes pagos a trabalhadores a título de ajudas de custo não foram tributados autonomamente, tendo sido informado pelo TOC da empresa que “(…) considerava estarem facturadas aos clientes porque se encontravam atribuídas aos trabalhadores no âmbito das obras realizadas”. Informou ainda que, deste modo, “considerava preencher os requisitos necessários para o efeito”.
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Face ao descrito, foi efectuada pela AT uma correcção à tributação autónoma declarada no exercício de 2012, no valor de €97.931,98, em resultado da aplicação da taxa de tributação autónoma de 15% aos encargos dedutíveis com ajudas de custo no valor de €652.879,86.
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A Requerente foi notificada do projecto de Relatório de Inspecção Tributária, proposto pelos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Lisboa, no qual se propunha a seguinte correcção:
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A Requerente foi, ainda, notificada, nos termos do artigo 60º do RCPITA e artigo 60º da LGT para, querendo, exercer o seu direito de audição, o que fez.
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Em sede de direito de audição, a Requerente apresentou a sua discordância relativamente à correcção proposta, solicitando a sua anulação, alegando para tal o seguinte:
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“Tendo em consideração que a sua actividade assenta, em parte, na execução de instalações eléctricas em Portugal e no estrangeiro, é importante enfatizar que a concretização deste tipo de serviço é, naturalmente antecedida de um orçamento de obra (que contempla todos os custos associados à obra em concreto, sejam eles directos ou indirectos) cuja aprovação por parte do cliente final culminará na celebração de um contrato (de empreitada ou outro).”;
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“o contrato celebrado com o cliente (…) contemplará os termos e condições em que assenta a prestação de serviço por parte da Expoente, designadamente em matéria de preço (…). O preço acordado contemplará, naturalmente, todos os custos que a expoente irá incorrer com a execução da obra (e.g. custo dos materiais, equipamentos, ajudas de custo, etc.) e a respectiva margem associada.”;
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“não se vislumbra como poderia a Expoente orçamentar uma determinada obra sem atender aos respectivos custos que a mesma originará, em particular com as ajudas de custo, especialmente atendendo ao facto de a instalação apenas poder ser concretizada com recurso a pessoal especializado e, naturalmente, deslocado para o local da obra, e de a sua atribuição decorrer da aplicação da lei.
Significa isto que a facturação associada a um determinado cliente terá sempre por base uma ou várias obras associadas (e respectivo orçamento), sendo que, tal como comentado pela TOC durante a inspecção tributária, a Expoente faz refletir na facturação dos seus clientes o custo com o pagamento de ajudas de custo (e outros custos associados à obra) embora não o discrimine expressamente na factura por respeito a práticas comerciais normalmente seguidas nas relações entre empresas.”;
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“inexiste uma obrigação legal de evidenciar expressamente os encargos com ajudas de custo nas facturas emitidas aos clientes”, acrescentando ainda que “a lei não estabelece, para efeitos de tributação autónoma a necessidade de evidenciar nas facturas o montante das ajudas de custo bastando para tal que a Expoente esteja em condições de demonstrar, através dos sistemas de informação de gestão e de outros meios de prova admissíveis, se as ajudas de custo foram facturadas aos clientes ou não”.
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Através do ofício nº … de, 17-07-2015, vieram os Serviços de Inspecção Tributária emitir o Relatório Final de Inspecção Tributária, do qual consta o seguinte:
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A Requerente foi notificada da liquidação n.º 2015 … tendo sido apurado um montante de imposto a pagar no valor de €98.088,22.
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Em 25-11-2015, a Requerente foi notificada da liquidação de juros compensatórios n.º 2015… e n.º 2015… e da demonstração de acerto de contas n.º 2015… .
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A Requerente procedeu oportunamente ao pagamento do montante apurado no referido acto tributário.
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Em 24 de Março de 2016, a Requerente apresentou Reclamação Graciosa tendo por objecto o acto de liquidação, que foi instaurada no Serviço de Finanças de Lisboa-… sob o n.º …2016… .
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Na reclamação graciosa a Requerente invocou, para além da ilegalidade da correcção efectuada à tributação autónoma, que o acto tributário então reclamado não reflectia no apuramento do imposto, como devido, o montante de €1.147,63, referente ao crédito de imposto por dupla tributação internacional.
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Em 10-01-2017, a Requerente foi notificada da decisão de deferimento parcial da reclamação graciosa, tendo sido atendida a pretensão da requerente quanto à correcção referente à dupla tributação internacional, mas mantendo-se as correcções às tributações autónomas.
A.2. Factos dados como não provados
Com relevo para a decisão, não existem factos que devam considerar-se como não provados.
A.3. Fundamentação da matéria de facto provada e não provada
Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. art.º 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).
Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. anterior artigo 511.º, n.º 1, do CPC, correspondente ao actual artigo 596.º, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).
Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do artigo 110.º/7 do CPPT, a prova documental e o PA juntos aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados, tendo em conta que, como se escreveu no Ac. do TCA-Sul de 26-06-2014, proferido no processo 07148/13[1], “o valor probatório do relatório da inspecção tributária (...) poderá ter força probatória se as asserções que do mesmo constem não forem impugnadas”.
Não se deram como provadas nem não provadas alegações feitas pelas partes, e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insusceptíveis de prova e cuja veracidade se terá de aferir em relação à concreta matéria de facto acima consolidada.
B. DO DIREITO
Em causa na presente acção arbitral está apreciar a legalidade da sujeição a tributação autónoma, nos termos do artigo 88.º, n.º 9 e n.º 14 do CIRC aplicável, dos encargos relativos a ajudas de custo pagas aos trabalhadores da Requerente, sem que nas facturas emitidas aos clientes desta tenha sido discriminado o valor pago a esse título.
Dispõe o referido artigo 88.º do CIRC, nos seus números 9 e 14:
“9 - São ainda tributados autonomamente, à taxa de 5 %, os encargos dedutíveis relativos a ajudas de custo e à compensação pela deslocação em viatura própria do trabalhador, ao serviço da entidade patronal, não faturados a clientes, escriturados a qualquer título, exceto na parte em que haja lugar a tributação em sede de IRS na esfera do respetivo beneficiário, bem como os encargos não dedutíveis nos termos da alínea f) do n.º 1 do artigo 45.º suportados pelos sujeitos passivos que apresentem prejuízo fiscal no período de tributação a que os mesmos respeitam. (...)
14 - As taxas de tributação autónoma previstas no presente artigo são elevadas em 10 pontos percentuais quanto aos sujeitos passivos que apresentem prejuízo fiscal no período de tributação a que respeitem quaisquer dos factos tributários referidos nos números anteriores.”
A questão que se coloca nos presentes autos, prende-se com o preenchimento do requisito da tributação autónoma aplicada, constante do n.º 9 transcrito, relativamente à facturação aos clientes, dos encargos dedutíveis relativos a ajudas de custo, escriturados pela Requerente como encargos dedutíveis.
A tributação autónoma em questão, foi introduzida pela Lei n.º 55-B/2004, de 30-12 (Lei do OE/2005), que alterou o artigo 81.º do CIRC, e aditando-lhe, para além do mais o n.º 9 (correspondente ao mesmo número do artigo 88.º do CIRC vigente à data dos factos tributários ora em causa, e ainda hoje), consagrando, na matéria ora em causa, um regime que se mantém nos seus traços essenciais[2].
O novo regime veio consagrar a restrição da incidência sobre os encargos referidos, quando dedutíveis, à verificação das seguintes circunstâncias:
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que não sejam facturados a cliente;
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que não haja, em todo ou em parte, lugar a tributação em sede de IRS na esfera do respectivo beneficiário.
Pressuposto da tributação autónoma ora em questão (ajudas de custo não facturadas a clientes e não tributadas em sede de IRS do beneficiário, mas dedutíveis), tal como foi criada, e ainda hoje se mantém, é assim que o sujeito passivo possua, como acontece no caso, por cada pagamento efectuado, um mapa através do qual seja possível efectuar o controlo das deslocações a que se referem as despesas, designadamente os respectivos locais, tempo de permanência, objectivo e, no caso de deslocação em viatura própria do trabalhador, identificação da viatura e do respectivo proprietário, bem como o número de quilómetros percorridos, nos termos da alínea f) do n.º 1 do artigo 45.º do CIRC, na redacção vigente à data dos factos tributários ora em causa (actual artigo 23.º-A/1/h)).
Para além disso, a tributação autónoma ora em análise (relativa a ajudas de custo e compensações por utilização de viatura própria do trabalhador não facturadas a clientes e não tributadas em sede de IRS do beneficiário, mas dedutíveis) apenas opera sobre despesas que não excedam os limites legais e que hajam observado os pressupostos da sua atribuição aos servidores do Estado, já que noutros casos, por força do disposto na al. d) do n.º 3 do artigo 2.º do CIRS, as ajudas de custo e compensações por utilização de viatura própria do trabalhador serão sujeitas a IRS e, como tal, não sujeitas à tributação autónoma em causa, prevista na primeira parte da norma em apreço.
Apenas cumprindo estas condições, as despesas em questão serão dedutíveis em sede IRC e não tributadas em sede de IRS, e como tal, susceptíveis de serem sujeitas à tributação prevista na primeira parte do n.º 9 do artigo 88.º do CIRC.
Ou seja, e resumindo, a tributação autónoma sobre gastos dedutíveis relativos a ajudas de custo e compensações por utilização de viatura própria do trabalhador incide sobre encargos relativamente aos quais:
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não se tenham excedido os limites legais da sua atribuição aos servidores do Estado;
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se tenham observado os pressupostos da sua atribuição aos servidores do Estado; e
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o sujeito passivo possua, por cada pagamento efectuado, um mapa através do qual seja possível efectuar o controlo das deslocações a que se referem as despesas, designadamente os respectivos locais, tempo de permanência, objectivo e, no caso de deslocação em viatura própria do trabalhador, identificação da viatura e do respectivo proprietário, bem como o número de quilómetros percorridos.
Cumpridas tais condições, a única via para não se sujeitar à incidência da tributação autónoma em causa é a facturação dos encargos aos clientes.
Aqui chegados, não é fácil vislumbrar qual o fundamento material atendível para a imposição da tributação autónoma em causa.
Assim, e desde logo, como aponta a Professora Ana Paula Dourado, será de excluir a finalidade de assegurar a receita fiscal, por ser um argumento interpretativo ilegítimo (falacioso), uma vez que “Todas as normas fiscais em sentido estrito têm como objectivo a obtenção de receitas, e este objectivo não pode autojustificar-se.” [3].
A tributação autónoma em questão, deverá, por isso, legitimar-se à luz dos fundamentos materiais que, face aos princípios constitucionais aplicáveis, têm sido invocados para – justamente – sustentar as tributações autónomas em geral, designadamente as finalidades penalisadoras, antiabuso e mitigação de fringe benefits.
A este propósito, sustenta a AT no RIT que a tributação em causa sub iudice se fundará na “alegada” [sic] dificuldade de distinção entre o caráter privado e a natureza empresarial de certos gastos e no facto de existirem algumas formas de rendimento que não eram tributadas nas pessoas dos seus beneficiários, ou porque não eram conhecidos ou porque o rendimento não era determinável com rigor.”.
Mais refere o RIT que “as despesas com ajudas de custo são de difícil comprovação e correspondem muitas vezes a verdadeiros salários dos trabalhadores”.
Já em sede arbitral, a Requerida, citando diversa jurisprudência elaborada a propósito das tributações autónomas, sustenta que a norma em questão integra “a categoria de norma anti-abuso.”, que “as despesas suportadas com as ajudas de custo, (...) são de difícil comprovação, correspondendo, frequentemente, a verdadeiros complementos de salários assim encapotados”, pelo que “foi entendimento do legislador restringir a sua aceitação apenas no caso em que fossem imputadas aos clientes.” e que “o modo de assegurar esse controlo é através da expressa menção do facto nas facturas emitidas.”.
Ressalvado o respeito devido a outras opiniões, crê-se que a devida compreensão do regime em questão, exige mais do que a mera replicação de princípios, considerandos e fundamentos de decisões proferidas em situações em que não estavam em causa as tributações autónomas que ora nos ocupam.
Posto isso, e quanto aos argumentos elencados pela AT no RIT e em sede arbitral, julga-se que não se poderá deixar de ter em vista que tais tributações autónomas, como se viu, respeitam a gastos que não tenham excedido os limites legais, e tenham observado os pressupostos, da sua atribuição aos servidores do Estado, e relativamente aos quais o sujeito passivo possua, por cada pagamento efectuado, um mapa que cumpra com o actualmente previsto no artigo 23.º-A/1/h) do CIRC.
Cumpridas as referidas condições, será de considerar, pelo menos à partida, que a Administração Tributária terá ao seu dispor todos os elementos para verificar se, efectivamente e em que medida, as ajudas de custo e compensações pela deslocação em viatura própria do trabalhador foram incorridas exclusivamente no interesse da empresa ou não, sendo que no primeiro caso, obviamente, serão os gastos em questão dedutíveis e no segundo, de maneira igualmente óbvia, não o serão.
As referidas condições impostas pelo regime da dedutibilidade de tais gastos, pressuposto da tributação autónoma em questão, asseguram assim, crê-se, todas as garantias necessárias a, em princípio, aferir a efectividade dos gastos, não sendo, por isso legítimo considerar que aquela assenta na circunstância de que “as despesas com ajudas de custo são de difícil comprovação”. Com efeito, esta circunstância, que não discute nos autos, está subjacente aos próprios requisitos da dedutibilidade que, cumpridos, permitem, como se disse, assegurar razoavelmente a comprovação necessária da respectiva efectividade.
Por outro lado, o cumprimento dos requisitos da al. d) do n.º 3 do artigo 2.º do CIRS, condição da não sujeição a IRS na esfera dos beneficiários, e igualmente pressuposto da tributação autónoma em questão, assegurará também suficientemente, crê-se, que as ajudas de custo em causa nem “correspondem (...) a verdadeiros salários dos trabalhadores”, nem “a verdadeiros complementos de salários assim encapotados”, já que, justamente, os limites e pressupostos da sua atribuição aos servidores do Estado visará, precisamente, assegurar que tal não acontece.
Do mesmo modo, não se deverá ter por subjacente à tributação autónoma em referência, o “facto de existirem algumas formas de rendimento que não eram tributadas nas pessoas dos seus beneficiários, ou porque não eram conhecidos ou porque o rendimento não era determinável com rigor.”, desde logo porque não está em causa nenhuma destas situações, ou seja, os beneficiários são conhecidos, e o valor que lhes é abonado está determinado com rigor, e depois porquanto a não tributação das ajudas de custo está legalmente regulada no CIRS, nos mesmos termos aplicáveis “aos servidores do Estado”, perfilhando, portanto, da mesma legitimação que assiste nos casos em que estão em causa ajudas de custo abonadas àqueles.
Para compreensão da tributação autónoma que ora nos ocupa, e do seu fundamento jurídico, cumpre, assim, ir mais além, e ter presentes os dois requisitos fundamentais da dedutibilidade dos gastos em sede de IRC que, como se sabe, são:
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a efectividade do gasto (e respectiva comprovação por meios idóneos);
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a necessidade daquele para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC.
As tributações autónomas de natureza não penalizadora[4], pode-se dizer que, de uma forma ou de outra, visam acudir a situações em que o regime geral de comprovação dos referidos requisitos fundamentais da dedutibilidade dos gastos em sede de IRC, consagrado no artigo 23.º do CIRC, é insuficiente na prática, face à realidade da vida económica, para assegurar, com a necessária credibilidade, a sua verificação.
Como refere J.L. Saldanha Sanches, “[n]este tipo de tributação, o legislador procura responder à questão reconhecidamente difícil do regime fiscal de despesas que se encontram na zona de intersecção da esfera pessoal e da esfera empresarial, de modo a evitar remunerações em espécie mais atraentes por razões exclusivamente fiscais ou a distribuição oculta de lucros.”[5]. Ora, no caso concreto, nada parece fazer presumir que as ajudas de custo pagas se traduzem em remunerações em espécie ou em distribuições ocultas de lucros.
Aquelas que são as notas habitualmente atribuídas às tributações autónomas não penalizadoras, podem reconduzir-se à referida constatação. Assim, o combate à erosão ilegítima da base tributável, o desincentivar de determinados gastos de causação presumidamente não empresarial, ou a tributação de distribuição encapotada de rendimentos a terceiros, não tributados na esfera destes, por meio das tributações autónomas, terá subjacente a constatação que o regime normal da dedutibilidade dos gastos, assente no artigo 23.º do CIRC, não é, nos gastos sujeitos àquela, adequado, de per si, a garantir que as referidas situações, contrárias àquela, não se verificam na realidade.
Ou seja: relativamente a determinados gastos, o legislador entendeu que os procedimentos contabilísticos e fiscais vigentes para a generalidade dos casos, não eram suficientemente eficazes para assegurar que aqueles cumpriam com um ou ambos dos referidos requisitos fundamentais da dedutibilidade, e, em ordem a mitigar as consequências daí decorrentes, optou por sujeitá-los a tributação autónoma, diminuindo, no fundo, o seu quociente de dedutibilidade.
No caso que nos ocupa, crê-se então que a tributação em causa se funda exclusivamente na referida inidoneidade do regime geral da dedutibilidade dos custos assegurar a efectiva necessidade das ajudas de custo sujeitas a tributação autónoma para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC, já que, como se viu, a comprovação da efectividade das mesmas (ou seja, da sua efectiva realização nos valores contabilizados e a identificação dos reais beneficiários) não está em causa, uma vez que é assegurada pelos requisitos adicionais consagrados pelo legislador para a sua dedutibilidade.
Compreende-se assim, a esta luz, a razão de ser do requisito da facturação a clientes consagrado na norma do n.º 9 do artigo 88.º do CIRC, como dirigindo-se a assegurar que as ajudas de custo em questão hajam sido incorridas para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC.
Coloca-se, então, a questão de apurar se o requisito em questão deve ser entendido na sua aparente literalidade, ou seja, se quando a norma em causa utiliza a expressão “não faturados a clientes”, está a exigir que sejam mencionadas expressa e discriminadamente na facturação os dados relativos às ajudas de custo incluídas no valor facturado, ou se o texto legal se reporta antes à exigência de demonstração que o valor das ajudas de custo se encontra abrangido pelo valor facturado a clientes, como comprovação de que aquelas foram incorridas para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC.
Ressalvado o respeito devido a outras opiniões, considera-se ser este último o caso.
Com efeito, e desde logo, tem sido reiteradamente afirmado pelos Tribunais Tributários superiores, que a facturação para efeitos de IRC é menos exigente do que para o IVA, e que se destina essencialmente a veicular “os elementos essenciais da operação que titulam, por forma a possibilitar à AT quer ao controle da legalidade da dedução para efeitos fiscais do gasto, quer da respectiva tributação dos montantes auferidos pelos prestadores de serviços.” [6].
No mesmo sentido, o Tribunal Central Administrativo Norte, por exemplo, decidiu que “[n]a redacção da Lei 87.º-B/98, de 31/12, a expressão ajudas de custo “facturadas a clientes”, que constava da alínea f) do n.º1 do art.º41.º do CIRC para efeitos da dedutibilidade integral do seu valor, correspondia a encargos a esse título debitados aos clientes e incluídos no valor da factura, não se exigindo a discriminação do seu montante na própria factura, nem qualquer formalidade na sua escrituração.”[7].
Tendo em vista este entendimento, que se perfilha, não será de presumir que o legislador fiscal tenha pretendido adicionar ao já complexo emaranhado de obrigações e deveres contabilísticos e declarativos dos sujeitos passivos abrangidos pelo regime de contabilidade organizada, a imposição de passar, como sugere a Requerida “fazer constar nas facturas emitidas o montante correspondente a ajudas de custo e aos quilómetros percorridos.”, ou “o local exacto (… da obra), o tempo ou a distância percorrida”, tanto mais que tais dados são absolutamente irrelevantes para o controlo fiscal quer do destinatário da factura, quer do emitente.
Por outro lado, e sob pena, crê-se, de inconstitucionalidade, a sujeição a tributação autónoma dos valores relativos a ajudas de custo, não sujeitas a IRS, por simplesmente “não faturados a clientes”, não poderá ser entendida na sua literalidade já que a facturação dos encargos aos clientes não será, em variadas situações, como sejam os casos de deslocações no interesse geral da empresa[8], de todo viável. Ou seja, se se entender que o encargos com ajudas de custo são “não faturados a clientes” se não estiverem expressa e discriminadamente mencionados numa factura, estar-se-á a sujeitar imperativamente a tributação autónoma, obstando à sua dedutibilidade integral, uma série encargos insusceptíveis (nesse sentido) de facturação, por terem sido contraídos no interesse geral da empresa, e não no serviço a um cliente concreto.
Esta consequência será ainda mais problemática, se se atentar que a dedutibilidade dos gastos com ajudas de custo estava (como está) expressamente garantida pelo artigo 23.º do CIRC (à data dos factos tributários, como ainda hoje, na al. d) do n.º 1), normativo que se verá contrariado pelo entendimento de que a tributação autónoma em causa inviabiliza, tout court, a dedução integral de tais gastos, no caso de não serem tributadas em IRS nem facturadas a clientes, mesmo que se comprovem devidamente e para lá de qualquer dúvida razoável a efectividade do gasto e a sua necessidade para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC.
Cair-se-ia então, naquela situação descrita pela Professora Ana Paula Dourado, em que “Se o objectivo fosse o de desincentivar a dedução de despesas a que as empresas têm direito, a tributação autónoma (...) seria difícil de compatibilizar com a Constituição e a tributação da capacidade contributiva e do lucro real.”[9], sendo que “o legislador não pode recorrer a presunções inilidíveis, ficções e todas as técnicas presuntivas semelhantes, sempre que (a partir do momento que) a utilização das mesmas ponha em causa a prevalência da tributação sobre o rendimento real”[10].
De resto, a própria Requerida acaba por reconhecer, na sua Resposta em sede arbitral, que “legislação indica não ser exigível que a facturação das ajudas de custo seja feita de forma expressa e discriminada na facturação a clientes.”[11], competindo unicamente aos “sujeitos passivos de imposto de possuir elementos aptos à demonstração que, não obstante tal facto, o preço final indicado ao cliente contempla os valores relativos a despesas com ajudas de custo e com compensação pela deslocação em viatura própria do trabalhador.”[12], e que “para demonstrar os pressupostos da norma do CIRC aqui em causa, teria a ora Requerente de demonstrar que, embora não facturados ao cliente, esses valores estavam, de facto, incluídos no “preço”.”[13].
Também no Acórdão arbitral proferido no processo 735/2014-T, citado pela Requerida, se concluiu que “Embora não se exigindo que os custos a que se reporta o n° 9 do artigo 88° do CIRC sejam reflectidos/ inscritos de forma expressa nas facturas emitidas aos clientes, tal facto não exclui (...) que a Requerente esteja dispensada de provar que o preço final inscrito nas facturas tenha incorporado os valores relativos a despesas com ajudas de custo e com compensação pela deslocação em viatura própria do trabalhador.”.
É, em suma, este o entendimento que se perfilha, ou seja, que os gastos a que se reporta o n° 9 do artigo 88° do CIRC não necessitam de ser reflectidos/ inscritos, de forma expressa, nas facturas emitidas aos clientes, devendo os sujeitos passivos de imposto que pretendam não sujeitar aqueles gastos a tributação autónoma possuir, para além do mais, elementos aptos à demonstração que, não obstante tal facto, o preço final indicado e efectivamente facturado ao cliente contempla os valores relativos a despesas com ajudas de custo e com compensação pela deslocação em viatura própria do trabalhador.
Face a tal entendimento, verifica-se desde logo que o acto tributário objecto da presente acção arbitral enferma de erro de direito, na interpretação e aplicação da norma do artigo 88.º/9 do CIRC, já que, conforme resulta do RIT, o mesmo assenta exclusivamente no entendimento de que “na faturação emitida pelo sujeito passivo aos seus clientes, não há qualquer evidência do débito de ajudas de custo nas respetivas faturas (valor e discriminação das ajudas de custo)”, de que “estas despesas só seriam (...) não tributadas autonomamente se o respetivo montante fosse imputado aos clientes e expressamente mencionado na faturação emitida.”, e de que “não resulta expressamente da análise da faturação emitida que estes encargos dedutíveis tenham sido faturados a clientes.”, entendimento este que, pelo que atrás se expôs, não é o que se deverá considerar como resultando da norma do artigo 88.º/9 do CIRC, e que, como se viu, não é conforme ao sustentado pela própria Requerida em sede arbitral.
Daí que, tendo em conta que, como se escreveu no Ac. do STA de 23-09-2015, proferido no processo 0134/11[14], “É exclusivamente à luz da fundamentação externada pela AT quando da prática da liquidação adicional de IVA que deve aferir-se a legalidade desse acto tributário.”, haverá que concluir, desde logo, pela anulabilidade do acto tributário objecto da presente acção arbitral, atento o apontado erro de direito.
Acresce ainda que resulta dos factos provados, para além do mais, que:
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A actividade da Requerente inclui, e incluía em 2012, uma forte componente de serviços realizados fora das suas instalações, obrigando a deslocações dos seus colaboradores, quer em Portugal, quer no estrangeiro;
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Os serviços prestados pela Requerente no exercício em questão, foram antecedidos de um orçamento que estimou todos os custos previsivelmente associados à obra, que, após aprovação por parte do cliente conduziu à celebração de contratos de empreitada ou outros;
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Os contratos celebrados pela Requerente com os seus clientes regulam os termos e condições em que assenta a prestação do serviço por parte daquela, incluindo em matéria de preço, o qual, dependendo do cliente em questão, assentou num valor fixo para toda a obra, num valor variável em função do grau de execução da obra ou num valor fixo para cada tarefa contemplada numa determinada obra;
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Entre os referidos custos encontrava-se, sempre que a obra implicasse deslocações, as ajudas de custo, referidas como “deslocações maiores”;
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Os preços acordados pela Requerente com os seus clientes contemplou os vários custos que a Requerente previu incorrer com a execução da obra, como custos dos materiais, equipamentos e custos com deslocações, e a respetiva margem associada;
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A facturação foi efectuada nos termos dos contratos a que respeitavam, tendo geralmente por base autos de medição, havendo casos em que ocorreu durante o período de garantia da obra;
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Os preços unitários facturados aos clientes da Requerente incluíram o custo por esta suportado com as ajudas de custo, mas não foi feita uma referência expressa aos encargos com as ajudas de custo nas facturas emitidas àqueles.
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As referidas ajudas de custo estão suportadas por mapas itinerários, os quais incluem o nome do trabalhador, a data e o local da deslocação, o tempo de permanência, bem como o montante atribuído.
Face a tais factos, haverá que concluir que a Requerida apresentou elementos aptos à demonstração que, não obstante não estarem expressamente mencionados na factura, o preço final indicado e facturado ao cliente contempla os valores relativos às despesas com ajudas de custo que não sujeitou a tributação autónoma.
Com efeito, a articulação da orçamentação, contratualização e facturação, com os mapas itinerários, serão elementos suficientes para a AT aferir se, e em que medida, o preço facturado pela Requerente aos seus clientes repercute as ajudas de custo por si abonadas, contabilizadas como dedutíveis e não sujeitas a tributação autónoma.
Ao desconsiderar tais elementos, incorreu o acto tributário também erro de facto, igualmente gerador da respectiva anulabilidade.
Assim, e por todo o exposto, devem os actos tributários objecto da presente acção ser anulados, procedendo o pedido arbitral.
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A Requerente pede ainda que seja condenada a Requerida no reembolso do imposto indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º, n.º 1, da LGT.
De harmonia com o disposto na alínea b) do artigo 24.º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a Administração Tributária a partir do termo do prazo previsto para recurso ou impugnação, devendo esta, nos exatos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até o termo do prazo previsto para execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, “restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito”, o que está em sintonia com o preceituado no artigo 100.º da LGT, aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária.
Já o n.º 5 do artigo 24.º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, que refere que “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previstos na Lei Geral Tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário” mais não é do que o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.
No caso em apreço, tendo sido declarada a ilegalidade do acto de liquidação, há lugar ao pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º, n.º 1, da LGT e do artigo 61.º do CPPT, calculados sobre a quantia que o Requerente pagou indevidamente.
Tais juros serão de considerar devidos desde a data do pagamento indevido até ao momento do respectivo reembolso.
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C. DECISÃO
Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral julgar integralmente procedente o pedido arbitral formulado e, em consequência:
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Anular a liquidação de IRC n.º 2015 …, de 23-11-2015, a liquidação de juros compensatórios n.º 2015 … e n.º 2015 … e a demonstração de acerto de contas n.º 2015…, todas de 25-11-2015, e a decisão de indeferimento parcial da reclamação graciosa n.º …2016…;
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Condenar a AT no pagamento de juros indemnizatórios, nos termos acima fixados;
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Condenar a Requerida nas custas do processo, no montante de € 3.060,00.
D. Valor do processo
Fixa-se o valor do processo em € 107.260,00, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
E. Custas
Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 3.060,00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pela Requerida, uma vez que o pedido foi totalmente procedente, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.
Notifique-se.
Lisboa 18 de Fevereiro de 2018
O Árbitro Presidente
(José Pedro Carvalho)
O Árbitro Vogal
(Leonardo Marques dos Santos)
O Árbitro Vogal
(Paulo Ferreira Alves)
[1] Disponível em www.dgsi.pt, tal como a restante jurisprudência citada sem menção de proveniência.
[2] Note-se ainda que, ao contrário do que, à data da entrada em vigor da Lei n.º 55-B/2004, de 30-12, acontecia com as tributações autónomas sobre despesas de representação, e do que ainda hoje (e à data dos factos tributários, acontece com a tributação autónoma sobre gastos com viaturas), não foi prevista a não sujeição dos sujeitos passivos isentos subjectivamente pelo que, em rigor, também as próprias entidades a que se referem os artigos 9.º e 10.º do CIRC, deverão liquidar e pagar tributação autónoma sobre as ajudas de custo abonadas aos seus trabalhadores, desde que não tributadas em sede IRS nem facturadas a clientes.
[3] “Direito Fiscal”, Almedina, 2016. p. 227.
[4] Entendendo-se por tributações autónomas de natureza penalizadora aquelas que incidem sobre gastos não dedutíveis ou cuja taxa excede a taxa normal de IRC.
[5] “Manual de Direito Fiscal”, 3.ª Edição, Coimbra Editora, 2007. p. 407.
[6] Neste sentido, p. ex., cfr. Ac. do TCS-Sul de 21-05-2015, proferido no processo 07833/14.
[7] Neste sentido, p. ex. cfr. Ac. Do TCA-Norte de 03/12/2015, proferido no processo 00005/04.2BEPNF.
[8] Deslocações para prospecção de mercado, divulgação de produtos, formação do trabalhador, contactos com entidades públicas, incluindo a própria Autoridade Tributária, etc.
[11] Ponto 35. da Resposta.
[12] Ponto 36. da Resposta.
[13] Ponto 40. da Resposta.