Decisão Arbitral
I - Relatório
1. A…, contribuinte n.º…, e B…, contribuinte n.º…, residentes no sítio da …, …, …-… Faro (doravante designados por “Requerentes”) apresentaram, em 04-04-2017, ao abrigo do artigo 2.º n.º 1, alínea a) e do artigo 10.º, n.ºs 1 e 2 do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, previsto no Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66- B/2012, de 31 de Dezembro (doravante abreviadamente designado “RJAT”) e dos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março, pedido de pronúncia arbitral no qual solicitam a anulação dos seguintes atos tributários: (i) ato de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (“IRS”), com o n.º 2016…, relativo ao ano de 2012; (ii) ato de liquidação de IRS n.º 2016…, ato de liquidação de juros compensatórios n.º 2016… e Demonstração de Acerto de Contas n.º 2016…, referentes ao ano de 2013; (iii) ato de liquidação de IRS n.º 2016…, ato de liquidação de juros compensatórios n.º 2016… e Demonstração de Acerto de Contas n.º 2016…, referentes ao ano de 2014.
2. É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (adiante designada por “Requerida”).
3. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira, em 19-04-2017.
4. Nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico do CAAD designou como árbitro do tribunal arbitral singular o Exmo. Senhor Dr. Olívio Mota Amador que, no prazo aplicável, comunicou a aceitação do encargo.
5. As partes foram notificadas, em 05-06-2017, da designação do árbitro, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
6. De acordo com o disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Tribunal Arbitral foi constituído em 22-06-2017.
7. A Requerida, devidamente notificada através do despacho arbitral, de 28-06-2017, apresentou, em 15-09-2017, a sua Resposta e remeteu o Processo Administrativo.
8. Os Requerentes, em 28-07-2017, juntaram os documentos n.ºs 10 (cópia do ofício dos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Faro n.º…, de 29-07-2010) e 11 (cópia do ofício dos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Faro n.º…, de 03-11-2010) que tinham protestado juntar no pedido de constituição do Tribunal Arbitral.
9. O Tribunal Arbitral por despacho, de 17-08-2017, notificou a Requerida da junção dos documentos, referidos no n.º anterior, e concedeu-lhe o prazo de 15 dias para, querendo, exercer o contraditório.
10. O Tribunal Arbitral por despacho, de 23-10-2017, notificou os Requerentes para, no prazo de 10 dias, indicarem os factos sobre os quais pediam a inquirição de testemunhas. Os Requerentes em 06-11-2017 procederam à indicação dos factos sobre os quais pretendiam produzir prova testemunhal.
11. O Tribunal Arbitral por despacho, de 19-12-2017, determinou: (i) prorrogar, nos termos do n.º 2 do artigo 21.º do RJAT, o prazo de arbitragem por dois meses e indicar como data limite para ser proferida a decisão arbitral 22-02-2018; (ii) dispensar a realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, ao abrigo do princípio da autonomia do Tribunal na condução do processo e em ordem a promover a celeridade, simplificação e informalidade deste (artigo 19.º e 29.º, n.º 2, do RJAT), atendendo a que não foi invocada matéria de exceção nem suscitadas questões que obstem ao conhecimento do mérito do pedido; (iii) marcar a data da inquirição das duas testemunhas arroladas pela Requerente (12-01-2018 às 11h), apesar das relevantes objeções suscitadas pela Requerida à inquirição das testemunhas, não se pretendeu limitar a produção de prova apresentada pelos Requerentes; (iv) caso as partes pretendam proferir alegações escritas, estas deverão ser produzidas no prazo de 10 dias, a contar da data da realização da prova testemunhal, concedendo-se à Requerida a faculdade de, caso assim entenda, juntar as suas alegações com caracter sucessivo relativamente às produzidas pelos Requerentes.
12. O Tribunal, em 12-01-2018, procedeu à inquirição das testemunhas, C… e D…, conforme ata que se encontra nos presentes autos arbitrais e que se dá, para todos os efeitos, como integralmente reproduzida. Na referida sessão os Requerentes requereram a admissão dos seguintes documentos: (i) cópia do comprovativo do início de atividade do Requerente; (ii)cópia da caderneta de teor do imóvel; (iii) cópia do projeto de relatório de inspeção relativo a três proprietários do mesmo empreendimento; (iv) cópia da informação vinculativa n.º 3626, de 09/10/2012 da Direção de Serviços do IVA; (v) cópia da informação vinculativa de 01/09/2014 da Direção de Serviços do IVA. Os documentos foram admitidos pelo Tribunal Arbitral tendo a Requerida a possibilidade de exercer o prazo de vista em sede de alegações escritas.
13. Os Requerentes apresentaram as suas alegações em 23-01-2018. Nas referidas alegações os Requerentes, atendendo ao disposto no artigo 265.º, n.º 2, do Código do Processo Civil ex vi alínea e) do artigo 29.º do RJAT, ampliaram o pedido para a Requerida, caso a ação venha a ser dada como procedente, ser condenada no pagamento de juros indemnizatórios, à taxa máxima em vigor, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 43.º e no n.º 10 do artigo 35.º da Lei Geral Tributária (LGT), no n.º 5 do artigo 61.º do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT) e no artigo 559.º do Código Civil e na Portaria n.º 291/2003, de 8 de abril.
14. As alegações da Requerida foram apresentadas em 29-01-2018.
15. A posição dos Requerentes, de harmonia com o disposto no pedido de constituição do Tribunal Arbitral e nas alegações escritas, é, em síntese, a seguinte:
15.1. A título de questão prévia refira-se que a fundamentação do Relatório Final de Inspeção Tributária, que consubstancia a motivação dos atos tributários que constituem o objeto do presente pedido arbitral, não é congruente nem clara. Efetivamente, o entendimento dos Serviços de Inspeção Tributária não passa de um juízo conclusivo que não tem qualquer suporte nos factos nem na lei, mas apenas numa Circular. Além disso, não demonstraram relativamente aos Requerentes, especialmente ao Requerente marido, a existência de “indícios fundados” que demonstrem que os rendimentos em causa são rendimentos da Categoria F e não da Categoria B. Assim, a Administração Tributária não cumpriu o ónus da prova da verificação dos respetivos indícios ou pressupostos da tributação que sobre si recai, nos termos do n.º 1 do artigo 74.º da LGT, ou seja, dos pressupostos legais da sua atuação, face à presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes (artigo 75.º da LGT), pelo que os atos tributários deverão ser anulados.
15.2. Os Requerentes entendem que a atividade exploratória turística que exerciam e os respetivos rendimentos gerados são auferidos no âmbito de uma atividade empresarial (ainda que resultem da exploração de um imóvel) e consequentemente devem ser tratados no âmbito da Categoria B do IRS, por força do princípio da preponderância desta Categoria em relação aos rendimentos que se enquadram nas outras categorias de rendimentos, mas que são obtidos em conexão com uma atividade empresarial (no caso, uma atividade comercial).
15.3. De acordo com as normas legais vigentes, para que os rendimentos sejam imputáveis às atividades geradoras de rendimentos empresariais ou profissionais, estando o sujeito passivo registado com o respetivo CAE, basta que os rendimentos auferidos estejam relacionados com essa atividade. O que manifestamente aconteceu no caso concreto.
15.4. Estando em causa rendimentos decorrentes da exploração turística, que é a atividade exercida pelo Requerente marido, não podem os mesmos ser tributados como rendimentos da Categoria F, completamente desfasados da referida atividade comercial exercida.
15.5. Se o legislador pretendia excluir do âmbito da alínea a) do n.º 1 do artigo 3.º do Código do IRS os rendimentos resultantes da exploração decorrente da contratação de serviços, impunha-se que este determinasse expressamente que só os resultados decorrentes da exploração direta estavam sujeitos a tributação no âmbito da Categoria B do Código do IRS, o que não acontece. Nesta norma o legislador utiliza a expressão “atividade” sem delimitar (restritivamente) a sua extensão, pelo que é evidente que pretendeu incluir todos os rendimentos obtidos, por qualquer forma, da exploração direta ou através da contratação de serviços para realizar os rendimentos em causa. Se em momento algum a lei faz qualquer limitação, não compete à Administração Tributária fazer essa limitação.
15.6. Carece de fundamento legal a posição e interpretação restritiva efetuada pela Administração Tributária porquanto atendendo ao conceito legal de atividade, terá de se concluir que os rendimentos em causa devem ser tributados em sede da alínea a) do n.º 1 do artigo 3.º do Código do IRS e não nos termos do n.º 2 do artigo 8.º do mesmo diploma.
15.7. Os Serviços de Inspeção Tributária entenderam ser de requalificar os rendimentos dos Requerentes com base no entendimento constante na Circular n.º 5/2013, de 2013-07-02. Não obstante a Administração Tributária estar adstrita ao cumprimento das orientações administrativas, nos termos do n.º 1 do artigo 68.º-A da LGT, a realidade é que estas orientações terão de ser sempre sujeitas a um juízo de legalidade, pelo que apenas serão válidas na medida da sua legalidade intrínseca.
15.8. Afigura-se, por isso, ilegítimo e ilegal que a Administração Tributária pretenda tributar os rendimentos auferidos pelos Requerentes, nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 8.º do Código do IRS (Categoria F), através de uma interpretação própria e contra legem.
15.9. Os rendimentos auferidos pelos Requerentes decorrentes do contrato de exploração turística celebrado são subsumíveis à tipologia de rendimentos de uma atividade comercial, em particular da prossecução de uma atividade de natureza hoteleira e similar, prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 3.º e da alínea h) do n.º 1 do artigo 4.º do Código do IRS e, em consequência, deverão as liquidações adicionais de IRS referentes aos anos de 2012, 2013 e 2014 ser anuladas, nos termos da alínea a) do artigo 99.º do CPPT.
15.10. Ainda que se admitisse que os rendimentos obtidos pelos Requerentes fossem rendimentos da Categoria F do Código do IRS jamais a matéria coletável do Requerente seria no valor apurado pelos Serviços de Inspeção Tributária. De facto, deverão ser entendidas como despesas dedutíveis aos rendimentos da Categoria F do IRS as despesas de manutenção e conservação referentes a mulher de limpeza, ordenado do jardineiro, eletricidade, água e gás, gastos com o aluguer de casa com equipamentos, reparações e pinturas, prémios de seguro e custos de administração do prédio. Tais despesas foram desconsideradas pelos Serviços de Inspeção Tributária, mas devem ser deduzidos à matéria coletável na medida em que são despesas essenciais para a obtenção dos rendimentos em causa.
15.11. Assim, deverão ser consideradas as despesas com salários de pessoal, limpeza, eletricidade, gás e água, suportadas pelos Requerentes no ano de 2012, 2013 e 2014, nos termos e para os efeitos do artigo 41.º do Código do IRS.
16. A posição da Requerida, expressa na resposta e nas alegações escritas, pode ser sintetizada no seguinte:
16.1. Quanto à temática da fundamentação, a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo tem uniformemente entendido que a fundamentação do ato é um conceito relativo que varia conforme o tipo de ato e as circunstâncias do caso concreto. Entende-se haver suficiente fundamentação quando esta permite a um destinatário normal compreender o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do ato, ou seja, quando o destinatário possa conhecer as razões que levaram o autor do ato a decidir daquela maneira e não de outra. No caso vertente, a fundamentação é suficientemente clara e inequívoca, tanto mais que os Requerentes, por via do presente pedido de pronúncia arbitral, demonstram ter cabalmente compreendido o quadro fáctico e legal em que assentou a decisão da Requerida. Aliás, da leitura do relatório inspetivo resulta que um homem médio, colocado na posição de destinatário, consegue apreender o seu sentido e conclusão. Pelo que não se verifica o vício de falta de fundamentação.
16.2. Todavia, a verificar-se uma situação de falta ou insuficiência da fundamentação – hipótese que só em teoria e sem conceder se admite -, cabia aos Requerentes utilizar o mecanismo previsto no artigo 37.º do CPPT e solicitar a respetiva notificação ou emissão da certidão em conformidade. Ora, não tendo os Requerentes usado daquela faculdade conferida pela lei, forçoso se torna concluir que os atos aludidos continham, como efetivamente contêm, todos os elementos necessários à sua cabal compreensão e que o apregoado vício de que eventualmente padeciam ficou sanado.
16.3. A lei refere expressamente que são entendidos como rendimentos empresariais os decorrentes do exercício de qualquer atividade comercial. Atendendo ao significado do conceito utilizado nas normas legais e à interpretação que do mesmo tem feito a jurisprudência dos tribunais superiores, conclui-se que não assiste qualquer razão aos Requerentes. O uso da palavra “exercício”, na redação dada no artigo 3.º do Código do IRS, por contraposição às palavras usadas no artigo 8.º do Código do IRS para definir quais são os rendimentos de categoria F, tem subjacente a prática de atos com um determinado propósito que, no caso, será o da obtenção de lucro.
16.4. Assim, não é conforme com a lei pretender, como fazem os Requerentes, que o facto de se ter declarado início de atividade, afirmando a intenção de exercer uma atividade de exploração turística (quando, efetivamente, nada mais se fez para além de adquirir um imóvel), deva ser valorado como suficiente para a qualificação dos rendimentos como imputáveis à Categoria B, quando depois efetivamente não se exerce a atividade declarada.
16.5. Desta forma os rendimentos que os Requerentes auferem advêm de forma meramente passiva, em resultado de uma prossecução de uma atividade comercial por parte da sociedade R… . Sendo que os Requerentes não aparentam, nem alegam, ter qualquer organização de carácter empresarial para a obtenção do referido rendimento.
16.6. Nesse sentido, o Serviço de Inspeção Tributária considerou que os rendimentos em apreço correspondem a rendimentos prediais enquadráveis na categoria F do IRS (artigo 8.º do Código do IRS). Estando em causa rendimentos relativos à cedência do uso do prédio ou de parte dele, as importâncias recebidas pelos proprietários, como contrapartida da cedência do uso dos apartamentos, são consideradas rendimentos prediais, de acordo com o previsto na alínea a) do n.º 2 do artigo 8.º do Código do IRS, independentemente do facto da importância recebida não ser fixa.
16.7. O mero ato de compra de um imóvel e a sua consequente e imediata cessão de exploração a um terceiro, têm de ser subsumidos a simples atos de gestão de património particular, não constituindo, em si mesmos, sinais de exercício de atividade de exploração de um imóvel por parte de quem cedeu a exploração.
16.8. Resulta assim evidente que os Requerentes não levam, nem podem levar a cabo qualquer atuação de livre uso e utilização do imóvel do qual são apenas proprietários.
16.9. Quanto à pretensão, por parte dos Requerentes, de que sejam aceites a totalidade das despesas com salários de pessoal, limpeza, eletricidade, gás e água, que não foram aceites na análise efetuada no procedimento inspetivo, importa salientar que tem que se avaliar se aquelas despesas, referidas em abstrato pelos Requerentes e não demonstradas em sede arbitral, revestem o carácter de despesas de conservação e/ou manutenção que incumbam ao sujeito passivo.
16.10. Não definindo o Código do IRS o conceito de “despesas de conservação”, deve valer aqui a noção civilística constante do Regime do Arrendamento Urbano-RAU - (aprovado pelo Decreto – Lei n.º 321-B/90, de 15 de outubro) relativa à definição de obras de conservação e a determinação de quais são as que incumbem ao senhorio constante do artigo 11º do RAU (vd., Acórdão do TCA Sul proferido no processo 05310/12, em 15.12.2016). Atendendo a este enquadramento legal, as despesas mencionadas pelos Requerentes não consubstanciam despesas de conservação nem, tão pouco, de manutenção.
16.11. No que concerne às despesas com salários e com a limpeza, ressalta das secções 5 e 6 do contrato de cessão que esses encargos estão a cargo da Gestora o que significa que nem são da responsabilidade dos Requerentes. Pelo que, também neste ponto, falece razão aos Requerentes no peticionado.
II - Saneamento
17. As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas e encontram-se regularmente representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O tribunal é competente e encontra-se regularmente constituído.
O processo não enferma de nulidades.
Não foram suscitadas exceções.
Não se verificam quaisquer outras circunstâncias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
Nestes termos, o Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído para apreciar e decidir o objeto do processo.
III - Mérito
III.1. Matéria de facto
18. Factos provados
18.1. Com relevo para a apreciação e decisão das questões suscitadas dão-se como assentes e provados os seguintes factos:
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Os Requerentes são sujeitos passivos não residentes em território nacional e, desde 22-08-2011, têm como representante fiscal, para efeitos de IVA, a sociedade “F…, Lda.”, NIPC … (conforme Documento n.º 1 anexo à ata da reunião do Tribunal Arbitral, de 12-01-2018, e que se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais);
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O Requerente, A…, encontra-se registado, desde 28-08-2011, com o CAE 55123, exercício da atividade “apartamentos turísticos sem restaurante”, estando enquadrado no regime normal de periodicidade trimestral, em sede de IVA, e no regime de contabilidade organizada, por opção, em sede de IRS (conforme Documento n.º 1 anexo à ata da reunião do Tribunal Arbitral, de 12-01-2018, e que se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais);
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Os Requerentes celebraram, em 21-06-2011, um contrato promessa de compra e venda com a sociedade G…, S.A., NIPC …, com sede na … n.º…, Lisboa, relativa à fração autónoma identificada pela letra A da Unidade …, localizada no rés-do-chão esquerdo do … (vd., Considerando A do Documento n.º 4 anexo ao pedido de pronuncia arbitral);
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O imóvel, referido na alínea anterior, encontra-se inscrito na matriz predial urbana, sob o artigo …, fração A, sito no…– …, …, da União de Freguesias de … e …, Concelho de …, Distrito de Faro (conforme Documento n.º 2 anexo à ata da reunião do Tribunal Arbitral, de 12-01-2018, e que se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais);
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Os Requerentes, em 21-06-2011, celebraram com a E…, S.A., NIPC…, com sede no …, …, e com a G…, S.A., NIPC…, com sede na … n.º…, Lisboa, um contrato de cessão de exploração turística da unidade … (conforme Documento n.º 4 (fls. 1 a 33) anexo ao pedido de pronuncia arbitral e que se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais);
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Do contrato de cessão da exploração turística, identificado na alínea anterior, importa destacar as cláusulas seguintes:
F.1) A duração do contrato de cessão da exploração turística é de 10 anos renovável (vd., cláusula 2.4, fls. 3 do contrato);
F.2) Os Requerentes, proprietários do imóvel, designam como Sociedade Gestora a E…, S.A.. (a seguir abreviadamente designada por “Gestora”). A Gestora prestará, em regime de exclusividade, os serviços previstos no referido contrato, assegurando também a gestão da propriedade Unidade … (vd., cláusula 2.1, fls. 2 do contrato);
F.3) Os Requerentes asseguram a exploração turística da Unidade … através dos serviços da Gestora (vd., cláusula 2.1, fls. 2 do contrato);
F.4) A Gestora pretende explorar turisticamente a Unidade … por conta dos Requerentes, ao público em geral, numa base temporária e como parte da sua atividade (vd., cláusula 2.1, fls. 3 do contrato);
F.5) A Gestora durante toda a vigência do Contrato presta os serviços seguintes:
“A. Administrar o Programa de Exploração Turística (Programa de Exploração) descrito na Secção 3;
B. Prestar os Serviços de Administração da Propriedade descritos na Secção 4;
C. Prestar os Serviços de Manutenção da Propriedade descritos na Secção 5; e
D. Prestar os Serviços de Limpeza e de Arrumação da Unidade descritos na Secção 6.” (vd., cláusula 2.1, fls. 3 do contrato);
F.6) Relativamente à exploração turística da unidade a cláusula 3.1 estabelece: “Em troca da remuneração descrita na Seção 7 infra, a GESTORA aceita desenvolver esforços comerciais razoáveis, de acordo com as disposições do presente Contrato, para explorar turisticamente a Unidade a Hóspedes, por conta e em benefício do PRIMEIRO OUTORGANTE.” (vd., fls. 3 do contrato);
F.7) Quanto à cobrança dos pagamentos devidos pela exploração turística a cláusula 3.2 dispõe o seguinte: “O PRIMEIRO CONTRATANTE autoriza a GESTORA a desenvolver esforços comerciais razoáveis para cobrar todos os pagamentos relativos à exploração turística da Unidade, quando estes passem a ser devidos.” (vd., fls. 4 do contrato);
F.8) A respeito das reservas a cláusula 3.4 afirma: “Sem prejuízo dos direitos do PRIMEIRO CONTRATANTE descritos na Secção 3.10 infra, o PRIMEIRO CONTRATANTE autoriza a GESTORA a aceitar reservas para a ocupação da Unidade por Hóspedes, por qualquer período de tempo e a qualquer altura, até ao termo do presente contrato, mas não depois desse momento.” (vd., fls. 4 do contrato);
F.9) Relativamente às tarifas, a cláusula 3.5 dispõe: “O PRIMEIRO CONTRATANTE concede, pelo presente, à GESTORA, autorização exclusiva para esta explorar turisticamente, e por sua conta, a Unidade, segundo as tarifas que esta livremente estabelecer e fixar, de acordo com a sua livre discricionariedade, com base em vários factores, (…) A GESTORA terá também o direito de alterar livremente as tarifas em vigor a cada momento (…)”(vd., fls. 4 do contrato);
F.10) Quanto ao sistema de reservas, a cláusula 3.9 dispõe: “As reservas da Unidade para hóspedes serão tratadas através do sistema de reservas gerido e mantido pela GESTORA e de acordo com as políticas e procedimentos que regulam o sistema de reservas.” (vd., fls. 5 do contrato);
F.11) De acordo com a cláusula 13.3., os Requerentes “(…) reconhecem e aceitam que a Gestora tem controlo das chaves da Unidade durante a vigência do Contrato” (vd., fls. 19 do contrato);
F.12) Nos termos da cláusula 3.11: “A GESTORA será responsável pelo pagamento das despesas de Operação do Programa de Exploração Turística em nome próprio e por conta do PRIMEIRO CONTRATANTE, durante a vigência do presente Contrato. Consideram-se incluídas nas Despesas de Operação do Programa de Exploração Turística, para efeitos do presente Contrato, as despesas (mas não limitadas) com: (i) Serviços de Administração de Propriedade (Seção 4); (ii) Serviços de Manutenção da Propriedade (Secção 5); (iii) Serviços de Limpeza e Arrumação (Seção 6); (iv) Despesas com Equipamento (incluídas na Secção 4.3); e (v) Prémios de Seguros.” (vd., fls. 8 e 9 do contrato);
F.13) A Gestora prestará os serviços recebendo como contrapartida a remuneração descrita na Seção 7 do Contrato (vd., cláusula 2.3, fls. 3 do contrato);
F.14) Nos termos da cláusula 7., pela administração do Programa de Exploração Turística relativamente à Unidade a Gestora terá direito a receber e reterá 25% da Receita Bruta de Exploração Turística (vd., fls. 16 do contrato);
F.15) Os Requerentes, nos termos da cláusula 3.8, ficam adstritos a: “(…)durante toda a vigência do presente Contrato, não explorará, arrendará ou por qualquer outro modo meio disponibilizará a Unidade a qualquer terceiro a troco de pagamento, renda, remuneração ou de quaisquer outros meios de pagamento (inclusivamente de carácter não pecuniário ou gratuito), mais reconhecendo e aceitando o PRIMEIRO CONTRATANTE a não divulgar nem permitir que outra pessoa singular ou colectiva divulgue a Unidade como estando, entre outras, disponível para ocupação.” (vd., fls. 4 do contrato);
F.16) De acordo com a cláusula 9., cada proprietário terá direito a receber, como retribuição, uma quota-parte proporcional, correspondente ao montante calculado com base no: “(I) Número de unidades participantes no Programa de Exploração Turística; e (ii) Número de dias em que a Unidade esteve disponível para utilização no âmbito do Programa de Exploração Turística, (isto é período que não sejam de ocupação pelo PRIMEIRO CONTRATANTE. Subtraído o valor correspondente aos custos e despesas suportados pela GESTORA, em seu nome e por conta do PRIMEIRO CONTRATANTE (a que se dá o nome de “Receita Líquida de Exploração”).” (vd., fls. 16 e 17 do contrato);
F.17) Nos termos da cláusula 9.2, a Gestora “(…) entregará a cada proprietário, no prazo máximo de 15 dias a contar do fim de cada mês, um extracto/declaração sobre a Receita Líquida de Exploração relativa ao mês anterior.” (vd., fls. 17 do contrato);
F.18) Nos termos da cláusula 11 a Gestora faculta aos Requerentes um Relatório Mensal e um Relatório Anual. Competindo à Gestora nomear livremente o auditor para auditar o relatório anual de contas (vd., fls. 18 do contrato);
F.19) De acordo com a cláusula 3.12, os Requerentes acordam em “(…) mobilar e equipar a Unidade com o pacote standard de mobília, arranjos e equipamento selecionado pela G… e pela GESTORA” (vd., fls. 9 do contrato).
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O título constitutivo dos “…” foi depositado na Direção Geral do Turismo, em 08-02-2008 (conforme Documento n.º 5 anexo ao pedido de pronuncia arbitral);
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A Câmara Municipal de…, em 07-07-2008, atribui à G…, S.A., a licença de utilização turística relativa ao empreendimento denominado “Apartamentos…” (conforme Documento n.º 6 anexo ao pedido de pronuncia arbitral);
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Os Requerentes foram objeto de um procedimento de inspeção tributária, através dos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Faro, incidente sobre o IRS dos anos de 2012 (Ordem de Serviço n.º OI 2016…, de 18-08-2016), 2013 (Ordem de Serviço n.º OI2016…, de 18-08-2016) e 2014 (Ordem de Serviço n.º OI2016…, de 18-08-2016) (conforme Processo Administrativo fls. 7 a 12);
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O projeto de Relatório de Inspeção Tributária foi notificado aos Requerentes, nos termos do artigo 60.º da LGT e do artigo 60.º do RCPIT, através do ofício n.º … dos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Faro, de 11-10-2016 (conforme Documento n.º 7 anexo ao pedido de pronuncia arbitral);
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Os Requerentes apresentaram, em 25-10-2016, nos termos do artigo 60.º, n.º 7, da LGT, o seu requerimento de audição prévia (conforme Documento n.º 8 anexo ao pedido de pronuncia arbitral);
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Os Requerentes foram notificados do Relatório de Inspeção Tributária, através do ofício n.º … dos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Faro, de 16-11-2016 (conforme Documento n.º 9 anexo ao pedido de pronuncia arbitral);
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O Relatório de Inspeção Tributária, identificado na alínea anterior, propôs correções à matéria coletável dos Requerentes de € 31.168,83 quanto ao ano de 2012, de € 18.061,36 quanto ao ano de 2013 e de € 5.984,63 quanto ao ano de 2014, decorrentes do enquadramento das rendas recebidas, relativas à cedência do uso do prédio propriedade dos Requerentes, na categoria F, nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 8.º do Código do IRS (conforme Processo Administrativo fls. 86 a 104);
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Em consequência do Relatório de Inspeção, referido na alínea anterior, os Requerentes foram notificados dos seguintes atos tributários: (i) Ato de liquidação de IRS n.º 2016…, relativo ao ano de 2012 do qual resultou uma coleta total de € 3.975,15; (ii) Ato de liquidação de IRS n.º 2016…, do ato de liquidação de juros compensatórios n.º 2016…, e da Demonstração de Acerto de Contas n.º 2016… todos referentes ao ano 2013, dos quais resultou um valor a pagar de € 10.225,00; (iii) Ato de liquidação de IRS n.º 2016…, do ato de liquidação de juros compensatórios n.º 2016…, e da Demonstração de Acerto de Contas n.º 2016…, todos referentes ao ano de 2014, dos quais resultou um valor a pagar de € 2.874,57 (conforme Documento n.ºs 1, 2 e 3 anexos ao pedido de pronuncia arbitral);
18.2. Inexistem outros factos com relevo para apreciação do mérito da causa que não se tenham provado.
18.3. Fundamentação da matéria de facto
Quanto à matéria de facto dada como provada a convicção do Tribunal Arbitral fundou-se na livre apreciação da prova documental junta aos autos, cuja autenticidade não foi colocada em causa, bem como na análise do processo administrativo remetido pela Requerida e nos depoimentos das testemunhas C… e D…, que aparentaram isenção nos seus depoimentos e terem conhecimento dos factos que relataram.
III.2. Matéria de Direito
19. A questão em causa nos presentes autos arbitrais consiste em saber se os rendimentos auferidos pelos Requerentes, decorrentes do contrato de exploração turística que celebraram, são enquadráveis nos rendimentos da categoria B do IRS, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 3.º do Código do IRS, ou se devem, antes, ser qualificados como rendimentos da categoria F do IRS, de acordo com o disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 8.º do mesmo diploma.
Previamente, importa analisar a alegação dos Requerentes relativa à violação do dever de fundamentação das liquidações adicionais efetuadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira, em virtude do vício de falta de fundamentação do Relatório de Inspeção Tributária.
Por fim, em caso de improcedência do pedido principal, cumpre analisar se os atos de liquidação contestados enfermam de ilegalidade parcial em virtude da Autoridade Tributária e Aduaneira não ter atendido, para efeitos de dedução em sede de Categoria F, a todas as despesas suportadas pelos Requerentes com o imóvel gerador dos rendimentos em causa.
20. A primeira questão que cumpre apreciar respeita à alegada falta de fundamentação do Relatório de Inspeção Tributária, identificado na alínea L) do n.º 18.1. supra, que consubstancia a motivação dos atos tributários objeto do presente pedido de pronúncia arbitral.
20.1. No enquadramento legal desta questão importa ter presente o disposto no artigo 268.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa (CRP) e no artigo 77.º, n.º 1 da LGT.
O artigo 268.º, n.º 3, da CRP estabelece que “os actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei, e carecem de fundamentação expressa e acessível quando afetem direitos ou interesses legalmente protegidos”.
O artigo 77.º, n.º 1 da LGT prevê que a “(…) decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária”.
20.2. A jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo tem sustentado que “(…) o dever de fundamentação exige que um destinatário normal, colocado na posição do recorrente, face ao teor expresso do acto, possa apreender o percurso lógico-jurídico trilhado pela autoridade recorrida para chegar a tal decisão, por forma a poder determinar-se, conscientemente, no sentido da impugnação ou não impugnação.” (vd., Acórdão do STA, de 11-11-1998, processo n.º 31339).
20.3. O Relatório de Inspeção Tributária, supra identificado, no ponto III “Descrição dos factos e fundamentos das correções meramente aritméticas à matéria tributável”, expõe com clareza a posição da Autoridade Tributária e Aduaneira que levou ao apuramento das correções à matéria coletável de IRS dos Requerentes, remetendo inclusive para o disposto na Circular n.º 5/2013, de 02-07-2013, e nas informações vinculativas n.ºs 477 e 1369 pedidas pela G… S.A. (vd., fls. 91 do Processo Administrativo). Da leitura do referido Relatório de Inspeção resulta perfeitamente cognoscível o quadro legal utilizado, permitindo a um destinatário normal “apreender o percurso lógico-jurídico” da Requerida na decisão tomada. Consequentemente, nada obsta que os Requerentes conheçam e apreendam as razões invocadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira. Aliás, os Requerentes, tanto no exercício do direito de audição relativamente ao Projeto de Relatório de Inspeção Tributária (vd., alínea K) do n.º 18.1. supra) como no próprio pedido de pronúncia arbitral (vd., artigo 34.º do pedido de pronúncia arbitral), revelam ter compreendido cabalmente as razões de facto e de direito expostas pela Requerida no Relatório de Inspeção Tributária. Os Requerentes podem obviamente não concordar com as razões invocadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira, mas essa não é uma questão de falta de fundamentação.
20.4. Pelo exposto, concluímos que não se verifica o vício de falta de fundamentação do Relatório de Inspeção Tributária, que deu origem aos atos de liquidação adicionais contestados pelos Requerentes no presente pedido de pronúncia arbitral.
21. Iremos agora analisar a questão da qualificação dos rendimentos auferidos pelos Requerentes, decorrentes do contrato de cessão da exploração turística que celebraram. Importa apurar se os referidos rendimentos são enquadráveis na categoria B (Rendimentos empresariais e profissionais) do IRS, ou se devem, antes, ser qualificados como rendimentos da categoria F (Rendimentos prediais) do IRS.
21.1. Verifica-se através do título constitutivo do empreendimento (vd., alínea G) do n.º 18.1. supra) e que este se encontra sujeito ao regime jurídico da instalação e do funcionamento dos empreendimentos turísticos.
O regime jurídico da instalação e do funcionamento dos empreendimentos turísticos (a seguir “RJIFET”) vigente em 08-02-2008, data do depósito do referido título constitutivo do empreendimento, constava do Decreto-Lei n.º 167/97, de 4 de julho, alterado pelo Decreto-Lei n.º 305/99, de 6 de agosto, pelo Decreto-Lei n.º 55/2002, de 11 de março e pelo Decreto-Lei n.º 217/2006, de 31 de outubro.
O RJIFET, no artigo 1.º, n.º 1, definia empreendimentos turísticos como “os estabelecimentos que se destinam a prestar serviços de alojamento temporário, restauração ou animação de turistas, dispondo, para o seu funcionamento, de um adequado conjunto de estruturas, equipamentos e serviços complementares”.
O artigo 44.º, n.º 1, do RJIFET estabelecia que “A exploração de cada empreendimento turístico deve ser da responsabilidade de uma única entidade.” E o n.º 2 do mesmo artigo dispunha que “A unidade de exploração do empreendimento não é impeditiva de a propriedade das várias fracções imobiliárias que o compõem pertencer a mais de uma pessoa.”
21.2. O Decreto-Lei n.º 39/2008, de 7 de março, aprovou um novo RJIFET, e manteve a consagração legal da regra da unicidade da exploração, constante do artigo 44.º, n.º 1, e reforça-a no artigo 45.º ao estabelecer o seguinte:
“1- Sem prejuízo do disposto no artigo 49.º, as unidades de alojamento estão permanentemente em regime de exploração turística, devendo a entidade exploradora assumir a exploração continuada da totalidade das mesmas, ainda que ocupadas pelos respetivos proprietários.
2- A entidade exploradora deve assegurar que as unidades de alojamento permanecem a todo o tempo mobiladas e equipadas em plenas condições de serem locadas para alojamento a turistas e que nelas são prestados os serviços obrigatórios da categoria atribuída ao empreendimento turístico.
3- Quando a propriedade e a exploração turística não pertençam à mesma entidade ou quando o empreendimento se encontre em regime de propriedade plural, a entidade exploradora deve obter de todos os proprietários um título jurídico que a habilite à exploração da totalidade das unidades de alojamento.
4- O título referido no número anterior deve prever os termos da exploração turística das unidades de alojamento, a participação dos proprietários nos resultados da exploração da unidade de alojamento, bem como as condições da utilização desta pelo respetivo proprietário.
5- Os proprietários das unidades de alojamento, quando ocupam as mesmas, usufruem dos serviços obrigatórios da categoria do empreendimento, os quais estão abrangidos pela prestação periódica prevista no artigo 56.º
6- As unidades de alojamento previstas no n.º 3 não podem ser exploradas directamente pelos seus proprietários, nem podem ser objecto de contratos que comprometam o uso turístico das mesmas, designadamente, contratos de arrendamento ou constituição de direitos de uso e habitação.”
Como ficou consignado na Decisão Arbitral proferida no processo n.º 275/2017-T:
“53. O legislador distinguia aqui claramente entre a propriedade das várias frações imobiliárias que compõe o empreendimento, a qual pode ser plural, e a exploração deste, que «deve ser da responsabilidade de uma única entidade».
54. Dito de outro modo, o legislador admite a propriedade plural, mas impõe a unicidade da exploração.
55. Daqui advém a indispensabilidade de celebração de contratos de cessão de exploração turística entre os proprietários das frações imobiliárias e a entidade responsável pela exploração turística.
56. A celebração de tais contratos decorre da necessidade de observância da lei, e não da vontade das partes contratantes – não se trata, pois, de uma opção de gestão por parte do proprietário da fração, mas antes de uma condição necessária para a aquisição da fração imobiliária.”
21.3. A exploração turística do imóvel de que os Requerentes são proprietários foi assegurada pela sociedade gestora, de acordo com a regra da unicidade da exploração consagrada no artigo 44.º, n.º 1, do RJIFET.
Do contrato de cessão da exploração turística atrás descrito (vd., alíneas F.2) a F.13) do n.º 18.1. supra) decorre que cabe à sociedade gestora assegurar a exploração turística da fração imobiliária de que os Requerentes são proprietários. Aliás os Requerentes, na qualidade de proprietários, na vigência do contrato de cessão de exploração turística, ficam impossibilitados de explorar, arrendar ou por qualquer outro meio disponibilizar o imóvel a terceiros (vd., alínea F.15) do n.º 18.1. supra).
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 3.º do Código IRS, consideram-se rendimentos empresariais e profissionais (categoria B) “a) Os decorrentes do exercício de qualquer atividade comercial, industrial, agrícola, silvícola ou pecuária “.
O legislador indica, na alínea h) do n.º 1 do artigo 4.º do Código do IRS, as “atividades hoteleiras e similares, restauração e bebidas, bem como a venda ou exploração do direito real de habitação periódica.” no elenco das diversas atividades consideradas comerciais e industriais.
Só que a atividade comercial que consiste na exploração turística do imóvel não é desenvolvida pelos Requerentes, mas pela sociedade gestora. Num tal contexto, os rendimentos auferidos pelos Requerentes não decorrem da exploração turística da fração imobiliária de que são proprietários, mas antes da cedência do referido imóvel para exploração por outra entidade (a denominada sociedade gestora ou gestora, nos termos do contrato de cessão de exploração turística).
Como se refere na Decisão Arbitral no processo n.º 275/2017-T “69. O que é decisivo é que, por imposição legal, a exploração turística da fração imobiliária de que os Requerentes são proprietários não pode ser assegurada pelos mesmos, pelo que os rendimentos por eles auferidos, (…) não podem, logicamente, ser imputados a tal atividade. “
21.4. O registo do Requerente no CAE, tal como o regime do IVA em que está enquadrado, não é determinante para a solução do presente caso. Os presentes autos não pretendem apurar se o Requerente está ou não a exercer a atividade comercial em que está inscrito. O que se pretende saber é se os rendimentos auferidos, resultantes do exercício da atividade de exploração turística, podem ser imputados ao Requerente a título de rendimentos comerciais (categoria B de IRS).
21.5. O artigo 8.º do Código do IRS, referente aos rendimentos da categoria F, estabelece o seguinte:
“1- Consideram-se rendimentos prediais as rendas dos prédios rústicos, urbanos e mistos pagas ou colocadas à disposição dos respectivos titulares.
2 - São havidas como rendas:
a) As importâncias relativas à cedência do uso do prédio ou de parte dele e aos serviços relacionados com aquela cedência;”
Assim, os rendimentos auferidos pelos Requerentes decorrem da cedência do imóvel, pelo que revestem a natureza de rendimentos prediais ficando abrangidos pelo disposto no artiga supra citado.
21.7. Neste sentido, pelo menos, já se pronunciaram as decisões do CAAD nos processos n.ºs. 211/2017-T, 235/2017-T e 275/2017-T.
22. Importa agora analisar a pretensão dos Requerentes, apresentada a título subsidiário, de que seja aceite a dedução da totalidade dos custos suportados, nos anos de 2012, 2013 e 2014, com despesas de manutenção e conservação referentes a salários de pessoal, limpeza, eletricidade, água e gás (vd., art.º 122.º do pedido de pronúncia arbitral).
22.1. De acordo com o n.º 2 do artigo 13.º do Código do IRS, são sujeitos passivos de IRS “(…) as pessoas singulares que residam em território português e as que, nele não residindo, aqui obtenham rendimentos.”.
O IRS incide sobre “o valor anual dos rendimentos das categorias seguintes, mesmo quando provenientes de atos ilícitos, depois de efetuadas as correspondentes deduções e abatimentos.” (vd., artigo 1.º, n.º 1, do Código do IRS).
As importâncias recebidas pelos Requerentes a título de rendas são consideradas rendimentos prediais – categoria F (vd., artigo 8.º do Código do IRS).
As despesas suscetíveis de serem dedutíveis aos rendimentos prediais encontram-se previstas no artigo 41.º do Código do IRS.
O artigo 41.º do Código do IRS, na redação em vigor no ano de 2012, previa que “aos rendimentos brutos referidos no artigo 8.º, deduzem-se as despesas de manutenção e de conservação que incumbam ao sujeito passivo, por ele sejam suportadas e se encontrem documentalmente provadas, bem como o imposto sobre imóveis e o imposto do selo que incide sobre o valor dos prédios (…) cujo rendimento tenha sido englobado.”.
A redação em vigor nos anos de 2013 e 2014 dispunha que “aos rendimentos brutos referidos no artigo 8.º, deduzem-se as despesas de manutenção e de conservação que incumbam ao sujeito passivo, por ele sejam suportadas e se encontrem documentalmente provadas, bem como o imposto sobre imóveis e o imposto do selo que incide sobre o valor dos prédios (…) cujo rendimento seja objecto de tributação no ano fiscal.”.
Atendendo ao disposto no artigo 41.º do Código do IRS, os pressupostos legais para consideração de despesas e encargos efetuados depende de: i) Despesas de manutenção e conservação que incumbam ao sujeito passivo; ii) Despesas efetivamente suportadas e documentalmente provadas; iii) IMI incidente sobre o valor do prédio arrendado, cujo rendimento seja objeto de tributação no ano fiscal, ou seja, pago no ano dos rendimentos a tributar em IRS.
22.2. A regra de dedutibilidade dos custos da categoria F está associada aos custos de manutenção e de conservação necessários para a obtenção dos rendimentos prediais tributáveis, mas que o legislador nunca tipificou. Efetivamente “ (…) o Código do IRS não define o que se entende por “despesas de manutenção e conservação”, pelo que, a interpretação daquele conceito deverá ser efectuada tendo por referência o artigo 11.º da LGT. Atendendo à noção civilística constante no Regime do Arrendamento Urbano (RAU), por ser o diploma que definia as regras do arrendamento urbano e definia quais as obras que incumbia ao senhorio, apesar de não existir correspondência terminológica entre “despesas de manutenção e conservação”, previstas no artigo 41.º do Código do IRS, e o RAU, que distingue entre "obras de conservação ordinária", "obras de conservação extraordinária" e "obras de beneficiação", o artigo 11.º dispunha que:
1 - Nos prédios urbanos, e para efeitos do presente diploma, podem ter lugar obras de conservação ordinária, obras de conservação extraordinária e obras de beneficiação.
2 - São obras de conservação ordinária:
a) A reparação e limpeza geral do prédio e suas dependências; b) As obras impostas pela Administração Pública, nos termos da lei geral ou local aplicável, e que visem conferir ao prédio as características apresentadas aquando da concessão da licença de utilização;
c) Em geral, as obras destinadas a manter o prédio nas condições requeridas pelo fim do contrato e existentes à data da sua celebração.
3 - São obras de conservação extraordinária as ocasionadas por defeito de construção do prédio ou por caso fortuito ou de força maior, e, em geral, as que não sendo imputáveis a acções ou omissões ilícitas perpetradas pelo senhorio, ultrapassem, no ano em que se tornem necessárias, dois terços do rendimento líquido desse mesmo ano.
4 - São obras de beneficiação todas as que não estejam abrangidas nos dois números anteriores.”.
Veja-se, a este propósito o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 06.07.2016, proferido no processo n.º 088/16, onde, para além do mais, se pode ler: “As despesas de manutenção e de conservação serão despesas que sejam necessárias à conservação e manutenção dos imóveis que são geradores de rendimento. Poderão ser, como antes definidas no Regime do Arrendamento Urbano, art. 11.º, despesas efectuadas com obras de conservação ordinária - reparação e limpeza geral do prédio, obras impostas pela Administração Pública, e, em geral, as destinadas a manter o prédio nas condições requeridas pelo fim do contrato e existentes à data da sua celebração; obras de conservação extraordinária – de reparação de defeitos de construção do prédio ou supervenientes; ou até de beneficiação do imóvel, mas sempre com repercussão no imóvel e na susceptibilidade de ele gerar rendimentos.”.
15. Assim, as despesas de manutenção e de conservação serão despesas que sejam necessárias à conservação e manutenção dos imóveis geradores de rendimento. Poderão ser despesas efectuadas com obras de conservação ordinária, de reparação e limpeza geral do prédio, obras impostas pela Administração Pública, e, em geral, todas as destinadas a manter o prédio nas condições requeridas pelo fim do contrato e existentes à data da sua celebração; obras de conservação extraordinária, de reparação de defeitos de construção do prédio ou supervenientes ou até de beneficiação do imóvel, mas sempre com repercussão no mesmo e na susceptibilidade de ele gerar rendimentos. Sendo que apenas as obras de conservação ordinária é que estão a cargo do senhorio. Contrariamente, as obras de conservação extraordinária e de beneficiação só ficam a cargo do senhorio quando a sua execução lhe seja ordenada pela câmara municipal competente ou quando haja acordo escrito das partes no sentido da sua realização, com discriminação das obras a efetuar.”[1]
Atendendo ao exposto, as despesas referentes a consumos de eletricidade, água e gás, não integram os conceitos de “manutenção e conservação” e consequentemente não podem ser deduzidas aos rendimentos brutos da categoria F, de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 41.º do Código do IRS.
22.3. Relativamente às demais despesas invocadas pelos Requerentes elas integram-se no conceito de despesas de manutenção e conservação, mas, nos termos do contrato de cessão de exploração turística, essas despesas estão a cargo da sociedade gestora (vd., alínea F.15) do n.º 18.1. supra e a Secção 6 e as cláusulas 5.3, 5.4 e 5.5 do contrato de cessão de exploração turística que se encontra anexo, como documento n.º 4, ao pedido de pronúncia arbitral).
Daí que os pagamentos referentes a este tipo despesas sejam realizados pela sociedade gestora. Pode afirmar-se que estas despesas são suportadas de forma indireta pelos Requerentes através da remuneração que pagam à sociedade gestora (vd., alínea F.15) do n.º 18.1. supra). O custo dedutível pelos Requerentes é o correspondente à remuneração paga à sociedade gestora, o qual não é contestado pelos Requerentes.
22.4. Em conclusão, improcede o pedido dos Requerentes de consideração, para efeitos de dedução aos rendimentos da categoria F do IRS, das despesas com salários de pessoal, limpeza, eletricidade, gás e água nos anos de 2012, 2013 e 2014.
IV - Decisão
Em face do exposto, o Tribunal Arbitral decide julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral e, em consequência, absolver a Requerida do pedido, com as devidas consequências legais.
V - Valor do Processo
Atendendo ao disposto nos artigos 32.º do CPTA, 306.º, n.º 2, do Código do Processo Civil e 97.º-A do CPPT, aplicáveis por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT, e no artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT) fixa-se o valor do processo em € 17.074,72 (dezassete mil, setenta e quatro euros e setenta e dois cêntimos).
VI - Custas
Custas a cargo da Requerente, no montante de € 1.224,00 (mil duzentos e vinte e quatro euros), nos termos da Tabela I do RCPAT, em cumprimento do disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, bem como do disposto no artigo 4.º, n.º 4, do RCPAT.
Notifique-se.
Lisboa, Centro de Arbitragem Administrativa, 22 de fevereiro de 2018
O Árbitro
Olívio Mota Amador
[1] Cfr., Decisão Arbitral proferida no processo n.º 264/2017-T.