Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 329/2017-T
Data da decisão: 2018-01-22  IVA  
Valor do pedido: € 485.590,25
Tema: IVA – Direito à dedução; Transmissão intracomunitária de bens - Prestação de serviços relativa a bens imóveis.
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DECISÃO ARBITRAL

 

Acordam os Árbitros José Pedro Carvalho (Árbitro Presidente), Diogo Leite de Campos e Artur Maria da Silva, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem Tribunal Arbitral:

 

 

I – RELATÓRIO

 

  1. No dia 18 de Maio de 2017, A…, contribuinte n.º …, com sede em …, …, Suécia, apresentou pedido de constituição de tribunal arbitral, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, com a redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro (doravante, abreviadamente designado RJAT), visando a declaração de ilegalidade do acto de liquidação adicional de Imposto sobre o Valor Acrescentado ("IVA") e respectivos juros compensatórios, com referência aos anos 2008, 2009 e 2010, no montante global de € 485.590,25 (correspondendo a € 448.899,64 de imposto e € 36.690,61 de juros compensatórios), conforme o seguinte quadro:

 

 

 

bem como do indeferimento do Recurso Hierárquico n.º …2012…, do indeferimento do processo de Reclamação Graciosa n.º …2011…, que tiveram aquelas liquidações como objecto.

 

  1. Para fundamentar o seu pedido alega a Requerente, em síntese, que ela própria e o seu registo fiscal em território nacional são uma e a mesma entidade jurídica, A…, ou seja, uma entidade sediada na Suécia, que, por realizar aquisições intracomunitárias de bens em Portugal, procedeu ao seu registo de IVA neste território e que forneceu bens aos seus clientes nacionais, com instalação ou montagem desses bens nos imóveis dos clientes em Portugal, tendo para o efeito subcontratado entidades terceiras, sujeitos passivos nacionais, os quais emitiram facturas relativas aos serviços prestados, com menção do número de identificação fiscal português da Requerente.

Mais alega a Requerente, que as referidas instalações ou montagens foram efectuadas mediante a subcontratação de empresas nacionais, constituindo uma prestação de serviços realizada nos seus clientes (B…, C…, D…), nos termos do n.º 1 do artigo 4.º do CIVA.

Alega, também que estes serviços de instalação ou montagem estão relacionados com imóveis sitos no território nacional, sendo estas operações localizadas em Portugal, de harmonia com o estipulado na al. a) do n.º 8 do artigo 6.º do CIVA.

Entendendo a Requerente que o NIF utilizado nos documentos que titulam a operação (sueco ou português) correspondem à mesma pessoa jurídica, conclui ser devido o reembolso por si liquidado nas respectivas declarações de imposto, corrigido pela AT.

 

  1. No dia 19-05-2017, o pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite e automaticamente notificado à AT.

 

  1. A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os signatários como árbitros do tribunal arbitral colectivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

 

  1. Em 07-07-2017, as partes foram notificadas dessas designações, não tendo manifestado vontade de recusar qualquer delas.

 

  1. Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral Colectivo foi constituído em 21-07-2017.

 

  1. No dia 03-10-2017, a Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou a sua resposta defendendo-se unicamente por impugnação.

 

  1. Ao abrigo do disposto nas als. c) e e) do art.º 16.º, e n.º 2 do art.º 29.º, ambos do RJAT, foi dispensada a realização da reunião a que alude o art.º 18.º do RJAT.

 

  1. Tendo sido concedido prazo para a apresentação de alegações escritas, as partes optaram por não as apresentar.

 

  1. Foi fixado o prazo de 30 dias para a prolação de decisão final, após o termo do prazo para a apresentação de alegações pela Requerida.

 

  1. O Tribunal Arbitral é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º. e 6.º, n.º 1, do RJAT.

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.

O processo não enferma de nulidades.

Assim, não há qualquer obstáculo à apreciação da causa.

 

Tudo visto, cumpre proferir:

 

II. DECISÃO

A. MATÉRIA DE FACTO

A.1. Factos dados como provados

 

  1. A Requerente, actualmente com a denominação E…- em virtude de ter ocorrido, em 2011, uma fusão entre a A… e a R…e, posteriormente, em 2014, uma alteração de denominação - é uma entidade sedeada na Suécia, membro do grupo internacional F…, de origem Finlandesa, e um dos maiores grupos económicos do mundo no desenvolvimento e engenharia de equipamentos e soluções mecânicas para diversas indústrias.
  2. A Requerente é um fornecedor global de tecnologia e serviços para as indústrias de mineração, construção, geração de energia, petróleo e gás, reciclagem, e papel e celulose.
  3. É na Suécia que a empresa centraliza a sua actividade, dedicando-se à elaboração de projectos destinados a clientes estabelecidos por todo o mundo.
  4. Os projectos por si desenvolvidos consistem no fornecimento de bens ou serviços, sendo que, no caso de fornecimento de bens, os mesmos podem comportar a respectiva instalação ou montagem, consoante as exigências de ordem técnica dos clientes.
  5. Em face das especificações técnicas dos diferentes tipos de projectos, a ora Requerente recorre por regra a fornecedores localizados em diversos países por forma a satisfazer as pretensões dos seus clientes de modo eficiente e dentro dos seus padrões de qualidade.
  6. A actividade da Requerente, tendo como destino Portugal, consistiu na aquisição de equipamento e seu posterior fornecimento a clientes em Portugal, incluindo, quando necessário, a respectiva instalação ou montagem.
  7. Tendo em conta tal actividade a Requerente inscreveu-se junto do Registo Nacional das Pessoas Colectivas, em Lisboa, sob o número … .
  8. A Requerente iniciou a sua actividade para efeitos do IVA em Portugal a 2 de Dezembro de 1997, tendo, para o efeito, entregue uma declaração de início de actividade.
  9. A Requerente procedeu à aquisição de equipamento em vista ao seu posterior fornecimento a clientes em Portugal, sendo que, sempre que esse equipamento necessitou de instalação ou montagem, a Requerente subcontratou a sujeitos passivos nacionais a realização deste serviço de instalação ou montagem, e eventual manutenção, de equipamento nas instalações dos seus clientes sitas em território nacional.
  10. A Requerente incorreu em IVA nas aquisições de serviços a prestadores nacionais, tendo efectuado a correspondente dedução nas suas declarações periódicas de IVA.
  11. Os serviços em questão consistiram na instalação dos bens vendidos pela Requerente nas instalações dos seus clientes, em conformidade com as obrigações contratuais por si assumidas para com estes.
  12. As operações activas realizadas, pela Requerente, referentes a Portugal, consistiram na venda de equipamentos e maquinaria, com o respectivo transporte e instalação e montagem nas instalações dos seus clientes localizados neste território.
  13. Em 2008, 2009 e 2010 a Requerente, em Portugal, (com o número de identificação fiscal PT…) entregou declarações periódicas do IVA, nas quais não reportou quaisquer operações activas.
  14. Por sua vez, a Requerente, na Suécia, (com o número de identificação fiscal SE …) reportou nas suas declarações recapitulativas suecas transmissões intracomunitárias da Suécia para Portugal, identificando como adquirentes os clientes dos projectos em território nacional, tendo as facturas correspondentes a estas operações sido emitidas com o seu NIF sueco.
  15. As transmissões intracomunitárias de bens da Suécia para Portugal identificaram como adquirentes os clientes dos projectos em território nacional.
  16. Após uma revisão interna de procedimentos, a Requerente procedeu à submissão de declarações periódicas de substituição relativas ao 2.º e 3.º trimestre de 2007 e, bem assim, ao 1.º, 2.º, 3.º e 4.º trimestre de 2008, e declarou as referidas operações activas no campo 8 do quadro 06 - operações isentas ou não tributadas que conferem o direito à dedução,
  17. As facturas oportunamente emitidas aos seus clientes, não foram, nesse momento, corrigidas de forma a mencionar o NIF português da ora Requerente.
  18. A Requerente solicitou, na declaração periódica de IVA referente a Agosto de 2010, o reembolso do crédito de IVA dedutível a seu favor, no montante de € 107.807,74.
  19. Na sequência deste pedido, e em conformidade com as ordens de serviço OI2010…, OI2011… e OI2011…, a Requerente foi objecto de uma acção inspectiva por parte dos Serviços de Inspecção Tributária ("SIT") da Direcção de Finanças de Lisboa, em matéria de IVA e com referência aos anos 2008, 2009 e 2010.
  20. Do Relatório de Inspecção Tributária (RIT) resultante da referida acção inspectiva, consta, para além do mais, o seguinte:

“III. Considerações Prévias

1. Em carta datada de 15/11/2010, enviada via e-mail, na mesma data, pela interlocutora P… (pertencente à sociedade G…, SA), o sujeito passivo em apreciação descreveu a sua actividade com os seguintes argumentos:

“...A A… é uma entidade sediada na Suécia, que pertence ao Grupo internacional H… de origem Finlandesa, um dos maiores grupos económicos do mundo, com diversas actividades no ramo industrial, nomeadamente nos sectores de produção de pasta e de papel...“

“...Neste contexto, em Portugal a A… procede à instalação e montagem de equipamento para a indústria da celulose nas instalações da B…, SA, no qual recorre a fornecedores como a I..., a J..., a K..., a L... “

2. Justificou-se um segundo pedido de esclarecimentos, enviado ao contribuinte via notificação sob o Ofício nº … de 25/01/2011, transcrevendo-se a questão colocada como ponto 1:

“1. Apresentar a actividade desenvolvida pelo registo de IVA em apreciação, A… (NIF…), no território nacional desde 2007, esclarecendo o circuito comercial desenvolvido, com os principais intervenientes identificados fiscalmente (fornecedores/clientes), projectos já desenvolvidos e os em curso/sua localização/período de execução/previsão de conclusão dos em curso, se envolveu a celebração de contratos precisando temporalmente/entidades contraentes, e os vários locais do exercício da actividade. Não esquecer de indicar qual o rumo da actividade do sujeito passivo após o pedido de reembolso de IVA solicitado em 2010-08.”

3. Em carta datada de 11/02/2011, com o registo de entrada nesta Direcção de Finanças nº … da mesma data, o sujeito passivo fez-nos chegar a seguinte informação como resposta ao questionado no ponto 1 da 2ª notificação (ponto 2 do presente relatório), transcrevendo-se alguns excertos:

“...em Portugal a actividade da A… consiste em garantir a boa implementação dos projectos que elaborou a pedido das empresas Portuguesas neste ramo, como a C…, D… e B…, para as diversas estações das linhas de produção nas fábricas desses clientes. Estes projectos implicam a selecção de potenciais e principais fornecedores de materiais ou trabalhos consoante as especificações ao nível de engenharia....”

“...os projectos (da A…) bem como os eventuais equipamentos instalados têm prazos de garantia que por norma não excedem 4 anos...”

“ ...desde o pedido de reembolso, Agosto de 2010, que a A… tem 3 projectos ainda a decorrer..., não tendo recebido comunicações recentes da parte dos seus clientes para eventuais intervenções adicionais, sejam elas dentro da garantia de projectos existentes, sejam para eventuais projectos novos...”

4. Adicionalmente, o sujeito passivo fez-nos chegar cópia da única declaração de alterações entregue em 25/02/2009, na qual altera a sua denominação social de M… para A…, deixando de ter a sede no território nacional na …, …, …º, … Lisboa (morada fiscal da sociedade G…, SA), para assumir um domicílio fiscal sueco.

5. A propósito dos esclarecimentos prestados pelo contribuinte em 11/02/2011, no ponto 2 da sua carta refere que “...A A… não desenvolveu nem pretende iniciar a sua actividade a nível comercial em Portugal...”.

6. Analisadas as DP’s de IVA submetidas pelo sujeito passivo (NIF…) desde o seu enquadramento em território nacional (02/12/1997), verificamos que de 2004 a 2007 o sujeito passivo demonstra ter estado praticamente inactivo.

7. O crédito de IVA solicitado pelo sujeito passivo A… (NIF…) no período de imposto 2010-08, no montante de 107.870,74 €, tem origem no período de imposto 2009-06T, justificando-se com as deduções de IVA associadas à facturação que lhe foi emitida por fornecedores nacionais, com liquidação de IVA, relativos à aquisição de serviços de isolamento de tubagens e reparação mecânica de equipamento, na sua maioria fazendo menção à obra da B… (“B…”). De notar que a facturação apresenta uma descrição em língua inglesa, podendo constar ou não alguma tradução para português.

8. Menciona-se de seguida alguns dos fornecedores nacionais associados à facturação emitida à A… (NIF…): I…, SA (…), N…, Lda (…), K…, Lda (…). Sublinha-se que a facturação em causa foi emitida de 2008 até 24/02/2009 com IVA liquidado pelo adquirente, e a partir de 25/02/2009 com IVA liquidado pelo fornecedor, data a partir do qual o sujeito passivo em apreciação deixa de ter a sua sede no território nacional, para assumir um domicílio fiscal sueco.

9. De notar ainda que o sujeito passivo justificou a sua situação de crédito permanente de IVA desde 2009, nos esclarecimentos constantes na alínea b) da sua carta datada de 15/11/2010, com a seguinte argumentação, que transcrevemos integralmente:

“...Para efeitos do Imposto sobre o Valor Acrescentado (“IVA”), a instalação e montagem do equipamento fornecido à B… configura-se como uma prestação de serviços de construção civil e, como tal, encontra-se abrangido pelo mecanismo de inversão do sujeito passivo IVA, pelo que este imposto tem sido autoliquidado pela B…, ao abrigo do Decreto-lei nº 21/2007, de 29 de Janeiro, e correspondentes Ofícios do Ministério das Finanças e da Administração Pública. ...”

10. Perante as respostas muito pouco satisfatórias do sujeito passivo em apreciação (A…, NIF…), aliado ao facto das suas DP’s de IVA não reproduzirem de maneira alguma a actividade assumida, apresentando-se as incoerências encontradas nos pontos A) e B) do presente relatório, justificou-se a necessidade de circularizar informação junto dos seus principais fornecedores nacionais (I…, SA – ofício nº … de 17/11/2010; K…, Lda – ofício nº … de 17/11/2010) e clientes assumidos (B… – email de 14/01/2011 e ofício n.º … de 17/11/2010; C…– email de 14/01/2011). Os sujeitos passivos nacionais circularizados responderam prontamente com extractos de conta, cópia das facturas e outros documentos emitidos quer ao sujeito passivo em análise (A… …), quer pelo sujeito passivo A… com NIF sueco (SE…), incluindo alguns contratos celebrados/notas de encomenda/relatórios de inspecção.

 

IV. Descrição dos Factos e Fundamentos das Correcções Aritméticas em sede de IVA

 

Em face das diligências efectuadas e das explicações obtidas, com todo o suporte documental recolhido, concluímos pela existência de uma grande incoerência de procedimentos quer ao nível das operações activas, quer ao nível das operações passivas, que passaremos a apresentar:

 

A) Incoerência de procedimentos ao nível das operações activas

1) Depois de um período marcado por alguma inactividade, as DP’s de IVA do sujeito passivo em apreciação com NIF…, começaram a reportar em 2007 apenas operações activas no montante total de 2.475.000 € (campo 8), sem qualquer actividade declarada ao nível das operações passivas. Em 2008, também no campo 8 das suas DP’s de IVA, foi declarado o valor global de 6.810.575 €, não tendo sido declarado desde então qualquer valor neste mesmo campo. Por outro lado, os valores declarados nos campos 3 e 4 das suas DP’s de IVA, apenas entre 2008 até ao período de imposto 2009-03T, não estão associados a qualquer facturação emitida com IVA liquidado pelo sujeito passivo em apreciação (NIF…), estando sim associadas à autoliquidação do IVA de facturação emitida por fornecedores nacionais a este mesmo nº de contribuinte.

2) Apesar de notificado para definir a actividade económica desenvolvida pelo registo de IVA em apreciação (NIF…), no nosso território desde 2007, o sujeito passivo apresentou-nos uma actividade muito pouco esclarecida, sem fazer uma apresentação objectiva do circuito comercial desenvolvido, sem definir fiscalmente os seus intervenientes, quais os projectos de investimentos desenvolvidos/período de execução/contratos celebrados/entidades contraentes, conforme transcrevemos nos pontos 1 a 3 do ponto III – Considerações Prévias deste relatório.

3) Com efeito, a actividade declarada nas DP’s de IVA entregues desde 2007 até à data não incluem quaisquer operações activas pertencentes à esfera do NIF…, uma vez que os valores declarados no campo 8 das sua DP’s de IVA de 2007 a 2008 dizem respeito a facturação emitida pelo sujeito passivo sueco A… (SE…) ao cliente nacional B… (…), SA (…), que verificamos integralmente.

4) Importa referir que toda a facturação emitida pelo sujeito passivo sueco à B… foi-nos remetida por esta empresa, quando circularizada, tendo sido possível confirmar os valores declarados pelo registo de IVA nacional com o NIF … . Por outro lado, o cliente nacional B… assumiu nos esclarecimentos prestados em carta datada de 30/11/2010 (registo entrada nesta Direcção de Finanças n.º … de 02/12/2010) que “...a entidade A…, contribuinte nº…, não é fornecedor da B… (B…), SA...”, mantendo uma relação comercial continuada com a A…, com o nº de contribuinte sueco (SE…), conforme apuramos nos contactos posteriormente desenvolvidos.

5) Os débitos emitidos pelo sujeito passivo sueco, A… com o NIF sueco (SE…), quer à B…, quer à C… (clientes nacionais circularizados), constituem transmissões intracomunitárias de bens (equipamento para a indústria da celulose) que foram expedidos para outro Estado Membro (Portugal), com destino ao adquirente (B… e outros sujeitos passivos nacionais no sector da celulose e pasta de papel), constituindo Transmissões Intracomunitárias Isentas de IVA para o sujeito passivo sueco (SE …). De facto, estas transmissões facturadas aos clientes sujeitos passivos nacionais foram devidamente declaradas em sede de IVA pelo sujeito passivo sueco nas suas declarações fiscais e confirmadas no VIES – Sistema de Informações de Trocas Intracomunitárias. Incoerentemente, as transacções facturadas pelo sujeito passivo sueco à B…, em 2007 e 2008, no valor total de 9.285.575,10 € (2.475.000 € em 2007; 6.810.575,10 em 2008) foram igualmente reportadas na esfera do registo de IVA da A… em território nacional, declarando-as no campo 8 das suas DP’s de IVA de 2007 (2007-06T e 2007-09T) e 2008 (2008-06T a 2008-12T).

6) Nestes termos, temos um sujeito passivo do IVA em Portugal, não residente, que não pratica qualquer operação activa no nosso território, fazendo jus ao afirmado em carta datada de 11/02/2011 pelo contribuinte, na resposta incluída no ponto 2 “...A A… não desenvolveu nem pretende iniciar a sua actividade a nível comercial em Portugal...”.

7) Notificado para clarificar quais são os proveitos da A… com o NIF…, com as aquisições cujo IVA suportou e declarou nas suas DP’s de IVA desde 2008 e a quem são debitadas, devendo comprovar para o efeito com a documentação emitida (todas as facturas de proveitos emitidas pelo sujeito passivo nacional … desde 2007), o contribuinte optou por não responder ao questionado, anexando a facturação emitida pela A… com o NIF sueco (SE…).

8) Em face de todas as incoerências apontadas nos pontos anteriores (1 a 7):

- Não ficou minimamente clarificado qual a actividade efectivamente exercida desde 2007 pelo sujeito passivo em apreciação (NIF…) no território nacional;

- Nem ficou provado a realização efectiva por parte da A… (NIF…) das operações activas por si declaradas no campo 8 das DP’s de IVA de 2007 e 2008, no valor total de 9.285.575,10 €.

 

B) Incoerência de procedimentos ao nível das operações passivas

1) A totalidade das deduções declaradas pelo sujeito passivo em apreciação no período em análise, reportadas no campo 24 das DP’s de IVA de 2008 a 2010, são relativas ao IVA suportado e deduzido com a aquisição de serviços a vários fornecedores nacionais já referidos, referentes a trabalhos de montagem e reparação realizados nas linhas de produção, maioritariamente da B…, e com menor expressão da C…, e da D… empresas ligadas ao sector da indústria da celulose e da pasta de papel.

2) De notar que esta facturação emitida pelos fornecedores nacionais até 24/02/2009 e declarada em sede de IVA até ao período de imposto 2009-03T, não foi geradora de crédito de IVA para o sujeito passivo em apreciação, uma vez que era emitida com IVA devido pelo adquirente, estando a liquidação do IVA espelhada no campo 4 das suas DP’s de IVA. A partir de 25/02/2009 a referida facturação passou a ser emitida com liquidação de IVA na esfera do prestador/fornecedor, em face de o sujeito passivo adquirente (NIF…) ter alterado a sua sede no território nacional para um domicílio na Suécia, ainda que continue a constar na facturação emitida pelos fornecedores nacionais até Dezembro de 2010 a morada Av. ..., …, … Lisboa (morada fiscal da sociedade G…, SA, sede do sujeito passivo em apreciação até 24/02/2009).

3) No âmbito dos esclarecimentos prestados pelos fornecedores circularizados, foi possível verificar contratos celebrados, notas de encomenda e relatórios de inspecção associadas à facturação emitida, onde a entidade adquirente identificada fiscalmente é a A… com o NIF sueco (SE …). De notar a particularidade de nas notas de encomenda verificadas e referentes a aquisições de 2010, a morada para facturação assumida ser uma morada na Finlândia (A…, O…, …, …, Finland), com o facto da competente factura continuar a mencionar a morada nacional referida no ponto anterior.

 

C) Dedução Indevida IVA (448.899,64 €)

1) Em face do exposto, perante uma clara incoerência de procedimentos quer ao nível das operações activas, quer ao nível das operações passivas declaradas pelo sujeito passivo em análise, A… (NIF…), sublinhamos que não ficou minimamente clarificado qual a actividade efectivamente exercida no território nacional, nem ficou provada a realização de qualquer operação activa no território nacional por parte deste sujeito passivo.

2) Dispõem o artigo 20º do Código do IVA que “Só pode deduzir-se o imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados pelo sujeito passivo para a realização das operações seguintes:

a) Transmissões de bens e prestações de serviços sujeitas a imposto e dele não isentas,

b) Transmissões de bens e prestações de serviços que consistam em:

I) Exportações e operações isentas nos termos do artigo 14.º;

II) Operações efectuadas no estrangeiro que seriam tributáveis se fossem efectuadas no território nacional;

III) Prestações de serviços cujo valor esteja incluído na base tributável de bens importados, nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 17.º;

IV) Transmissões de bens e prestações de serviços abrangidas pelas alíneas b), c), d) e e) do n.º 1 e pelos n.ºs 8 e 10 do artigo 15.º;

V) Operações isentas nos termos dos n.ºs 27) e 28) do artigo 9.º, quando o destinatário esteja estabelecido ou domiciliado fora da Comunidade Europeia ou que estejam directamente ligadas a bens, que se destinam a ser exportados para países não pertencentes à mesma Comunidade;

VI) Operações isentas nos termos do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 394-B/84, de 26 de Dezembro.”

3) Atendendo que o sujeito passivo não procedeu à realização de qualquer operação das mencionadas no nº 1 do artº 20 do Código do IVA, não se podem aceitar como legítimas as deduções de IVA declaradas pelo sujeito passivo no campo 24 das DP’s de IVA no período em análise (2008 a 2010), no montante total de 448.899,64 €, discriminado por períodos de imposto no quadro resumo seguinte.

Em face do exposto, propõe-se:

1) Correcção técnica em sede de IVA no montante total de 448.899,64 €, discriminado por períodos de imposto no quadro anterior;

2) O consequente indeferimento do reembolso de IVA solicitado na DP de IVA do período de imposto 2010-08, no montante total de 107.870,74 €.

Nestes termos, vai o sujeito passivo ser notificado para exercer o Direito de Audição nos termos previstos no artº 60º da Lei Geral Tributária e artº 60º do Regime Complementar do Procedimento da Inspecção Tributária.

 

V) Direito de Audição

O sujeito passivo foi notificado para exercer o Direito de Audição nos termos previstos no artº 60º da Lei Geral Tributária e artº 60º do Regime Complementar do Procedimento da Inspecção Tributária via ofício nº …de 04/03/2011. Para conhecimento da G…, na pessoa da senhora P…, interlocutora assumida nos esclarecimentos prestados pelo sujeito passivo, foi enviado ao seu cuidado, via correio, sob o ofício nº … de 10/03/2011, cópia do Projecto de Correcções do Relatório da Inspecção, com os pareceres que sobre ele recaíram do Chefe de Equipa e do Chefe de Divisão, incluindo o ofício nº … de 04/03/2011 inerente à remessa deste mesmo Projecto para o domicílio fiscal sueco do sujeito passivo, com entrega conseguida em 10/03/2011.

O Direito de Audição foi exercido por escrito, recepcionado nos nossos Serviços de Inspecção Tributária em 25/03/2011, com registo de entrada nº…, apresentando a argumentação que passamos a expor e a comentar:

 

1. No 1º parágrafo, o sujeito passivo qualifica o relatório inerente ao Projecto de Correcções como sendo um “...relatório que propõe correcções baseadas no argumento de que a informação obtida no que concerne à actividade exercida terá sido de acordo com o passamos a transcrever como “muito pouco esclarecida”, “nada elucidativo” ou até “de maneira alguma” corresponde ao declarado para efeitos do IVA...”, constituindo um argumento que nos merece os seguintes comentários:

a) O Relatório da Inspecção inerente ao Projecto de Correcções remetido ao contribuinte foi elaborado após terem sido realizadas um conjunto de diligências, exaustivamente apresentadas no ponto III) Considerações Prévias do mesmo relatório, com duas notificações enviadas ao sujeito passivo em apreciação, que em face da suas respostas muito pouco satisfatórias, justificou que os seus principais fornecedores nacionais e clientes assumidos fossem igualmente notificados para prestar esclarecimentos;

b) Sublinhe-se também o facto de nos termos colocado à disposição do sujeito passivo para ultrapassar qualquer dúvida relacionada com o processo inspectivo em curso, onde obviamente esteve incluída a natureza das questões que lhe foram colocadas quando notificado. Contudo, para além dos dois esclarecimentos que nos fizeram chegar, já identificados no Projecto de Correcções, apenas acusamos dois telefonemas em que os interlocutores do sujeito passivo (Q… e P…, ambas da G…) nos colocaram questões relacionadas com o prazo para apresentação da resposta à notificação ou ao exercício do Direito de Audição;

c) Daqui infere-se que o trabalho inspectivo desenvolvido foi levado a cabo sob a tónica da disponibilidade, do elevado sentido de responsabilidade e do conhecimento dos normativos legais aplicáveis em sede de IVA para aferir a legitimidade do reembolso em apreciação.

2. Nos parágrafos 2º, 3º e 4º, o sujeito passivo continua a seguir a linha que já demonstrou anteriormente nas respostas que nos fez chegar, revelando uma incapacidade em apresentar e comprovar documentalmente quais as operações económicas de carácter empresarial desenvolvidas pelo sujeito passivo em apreciação, A… (NIF…). Para o efeito, sugere visitas às instalações dos “...poucos clientes, de à longa data, que a empresa tem em Portugal. ...” e fez incluir um anexo como “Documento 1”, sob o título “Apresentação da A…”, composto por 174 páginas em língua inglesa.

3. Prossegue nos parágrafos seguintes sem definir a actividade económica desenvolvida pelo registo de IVA em apreciação (NIF…), no nosso território desde 2007, sem fazer uma apresentação objectiva do circuito comercial desenvolvido, sem definir fiscalmente os seus intervenientes, sem apresentar os projectos de investimentos desenvolvidos/período de execução/contratos celebrados/entidades contraentes.

4. A realidade documental recolhida confirma o exercício directo da actividade em Portugal pela casa-mãe sueca, A… com o NIF sueco (SE …), quando debita aos clientes nacionais no sector da celulose e pasta de papel as transmissões de equipamento para a indústria portuguesa da celulose, constituindo Transmissões Intracomunitárias Isentas de IVA para o sujeito passivo sueco (SE …) e aquisições intracomunitárias de IVA para os clientes sujeitos passivos nacionais. Na circularização de informação efectuada junto dos clientes nacionais já mencionados e na consulta efectuada ao VIES – Sistema de Informações de Trocas Intracomunitárias, verificamos que se trata de uma relação comercial continuada e que se mantém à longa data, como confirma o sujeito passivo no 2º e 28º parágrafos do exercício do Direito de Audição.

5. Incoerentemente, vemos o sujeito passivo a argumentar nos parágrafos 29º a 32º “...que as operações activas preconizadas pela A… sofreram obrigatoriamente alterações...” com a entrada em vigor do DL 21/2007. De maneira nenhuma, pode a facturação emitida pelo sujeito passivo sueco aos clientes nacionais ser apresentada como documento justificativo de facturação emitida pelo sujeito passivo em apreciação A… (NIF…) e aceite como comprovativo de que este registo de IVA pratica operações activas que conferem total ou parcialmente o direito à dedução de IVA. Mais, a facturação emitida pelo sujeito passivo sueco aos clientes nacionais não pode servir para se concluir que a A… (NIF…) está a aplicar a regra de inversão do sujeito passivo enquanto “prestador de serviços de construção civil”, onde o imposto seria auto-liquidado pelos clientes nacionais. O imposto foi efectivamente auto-liquidado pelos clientes nacionais da A… com o NIF sueco (SE…), mas por força da aquisição intracomunitária associada, constituindo transacções devidamente declaradas nas respectivas declarações fiscais.

6. É notório um claro desconhecimento do preceituado no Ofício-Circulado nº 30101 de 24/05/2007 quanto ao tratamento dado aos meros registos de IVA, quer enquanto prestador, quer enquanto adquirente de serviços de construção civil, ou mesmo quando justificaram a situação de crédito de imposto em apreciação.

7. O sujeito passivo fez incluir no Direito de Audição como “Documento 2” e “Documento 3” facturação emitida pela A… com o NIF sueco (SE…) aos clientes nacionais C…, e D… devidamente declarada na esfera destas entidades, sendo de referir que alguma desta facturação já se encontrava no processo inspectivo, tendo sido recolhida no âmbito da circularização efectuada junto dos clientes sujeitos passivos nacionais. Com efeito, constituem operações activas pertencentes à esfera da A… com o NIF sueco (SE …), que não podem ser declaradas na esfera da A… (NIF …), facto que deve ser acolhido pelo contribuinte, uma vez que inviabiliza a intenção manifestada no parágrafo 35º do exercício do Direito de Audição.

8. Os nossos últimos comentários ao Direito de Audição remetido pelo sujeito são os seguintes:

a) Temos um registo de IVA no território nacional que é uma entidade abrangida pela definição de sujeito passivo do imposto, sujeita ao cumprimento das obrigações derivadas da aplicabilidade do Código do IVA, nomeadamente obrigações declarativas, de facturação, de pagamento e de escrituração;

b) Por outro lado, reclama um crédito do Estado português relativo a imposto suportado no território nacional, direito este que deriva obviamente do cumprimento das obrigações estabelecidas no referido Código;

c) As incoerências levantadas no âmbito do Projecto de Correcção mantêm-se, concluindo-se que o contribuinte em apreciação se trata de um sujeito passivo de IVA em Portugal, não residente, que não pratica qualquer operação activa no nosso território, à semelhança do afirmado nos seus esclarecimentos prestados em carta datada de 11/02/2011, que mais uma vez transcrevemos “...A A… não desenvolveu nem pretende iniciar a sua actividade a nível comercial em Portugal...”.

 

VI) Conclusão do Relatório Final das Correcções

Assim, não tendo os elementos e argumentos trazidos ao processo, pelo sujeito passivo, contrariado a fundamentação para as correcções propostas com base na legislação do Código do IVA, as mesmas são de manter.

Em face do exposto, propõe-se correcção técnica em sede de IVA, no montante total de 448.899,64 €, tendo por base a legislação infringida já mencionada, com o consequente indeferimento do reembolso de IVA solicitado na DP de IVA do período de imposto 2010- 08, no montante total de 107.870,74 €.

Para o efeito, foram efectuados documentos de correcção para os períodos de imposto elencados no quadro resumo constante do presente relatório, bem como se procedeu ao levantamento do competente auto de notícia, tendo sido elaborada notificação do Resultado da Acção de Inspecção.”

  1. Da supra referida acção inspectiva resultaram correcções no valor global de € 485.590,25, tendo considerando os SIT que a Requerente tinha deduzido indevidamente IVA.
  2. Subsequentemente, o Serviço de Finanças de Lisboa … procedeu à emissão de liquidações adicionais de IVA e correspondentes juros compensatórios, objecto da presente acção arbitral, que foram oportunamente pagas pela Requerente.
  3. As facturas supra-referidas em 17 foram corrigidas em 2011, tendo a Requerente procedido à emissão de notas de crédito aos três clientes nacionais, anulado a facturação emitida com o número de identificação sueco e emitido facturas rectificativas na mesma data com a indicação do seu número de identificação fiscal português, conforme quadro seguinte:

 

 

 

  1. Em 27 de Outubro de 2011, a Requerente deduziu Reclamação Graciosa contra as liquidações adicionais de IVA e de juros compensatórios respeitantes aos exercícios de 2008, 2009 e 2010, tendo a mesma sido objecto de indeferimento.
  2. Em 30 de Julho de 2012, a Requerente apresentou Recurso Hierárquico contra aquela decisão de indeferimento, tendo o mesmo sido igualmente indeferido por despacho notificado à Requerente em 20 de Fevereiro de 2017.

 

A.2. Factos dados como não provados

1- Que os bens vendidos pela Requerente para Portugal tenham sido fixados, com carácter de permanência, em imóveis dos respectivos adquirentes.

2- Que os procedimentos descritos nos pontos 13 a 15 dos factos dados como provados tenham provindo de lapso.

3- Que tenham sido anuladas as operações intracomunitárias declaradas nas declarações recapitulativas reportadas na Suécia (e espelhadas no VIES) para os três clientes nacionais – a B…, a C…, SA, e a D…, SA.

 

A.3. Fundamentação da matéria de facto provada e não provada

Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. art.º 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).

Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. anterior artigo 511.º, n.º 1, do CPC, correspondente ao actual artigo 596.º, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).

Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do artigo 110.º/7 do CPPT, e a prova documental junta aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados, tendo em conta que, como se escreveu no Ac. do TCA-Sul de 26-06-2014, proferido no processo 07148/13[1], “o valor probatório do relatório da inspecção tributária (...) poderá ter força probatória se as asserções que do mesmo constem não forem impugnadas”.

Os factos dados como não provados decorrem da ausência ou insuficiência de prova a seu respeito.

Não se deram como provadas nem não provadas alegações feitas pelas partes, e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insusceptíveis de prova e cuja veracidade se terá de aferir em relação à concreta matéria de facto acima consolidada, nem factos incompatíveis com os provados ou não provados.

 

B. DO DIREITO

 

            A questão que se apresenta a decidir a este tribunal, reconduz-se, essencialmente, a averiguar se à Requerente, entidade domiciliada noutro Estado Membro da Comunidade Europeia, assiste o direito de deduzir o IVA suportado com operações passivas (prestações de serviços), relacionadas com o fornecimento e instalação de bens vendidos a sujeitos passivos nacionais.

            Com efeito, e conforme resulta da matéria de facto, a Requerente, residente na Suécia, procedeu à aquisição de equipamento em vista ao seu posterior fornecimento a clientes em Portugal, sendo que, sempre que esse equipamento necessitou de instalação ou montagem, subcontratou a sujeitos passivos nacionais a realização deste serviço de instalação ou montagem, e eventual manutenção, do equipamento, em território nacional.

Como a Requerente incorreu em IVA nas aquisições de serviços a prestadores nacionais, efectuou a correspondente dedução em substituição das declarações periódicas de IVA, oportunamente apresentadas.

Sustenta a Requerente, em suma, a sua pretensão no disposto na al. a) do n.º 8 do artigo 6.º do CIVA, na redacção aplicável, cujo teor é o seguinte:

“Não obstante o disposto no n.º 6, são tributáveis as seguintes operações:

a) Prestações de serviços relacionadas com um imóvel sito no território nacional, incluindo os serviços prestados por arquitectos, por empresas de fiscalização de obras, por peritos e agentes imobiliários, e os que tenham por objecto preparar ou coordenar a execução de trabalhos imobiliários, assim como a concessão de direitos de utilização de bens imóveis e a prestação de serviços de alojamento efectuadas no âmbito da actividade hoteleira ou de outras com funções análogas, tais como parques de campismo;”.

            Esta redacção vigorou a partir de 1 de Janeiro de 2010, por força da entrada em vigor do DL 186/2009, de 12 de Agosto, sendo que na matéria em questão, até àquela data, regeu a al. a) do n.º 6 do mesmo artigo 6.º, com a seguinte redacção:

“São, no entanto, tributáveis, onde quer que se situe a sede, o estabelecimento estável ou o domicílio do prestador:

a) As prestações de serviços relacionadas com um imóvel sito no território nacional, incluindo as prestações que tenham por objecto preparar ou coordenar a execução de trabalhos imobiliários e as prestações de peritos e agentes imobiliários que actuem em nome próprio e por conta de outrem;”.

            Para a Requerente, a sua actividade consistiu em transmissão de bens com instalação e montagem em imóveis localizados neste território, considerando que as referidas instalação e montagem constituem prestações de serviços autónomas, nos termos do n.º 1 do artigo 4.º do CIVA, localizáveis em Portugal, face à supra-referidas als. a) do n.º 6 (até 31-12-2009) e do n.º 8 (após aquela data) do artigo 6.º do CIVA.

            Já a AT considerou que estamos perante “transmissões intracomunitárias de bens (equipamento para a indústria da celulose) que foram expedidos para outro Estado Membro (Portugal), com destino ao adquirente (B… e outros sujeitos passivos nacionais no sector da celulose e pasta de papel), constituindo Transmissões Intracomunitárias Isentas de IVA para o sujeito passivo sueco (SE…)”, notando que “estas transmissões facturadas aos clientes sujeitos passivos nacionais foram devidamente declaradas em sede de IVA pelo sujeito passivo sueco nas suas declarações fiscais e confirmadas no VIES – Sistema de Informações de Trocas Intracomunitárias” e que “A realidade documental recolhida confirma o exercício directo da actividade em Portugal pela casa-mãe sueca, A… com o NIF sueco (SE …), quando debita aos clientes nacionais no sector da celulose e pasta de papel as transmissões de equipamento para a indústria portuguesa da celulose, constituindo Transmissões Intracomunitárias Isentas de IVA para o sujeito passivo sueco (SE…) e aquisições intracomunitárias de IVA para os clientes sujeitos passivos nacionais”

            Mais julgou a AT que não “ficou provada a realização de qualquer operação activa no território nacional por parte deste sujeito passivo.”, concluindo que “Atendendo que o sujeito passivo não procedeu à realização de qualquer operação das mencionadas no nº 1 do artº 20 do Código do IVA, não se podem aceitar como legítimas as deduções de IVA declaradas pelo sujeito passivo”, já que “se trata de um sujeito passivo de IVA em Portugal, não residente, que não pratica qualquer operação activa no nosso território, à semelhança do afirmado nos seus esclarecimentos prestados em carta datada de 11/02/2011, que mais uma vez transcrevemos “...A A… não desenvolveu nem pretende iniciar a sua actividade a nível comercial em Portugal...””.

 

*

            Como facilmente se constata do quanto se vem de expor, o dissídio fundamental entre o contribuinte e a AT radica, não na relevância ou estatuto jurídico da dualidade de registos para efeitos de IVA, em Portugal e na Suécia, questão a que a Requerente dedica a maior parte da sua argumentação, nem sequer na realização ou não de operações económicas pela Requerente envolvendo o território nacional, mas na efectiva existência, ou não, de operações activas da Requerente localizáveis em Portugal, correspectivas das operações passivas com que aquela pretende titular o seu direito à dedução, e, dos pressupostos do artigo 20.º/1 do CIVA, que dispõe que só pode deduzir-se o imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados pelo sujeito passivo para a realização das transmissões de bens e/ou prestações de serviços sujeitas a imposto e ali discriminadas.

            Conexionada com esta questão, está a de apurar se, em concreto, as operações de instalação e montagem constituem operações autónomas de prestações de serviços, sujeitas a regras específicas de localização, ou se, antes, são operações meramente auxiliares ou acessórias da prestação de fornecimento (transmissão) de bens, sujeita às regras de localização e tributação próprias de tais operações.

            Sustenta a este respeito a Requerente que a montagem e instalação dos bens que forneceu aos sujeitos passivos nacionais constitui uma prestação de serviços autónoma, localizável em Portugal por ter como objecto imóveis.

            Já para a AT, a Requerente procedeu, ao nível das operações activas, exclusivamente a transmissões intra-comunitárias de bens (vendas), não tributáveis em Portugal, e, como tal, não tem qualquer direito a deduzir, perante o Estado Português, qualquer imposto.

            Compulsada a matéria de facto, verifica-se que a Requerente procedeu à aquisição de equipamento em vista ao seu posterior fornecimento a clientes em Portugal, sendo que, sempre que esse equipamento necessitou de instalação ou montagem, subcontratou a sujeitos passivos nacionais a realização deste serviço de instalação ou montagem, e eventual manutenção, do equipamento, em território nacional.

            Verifica-se assim, o que é confirmado por toda a documentação, incluindo a disponibilizada pela Requerente, como contratos (“Delivery Contract”) e facturação (com menções como “fornecimento”) que as operações realizadas pela Requerente, em questão nos presentes autos arbitrais, foram essencialmente operações de fornecimento de bens (equipamentos e maquinaria) ou seja transmissões intra-comunitárias de bens (vendas), como entendeu a AT.

            Isto, de resto, é particularmente evidente do documento junto pela Requerente com o n.º 9, onde se lê (ponto 2.), sem quaisquer dúvidas, que o objecto é a compra, pelo cliente da Requerente, e a venda, pela Requerente, de maquinaria e equipamento, concordando a Requerente em, para além do mais, entregar e instalar os bens vendidos, sendo que a entrega (“Delivery”) apenas se considerará completa, com a execução de tais serviços adicionais assumidos pela Requerente, e que o preço acordado é fixo e global (“not indexed”; cfr. ponto 4.).

            Ora, tem sido jurisprudência recorrente do TJUE que o regime de tributação das prestações acessórias segue o regime de tributação da prestação principal.

            Neste sentido pronunciou-se, entre outros, aquele alto Tribunal nos seguintes casos, apresentando-se a jurisprudência comunitária na matéria que releva para os presentes autos como perfeitamente clara, continuada e esclarecedora, não se vislumbrando a necessidade de qualquer reenvio prejudicial, em ordem a resolver a presente causa[2]:

  • Processo C‑273/16[3]:
    • “37 A este propósito, importa recordar que, para efeitos do IVA, cada operação deve normalmente ser considerada distinta e independente, tal como resulta do artigo 1.º, n.º 2, segundo parágrafo, da Diretiva IVA (v., neste sentido, acórdão de 17 de janeiro de 2013, BGŻ Leasing, C‑224/11, EU:C.2013:15, n.º 29).

38 Não obstante, resulta igualmente da jurisprudência do Tribunal de Justiça que, em determinadas circunstâncias, várias prestações formalmente distintas, suscetíveis de ser fornecidas separadamente e, assim, de dar lugar, separadamente, à tributação ou à isenção, devem ser consideradas uma operação única, quando não sejam independentes. Tratase de uma operação única, nomeadamente, quando dois ou vários elementos ou atos fornecidos pelo sujeito passivo estão tão estreitamente ligados que formam, objetivamente, uma única prestação económica indissociável, cuja decomposição revestiria caráter artificial (acórdão de 16 de julho de 2015, Mapfre asistencia e Mapfre warranty, C‑584/13, EU:C:2015:488, n.º 50).

39 A este respeito, cabe recordar que o artigo 86.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA garante que a tributação da prestação acessória segue a tributação da prestação principal.”

  • Processo C-208/15[4]:
    • “26 A este respeito, importa recordar que, para efeitos de IVA, cada prestação deve normalmente ser considerada distinta e independente, tal como resulta do artigo 1.º, n.º 2, segundo parágrafo, da Diretiva IVA (acórdão de 16 de abril de 2015, Wojskowa Agencja Mieszkaniowa w Warszawie, C‑42/14, EU:C:2015:229, n.º 30 e jurisprudência referida).

27 Não obstante, em determinadas circunstâncias, várias prestações formalmente distintas, suscetíveis de ser fornecidas separadamente e, assim, de dar lugar, separadamente, à tributação ou à isenção, devem ser consideradas uma operação única quando não sejam independentes. Está em causa uma operação única, nomeadamente, quando dois ou vários elementos ou atos fornecidos pelo sujeito passivo ao cliente estão tão estreitamente ligados que formam, objetivamente, uma única prestação económica indissociável, cuja decomposição revestiria um caráter artificial. Tal acontece igualmente quando uma ou várias prestações constituem uma prestação principal e a ou as outras prestações constituem uma ou várias prestações acessórias que partilham da sorte fiscal da prestação principal. Uma prestação deve ser considerada acessória em relação a uma prestação principal quando não constitua para a clientela um fim em si mesmo, mas um meio de beneficiar, nas melhores condições, do serviço principal do prestador (acórdão de 16 de abril de 2015, Wojskowa Agencja Mieszkaniowa w Warszawie, C‑42/14, EU:C:2015:229, n.º 31 e jurisprudência referida). (...)

29 A este respeito, há que salientar, por um lado, que para determinar se uma operação que envolve várias prestações constitui uma operação única para efeitos do IVA, o Tribunal de Justiça tem em consideração o objetivo económico dessa operação (v., neste sentido, acórdãos de 19 de novembro de 2009, Don Bosco Onroerend Goed, C‑461/08, EU:C:2009:722, n.º 39; de 28 de outubro de 2010, Axa UK, C‑175/09, EU:C:2010:646, n.º 23; e de 27 de setembro de 2012, Field Fisher Waterhouse, C‑392/11, EU:C:2012:597, n.º 23). Na sua análise, o Tribunal de Justiça tem igualmente em conta o interesse dos destinatários das prestações (v., neste sentido, acórdão de 16 de abril de 2015, Wojskowa Agencja Mieszkaniowa w Warszawie, C‑42/14, EU:C:2015:229, n.º 35).”

  • Processo C-276/09[5]:
    • “21 Decorre do artigo 2.° da Sexta Directiva que cada operação deve normalmente ser considerada distinta e independente (v., nomeadamente, acórdão CPP, já referido, n.° 29; e acórdãos de 29 de Março de 2007, Aktiebolaget NN, C‑111/05, Colect., p. I‑2697, n.° 22, e de 19 de Novembro de 2009, Don Bosco Onroerend Goed, C‑461/08, Colect., p. I‑11079, n.° 35).

22 Todavia, a operação constituída por uma só prestação no plano económico não deve ser artificialmente decomposta, para não se alterar a funcionalidade do sistema do IVA (v., nomeadamente, acórdãos, já referidos, CPP, n.° 29, e Aktiebolaget NN, n.° 22; e acórdão de 22 de Outubro de 2009, Swiss Re Germany Holding, C‑242/08, Colect., p. I‑10099, n.° 51).

23 Além disso, em determinadas circunstâncias, várias operações formalmente distintas, susceptíveis de ser realizadas separadamente e de dar assim lugar, em cada caso, à tributação ou à isenção, devem ser consideradas uma operação única quando não sejam independentes (v. acórdãos de 21 de Fevereiro de 2008, Part Service, C‑425/06, Colect., p. I‑897, n.° 51; de 11 de Junho de 2009, RLRE Tellmer Property, C‑572/07, Colect., p. I‑4983, n.° 18; e Don Bosco Onroerend Goed, já referido, n.° 36).

24 Tal sucede, por exemplo, quando se verifica que uma ou várias prestações constituem uma prestação principal e que, pelo contrário, outros elementos devem ser considerados uma ou várias prestações acessórias que partilham do destino fiscal da prestação principal (v., nomeadamente, acórdão CPP, já referido, n.° 30; acórdão de 15 de Maio de 2001, Primback, C‑34/99, Colect., p. I‑3833, n.° 45; acórdão RLRE Tellmer Property, já referido, n.° 18; e despacho de 14 de Maio de 2008, Tiercé Ladbroke e Derby, C‑231/07 e C‑232/07, n.° 21).

25 Em particular, uma prestação deve ser considerada acessória de uma prestação principal, quando não constitua para a clientela um fim em si, mas um meio de beneficiar, nas melhores condições, do serviço principal do prestador (v., nomeadamente, acórdãos, já referidos, CPP, n.° 30, Primback, n.° 45, e RLRE Tellmer Property, n.° 18; e o despacho Tiercé Ladbroke e Derby, já referido, n.° 21)

26 Para determinar se o sujeito passivo fornece ao consumidor – entendido como consumidor médio – diversas prestações principais distintas ou uma prestação única, importa procurar os elementos característicos da operação em causa e tomar em consideração todas as circunstâncias em que a mesma se realiza (v., neste sentido, acórdãos, já referidos, CPP, n.ºs 28 e 29, Aktiebolaget NN, n.ºs 21 e 22, e Ludwig, n.° 17; e despacho Tiercé Ladbroke e Derby, já referido, n.ºs 19 e 20).”

            No caso, face aos factos provados e a todos os elementos disponibilizados, julga-se estar precisamente perante uma situação em que os vários elementos ou actos fornecidos pelo sujeito passivo estão tão estreitamente ligados que formam, objectivamente, uma única prestação económica indissociável, cuja decomposição revestiria carácter artificial.

            Com efeito, e desde logo, tal é evidenciado pelo contexto contratual apurado, e atrás discriminado, verificando-se desde logo que o preço acordado é fixo e global, sendo que, como o próprio TJUE afirmou já “quando um prestador fornece aos seus clientes uma prestação de serviços composta por vários elementos contra o pagamento de um preço único, este último pode ser considerado um elemento importante a favor da existência de uma prestação única”[6].

Para além disso, como se viu, o objecto contatual é a compra, pelo cliente da Requerente, e a venda, pela Requerente, de maquinaria e equipamento, concordando a Requerente em, para além do mais, entregar e instalar os bens vendidos, sendo que a entrega dos bens apenas se considerará completa, com a execução de tais serviços adicionais assumidos pela Requerente, não sendo assim cindível a operação de transmissão dos bens, que constitui, inquestionavelmente, o objecto principal e essencial do contrato,   das demais prestações de serviços que lhe são acessórias.

            Acresce a tudo isto a circunstância de inicialmente a própria Requerente ter tratado as operações em questão como transmissões intracomunitárias de bens e informado as autoridades fiscais portuguesas de que “não desenvolveu nem pretende iniciar a sua actividade a nível comercial em Portugal...””, apenas tendo procedido no sentido da alteração do enquadramento fiscal por si outorgado, após uma alteração legislativa no ordenamento jurídico português, que, porventura, se lhe configurou como oferecendo vantagens fiscais na separação de prestações (instalação e/ou montagem), a que inicialmente não procedeu.

            Nota-se ainda que, não obstante o contrato apresentado pela Requerente como doc. 9 mencionar outras prestações de serviços (para além da instalação/montagem) dos equipamentos e maquinaria vendidos por aquela, como sejam o transporte, os testes operacionais (“test runs”), e a formação (“training”) na utilização daqueles, serviços estes que a Requerente já não autonomiza, bem como, conforme está provado, que em 2008, 2009 e 2010, em Portugal, (com o número de identificação fiscal PT…) a Requerente entregou declarações periódicas do IVA, nas quais não reportou quaisquer operações activas

            De resto, não deixa também de ser significativo que a Requerente não refira que o enquadramento das operações em questão que operou inicialmente a nível fiscal – como transmissão intracomunitária de bens – lhe tenha causado qualquer prejuízo, maxime em sede de IVA, não referindo também que a revisão do enquadramento que operou e pretende fazer valer, tenha decorrido de qualquer intervenção das autoridades fiscais do seu país de origem, em seu prejuízo.

            Deste modo, tudo aponta no sentido de que a separação das prestações de instalação e montagem do fornecimento de bens que não contesta, assente essencialmente na tentativa de obter vantagens fiscais, decorrente de tal separação e da subsequente qualificação das mesmas como relativas a imóveis (questão que se abordará infra), revestindo-se, portanto, de natureza susceptível de ser considerada como artificial.

            Por outro lado, nada se apura no sentido que as (destacadas pela Requerente) prestações de instalação e montagem constituam para os concretos clientes da Requerente um fim em si mesmo.

            Pelo contrário: o que o contrato evidencia é que o interesse da clientela da Requerente radica na prestação global das operações globalmente previstas no contrato, cuja essência e peso económico dominante é, claramente, um fornecimento de bens, sendo, de forma evidente, o objectivo económico da operação e o interesse dos destinatários das prestações, a aquisição em estado acabado e funcional (pronto a funcionar) da maquinaria e equipamentos vendidos pela Requerente.

            Deste modo, tendo em conta os elementos característicos das operações em causa e todas as circunstâncias em que a mesmas se realizam, conclui-se que as operações activas realizadas pela Requerente, em questão na presente acção arbitral se configuram, integralmente, como transmissões intracomunitárias de bens.

 

*

            Em todo caso, e sem prejuízo do quanto se vem de concluir, mesmo que se concluísse pelo destacamento das operações de instalação e montagem, como pugna a Requerente, sempre se haveria de concluir pela não demonstração de que aquelas tenham tido como objecto bens imóveis.

            Com efeito, toda a documentação disponibilizada, designadamente o contrato junto como doc. 9 e a facturação apresentada, aponta no sentido de que o objecto directo e imediato dos serviços de instalação e montagem são os equipamentos e maquinaria vendidos pela Requerente, e não os imóveis onde aqueles foram instalados, não se sabendo, por exemplo, se os mesmos eram sequer propriedade dos clientes da Requerente.

            Ou seja, ao contrário do que afirma a Requerente, nada evidencia que a mesma haja prestado “serviços de construção civil” (cfr. artigo 82.º do Requerimento inicial), nem que “os requisitos materiais do direito à dedução estão claramente reunidos”, e que “os serviços prestados pela Requerente constituíram operações tributadas em sede de IVA em Portugal” (artigo 79.º do Requerimento inicial), já que o que se apura, como se viu, é que a Requerente efectuou transmissões intracomunitárias de bens (vendas), incluindo prestações de serviços acessórias (transporte, instalação ou montagem, testes operacionais de funcionamento (“Test runs”), formação (“training”)), que foram tributadas como tal (e não como prestações de serviços de construção civil) em Portugal.

            Por outro lado, nada também indicia que os equipamentos e maquinaria vendidos pela Requerente para Portugal tenham sido fixados com carácter de permanência a imóveis, em termos de se poder reconhecer, como pretende a Requerente, a execução de trabalhos de construção civil, tal como pressuposto da previsão normativa de “prestações de serviços relacionadas com um imóvel”, já que não só tal não tem qualquer correspondência na documentação contratual (o imóvel não assume qualquer evidência na mesma, aparecendo meramente como local de entrega e instalação dos bens fornecidos), como não será qualquer instalação de bens, ainda que fixados ao imóvel, que se poderá considerar como prestações de serviços relacionadas com um imóvel, sendo necessário, evidentemente, na aplicação dos conceitos anteriormente evidenciados, que se centre naquele o essencial da operação económica em questão, ou seja, que a beneficiação do imóvel, enquanto tal, pela instalação de determinados bens, constitua para os concretos operadores económicos um fim em si mesmo, que o radique aí o principal interesse e objectivo da operação económica, o que no caso, como se viu já, não se demonstra ocorrer.

 

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            Face a todo o exposto, verificando-se que, tal como considerou a AT nas liquidações contestadas, as operações activas realizadas pela Requerente, em questão na presente acção arbitral se configuram, integralmente, como transmissões intracomunitárias de bens não localizáveis em Portugal, não se apurando a realização de quaisquer operações activas localizáveis em território nacional, correlativas do direito à dedução pretendido exercer pela Requerente, e corrigido, nas referidas liquidações, nem, consequentemente, a verificação dos pressupostos do artigo 20.º do CIVA, dever-se-ão ter por fundadas de facto e de direito tais correcções, improcedendo, consequentemente, o pedido arbitral.  

 

*

 

C. DECISÃO

Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral julgar improcedente o pedido arbitral formulado e, em consequência:

  1. Absolver a Requerida do pedido; e
  2. Condenar a Requerente nas custas do processo, no montante de € 7.650,00.

 

D. Valor do processo

Fixa-se o valor do processo em € 485.590,25, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

E. Custas

Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 7.650,00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pela Requerente, uma vez que o pedido foi totalmente improcedente, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 22 de janeiro de 2018

 

O Árbitro Presidente

 

 

(José Pedro Carvalho)

 

O Árbitro Vogal

 

 

(Diogo Leite de Campos)

 

O Árbitro Vogal

 

 

(Artur Maria da Silva)