Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 310/2017-T
Data da decisão: 2018-01-05  IRC  
Valor do pedido: € 7.938,36
Tema: IRC - Dedução de gastos - Requisitos das facturas e ónus da prova da sua veracidade.
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DECISÃO ARBITRAL

 

I. Relatório

 

1. No dia 02-05-2017, a sociedade A…, Unipessoal, Lda., NIPC…, apresentou um pedido de constituição do tribunal arbitral singular, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por RJAT), tendo em vista a declaração de ilegalidade das liquidações adicionais de IRC e juros compensatórios, referentes aos período tributário de 2013 no montante de €6.814,76, e ao período tributário de 2014, no montante de €1.123,60, no valor total de €7.938,36.

2. Nos termos do n.º 1 do artigo 6.º do RJAT, o Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem designou o árbitro ora signatário, notificando as partes.

3. O tribunal encontra-se regularmente constituído para apreciar e decidir o objecto do processo.

4. As alegações que sustentam o pedido de pronúncia arbitral da Requerente são em súmula, as seguintes:

4.1. A Requerente foi, em sequência de Ordens de Serviço Internas, relativas aos exercícios de 2011, 2012 e 2013, à sociedade comercial com a firma “B…, Lda.”, alvo de acções inspectivas internas, tendo sido no âmbito da Ordem de Serviço n.º OI2016…, em setembro de 2016, notificada pela Autoridade Tributária e Aduaneira, pelos Serviços de Inspeção Tributária da Direcção de Finanças de Lisboa, que projectava corrigir, como resultado da acção inspectiva interna efectuada ao exercício de 2013, o lucro tributável em termos de IRC, e pela dedução indevida do imposto suportado com a prestação de serviços do sujeito passivo B…, Lda. NIF…, nos termos do n.º3 do art. 19º do CIVA, no montante de €16.019,50 (2013/12T).

4.2. A requerente exerceu o direito de audição prévia contra o projecto que lhe foi comunicado, tendo sido, posteriormente, notificada das liquidações adicionais que agora impugna e que foram pagas em 02 de Fevereiro de 2017 (relativas ao exercício de 2013).

4.3. Em Janeiro de 2017, é notificada pela Requerida do Projecto de Correcções do Relatório de Inspecção interna efectuada ao exercício de 2014, no que ao IRC diz respeito, tendo a requerente exercido o seu direito de audição prévia.

4.4. Em Fevereiro de 2017, foi notificada, ao abrigo da Ordem de Serviço n.º OI2016…, da Direcção de Finanças de Lisboa, que incidiu sobre o exercício de 2014, na sequência das correcções efectuadas ao exercício de 2014, nos termos e para os efeitos no artigo 52º do CIRC, tendo sido, posteriormente, notificada das liquidações adicionais que agora impugna e que foram pagas em 07 de Abril de 2017 (relativas ao exercício de 2014).

4.5. A Requerente foi contactada pela sua cliente, a firma C…, CRL, para a execução de obras em Matosinhos (…), sendo certo que, por lapso então, a cópia junta do contrato celebrado com o Dono de Obra carecia da assinatura do mesmo, mas que bastava a AT ter questionado a Requerente, que esta tinha no imediato procedido à junção do Contrato de Empreitada, assinado pelas partes.

4.6. E porque a Requerente, por um lado não queria perder a obra, mas por outro não tinha meios humanos e técnicos suficientes para a execução da totalidade da mesma, e tratando-se de clientes de especial interesse, recorreu a outros subempreiteiros para a sua execução.

4.7. Neste contexto, de entre vários subempreiteiros, o Sr. D…, que se apresenta com disponibilidade e meios  para a execução da obra através da firma B…, Lda. - tendo a Requerente tratado os assuntos inerente à obra quer com o Sr. D… (que se apresentava como trabalhador/prestador de serviços dos “B…”), quer com o Sr. E…, sócio gerente, que representava a sociedade comercial, acompanhava a obra (trabalhava igualmente) e a quem eram feitos os pagamentos após entregar as competentes facturas.

4.8. Não obstante, a Requerente então pesquisou sobre a sociedade comercial quer nos sites institucionais, quer junto do próprio Serviço de Finanças de …, se a firma B… se encontrava inscrita e se tinha dívidas fiscais, tendo-lhe sido afirmado, que a firma NIPC n.º…, encontrava-se inscrita e activa e sem quaisquer dívidas, não sendo possível obter outras informações solicitadas, pois foi alegado o sigilo fiscal.

4.9. Junto ainda do Portal MJ (https://publicacoes.mj.pt/pesquisa.aspx), concluiu, então, que a sociedade comercial, NIPC…, se encontrava registada com o objecto comercial: “Construção Civil e Obras Públicas, compra e venda de bens e imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim”, como actualmente, ainda está, pese embora, agora se verifique, sem qualquer actividade, mormente sem cumprir com a obrigação legal de prestação de contas, desde a sua constituição em 2010.

4.10. Em face desta situação, e porque a Requerente pretendia a execução da subempreitada e garantir o cumprimento do contrato de empreitada, adjudicou a obra (parte) à sociedade comercial B…, que sempre cumpriu a execução da mesma, e consequentemente aquela, pôde cumprir juntos do seu cliente (C…).

4.11. As facturas colocadas em crise pela Requerida são facturas emitidas, através de Programa Certificado (n. º19/DGCI) de acordo com o cumprimento das exigências legais quer dos requisitos de natureza substantiva quer de natureza formal.

4.12. As facturas foram emitidas pelo sujeito que prestou serviços à Requerente, com número de contribuinte válido, por quem presta serviços de construção civil (como decorre do objecto comercial da entidade) a quem os mesmos contrata e os afecta às suas operações tributáveis (artigos 1º, 2º e 20º do CIVA).

4.13. E acrescente-se que não compete à Requerente que controle ou esteja munida de documentos atinentes à natureza jurídica do sujeito passivo que lhe preste serviços e lhe emite as facturas (artigos 19º e 36º do CIVA).

4.14. Das facturas emitidas consta, nos termos da b) do n.º 5 do artigo 36º do CIVA, a denominação usual dos serviços prestados pela sociedade B… à Requerente, de acordo com o contrato de subempreitada celebrado entre as partes e conhecido da Requerida.

4.15. Ainda acrescentando que, não obstante, a ora Requerente não teria direito a deduzir o imposto, pois atenta a inversão do sujeito passivo do imposto, caberia a esta enquanto adquirente do serviço a liquidação e entrega do imposto nos cofres do estado.

4.16. E claro está, que, todo este procedimento de liquidações adicionais surge apenas e só porque a entidade B… não entregou o imposto liquidado ao Estado, de outra forma, nada mais relevava, como aconteceu com outros subempreiteiros contratados pela Requerente para a mesma obra (numa outra fase.

4.17. Seria essencial, para o sucesso da autoridade Requerida nesta demanda,  na sua decisão de estar perante operações simuladas, que provasse inequivoca e objectivamente, a falta de estrutura para a sociedade B… exercerem a actividade e os serviços facturados, que as facturas emitidas variassem de cliente para cliente ou que a actividade em que o sujeito passivo está registado seja de “Construção de Edifícios e compra e venda de bens imobiliários”, bem como que provasse que essas faltas e alegadas irregularidades apontadas, fossem ou devessem ser do conhecimento da Requerente, tivessem associadas à falta de pagamento do imposto e/ou à consideração das mesmas como custo.

4.18. E tal, nos termos do artigo 74º n.º 1 da LGT e como tem sido a posição dominante da jurisprudência, caberia demonstrar à própria Autoridade Tributária ora Requerida, sobre quem recai o ónus da prova.

4.19. A Autoridade Requerida não prosseguiu as suas atribuições de inspecção e fiscalização dos agentes económicos e limitou-se a tributar a Requerente, além de que violou entre outros princípios o da presunção das declarações dos contribuintes constantes do art. 75º da LGT, violando por isso, o principio da legalidade da actuação administrativa, principio da justiça e da boa fé.

4.20. Contudo, apesar das tentativas de demonstração e prova apresentados pela Requerente, designadamente ao abrigo da audição prévia, e com os documentos que contrariam a tese de operações fictícias levada a cabo pela Requerida, esta sempre recusou tais argumentos aduzidos ou mesmo provas apresentadas, sendo certo que nada de relevante carreou para o Relatório, o que não deixa de ser denunciador da inexistência de indícios sérios e objetivos que sustentem a tese da ora Requerida.

4.21. A Requerente, apresentou toda a prova possível para que junto da AT afastasse a tese de que os serviços prestados titulados pelas facturas conhecidas na presente data, não tiveram concretização real e efectiva, sendo assim fortes os indícios de que aqueles documentos pretendem titular, na mesma medida operações fictícias, juntou contratos, documentos que para si comprovavam a efectiva existência regular dos sujeitos passivos ora em causa, além de demonstrar que a obra está feita e que é uma obra de grande dimensão em Matosinhos, inclusive de controlo e fiscalização por parte da administração central.

4.22. É da competência da AT o efectivo controlo deste tipo de agentes económicos, pois só ela é dotada de jus imperium, competir-lhe-ia, mormente, declarar oficiosamente a cessação de actividade quando for manifesto que esta não está a ser exercida nem há intenção de a continuar a exercer ou sempre que o sujeito passivo tenha declarado o exercício de uma actividade sem que possua uma adequada estrutura empresarial susceptível de a exercer (art. 8. n.º6 do CIRC).

4.23. Aliás, só cumprindo com o que dispõe no n.º 6 do art. 8º do CIRC, a autoridade tributária impedirá a ocorrência de situações desta natureza, evitando a AF não só a proliferação de situações potenciadoras de fraude e de evasão fiscal e por outro lado a certeza jurídica dos agentes económicos que pretendem operar com cumprimento das suas obrigações fiscais.

4.24. Devem, as facturas em crise, ser admitidas e consideradas como gastos, para efeitos de apuramento do lucro tributável, uma vez que os referidos gastos estão comprovados e são indispensáveis para a realização dos rendimentos da ora Requerente.

5. Por seu turno, a Requerida Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta, na qual se defendeu, em súmula, nos seguintes termos:

5.1. Em 02.06.2016, foi emitida a Ordem de Serviço nº OI2016…, dando-se início a uma acção inspectiva interna em nome da Requerente, na sequência da acção inspectiva ao sujeito passivo B…, Lda, titular do NIF…, e realizada a coberto das Ordens de Serviço OI2015…, OI2015… e OI2015…, respeitantes aos anos de 2011, 2012 e 2013.

5.2. A Requerente é uma sociedade por quotas, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de …, tem o capital social de € 66.400,00 e é detida em 100% por F…, sua sócia-gerente.

5.3. E tem, desde 17.04.2001, por objecto social a “prestação de serviços na área da construção civil, empreitadas e subempreitadas de obras públicas e particulares, designadamente construção, reconstrução e remodelação de edifícios residenciais, bem como actividades especializadas da construção como montagem e revestimento de pavimentos ou paredes, venda e aluguer e montagem e desmontagem de andaimes. Compra e venda de propriedades, imóveis, terrenos turísticos e urbanos, bem como arrendamento dos seus bens imobiliários, revenda dos prédios adquiridos”

5.4. Desde essa data que se encontra colectada pela actividade principal de “Outras instalações em construções”, a que correspondia o CAE 43290 e pelas actividades secundárias de “Revestimentos de pavimentos e paredes”, de “Pintura e colocação de vidros” e de “Compra e venda de bens imobiliários” a que correspondem os CAE 43330, 43340 e 68100, respectivamente.

5.5. Para efeitos de IVA, encontra-se enquadrada, desde 01.01.2013, no regime normal de periodicidade trimestral e, para efeitos de IRC, no regime geral de tributação, desde 01.01.2009.

5.6. Entre 23.04.2001 e 06.11.2015 foi seu contabilista certificado o Sr. G…, titular do NIF…, data a partir da qual passou a exercer as mesmas funções o Sr. H…, titular do NIF… .

5.7. Nos anos em análise (2013 e 2014) apurou-se que a Requerente declarou, através do anexo P das declarações anuais, a aquisição de serviços/bens aos fornecedores titulares dos NIF…, …, …, …, … e … .

5.8. Este último NIF pertence à sociedade B…, Lda, que os SIT já tinham apurado ser um sujeito passivo emitente de facturação falsa.

5.9. Razão pela qual solicitaram à Requerente que prestasse a prova de que as prestações de serviço, tituladas nas facturas em que o emitente era esse sujeito passivo, correspondiam a operações efectivamente realizadas.

5.10. Sucede que a Requerente, face à insuficiência dos documentos apresentados, não logrou prestar essa prova.

5.11. Donde os SIT acabaram por concluir que evidenciando as facturas indícios fundados de operações simuladas não poderiam as mesmas consubstanciar gastos susceptíveis de concorrer para a formação do resultado fiscal.

5.12. Notificada para exercer o direito de audição, a Requerente não acrescentou quaisquer elementos novos susceptíveis de inverter a fundamentação constante do projecto de decisão não correspondendo minimamente à verdade que o mesmo tenha sido desatendido como refere no ponto 2 da PI.

5.13. O lucro tributável das pessoas colectivas é calculado pela soma algébrica do resultado líquido do exercício e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no período que não são reflectidas no resultado.

5.14. Concorrem para esse resultado os gastos "que comprovadamente forem indispensáveis para a realização de proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora" cfr artigo 23ºdo CIRC.

5.15. Inexistindo uma definição precisa do conceito de gasto fiscal, o CIRC considera gastos, para efeitos fiscais, aqueles que são suportados pela empresa e indispensáveis à realização dos proveitos ou à manutenção da fonte produtora.

5.16. A sociedade B... Lda, subempreiteira que a Requerente alegadamente contratou para prestar serviço na obra de Matosinhos estava já indiciada no âmbito de outro procedimento inspectivo como prestador de serviços emitente de facturas falsas.

5.17. Pelo que para se aferir se as prestações de serviço tituladas pelas facturas na posse da Requerente tiveram, ou não, subjacentes operações efectivamente realizadas, os SIT desencadearam o competente procedimento inspectivo.

5.18. No âmbito da acção inspectiva realizada contra a Sociedade B…, Lda os SIT já haviam recolhido a prova de que a mesma carecia de uma estrutura empresarial técnica, humana e logística adequada aos trabalhos descritos nas facturas, falta de estrutura essa que lhe permitisse realizar os valores facturados.

5.19. Perante tais premissas a AT não podia deixar de sopesar que sendo a Requerente uma cliente daquele fornecedor, tal como figurava das suas próprias declarações submetidas à AT, haveria uma forte possibilidade de as facturas na sua posse não titularem operações reais.

5.20. E por isso mesmo, mediante o ofício nº…, de 16.03.2016, foi a Requerente notificada para apresentar relativamente ao fornecedor B…, Lda, titular do NIF … e com sede na Rua …, nº …. –…-… QUELUZ, os elementos respeitantes a cópias das facturas/recibos, a contabilização, os extractos de conta, as fotocópias dos meios de pagamento, designadamente cheques (frente e verso) emitidos pelo banco ou comprovativos das transferências bancárias bem como orçamentos propostas de orçamentos e contratos relativos aos anos de 2012 e 2013.

5.21. Foi-lhe também solicitada a identificação dos trabalhadores relacionados com a realização de trabalhos e obras mencionados nas facturas e ainda a identificação dos subempreiteiros pelo mesmo SP e/ou dos próprios colaboradores e funcionários que tinham trabalhado nas referidas obras.

5.22. Em cumprimento do solicitado a Requerente procedeu à entrega de alguns documentos requeridos, designadamente a cópia do contrato de empreitada celebrado, em 01.09.2013, entre si e aquele sujeito passivo, no valor € 69.650,00 e cópias de extractos das contas 12.1.1, 22.1.1, 24.3.2,31.2.1, 62.2.1 e cópias dos cheques (só frente).

5.23. Sem embargo, a Requerente não juntou ao processo qualquer elemento comprovativo da existência de alvará por parte da Sociedade B…, Lda, tendo, posteriormente, esclarecido, via mail, que tinham estado presentes na obra os responsáveis daquela sociedade.

5.24. Tendo ainda justificado não lhe ser possível proceder à identificação dos trabalhadores que ali tinham intervindo, dado aqueles representantes se encontrarem, actualmente, emigrados na Alemanha.

5.25. Ora, tendo em conta que a sociedade emitente das facturas estava referenciada como um sujeito passivo fraudulento a Requerente objectivamente não identificou nenhum dos trabalhadores da referida obra, por forma a evidenciar estrutura humana afecta à obra realizada.

5.26. Na verdade, a Requerente limita-se a sustentar que a obra se materializou mas não juntou quaisquer elementos que permitissem concluir pela sua real execução e portanto mostrou-se incapaz de dar cumprimento ao solicitado.

5.27. Não obstante, ainda lhe restava uma hipótese de comprovar a efectividade da obra que reitera ter ocorrido, se conseguisse demonstrar o pagamento dos bens/serviços à sociedade B…, Lda, o que também não resultou comprovado.

5.28. Sendo certo que os registos contabilísticos revelaram que os pagamentos foram efectuados pela A…, através de cheques no montante de € 89.669,50 (IVA incluído), a Requerente no procedimento inspectivo apesentou cópia certificada pelo Banco J…, S.A do cheque nº…, de 14.10.2013, no valor € 22.078,50, não comprovando o restante valor de € 67.521,00,  através das fotocópias frente e verso dos cheques e/ ou apresentou outros elementos tais como evidência financeira da movimentação das contas bancárias, de acordo como prescrito no artigo 63º-C da LGT.

5.29. Não se compreende esta postura, porque bastaria à Requerente solicitar ao banco, como titular dessas contas, o extracto das contas sobre as quais os cheques tinham sido sacados, o que certamente conduziria à prova efectiva dos beneficiários dos pagamentos.

5.30. Ademais e certamente, por lapso, a Requerente juntou à PI como documento 5 o cheque do Banco J…, SA do cheque nº …, de 14.10.2013, no valor de € 22.078,50, o qual acima se fez referência quando sabe perfeitamente que, tendo-se dado por comprovado tal pagamento, ficou apenas por comprovar o pagamento do restante valor de € 67.521,00.

5.31. O facto de se tratar de um programa certificado, não impediu a coexistência da emissão de facturas processadas segundo esse programa com ou sem assinatura e/ou da sociedade e de facturas impressas por tipografia com ou sem assinatura/carimbo da sociedade.

5.32. Ora, quer as facturas e documentos rectificativos de facturas, quer as guias de transporte, guias de remessa e quaisquer outros documentos que sirvam de documento de transporte são de assinatura obrigatória, nos termos dos artigos 6.º e 7.º da Portaria n.º 363/2010, de 23 de Junho, com as alterações introduzidas pela Portaria n.º 22-A/2012, de 24 de Janeiro.

5.33. Ao que acresce que as facturas ou documentos equivalentes só podem ser emitidas de forma manual em caso de inoperacionalidade do programa (nos termos do artigo 8.º da Portaria 363/2010).

5.34. Quanto à questão da inclusão e discriminação obrigatória dos serviços prestados nas facturas exigida pelo artigo 36º do CIVA, é certo que em sede de IRC, as exigências formais não são tão severas, entendendo a jurisprudência tem entendido que basta apenas um documento escrito, em princípio externo e com menção das características fundamentais da operação.

5.35. Aqui, porém, a Requente titula o custo não através de um outro documento externo mas sim através de factura.

5.36. E se assim é, não é uma questão de pormenor a exigência na factura da discriminação dos serviços, uma vez que sem essas descrições não é possível identificar que tipo de trabalho foi efectuado pelo emitente da factura, nomeadamente se foi prestada somente mão-de-obra e, nesse caso, não se sabe qual o número de horas, ou se foram fornecidas matérias-primas ou ainda os dois serviços, só assim sendo possível concluir se os mesmos foram, ou não, indispensáveis para a realização dos proveitos tributáveis ou para a manutenção da fonte produtora.

5.37. Com efeito, por força do Decreto Lei 21/2007, de 29.01, no caso de prestação deste tipo de serviços (construção civil), a factura correspondente não deverá fazer qualquer outra menção ao IVA, para além da expressão “IVA devido pelo adquirente”.

5.38. Isto porque é o adquirente que, aquando da contabilização da dita factura, deverá proceder à liquidação do IVA, neste caso, uma autoliquidação e, na medida em que tal serviço é também dedutível, evidenciará este facto, pela dedução do IVA correspondente.

5.39. E só nestes casos, em que o IVA seja autoliquidado pelo adquirente em virtude da prestação de um serviço de construção civil o imposto poderá ser deduzido.

5.40. Trata-se de uma mera operação de registo em que os montantes que se auto-liquidam na declaração do IVA são os mesmos do que aqueles que se deduzem na mesma declaração.

5.40. Quanto à liquidação do ano de 2014 ela decorre das correcções aritméticas do ano de 2013 no montante de € 69.650,00, logo, o prejuízo fiscal declarado pelo sujeito passivo de - € 17.655,00 foi corrigido para o montante de € 51.994,99.

5.41. Mas como este prejuízo foi utilizado na totalidade em 2013, em 2014 o saldo dos prejuízos fiscais já era inexistente, razão pela qual ao lucro do ano de 2014 de € 8.851,33 já não era possível deduzir qualquer prejuízo, o que motivou a presente correcção.

5.42. A relação jurídico-fiscal estabelecida entre a AT e a sociedade B…, LDA está abrangida pelo dever de confidencialidade a que estão sujeitos todos os funcionários da AT, mormente os SIT.

5.43. O que nos parece importante transmitir é que o princípio da cooperação não vincula apenas a AT e que esta esgotou in casu todas as diligências na recolha da prova que carreou para os autos procurando dar expressão ao princípio da verdade material.

5.44. Sendo que os juros compensatórios são devidos, pelo retardamento da liquidação de parte do imposto por facto imputável à Requerente, ou seja, pela diferença entre o que já foi pago e o remanescente.

5.45. In casu não pode deixar de concluir-se pela imputabilidade, a título negligente, do retardamento da totalidade do imposto devido, à Requerente, na medida em que a ignorância da lei não justifica a sua falta de cumprimento (artigo 6º do CC), não podendo, por conseguinte, favorecê-la.

6. No dia 17 de Outubro de 2017, pelas 11 horas, teve lugar a reunião prevista no artigo 18º do RJAT.

6.1. Foram ouvidas as testemunhas da Requerente D… e K… .

6.2. Foi concedido pelo Tribunal Arbitral o prazo de 10 dias para a Requerente declarar nos autos se conseguiu localizar a testemunha E…, ficando agendada nova reunião de inquirição de testemunhas para o dia 30 de Outubro de 2017.

6.3. O Tribunal Arbitral notificou a Requerente e a Requerida para, por esta ordem e de modo sucessivo, apresentarem alegações escritas no prazo de 10 dias, sendo que o prazo para a Requerente começaria a contar no dia 27 de Outubro de 2017 ou a partir da reunião agendada para o dia 30 de Outubro de 2017, se a mesma se realizasse. O prazo para a Requerida começaria a contar com a notificação da junção das alegações da Requerente.

6.4. Nos termos do artigo 18º, nº 2 do RJAT, foi designado o dia 14 de Janeiro de 2018 para o efeito de prolação da decisão arbitral.

7. No dia 27 de Outubro de 2017, a Requerente apresentou um requerimento, informando o Tribunal Arbitral da impossibilidade de localizar a testemunha E… .

8. As partes apresentaram alegações escritas, onde reafirmaram o previamente alegado.

 

 

II – Factos Provados

 

9. Com interesse para a decisão da causa, julgam-se provados os seguintes factos:

9.1. A Requerente é uma sociedade por quotas, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de … a, tem o capital social de € 66.400,00 e é detida em 100% por F…, sua sócia-gerente.

9.2. E tem, desde 17.04.2001, por objecto social a “prestação de serviços na área da construção civil, empreitadas e subempreitadas de obras públicas e particulares, designadamente construção, reconstrução e remodelação de edifícios residenciais, bem como actividades especializadas da construção como montagem e revestimento de pavimentos ou paredes, venda e aluguer e montagem e desmontagem de andaimes. Compra e venda de propriedades, imoveis, terrenos turísticos e urbanos, bem como arrendamento dos seus bens imobiliários, revenda dos prédios adquiridos”.

9.3. Desde essa data que se encontra colectada pela actividade principal de “Outras instalações em construções”, a que correspondia o CAE 43290 e pelas actividades secundárias de “Revestimentos de pavimentos e paredes”, de “Pintura e colocação de vidros” e de “Compra e venda de bens imobiliários” a que correspondem os CAE 43330, 43340 e 68100, respectivamente.

9.4. Para efeitos de IVA, a Requerente encontra-se enquadrada, desde 01.01.2013, no regime normal de periodicidade trimestral e, para efeitos de IRC, no regime geral de tributação, desde 01.01.2009.

9.5. Entre 23.04.2001 e 06.11.2015 foi seu contabilista certificado o Sr. G…, titular do NIF…, data a partir da qual passou a exercer as mesmas funções o Sr. H…, titular do NIF… .

9.6. Nos anos de 2013 e 2014, a Requerente declarou, através do anexo P das declarações anuais, a aquisição de serviços/bens aos fornecedores titulares dos NIF…, …, …, …, … e … .

9.7. O número de contribuinte fiscal … pertence à sociedade B…, Lda.

9.8. A sociedade B…, Lda. emitiu as facturas nºs 119, 120, 131 e 136, emitidas a 1ª e a 2ª em 04.10.2013, a 3ª em 11.11.2013 e a 4ª em 02.12.2013, pelos montantes totais de € 22.078,50, € 15.6421,00 e € 23.995,00 as 3ª e 4ª, nelas constando o IVA de € 4.128,50, € 2.921,00 e de € 4.485,00 as 3ª e 4ª.

9.9. Em 02.06.2016, foi emitida a Ordem de Serviço nº OI2016…, dando-se início a uma acção inspectiva interna em nome da Requerente, na sequência da acção inspectiva ao sujeito passivo B…, Lda., titular do NIF…, e realizada a coberto das Ordens de Serviço OI2015…, OI2015… e OI2015…, respeitantes aos anos de 2011, 2012 e 2013.

9.10. A Requerente foi, em sequência de Ordens de Serviço Internas, relativas aos exercicios de 2011, 2012 e 2013, à sociedade comercial com a firma B…, Lda., alvo de acções inspectivas internas, tendo sido no âmbito da Ordem de Serviço n.º OI2016…, em setembro de 2016, notificada pela Autoridade Tributária e Aduaneira, pelos Serviços de Inspeção Tributária da Direcção de Finanças de Lisboa, que projectava corrigir, como resultado da acção inspectiva interna efectuada ao exercicio de 2013, o Lucro Tributável em termos de IRC, e pela dedução indevida do imposto suportado com a prestação de serviços do sujeito passivo B…, Lda., NIF…, nos termos do n.º3 do art. 19º do CIVA, no montante de €16.019,50.

9.11. A Requerente exerceu o direito de audição prévia contra o projecto que lhe foi comunicado, tendo a Administração Tributária mantido a sua posição e notificado a Requerente, em Novembro de 2016, das correcções resultantes da acção inspectiva supra referida.

9.12. As liquidações adicionais relativas ao exercício de 2013 foram pagas pela Requerente a 2 de Fevereiro de 2017.

9.13. A Requerente foi notificada, em Janeiro de 2017, do Projecto de Correcções do Relatório de Inspeção interna efectuada ao exercicio de 2014, no que ao IRC diz respeito.

9.14. A Requerente exerceu o direito de audição prévia contra o projecto que lhe foi comunicado, tendo a Administração Tributária mantido a sua posição.

9.15. Em Fevereiro de 2017, a Requerente foi notificada, ao abrigo da Ordem de Serviço n.º OI2016…, da Direcção de Finanças de Lisboa, que incidiu sobre o exercicio de 2014, na sequência das correcções efectudas ao exercicio de 2014.

9.16. As liquidações adicionais relativas ao exercício de 2013 foram pagas pela Requerente a 7 de Abril de 2017.

9.17. A Requerente celebrou, na qualidade de segunda outorgante, com a sociedade C…, CRL., um contrato de empreitada relativo à uma obra de “substituição de cobertura”, em Matosinhos em 30 de Abril de 2013.

9.18. A Requerente celebrou, na qualidade de primeira outorgante, com a sociedade B…, Lda., um contrato de empreitada, datado de 1 de Setembro de 2013, relativo à execução de uma obra de cofragem, betonagem, armação de ferro, afagamento de betão, sita em Matosinhos.

9.19. De acordo com aditamento manuscrito no próprio contrato, o objecto do mesmo foi alterado, acrescentando-se a “substituição de cobertura: montagem de estrutura em telhado e trabalhos co-relacionados”.

 

III – Factos Não Provados

 

10. Julgam-se não provados os seguintes factos:

10.1. A sociedade B…, Lda. possui uma estrutura empresarial técnica, humana e logística adequada aos trabalhos descritos nas facturas, estrutura essa que lhe permite realizar os valores facturados.

10.2. A sociedade B…, Lda. possui o alvará necessário à realização da obra contratada.

10.3. A obra descrita no contrato de empreitada celebrado entre a Requerente e a sociedade B…, Lda. foi efectivamente realizada.

 

IV – Fundamentação da decisão de facto.

 

11. Os factos resultam da documentação juntas aos autos. Os factos não provados resultam de as testemunhas apresentadas não terem conseguido demonstrar o referido pela Requerente. Efectivamente, a testemunha D… não soube identificar onde se localizava a empresa B…, Lda, e a testemunha K… referiu que pagava directamente aos trabalhadores sem recibo.

 

V– Do Direito

 

12. Está em causa apenas a apreciação da ilegalidade das liquidações adicionais de IRC e juros compensatórios relativas ao período tributário de 2013 e 2014

 

Dispõe o artigo 23º, nº 1 do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas: “Para a determinação do lucro tributável, são dedutíveis todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC.”

Refere o nº 4 do mesmo artigo:

“No caso de gastos incorridos ou suportados pelo sujeito passivo com a aquisição de bens ou serviços, o documento comprovativo a que se refere o número anterior deve conter, pelo menos, os seguintes elementos:

a) Nome ou denominação social do fornecedor dos bens ou prestador dos serviços e do adquirente ou destinatário;

b) Números de identificação fiscal do fornecedor dos bens ou prestador dos serviços e do adquirente ou destinatário, sempre que se tratem de entidades com residência ou estabelecimento estável no território nacional;

c) Quantidade e denominação usual dos bens adquiridos ou dos serviços prestados;

d) Valor da contraprestação, designadamente o preço;

e) Data em que os bens foram adquiridos ou em que os serviços foram realizados.”

Conforme o nº 6 do mesmo artigo: “Quando o fornecedor dos bens ou prestador dos serviços esteja obrigado à emissão de factura ou documento legalmente equiparado nos termos do Código do IVA, o documento comprovativo das aquisições de bens ou serviços previsto no n.º 4 deve obrigatoriamente assumir essa forma.”

Verifica-se, contudo, que as indicações dos serviços fornecidos nas facturas são genéricas e repetitivas e, na sua generalidade, estão formuladas de forma análoga ao que consta no objecto do contrato, sendo que este foi inclusive alterado por aditamento manuscrito, desconhecendo-se qual das partes procedeu à alteração e em que data.

Por outro lado, em relação à prova documental apresentada, verifica-se que determinadas facturas correspondem a mais do que um cheque, que apenas um cheque (datado de 14/10/2013, com o valor de € 22.078,50, é apresentado em frente e verso (Documento nº 5, junto com a Petição Inicial), que os três cheques que correspondem ao pagamento da factura nº 131 e pagamento parcial da factura nº 136 foram emitidos em 2014, não obstante a sua validade ter terminado a 29 de Outubro de 2010 (Documento nº 2.2, p. 29, junto com a Petição Inicial). Verifica-se ainda que o cheque que se refere ter sido emitido para pagamento da factura 120 tem a data incompleta, apenas referindo o ano de 2013 (Documento nº 2.2, p. 26, junto com a Petição Inicial).

Verifica-se ainda que as facturas emitidas pela sociedade B…, Lda. não contêm a menção obrigatória “IVA - autoliquidação”, legalmente exigida nas prestações de serviço e/ou de bens conexas com a construção civil, nos termos dos artigos 36º, nº 13 e 2º, alínea j) do Código do IVA.

As testemunhas apresentadas não lograram provar a existência da obra ou a capacidade humana e material para a realização dos trabalhos, por parte da sociedade B…, Lda.

Não se verifica, portanto, que a Requerente tenha logrado provar a realização da obra por parte da sociedade B…, Lda., nem o pagamento total das facturas.

Como refere o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo datado de 7 de Maio de 2003, Proc. nº 01026/02, referente à situação análoga de dedução de IVA:

Dispunha o artigo 78º do CPT que “quando a contabilidade ou escrita do sujeito passivo se mostre organizada segundo a lei comercial ou fiscal, presume-se a veracidade dos dados e apuramentos decorrentes, salvo se se verificarem erros, inexactidões ou outros indícios fundados de que ela não reflecte a matéria tributável efectiva do contribuinte”. Ora, como quem tem a seu favor uma presunção estabelecida na lei está dispensado da prova do facto presumido (cfr. os artigos 349º e 350º nº 1 do Código Civil - (CC)), a recorrente, tendo a sua escrita organizada conforme as exigências legais, não precisa de provar que são verdadeiros os dados decorrentes. A não ser que se verifiquem erros, inexactidões ou outros indícios fundados de que ela não reflecte a matéria tributável efectiva. Quer dizer, a presunção cessa quando, estando, embora, a escrita ou contabilidade organizada de acordo com a lei, enferme de erros ou inexactidões, ou haja “indícios fundados” de que, apesar da sua correcta organização, não reflecte a matéria tributável efectiva. Cabe nesta previsão, claramente, o caso de a contabilidade, impecavelmente organizada, se avaliada do ponto de visto técnico-contabilístico, no entanto omitir operações efectuadas; e cabe o caso inverso - o de incluir operações não efectuadas. Este último é aquele que correntemente se vem chamando de “facturas falsas”, isto é, a contabilidade considera (e trata de forma contabilisticamente correcta) documentos emitidos na forma legal, mas que não correspondem a qualquer realidade, porque as operações que era suposto reflectirem, na verdade, não tiveram lugar. E, aqui, a lei não exige senão “indícios fundados”, ou seja, não impõe à Administração a “prova provada” de que por detrás dos documentos não está a realidade que normalmente reflectem e comprovam, basta-se com indícios fundados para fazer cessar a presunção a favor do contribuinte. E a este, desprovido do escudo protector da presunção, não resta senão demonstrar a veracidade dos seus elementos contabilísticos, e respectivos suportes, destarte posta em crise, face àqueles “fundados indícios”. Temos, pois, que, quando seja a Administração Fiscal a praticar um acto, designadamente, um acto tributário de liquidação, fundada na existência de determinado facto tributário, por hipótese não revelado pela escrita do contribuinte, é ela que deve provar tal existência, pressuposto da sua actuação. Estamos perante um corolário do princípio da legalidade administrativa, de acordo com o qual a Administração só pode agir se isso lhe permitir a lei, e não pode fazê-lo contra ela. Os pressupostos da sua actuação são, pois, factos constitutivos do seu direito a agir, cuja prova lhe compete, por isso que é o agente. No caso do acórdão recorrido, porém, a Administração Fiscal não actuou baseada na existência de qualquer facto tributário por si invocado. Antes, pretende que a recorrente não tem direito à dedução do IVA constante das facturas em causa, baseada no entendimento de que, face aos indícios recolhidos, não se teriam, realmente, realizado as operações comerciais que tais facturas, supostamente, titulavam.  Nos termos do artº 82° n° 1 do CIVA, "o chefe da Repartição de Finanças competente procederá à rectificação das declarações dos sujeitos passivos quando fundadamente considere que nelas figura um imposto inferior ou uma dedução superior aos devidos liquidando-se adicionalmente a diferença". Como assim, é a recorrente quem se arroga um direito que pretende exercer - o direito à dedução do IVA -, que não é reconhecido pela Administração Fiscal, que no processo demonstrou haver indícios sérios de que as operações tituladas por aquelas facturas não terão ocorrido. Destarte, não é a Administração que afirma um facto positivo com consequências tributárias - é o contribuinte que invoca o seu direito à dedução do IVA pago a montante. Por isso, é ele quem deve provar a verificação dos pressupostos em que assenta tal direito.”

 

Refere ainda o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, datado de 4 de Junho de 2013, Proc. nº 06478/13:

“Com efeito, competindo ao contribuinte ónus da prova da veracidade das operações em causa, não lhe basta criar dúvida sobre a sua veracidade, ainda que fundada, pois neste caso o art. 100º do CPPT não tem aplicação. Neste ponto, diga-se que o ónus consagrado no art. 100º nº 1 do CPPT, contra a administração tributária (de que a dúvida quanto à existência e quantificação do facto tributário deve ser decidida contra a AT: in dubio contra Fisco) apenas existe quando seja esta a afirmar a existência dos factos tributários e respectiva quantificação. Por outro lado, não obstante a posição assumida pela impugnante, reclamando a efectiva realização de todas as transacções referenciadas nas facturas postas em crise pela AF, constata-se que nenhuma dessa relevante factualidade foi demonstrada pela produção das provas, maxime, a testemunhal, que ofereceram no âmbito deste processo de impugnação judicial. Aliás, em relação à prova testemunhal, o Tribunal foi claro e directo ao referir que “os depoimentos das testemunhas arroladas não permitem comprovar que as operações efectuadas diziam respeito ás prestações de serviço concretamente desconsideradas pela Adm. Fiscal”.

Conforme afirma ainda o mesmo Acórdão: “Assim sendo, e na medida em que a ora Recorrida não fez prova da veracidade das transacções em causa, aqui, tal como foi assumido pela AT, só podemos apontar e aceitar o procedimento de desconsiderar os custos correspondentes aos montantes inscritos nas facturas reputadas “falsas”, na medida em que os mesmos, pura e simplesmente, não foram suportados, pagos, pela impugnante, na medida em que só desta forma, se concretiza e respeita, nomeadamente, a exigência legal de só se poderem considerar custos ou perdas “os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora …” - cfr. art. 23º nº 1 do CIRC, o que significa que a sentença recorrida não pode manter-se, impondo-se a sua revogação.”

Conforme é afirmado no Acórdão do Tribunal Administrativo Sul, datado de 16 de Outubro de 2014, Proc. nº 06964/13:

No caso em exame, está em causa a correcção técnica referente à desconsideração de custo inscrito na contabilidade de sujeito passivo, que optou pela contabilidade organizada, pelo que se mostra sujeito às regras do CIRC de determinação do lucro tributável (artigo 32.º do CIRS). Nos termos do artigo 23.º/1, do CIRC, «[c]onsideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora». A este propósito, sublinha-se que: «[o]s custos ou perdas da empresa constituem, portanto, os elementos negativos da conta de resultados, os quais são dedutíveis do ponto de vista fiscal quando, estando devidamente comprovados, forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva da empresa em causa. A ausência de qualquer destes requisitos implica a não consideração dos referidos elementos como custos, assim devendo os respectivos montantes ser adicionados ao resultado contabilístico» (1). Por outras palavras, perante a dúvida fundada sobre a credibilidade do registo contabilístico do custo (=declaração fiscal do contribuinte), criada pela Administração Fiscal, recai sobre o contribuinte o ónus de demonstrar a efectividade do custo (2). Donde decorre que a dúvida criada pela Administração Fiscal pode não ser fundada ou consistente, o que determina, desde logo, a prevalência do princípio declarativo. Ao invés, tal princípio pode ter sido correcta ou fundadamente afastado pelo acto tributário e, no entanto, recobrar o seu vigor com a demonstração, por parte do contribuinte, da efectividade do custo, no quadro do processo fiscal, sem embargo da perda de credibilidade da contabilidade gerada pelo acto tributário que desconsiderou o custo. É ponto assente o de que a dedutibilidade do custo depende da verificação em relação ao mesmo das características seguintes: i) ser efectivo (existente, real); ii) devidamente contabilizado como tal; iii) em obediência a critérios de imputação temporal; iv) comprovado (justificado); v) indispensável; vi) incorrido para a obtenção de proveitos ou ganhos sujeitos a imposto; vii) contanto que não exista preceito que negue directa ou indirectamente a sua dedutibilidade.”

Verifica-se, portanto, que, cabendo à Requerente o ónus da prova relativamente à existência dos custos que pretende deduzir e tendo a Administração Tributária indícios fundamentados de que as operações em causa não se realizaram, não logrou a Requerente provar a sua efectiva realização, conforme lhe competia, pelo que tem que ser julgado improcedente o pedido arbitral.

 

VI – Decisão

 

Julga-se improcedente o pedido de declaração de ilegalidade das liquidações adicionais de IRC e juros compensatórios, referentes ao período tributário de 2013 no montante de €6.814,76, e ao período tributário de 2014, no montante de €1.123,60, no valor total de €7.938,36.

 

Fixa-se ao processo o valor de € 7.938,36 (valor indicado e não contestado) e o valor da correspondente taxa de arbitragem em € 612,00 nos termos da Tabela I do Regulamento de Custas dos Processos de Arbitragem Tributária.

 

Custas pela Requerente.

 

 

Lisboa, 5 de Janeiro de 2018

 

 

O Árbitro

 

 

(Luís Menezes Leitão)