Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 168/2017-T
Data da decisão: 2018-01-02  IRC  
Valor do pedido: € 267.742,55
Tema: IRC - Falta de documentos – Reforma da decisão arbitral (anexa à decisão)
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Decisão Arbitral

 

          Os árbitros Cons. Jorge Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Dr. Ricardo Rodrigues Pereira e Dr. Jaime Carvalho Esteves (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 26-05-2017, acordam no seguinte:

 

         

          1. Relatório

 

A…, LDA., contribuinte n.º …, com sede na Rua …, n.º…, Porto (doravante designada como “A…” ou “Requerente”), veio, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária ou ”RJAT”), apresentar pedido de pronúncia arbitral visando a declaração da ilegalidade parcial da liquidação de IRC n.º 2015…, no valor de € 170.116,68 (em que incluem € 93.749,49 de IRC, com juros compensatórios no valor de € 18.834,37, derrama municipal no valor de € 5.336,35 e tributações autónomas no valor de € 54.514,14), bem como da decisão de indeferimento parcial da reclamação graciosa que dela apresentou.

A Requerente impugnou também liquidações de IVA e juros compensatórios, bem como a decisão de indeferimento parcial da reclamação graciosa que delas apresentou, mas optou por impugnar no presente processo apenas os actos respeitantes a IRC, na sequência de o Tribunal Arbitral ter decidido que não é viável a cumulação de pedidos.

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 24-03-2017.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral colectivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 11-05-2017 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 26-05-2017.

A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta em que defendeu que suscitou a excepção da cumulação ilegal de pedidos e defendeu que o pedido deve ser julgado improcedente.

A excepção foi julgada procedente, tendo a Requerente optado pela impugnação no presente processo dos actos respeitantes a IRC.

Em 09-11-2017, realizou-se uma reunião, em que o Sujeito Passivo requereu a rectificação de lapsos de escrita, foi produzida prova testemunhal e decidido que o processo prosseguisse com alegações escritas.

As Partes não apresentaram alegações.

O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do RJAT, e é competente.

As partes estão devidamente representadas gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de nulidades.

 

 

2. Matéria de facto

 

2.1. Factos provados

 

Com base nos elementos que constam do processo e do processo administrativo junto aos autos, consideram-se provados os seguintes factos:

 

  1. A Requerente A…, LDA é uma sociedade unipessoal por quotas que exercia, em 2011, a título principal, a actividade de leilões para a venda de objectos de arte e antiguidades e, acessoriamente, a compra e revenda dos mesmos em segunda mão;
  2. A actividade leiloeira da Requerente, quanto aos bens que vende por conta de particulares, é efectuada nos seguintes termos:

- a A… leilões não adquire a propriedade dos bens que coloca em leilão agindo em nome do vendedor;

- a A… leilões e o vendedor de um bem vinculam-se entre si mediante a assinatura do respectivo contrato de prestação de serviços;

- do contrato de prestação de serviços constam, entre outros, os seguintes elementos: preço mínimo de venda para cada bem; comissão devida pelo vendedor à A… leilões; em caso de venda do bem e o valor recebido do comprador, a A… leilões obriga-se a entregar ao vendedor a quantia da venda deduzida da sua comissão e impostos;

- o comprador obriga-se a pagar a A… leilões a quantia devida pela compra do bem, ou seja o montante da arrematação acrescido de uma comissão com IVA incluído à taxa legal.

  1. Paralelamente, a Requerente procedeu a compra de bens (quer no mercado nacional, quer em países terceiros) para revenda;
  2. Em 2011, a A… realizou 3 leilões, com 3 sessões cada, sendo que, quando os bens são vendidos ao cliente final (comprador) emite uma factura (a que corresponde a série 01) onde indica o valor de adjudicação (que designa por preço de martelo), acrescido de uma comissão que correspondente, em média, a 14% sobre esse preço, com IVA incluído à taxa normal e que corresponde ao valor recebido desse cliente final;
  3. Quando uma peça é vendida a A… emite uma factura (a que corresponde a série 02) ao comitente das vendas em leilão, onde menciona o preço de adjudicação e a respectiva comissão a cobrar a este comitente que correspondente, em média a 11% sobre esse preço, sendo que o comitente tem direito a receber a diferença entre o preço final e a comissão com IVA incluído à taxa normal;
  4. A Autoridade Tributária e Aduaneira procedeu a uma acção inspectiva à Requerente relativa ao ano de 2011, em sede de IRC (além de IVA), ao abrigo da Ordem de Serviço n.º OI2013…, que teve o seu início em 16-10-2014, cujo prazo foi prorrogado;
  5. Na acção inspectiva referida foi elaborado o Relatório da Inspecção Tributária que consta do processo administrativo, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais o seguinte:

Capítulo III - Descrição dos factos e fundamentos das correções meramente aritméticas

A - IRC - matéria tributável e IVA em falta: rendimentos não reconhecidos na contabilidade, falta de liquidação de IVA e erro no preenchimento das declarações periódicas de IVA A.1) O sujeito passivo foi notificado pessoalmente, em 13/03/2015, para justificar as divergências existentes entre o montante das comissões (ganhos) que constam das faturas listadas no ficheiro SAFT-PT de faturação e o montante das mesmas reconhecidas na conta contabilística SNC 7211 – Prestações de Serviços/Mercado Nacional. Em resposta apresentada em 13/04/2015, no respetivo ponto 3, o sujeito passivo vem confirmar a falta de reconhecimento na referida conta 7211, do valor de comissões no montante de € 3 593,14, que discrimina nos anexos 3.2. e 3.3. que apresenta na referida resposta.

Pelo exposto, encontra-se em falta de declaração rendimentos sujeitos a IRC, no valor de € 3 593,14, que correspondem a rendimentos omitidos, nos termos do art. 20.º do Código do Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (CIRC).

(...)

A.2) O sujeito passivo contabilizou a nota de lançamento nº … de 30/04/2011 com o reconhecimento de vários débitos na conta SNC 121- Depósitos à Ordem/B…, por crédito da conta 21111001 - Clientes C/C - Clientes Gerais - Clientes Nacionais - C/C, tendo sido notificado, em 13/03/2015, para justificar os registos efetuados através dessa nota de lançamento e, especificamente, justificar, individual e comprovadamente, os motivos das regularizações efetuadas, bem como as entidades (Nome e NIF) que efetuaram os pagamentos que entraram na conta bancária e a que titulo foram efetuadas.

Em resposta a A… refere que quanto aos “débitos por contrapartida da conta SNC 21111001 – Clientes CC: as entradas no banco de meios monetários provenientes de depósito, transferências e TPA, foram consideradas como recebimentos de clientes". Apresenta, ainda, o anexo 22.1. que contém um quadro no qual, relativamente a parte desses débitos, registados na conta 121, se observa que não consegue identificar quem efetuou os pagamentos e qual o respetivo documento justificativo da respetiva entrada na conta bancária.

Assim, foram recebidos na conta bancária titulada pela empresa, valores a seu favor que, não se encontram individualizados em contas de clientes que permitem a sua identificação e a associação ao respetivo documento de ganho (fatura) sendo que, mesmo depois de notificado, não identificou a que titulo foram efetuadas essas entradas e quem as realizou.

Face ao exposto, tais débitos resultam da normal atividade da empresa, ou seja, respeitam a recebimentos de clientes resultantes da sua atividade e que incorporaram a sua esfera patrimonial, sendo, portanto, rendimentos obtidos e que não foram objeto de faturação, num total de € 46 188,03, conforme quadro seguinte:

 

 

De acordo com o n.º 1 do artigo 20º do CIRC "consideram-se rendimentos os resultantes de operações de qualquer natureza, em consequência de uma ação normal ou ocasional, básica ou meramente acessória" do sujeito passivo, pelo que, os recebimentos que estão quantificados e determinados na mencionada conta bancária, no montante de € 46 188,03 enquadram-se como rendimentos ou ganhos decorrentes da atividade de prestação de serviços/transmissão de bens para a qual se encontra enquadrado, operações essas sujeitas a IVA, nos termos do art. 3.º, 4.º, 7.º e 8.º do CIVA, à taxa normal de 23% prevista nos art. 18.º do mesmo diploma.

Face ao exposto, o sujeito passivo omitiu rendimentos no valor de € 46 188,03, infringindo o disposto no art. 20.º do CIRC, pelo que se procederá ao acréscimo deste valor ao lucro tributável declarado. Para efeitos de IVA encontra-se em falta de liquidação e entrega o valor de € 10.623,25 (= € 46 188,03 x 23%), devido no 2.º trimestre de 2011.

B - IRC - matéria tributável: valor deduzido aos rendimentos declarados/perdas por imparidade

O sujeito passivo reconheceu a débito da conta 7211 - Prestações de Serviços/Mercado Nacional, em 31/12/2011, o montante de € 25 566,17 (registo nº…).

Na resposta prestada à notificação efetuada, o sujeito passivo vem, no respetivo ponto 6, afirmar que esse valor respeita a uma regularização relacionada com o reconhecimento de um crédito incobrável, relativo a C…, NIF…, para o qual foi proferida sentença de declaração de insolvência, no qual foi confirmado um crédito reclamado de € 19.101,17. Afirma, ainda, que o referido registo está errado pelo que deve ser estornado pretendendo, no entanto, que seja reconhecida uma divida incobrável, no montante de € 18.651,61, que deveria ter sido registada na conta 683 – Dívidas incobráveis.

Analisada a resposta prestada pelo sujeito passivo e os respetivos elementos que anexou, constata-se que o valor de € 25.566,17, respeita a faturas emitidas com um preço adjudicado (preço a martelo) de € 24.530,00, a que acresceu comissões de € 2.871,60 e IVA de € 660,47, num total de € 28.062,07. Deste valor o sujeito passivo, informa que recebeu € 2.495,90 e retomou peças, a que atribuiu um valor de € 6.465,00, considerando, por diferença um crédito incobrável de € 19.101,17.

Ora, não obstante o ganho relativo à sua atividade corresponda apenas à comissão de € 2.871,60, o sujeito passivo pretende considerar como crédito incobrável o valor total de venda das peças, mais a comissão, com o argumento de que tal valor não foi recebido na totalidade.

De acordo com o estipulado no art. 35.º do CIRC, com a redação vigente em 2011, "podem ser deduzidas para efeitos fiscais as perdas por imparidade contabilizadas no mesmo período de tributação ou em períodos de tributação anteriores:

a) As relacionadas com créditos resultantes da actividade normal que, no fim do período de tributação, possam ser considerados de cobrança duvidosa e sejam evidenciados como tal na contabilidade".

Como foi referido, o valor em causa não foi evidenciado como tal na contabilidade, sequer pelo montante da comissão faturada, no valor de € 2.871,60, valor este que corresponderia ao ganho/rendimento decorrente da atividade normal do sujeito passivo, considerando-se que esta apenas abrange operações envolvendo transações correntes, ou seja operações de natureza comercial relacionadas com a prestação de serviços.

Por outro lado o sujeito passivo também não contabilizou no período de tributação de 2011 ou, em períodos de tributação anteriores, a pretendida perda por imparidade, pelo que, não seria de aceitar esse pretendido reconhecimento uma vez que não se encontram cumpridos os requisitos necessários para que se possam deduzir para efeitos fiscais, nos termos do art. 35.º do CIRC.

Face ao exposto, será de corrigir ao lucro tributável declarado, o valor de € 25 566,17 registado a débito da conta 7211 - Prestações de Serviços/Mercado Nacional, que se encontra a reduzir os ganhos da atividade, dado ter sido infringido o disposto no art. 20.º do CIRC.

(...)

D - IRC - matéria tributável e IVA em falta: omissão de rendimentos e IVA não liquidado na venda de peças

Em 23/12/2011 o sujeito passivo (A…) emitiu as faturas nºs 433, 434, 435 e 436 para o próprio (autofacturação).

As faturas respeitam à venda de peças, num total de preço adjudicado ao cliente final de € 301.715,00, comissões (que o sujeito passivo considerou como comissões do comitente) no valor de € 30.139,46 e IVA liquidado sobre esta comissão de € 6.932,07.

As referidas faturas foram reconhecidas, pelo montante da comissão, a débito da conta SNC 6221-Trabalhos especializados e a crédito da conta SNC 7211- Prestações de Serviços/Mercado nacional. O respetivo IVA liquidado (sobre a comissão) foi reconhecido a débito de uma conta de IVA dedutível e a crédito de uma conta de IVA liquidado, ou seja, estas faturas, contabilística e fiscalmente, tiveram um efeito inócuo.

Da resposta ao quesito 27 da notificação pessoal efectuada em 13/03/2015, no quadro apresentado pelo sujeito passivo em Anexo 27.2, onde consta a identificação de todas as faturas emitidas aos comitentes relativas às peças vendidas em 2011, surgem as referidas faturas n.ºs 433, 434, 435 e 436. Ora, relativamente às peças vendidas, que o sujeito passivo elencou nas referidas faturas, não identificou, portanto, como devia e como era obrigado nos termos dos artigos 9.º a 13.º do Regime Especial (Decreto lei n.º 199/96 de 18 de Outubro) os respectivos comitentes, não se podendo concluir estar subjacente qualquer contrato de comissão de venda (cfr. prevê n.º 1 do art. 9.º e al. e) do art. 2.º do referido Regime Especial). Ainda a referir que, quanto à venda destas peças o sujeito passivo não comprova que as mesmas foram alienadas por conta de (cfr. art. 9.º, n.º 1 do Regime Especial):

“a) De qualquer pessoa que não seja sujeito passivo;

b) De outro sujeito passivo, desde que a transmissão feita por este seja isenta de imposto, ao abrigo do n.º 33 do artigo 9.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado ou de idêntica disposição legal vigente no Estado membro onde a transmissão dos bens seja efectuada;

c) De outro sujeito passivo, desde que a transmissão feita por este tenha tido por objecto um bem de investimento e seja isenta de imposto ao abrigo do artigo 53.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado ou de idêntica disposição legal vigente no Estado membro onde a transmissão dos bens seja efectuada;

d) De outro sujeito passivo revendedor, desde que a transmissão feita por este seja sujeita a imposto nos termos do regime especial de tributação da margem, previsto neste diploma, ou de idêntica regulamentação vigente no Estado membro onde seja efectuada a transmissão. "

Efetivamente, para o sujeito passivo poder aplicar, enquanto organizador de vendas em leilão, o Regime Especial, as transmissões têm que ser efetuadas por conta de um comitente, conforme definido no seu artigo 1.º, o que não sucede com as peças faturadas a si mesmo (ao próprio sujeito passivo), dado não ter sido emitida a fatura aos respectivos comitentes, como deveria acontecer.

Com efeito, convém lembrar que o sujeito passivo utiliza duas séries de faturação: uma para faturas emitidas ao adquirente de bens em leilão (cliente final) e outra (onde constam as faturas em causa, n.ºs 433, 434, 435 e 436) para os comitentes. De acordo com os procedimentos adotados na sua actividade as faturas só são emitidas ao comitente após a emissão das faturas ao adquirente/cliente final, isto é quando a peça é vendida, pelo que se conclui que as peças que constam das referidas faturas foram todas vendidas. Aliás a este propósito o próprio n.º 2 do art. 9.º do Regime Especial estabelece que:

“a transmissão dos bens do comitente para o sujeito passivo organizador de vendas em leilão, referida nas alíneas b), c) e d) do número anterior, considerar-se-á efectuada no momento da realização da venda em leilão desses mesmos bens. "

O sujeito passivo, através de e-mail de 05/06/2015, veio afirmar que as peças incluídas nas referidas faturas são peças próprias e que as mesmas originaram faturas de venda emitidas a clientes finais, nas quais calculou comissões e liquidou IVA. Contudo, a contabilidade não revela o registo de inventários de peças próprias ou de peças à consignação, além de que não revela qualquer registo das contas correntes individualizadas de clientes e comitentes.

Assim, relativamente às peças que constam nas faturas em análise não nos foi facultada qualquer outra informação adicional que comprovadamente e inequivocamente identificasse qual a origem e proveniência das mesmas.

Por último é de salientar que a contabilidade não revela as contas de terceiros que permitam o controlo previsto e exigível no art. 13.º do Regime Especial, que aliás é condição para aplicabilidade do referido regime, e que refere:

" Os organizadores de vendas em leilão que efectuem transmissões de bens nas condições previstas no artigo 9.º são obrigados a registar, em contas de terceiros e devidamente justificados:

a) Os montantes obtidos ou a obter do comprador do bem; e

b) Os montantes reembolsados ou a reembolsar ao comitente. ”

Apesar da inexistência destas contas e respectivos registos individualizados, o sujeito passivo foi notificado para apresentar os mesmos nos termos do mencionado art. 13.º tendo apenas, em resposta, apresentado uma listagem das faturas emitidas aos compradores e respectivos valores de venda, comissões e IVA e uma listagem das faturas emitidas aos comitentes, também com os valores de venda, respectivas comissões e IVA. Não apresentou, portanto, as contas correntes de terceiros e as respectivas justificações, designadamente dos montantes obtidos ou a obter dos compradores e dos montantes reembolsados ou a reembolsar aos comitentes.

Em conclusão, verifica-se que não estão reunidas as condições para aplicação do Regime Especial de IVA nas vendas de peças efectuadas que constam nas facturas emitidas pelo sujeito passivo a si mesmo (faturas n.ºs 433 a 436), pelo que será de aplicar o Regime Geral do IVA nestas transmissões, aplicando-se as normas de incidência gerais do CIVA. Estamos, assim perante transmissões de bens e prestações de serviços, sujeitas a IVA nos termos do art. 3.º, 4.º 7.º e 8.º do referido diploma, à taxa normal de 23%, prevista na al. c) do nº 1 do art. 18.º do CIVA. O valor tributável, está determinado nos termos do n.º 1 do art. 16.º do referido Código, nas próprias faturas emitidas n.ºs 433 a 436, que e o valor de venda das peças que consta das mesmas, num total de € 301.715,00.

No que se refere às vendas das peças em causa, verifica-se que o sujeito passivo não procedeu ao registo do respectivo ganho no valor de € 301.715,00, pois, não tendo comprovado a origem e proveniência das mesmas, designadamente quanto aos respetivos comitentes ou eventuais fornecedores, não é de acolher como ganho sujeito a IRC, somente a eventual comissão faturada ao cliente final.

(...)

D.2) Omissão de rendimentos sujeitos a IRC

O sujeito passivo omitiu aos rendimentos declarados para efeitos de IRC os ganhos decorrentes das vendas das peças, num total de € 301.715,00.

Face ao exposto, propomos a correcção ao lucro tributável de IRC do montante de € 301.715,00, nos termos da al. a) do n.º1 do art. 20.º do CIRC.

(...)

F - IRC devido por tributação autónoma: despesas não documentadas

F.1) Através da nota de lançamento nº … de 31/03/2011 o sujeito passivo reconheceu um crédito na conta SNC 122- Depósitos à Ordem/D…, no montante de € 7 750,00 por débito da conta SNC 27881001- Outros Devedores e Credores/Consignação, sem qualquer outro documento de suporte a esse lançamento, além da referida nota interna.

Em resposta à notificação pessoal efectuada para esclarecimento e justificação desse movimento (ponto 7. da notificação), sujeito passivo apenas juntou cópia da respetiva nota de lançamento e de um cheque emitido à ordem de R…, esclarecendo que se trata de um pagamento a um comitente.

Contudo, não apresentou ou identificou a respetiva fatura emitida ao comitente, pelo que não se pode apurar inequivocamente a qual natureza do pagamento titulado pelo cheque, no valor de € 7 750,00.

F.2) Em 30/04/2011, através da nota de lançamento nº…, o sujeito passivo reconheceu um crédito da conta SNC 121- Deposito à Ordem/B…, num montante único de € 193 109,05 por débito da conta SNC 27881001- Outros Devedores e Credores/Consignação, tendo como base de suporte apenas a referida nota de lançamento interna.

Para esclarecimento deste lançamento, o sujeito passivo foi notificado (ponto 12. da notificação) para exibir copia dos documentos de suporte a tais registos bem como para justificar os mesmos, assim como qual o motivo pelo qual esses movimentos não se encontram refletidos nos extractos bancários.

Em resposta, apenas referiu que “aquando da reconciliação dos saldos de depósitos a ordem foi feito um lançamento provisório, a crédito da conta SNC 121 – B…, agregando diversos movimentos que não estavam identificados, para retificação posterior, o que nunca chegou a ser concretizado, lapso que só agora foi identificado" e apresentou um mapa titulado por “Listagem de Meios de Pagamento” (que juntou como anexo 12.3.), num total de € 191.097,69, contendo a indicação genérica de que os beneficiários desses pagamentos se tratam de fornecedores (“fornecedor geral"/“fornecedor existências'/"fornecedor leilão”), pessoal e beneficiários não identificados, contudo, não justificou ou identificou documentalmente, quer os respectivos beneficiários, quer quais as despesas concretas que essas saídas de dinheiro visariam pagar.

Anexa-se a este documento cópia do mapa que foi junto à resposta dada pelo sujeito passivo (ANEXO n.º 2).

Relativamente a estas saídas monetárias, num total de € 193.109,05, o sujeito passivo tinha apresentado justificação no ponto 10. da resposta à nossa notificação, do valor de € 85 353,47, que correspondem a seis saídas monetárias, para os quais identificou quais os fornecedores em questão e apresentou, para estes movimentos, cópias dos respectivos meios de pagamento (por cheques e transferências bancárias), e das correspondentes faturas.

Face ao exposto o sujeito passivo, justificando apenas o valor de € 85 353,47, não identificou concreta e individualmente quais os restantes beneficiários das saídas financeiras relevadas no documento interno n.º … e não justificou ou comprovou documentalmente o motivo, a natureza dessas saídas no montante de € 107 755,58 (= € 193 109,05 -€ 85 353,47).

F.3) Através da nota de lançamento interna nº … de 30/11/2011 foi efectuado o reconhecimento de vários registos a crédito da conta SNC 121- Depósitos às Ordem/B…, no valor de € 51.091,27, por débito da conta SNC 27881999- ODC em conferência, pelo montante de € 49 694,47 €. Este movimento, contempla, ainda, os registos a débito na conta SNC 111 - Caixa, no valor de € 346,50, da referida conta SNC 121, no valor de € 1.053,08 e da conta SNC 27881001 - Outros Devedores e Credores/Credores Diversos/Consignação, no valor de € 2.050,30, e a crédito da conta SNC 21111001-Clientes Gerais/Clientes Nacionais/CC, no valor de € 1.053,98.

Estes lançamentos correspondem ao movimento contabilístico n.º… de 30/11/2011, e que o sujeito passivo justifica como sendo o mesmo movimento/lançamento, pelo faco de ter existido um erro na numeração.

Notificado o sujeito passivo para justificar, individual e comprovadamente os motivos das regularizações efectuadas, bem como os beneficiários (Nome e NIF) efectivos das saídas dos meios monetários, vem responder que se tratam de “saídas da conta SNC 121 -B…, reconhecidas directamente do extracto bancário" e que “como à data deste processamento não foi possível identificar os destinatários, a opção foi lançar a respectiva contrapartida a débito da conta SNC 2781999 - ODC em Conferência, para posterior regularização”.

Junta ainda, em resposta um mapa a que lhe corresponde o anexo 21.2., com uma lista dos beneficiários dos pagamentos, com o nome e NIF, referindo que se tratam de: “fornecedor leilão"/”fornecedor geral".

Da referida listagem não se identificou quer nos extractos de contabilidade (SAFT- Contabilidade), quer no ficheiro SAFT - facturação, como sendo fornecedores os beneficiários de saídas financeiras, “E…”, "F…” e "G…”, pelos valores de € 2.050,30, € 1.000,00 e € 1.700,00, num total de € 4.750,30.

Assim, estas saídas, no valor de € 4.750,30, não foram justificadas documentalmente, assim como não foram identificadas quais as despesas concretas que essas saídas de dinheiro visariam pagar.

Pelo exposto nos pontos F.1), F.2) e F.3) verifica-se que estamos perante despesas efectuadas pelo sujeito passivo, mas que não se encontram documentadas, num total de € 120.255,88 ‹= € 7 750,00 + € 107 755,50 + € 4.750,30).

Nos termos do n.º 1 do art.º 88.º do CIRC, são sujeitas a tributação autónoma à taxa de 50% as despesas não documentadas.

Efetivamente, o sujeito passivo procedeu a pagamentos relativamente aos quais não identificou o respectivo beneficiário e não apresentou, mesmo após notificação para o efeito, respetiva justificação para a realização de cada uma dessas despesas.

As saídas de valores monetários, num total de € 120.255,88, traduz-se numa efetiva diminuição de meios financeiros do sujeito passivo, a favor de beneficiários que não foram identificados, ou para despesas que não foram justificadas e comprovadas, pelo que estamos perante despesas indocumentadas e sujeitas a tributação autónoma nos termos do n.º 1 do art. 88.º do CIRC.

Face ao exposto, resulta imposto em falta decorrente de tributação autónoma nos valores de € 60.127,94 (€ 120.255,88 x 50%), determinado nos termos do n.º 1 do referido artigo 88.º.   

G - IRC devido por tributação autónoma: despesas de representação

Na contabilidade do sujeito passivo consta o documento com o n° … registado na conta SNC 6251-Deslocações e estadas, pelo montante de € 420,00 a que corresponde a uma venda a dinheiro de 17/07/2011, emitida pela entidade “O casarão do castelo", referente a 12 refeições.

Em resposta à notificação pessoal efetuada em 13/03/2015 o contribuinte vem esclarecer que a referida venda a dinheiro deve ser qualificada como despesas de representação (ponto 16.), dado referir-se a um almoço com potenciais clientes internacionais.

Nos termos do n° 7 do artigo 88.° do CIRC as despesas de tributação estão sujeitas a uma taxa de tributação autónoma de 10%.

Face ao exposto, resulta imposto em falta decorrente de tributação autónoma nos valores de € 42,00 (=420,00 x 10%)., determinado nos termos do n.° 1 do referido artigo 88.°.

(...)

Capitulo IX - Direito de Audição - Fundamentação

De acordo com o preceituado nos art. 60.º da LGT e artº 60º do RCPITA, o sujeito passivo foi notificado, através do oficio n.º …/… de 11/06/2015, entregue pessoalmente em 11/06/2015, para no prazo de 15 dias, exercer o direito de audição sobre o Projeto de Relatório de Inspeção Tributária (PRIT).

Em 26/06/2015, o sujeito passivo apresentou nesta Direção de Finanças requerimento com o n.º … a solicitar que o prazo inicialmente concedido de 15 dias para o exercício do seu Direito de Audição sobre o PRIT fosse prorrogado para 25 dias, nos termos do n.º6 do art.º 60.º da Lei Geral Tributária (LGT).

No seguimento desse requerimento, o sujeito passivo foi notificado pessoalmente em 30/06/2015, do despacho datado de 29/06/2015 do Chefe da Divisão… da Área da Inspeção Tributária da Direção de Finanças do Porto, que recaiu sobre o pedido apresentado, o qual autorizou os 25 dias solicitados para o exercício de direito de audição, terminando assim o referido prazo no dia 06/07/2015.

O sujeito passivo exerceu tempestivamente, de forma escrita, o direito de audição, conforme petição que deu entrada na Direção de Finanças do Porto em 06/07/2015 ao qual foi atribuído o nº de entrada … .

Na referida petição o sujeito passivo aceita as correcções propostas no capitulo III do PRIT, pontos A.1, apenas no que se refere à correcção à matéria tributável de IRC, C.1. a C.6., E.1, G e F.3., no que respeita à correção proposta em tributação autónoma de IRC quanto às “G…" e apresenta o contraditório quanto às correções propostas nos pontos A.1., A.2., B, D, E.2, F.1., F.2. e F.3. subdividindo em oito pontos, o qual merece a seguinte apreciação:

(...)

PONTO A.2) IRC - matéria tributável e IVA em falta: rendimentos não reconhecidos na contabilidade e falta de liquidação de IVA

Neste ponto o sujeito passivo vem apresentar novos elementos, além dos que tinha apresentado no decurso dos atos inspectivos, em resposta à notificação pessoal efectuada em 13/03/2015, invoca, ainda, neste ponto que, quanto à forma de tributação em sede de IRC e IVA adotada pela inspeção, “os recebimentos efectuados pela A… apenas resultaria para si um valor correspondente a - de acordo com os cálculos da inspeção - 14% desse valor”.

Analisados os documentos agora apresentados (cheques frente e verso e depósitos bancários nas contas bancárias da A…) e identificação dos documentos de suporte (faturas emitidas), acolhemos a prova apresentada, com a exceção dos seguintes valores, cuja proposta de correcção iremos manter, pelos motivos que a seguir se expressam:

» € 6.860,20: que identifica como transferência bancária de H…, contudo informa que a fatura destes recebimentos se encontra por emitir;

» € 872,18: que identifica como recebimento de I… Lda e associa este recebimento à fatura F1/1521. Contudo, esta fatura foi emitida para "consumidor final', sem qualquer NIF, pelo que não é comprovadamente de associar ao referido recebimento;

» € 8.000,00 e € 10.000,00: são depósitos em numerário, de 27/04/2011 e 29/04/2011, que identifica como recebimentos de J… e que associa como correspondentes a parte da fatura n.º F1/1388, como “fornecimentos em conta corrente". Ora, não obstante esta fatura ter sido emitida a J…, na qual foi indicado o número fiscal “E...", consultado o Sistema Informático da AT, consta como número inválido (conforme ANEXO n.º 3) e dada a inexistência de outros elementos comprovativos da inequívoca associação agora efectuada pelo sujeito passivo deste recebimento em numerário de € 18.000,00 à fatura, designadamente as contas correntes de clientes, não será de acolher o invocado pelo sujeito passivo.

Quanto ao argumento de que se deveria considerar como rendimento sujeito a IRC e IVA apenas 14% do valor recebido, temos a referir que a percentagem de 14% foi indicada pela inspeção (parágrafo 2.º da página 4 do PRIT) na descrição da actividade declarada pelo sujeito passivo como correspondendo à margem média de comissão praticada, quando no âmbito da sua actividade como organizador de vendas em leilão. No caso em apreço cabia ao sujeito passivo a comprovação de possuir os requisitos necessários para a aplicação desse regime - Regime especial de organizador de vendas em leilão - o que, no caso em apreciação não está comprovado.

Face ao exposto será de acolher parcialmente o alegados pelo sujeito passivo neste ponto, mantendo-se a correcção de € 25.732,38 (= € 6.860,20 + € 872,18 + € 18.000,00), em sede de IRC e de IVA no valor de € 5.918,45, devido no 2.º trimestre de 2011.

PONTO B) IRC - matéria tributável: valor deduzido aos rendimentos declarados/perdas por imparidade

Quanto a este ponto o sujeito passivo vem argumentar que “pagou ao comitente/vendedor sem que tivesse recebido do comprador, o que originou a correspondente perda por incobrabilidade” e que o crédito que a empresa não recebeu é o que consta da fatura que emitiu ao comprador final de € 25.566,17.

Alega que não está em causa um crédito de cobrança duvidosa, mas antes um custo efetivo, ao abrigo do art. 41 .º do CIRC.

Sobre o alegado convém lembrar que o que está em causa é uma correção ao lucro tributável declarado, no valor de € 25 566,17 registado a débito da conta 7211 - Prestações de Serviços/Mercado Nacional, que se encontra a reduzir os ganhos da atividade, dado ter sido infringido o disposto no art. 20.º do CIRC.

Importa apenas acrescentar que o preceituado no art. 41.º do CIRC, com a redação vigente à data dos factos, exigia, para a aceitabilidade fiscal dos créditos incobráveis que:

" Os créditos incobráveis podem ser directamente considerados gastos ou perdas do período de tributação desde que:

a) Tal resulte de processo de insolvência e de recuperação de empresas e

b) Não tenha sido admitida perda por imparidade ou, sendo-o, esta se mostre insuficiente.

2 - Sem prejuízo da manutenção da obrigação para efeitos civis, a dedutibilidade dos créditos considerados incobráveis nos termos do número anterior ou ao abrigo do disposto no artigo 36.º fica ainda dependente da existência de prova da comunicação ao devedor do reconhecimento do gasto para efeitos fiscais, o qual deve reconhecer aquele montante como proveito para efeitos de apuramento do lucro tributável. (negrito e sublinhado nosso)

Assim, uma das condições para a aceitabilidade fiscal de qualquer crédito incobrável seria sempre a de que não tenha sido admitida perda por imparidade ou esta se mostre insuficiente, o que neste caso se demonstrou no PRIT não ser, desde logo, de admitir.

PONTO D) IRC - matéria tributável e IVA em falta: omissão de rendimentos e IVA não liquidado na venda de peças

Quanto a este ponto, o sujeito passivo vem argumentar que estão em causa peças que a requerente era proprietária e que colocou directamente em leilão juntamente com as demais peças pertencentes a comitentes. Refere que “independentemente de se apurar se o método de facturação a que a requerente se socorreu é, ou não o mais acertado", discorda da correcção proposta.

Refere que “é indiscutível - e aceite pela AT - que a requerente vendeu peças a clientes finais pelo valor global de adjudicação de 301.715,00 € e que as mesmas foram àqueles faturadas (pág. 11, 4.º parágrafo), cujos comprovativos foram entregues ao senhor inspector."

Adianta que "por se tratar de peças próprias não foram emitidas faturas a comitentes (conforme procedimento habitual), tendo-se entendido que deveria ser a A…, enquanto leiloeira, a facturar à A… enquanto revendedora (equivalente a comitente)" “aquele valor incrementou os ganhos da requerente sujeitos a /RC não se vislumbrando como se pode agora pretender que aquele valor seja novamente acrescido aos rendimentos da A… gerando duplicação de matéria colectável". (sublinhado nosso)

Remete para as respostas e documentos remetidos no e-mail de 23/01/2015 “onde de forma circunstanciada se identificam as peças importadas, o respectivo custo unitário, bem como os processos de importação", as quais ascendem a “170. 740,26 € e influenciam o questionado montante de 301.715,00 € , em 70.215,00 € (valor por que, durante 2011, foram vendidas as peças importadas).”

Argumenta que "no que respeita a compras efectuadas a particulares a A… nem sempre recorreu ao que designa por “declaração de venda e ao facto de "nunca terem sido solicitados tais documentos, ou sequer questionado a sua existência".

Adverte que “ a AT teve conhecimento da actividade simultânea de leiloeira e de revendedora da A…”, “ainda que não possuísse documentação das demais aquisições, tal não assume grande relevância fiscal” e que o Regime Especial não contempla apenas as vendas em leilão mas também a revenda de bens em segunda mão, de objectos de arte, de colecção ou antiguidades.

No que respeita ao IRC o sujeito passivo “entendeu que o tratamento contabilístico dos dois tipos de vendas seria similar” e que não relevou “contabilisticamente o custo de aquisição de bens" ou “tendo-o feito indevidamente".

Conclui que a correção proposta teria que se cingir a uma de duas hipóteses:

» na hipótese de venda de peças próprias em revenda, o lucro tributável teria que resultar da reconstituição do lucro da actividade da empresa por uma de duas vias:

“ 1- Diferença entre o preço de venda e o preço de aquisição efectivo para os casos em que existe prova documental”;

“ 2 - Quando não seja detetado documento que comprove aquele custo de aquisição, este corresponderia.... a 50% daquele valor " (remetendo para o n.º 4 do art. 4.º do Regime Especial e n.º 6 do art. 23.º do CIRC) ou

» na hipótese de considerar estar-se perante vendas em leilões, a “a AT assume que a sociedade apenas beneficiaria de um valor correspondente a comissão de venda de 14% sobre o valor das vendas, sendo somente este o valor que se admite pudesse integrar a matéria colectável da requerente".

Quanto ao argumentado neste ponto temos a referir o seguinte:

A contabilidade não revela o registo de inventários (mercadorias) de peças próprias ou de peças à consignação, além de que não revela qualquer registo das contas correntes individualizadas de clientes, comitentes, fornecedores ou outros transmitentes como estava obrigado, independentemente de ser de aplicar o art. 4.º (venda de peças por revendedor) ou o art. 9.º (organizador de vendas em leilão) do Regime Especial, para podermos aferir, comprovadamente e inequivocamente, a identificação, origem e proveniência das peças.

Não obstante, apesar de se detetar a existência na conta 31113 - Compras/mercadorias/Outros países, o valor de € 44.761,06, 31111 - Compras/mercadorias em mercado nacional, no valor de € 6.357,00 e na conta 435- Equipamento administrativo o montante de € 14 965,12, valor este que se refere a peças importadas erradamente contabilizadas como ativo fixo e erradamente depreciadas, o sujeito passivo não apurou na contabilidade, numa conta SNC 616 - Custo das Mercadorias vendidas e das Matérias Consumidas (CMVMC), qualquer custo com peças próprias vendidas, mantendo as contas de compras (31113 e 31111) com saldos finais em 31/12/2011. Por outro lado, não evidenciou qualquer inventário de mercadorias inicial e final, onde constasse, designadamente as peças adquiridas em anos anteriores a 2011, e as peças importadas/adquiridas em 2011, que teriam transitado em stock para anos seguintes a 2011.

No entanto, o sujeito passivo foi questionado, em notificação efetuada no decurso do procedimento inspetivo (ponto 26 da notificação), relativamente a importação de bens, cujos processos foram por si identificados no e-mail de 23/01/2015, para identificar, para cada um dos bens, qual a fatura de venda e o respectivo IVA liquidado. Em resposta apresentou uma listagem (que juntou em anexo 26.1.) em que associa as peças importadas às faturas em questão (n.ºs 433, 434, 435 e 436), apresentando um cálculo, em mapa excel, de uma margem bruta de € 1.085,90 (com IVA incluído), determinada a partir de:

- um valor de venda total de peças importadas de € 61.578,55, em que identifica como documento de venda as faturas n.ºs 433 a 436) e

- um valor de custo de € 60.492,65.

Ainda na resposta dada à notificação sobre este ponto afirmou que “em 2011 não foi efectuado o apuramento da margem resultante da venda das peças importadas, nem efectuada a respetiva liquidação de IVA, que a A… se encontra disponível para corrigir”.

Mais tarde, o sujeito passivo, através de e-mail de 05/06/2015, veio afirmar que as peças incluídas nas referidas faturas são peças próprias e que as mesmas originaram faturas de venda emitidas a clientes finais, nas quais calculou comissões e liquidou IVA. Juntou outra listagem em que associa as peças que constam nas mesmas faturas n.ºs 433 a 436 a diversas faturas de vendas a clientes finais, nas quais indica ter apurado comissões de venda e respetivo IVA liquidado.

Por outro lado, tendo sido especificamente notificado para apresentar as contas de terceiros, que a contabilidade não revela, que permitam o controlo previsto e exigível no art. 13.º do Regime Especial, o sujeito passivo, em resposta, apresentou uma listagem das faturas emitidas aos compradores e respectivos valores de venda, comissões e IVA e uma listagem das faturas emitidas aos comitentes, também com os valores de venda, respectivas comissões e IVA. Os valores constantes destas listagens correspondem ao total de comissões declaradas, portanto no âmbito do regime de organizador de vendas em leilão, previsto nos artigos 9.º a 13.º do Regime Especial (Decreto lei n.º 199/96 de 18 de Outubro).

Nesta listagem incluiu as faturas em questão, n.ºs 433 a 436, ou seja considerou-as como sujeitas ao regime de organizador de vendas em leilão, como faturas emitidas a comitentes, associando-as a faturas de venda a clientes finais (compradores). No entanto, esta associação, por si só, não comprova que as peças vendidas a estes clientes finais respeitem inequivocamente às peças “autofaturadas”. E isso não é assumido no parágrafo 4.º da página 11 do PRIT, ao contrário do que alega o sujeito passivo no direito de audição. Efetivamente o que ai foi dito é que:

“Em conclusão, verifica-se que não estão reunidas as condições para aplicação do Regime Especial de IVA nas vendas de peças efectuadas que constam nas facturas emitidas pelo sujeito passivo a si mesmo (faturas n.ºs 433 a 436), pelo que será de aplicar o Regime Geral do IVA nestas transmissões, aplicando-se as normas de incidência gerais do CIVA."

Assume-se assim, apenas que as peças “autofaturadas” foram efetivamente vendidas, mas sem a certeza de o terem sido mediante as faturas a clientes finais que o sujeito passivo identificou. Efetivamente no parágrafo da página 10 do PRIT conclui-se que :

"De acordo com os procedimentos adotados na sua actividade as faturas só são emitidas ao comitente após a emissão das faturas ao adquirente/cliente final, isto é quando a peça é vendida, pelo que se conclui que as peças que constam das referidas faturas (n.ºs 433 a 436) foram todas vendidas”.

Em conclusão o sujeito passivo enquadrou todas as suas operações no âmbito do regime em organizador de vendas em leilão e, perante as incongruências detectadas e descritas no PRIT e agora reiteradas, não reunimos condições para acolher a qualquer das hipóteses apontadas pelo sujeito passivo no direito de audição, para determinação do valor tributável em sede de IRC e IVA:

- como revendedor, acolhendo a margem a partir da diferença entre o preço venda e o preço de compra ou - como organizador de vendas em leilão, considerando apenas as comissões de venda correspondentes a 14%.

Ainda a referir, quanto ao argumentado sobre a aplicação do n.º 6 do art. 23.º do CIRC, cuja redacção entrou em vigor em 01/01/2013, invocando a desnecessidade de que os custos assumam a forma de fatura, quando o fornecedor não esteja obrigado à sua emissão, teria sempre o sujeito passivo de comprovar de outra forma, mesmo com declarações de venda emitidas por particulares, e as quais deveriam estar devidamente contabilizadas, a fim de ser possível acolher tal gasto fiscal.

Por outro lado e no que se refere ao IVA, é de referir o estipulado no n.º 2 do art. 6.º do Regime Especial que estabelece que “as transmissões sujeitas ao regime de tributação da margem devem ser escrituradas de modo a evidenciar os elementos que permitam concluir a verificação das condições previstas no artigo 3.º e dos elementos determinantes do valor tributável referidos no artigo 4.º", o que de forma alguma a contabilidade revela e demonstra.

Assim, face ao descrito, designadamente:

» pela inexistência de registos contabilísticos devidos e que permitam o adequado controlo do regime da margem, seja no âmbito da actividade de revendedor, seja no âmbito da actividade de organizador de vendas em leilão;

›› pelo enquadramento dado pelo sujeito passivo a toda a atividade como organizador de vendas em leilão, que resulta quer da contabilidade exibida, quer pelas séries de faturação emitidas e adotadas e ainda pelo próprio enquadramento dado pelo sujeito passivo, como se transcreve: “a A… presta um serviço na organização de vendas em leilão e emite as correspondentes facturas conforme o art. 12.º do Decreto - lei n.º 199/96 de 18/10 (conforme resposta ao ponto 3. da notificação efectuada no decurso da inspeção);

» da resposta ao quesito 27 da notificação pessoal efectuada em 13/03/2015, no quadro apresentado em anexo 27.2, o sujeito passivo identificou todas as faturas emitidas aos comitentes relativas às peças vendidas em 2011, nas quais incluiu as referidas faturas n.ºs 433, 434, 435 e 436, ou seja quis enquadrá-las como organizador de vendas em leilão, com o objetivo de as vir a associar a faturas de venda a clientes finais;

›› relativamente às peças vendidas, que o sujeito passivo elencou nas referidas faturas n.ºs 433 a 436, não identificou, portanto, como devia e como era obrigado nos termos dos artigos 9.” a 13.º do Regime Especial (Decreto lei n.º 199/96 de 18 de Outubro) os respectivos comitentes, não se podendo concluir estar subjacente qualquer contrato de comissão de venda (cfr. prevê n.º 1 do art. 9.º e al. e) do art. 2.º do referido Regime Especial);

» mesmo admitindo a eventual aplicação do regime da margem enquanto revendedor, o sujeito passivo teria sempre de comprovar a origem e proveniência das peças em causa para a comprovação das condições previstas no n.º 1 do art. 3.º, sendo que no caso de peças importadas tal pressupõe uma opção pelo regime especial da margem, nos termos dos n.º 3 a 6 do referido art. 3.º;

verifica-se que não estão reunidas as condições para aplicação do Regime Especial de IVA (revendedor/organizador de vendas em leilão) nas peças que constam nas facturas emitidas pelo sujeito passivo a si mesmo (faturas n.ºs 433 a 436), pelo que será de aplicar o Regime Geral do IVA nestas operações (vendas e/ou prestações de serviços), aplicando-se as normas de incidência gerais do CIVA e, em sede de IRC, não comprovando e demonstrando a origem e proveniência das mesmas, designadamente quanto aos respetivos comitentes ou eventuais fornecedores/transmitentes, não registando quaisquer inventários de mercadorias próprias e à consignação, será de considerar como ganho sujeito a IRC a totalidade do preço final, indicado nas referidas faturas, de € 301.715,00, valor este que corresponderá, no mínimo, a prestações de serviços relacionadas com a venda das peças.

(...)

PONTO F.1) IRC devido por tributação autónoma: despesas não documentadas

O sujeito passivo vem alegar que tinha fornecido informação incorreta, identificando agora o pagamento a K…, não enquanto comitente, "mas como fornecedor de peça para revenda, de que não existe fatura, por o vendedor não ter essa obrigação".

Quanto ao alegado é de lembrar que na resposta à notificação pessoal efectuada para esclarecimento e justificação do movimento em causa, o sujeito passivo apenas juntou cópia da respetiva nota de lançamento (nota interna) e de um cheque emitido à ordem de K…, esclarecendo que se tratava de um pagamento a um comitente. Contudo, não apresentou ou identificou a respetiva fatura emitida ao comitente, vindo agora identificá-lo, não como comitente mas como fornecedor de peça para revenda, sem juntar qualquer documento comprovativo inequívoco que demonstre o alegado. Face ao exposto apenas se pode concluir que se trata de despesa não documentada pois o sujeito passivo não comprova documentalmente a natureza do pagamento titulado pelo cheque, no valor de € 7 750,00.

PONTO F.2) IRC devido por tributação autónoma: despesas não documentadas

O sujeito passivo vem trazer novos elementos em sede de direito de audição, apresentando um mapa em excel onde elenca os movimentos que totaliza € 105.744,52 e apresenta cópias de alguns documentos de suporte contabilísticos, como faturas e recibos. Analisados estes elementos, temos a referir que:

» o valor em causa (€ 107.755,58) foi reconhecido na contabilidade apenas tendo como base de suporte a nota de lançamento nº…, em crédito da conta SNC 121- Deposito à Ordem/B…, por débito da conta SNC 27881001- Outros Devedores e Credores/Consignação;

›› na resposta à notificação pessoal de 13/03/2015 (ponto 12. da notificação) o sujeito passivo apenas referiu que "aquando da reconciliação dos saldos de depósitos a ordem foi feito um lançamento provisório, a crédito da conta SNC 121 -B…, agregando diversos movimentos que não estavam identificados, para retificação posterior, o que nunca chegou a ser concretizado, lapso que só agora foi identificado” e apresentou um mapa titulado por “Listagem de Meios de Pagamento" (que juntou como anexo 12.3.), num total de € 191.097,69, contendo a indicação genérica de que os beneficiários desses pagamentos se tratam de fornecedores (“fornecedor geral" “fornecedor existências”/"fornecedor leilão”), pessoal e beneficiários não identificados, contudo, não justificou ou identificou documentalmente, quer os respectivos beneficiários, quer quais as despesas concretas que essas saídas de dinheiro visariam pagar;

» desse valor foi justificado o montante de € 85 353,47, conforme se expôs na página 14 do PRIT;

›› quanto ao valor restante (€ 107.755,58), agora em sede de direito de audição, o sujeito passivo não identifica os beneficiários dos cheques que emitiu ou dos beneficiários de “pagamento de serviços", nem apresenta cópias dos referidos cheques que permitisse comprovar quais os efectivos beneficiários e se estes correspondem aos elencados no mapa em excel, grande parte destes sem qualquer NIF;

» para justificação de parte destes cheques/pagamentos de serviços, o sujeito passivo apenas associa faturas e recibos, no entanto, como é óbvio, e face à inexistência de contas correntes individualizadas onde esses movimentos (financeiros e económicos) fossem contabilizados, não é de acolher os argumentos agora apresentados;

» no entanto, dado que relativamente a alguns valores pagos por transferência bancária se identifica o beneficiário no respectivo extracto bancário da conta titulada pela A… e tendo, agora em sede de direito de audição, o sujeito passivo identificado a fatura correspondente, será de acolher parcialmente os seguintes montantes, no total de € 9.261,30 (= € 228,02 + € 5.000,00 + € 4.000,00 + € 33,28):

» € 228,02: transferência bancária a favor de L… em que identifica a fatura n.º F2/425;

» € 5.000,00: transferência bancária a favor de M… em que identifica a fatura n.º F2/458;

›› € 4.000,00: transferência bancária a favor de N…, em que identifica a fatura n.º F2/452 emitida para o cônjuge O… (que consta no cadastro fiscal da AT como tal) e

›› € 33,28: transferência bancária a favor P…, em que identifica a fatura registada contabilisticamente com o n.º … de 30/04/2011.

Face ao exposto, continua por justificar o valor de € 98.494,28 (= € 107 755,58 - € 9.261,30), que o sujeito passivo não identifica concreta e individualmente quais os beneficiários dessas saídas financeiras, relevadas no documento interno n.º…, e não justifica ou comprova, inequívoca e documentalmente, qual o motivo e a natureza dessas saídas.

(...)

Conclusão da apreciação do direito de audição

Analisados os elementos e argumentos apresentados, no âmbito do direito de audição, conclui-se, em conformidade com o explanado atrás, atender ao sujeito passivo nos seguintes termos:

Reformulação do Ponto F - IRC devido por tributação autónoma: despesas não documentadas

Valor proposto no PRIT: € 60.169,94 (= € 120.339,88 x 50%)

Valor a acolher em sede de direito de audição: € 5.655,80 (= € 11.311,60 x 50%), sendo que € 11.311,60 =€ 9.261,30 (ponto F.2.) + € 2.050,30 (ponto F.3.)

Valor proposto no Relatório de Inspeção Tributária (RIT): € 54.514,14 (= € 60.169,94 - € 5.655,80)

Reformulação do Ponto A.2. - IRC - matéria tributável e IVA em falta: rendimentos não reconhecidos na contabilidade e falta de liquidação de IVA

Acréscimo à matéria tributável de IRC:

Valor proposto no PRIT: € 46 188,03

Valor a acolher em sede de direito de audição: € 20.455,65 (ponto A.2.)

Valor proposto no RIT: € 25.732,38 (= € 46 188,03 - € 20.455,65)

Correção ao IVA em falta (2.º trimestre de 2011):

Valor proposto no PRIT: € 10.623,25 (= € 46 188,03 x 23%)

Valor a acolher em sede de direito de audição: € 4.704,80 [= 20.455,65 x 23% (ponto A.2.)]

Valor proposto no RIT: € 5.918,45, (= € 10.623,25 - € 4.704,80)

Face ao exposto, propõe-se a manutenção das restantes correções constantes do PRIT, 0 que resulta nos montantes finais de:

 

  1. A Requerente regista em sistema informático as entradas das peças e a sua submissão a leilão (depoimento da testemunha Q…);
  2.  A partir do momento em que é realizada a venda em leilão é emitida a factura (da série 01), o risco do negócio corre exclusivamente pela Requerente, que assume perante o comitente o pagamento da peça transaccionada;
  3. A Requerente recorreu a “autofacturação" relativamente a venda em leilão de peças próprias, que adquiriu em segunda mão na sua maioria a particulares ou por importação (documentos n.ºs 16 e 17, juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);
  4. No que respeita às aquisições efectuadas a particulares, a Requerente elaborava documentos designa como «declarações de venda», embora não o tenha feito em relação a todas as aquisições, sendo declarações desse tipo as que constam do documento n.º 18 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, no valor global de € 85.820,62;
  5. Os bens a que se referem as declarações de venda que constam do documento n.º 18 foram vendidos em leilões pelo valor global de € 111.095,00;
  6. Na sequência da acção inspectiva, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a liquidação de IRC n.º 2015…, datada de 24-08-2015, com valor a pagar de € 170.116,68, em que se inclui o montante de € 18.834,37 relativo a juros compensatórios (documento n.º 9 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
  7. Em 01-03-2016, a Requerente apresentou reclamação graciosa da liquidação de IRC referida, que consta do processo administrativo, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais o seguinte:

111°

Considera a AT existirem despesas não documentadas pela reclamante no valor de 98.494,28 €.

112°

Diga-se que nunca haviam sido solicitados directamente em sede de inspecção documentos justificativos das pretensas despesas indocumentadas cujo valor, aquando da notificação para exercício de direito de audição prévia, se pretendia ascender a 107.755,58 €.

113º

Devendo esclarecer-se que a não consideração como despesa não documentada do valor de 85.353,47 € (cf. pag. 14, parágrafo 5° do relatório), resultou de documentação apresentada pela requerente, não com esse fim, mas apenas para dar resposta ao expressamente solicitado no quesito 10° do ofício da AT de 13-03-2015.

114º

Entretanto, em sede de audição prévia veio a requerente apresentar mapa das despesas referentes ao aludido valor de 105.744,52 €, como consta do relatório de inspecção.

115º

Sucede que, por lapso administrativo, não se juntaram todos os documentos a que se fazia alusão naquele quadro.

116º

Pelo que, requerendo-se relevação daquele lapso, juntam-se, em anexo, os documentos que dão resposta ao pretendido e permitirão a esses serviços proceder à correcção efectuada neste âmbito, bem como da respectiva liquidação (doc. 2).

117º

O que deverá ser feito nesta sede uma vez que a inspecção tributária, ao invés de solicitar a sua entrega, considerado apenas os “valores pagos por transferência bancária onde se identifica o beneficiário no respectivo extracto bancário da conta titulada pela A… e tendo, agora em sede de direito de audição, o sujeito passivo identificado a factura correspondente”.

118º

Reduzindo, então aquele valor de 105.744,52 € para apenas 98.494,28 €.

119º

 O que não se pode aceitar.

120º

É que, como resulta do mapa supra e documentos que o sustentam, a reclamante demonstra de forma inequívoca o destino das despesas efectuadas e que, por isso, à semelhança das demais já aceites pela inspecção, não podem ser consideradas como despesas não documentadas.

 

  • Relativamente à reclamação graciosa foi elaborado um parecer datado de 26-10-2016, que consta do processo administrativo, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais, o seguinte:

PARECER

 

Em 01/03/2016, vem o reclamante supra identificado, deduzir reclamação graciosa, ao abrigo dos art.s 68º e ss. do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), da liquidação de IRC/2011.

Compulsados os elementos junto aos Autos, verifica-se que nos termos dos arts.º 9º, 68º e 70º do CPPT, a reclamação apresentada é o meio próprio, é tempestiva e o reclamante tem legitimidade para o acto.

Verifica-se também, na presente data, a inexistência de Impugnação Judicial, após consulta ao Sistema de Contencioso Judicial Tributário.

 

Do alegado pelo reclamante

 

Dos fundamentos constantes da petição inicial, que se dão aqui como integralmente reproduzido, no essencial, alega o reclamante, com referência ao relatório de inspecção (RIT):

• Ponto A.2

- Relativamente à transferência de € 6.860,20, assume erro na falta de emissão de fatura, mas o valor divide-se em € 6.000,00 de adjudicação, € 720,00 de comissão e € 165,60 de IVA;

- Quanto ao recebimento de € 872,18, o mesmo diz respeito à fatura F1/1521, considerando existir uma dupla tributação;

- Aos recebimentos de € 8.000,00 e € 10.000,00 corresponde a fatura F1/1388. Na referida fatura foi indicado no campo do NIF o n.º de cartão de residente em Espanha.

• Ponto B - Está em causa a consideração de créditos, incobráveis ou de cobrança duvidosa (porque não ocorreu o seu recebimento) e não de ganhos de actividade;

- Parte do valor (€ 19.101,17) foi reclamado em processo de declaração de insolvência que o respectivo cliente foi objecto;

- Em 31/12/2011 estavam reunidos todos os requisitos exigidos pelo art.º 41º do CIRC (reacção da Lei 55-A/2010 de 31/12) para o reconhecimento do crédito incobrável respeitante às faturas emitidas a C…;

• Ponto D

- Considera o relatório de inspecção ter havido, por parte da reclamante omissão de rendimentos relativamente à venda de peças próprias, ou seja, revenda;

- A reclamante recorreu à designada “autofacturação” para destacar a venda em leilão de peças próprias, não tendo sido emitidas faturas a comitentes, tendo-se entendido que deveria ser a requerente, enquanto leiloeira, a facturar a si própria enquanto revendedora (equivalente a comitente);

- A correcção efectuada pela AT, tem por base uma simples dúvida, de acordo com o 1º parágrafo da página 24 do RIT;

- Independentemente das boas práticas contabilísticas que devem ser adoptadas pelos contribuintes, em matéria de IRC prevalece o princípio da substância económica, ou da realidade económica, sobre a forma;

- A reclamante adquiriu vários bens em segunda mão, quer por importação, quer por aquisição a particulares, sendo que no caso destes últimos, por não serem sujeitos passivos não estão sujeitos ao cumprimento de obrigações contabilísticas declarativas, pelo que não há lugar à emissão de fatura pelas peças vendidas à reclamante. A exigência de documentos comprovativos em sede de IVA não deve ser necessariamente igual à do IRC (cfr art.º 23º n.º 6 do CIRC), sendo por isso admissível a aceitação de custo sem que exista fatura;

- O “Regime Especial de Tributação” assume de forma expressa a possibilidade de inexistência de qualquer suporte documental na aquisição, conforme art.º 4º n.º 4;

- Apresenta os cálculos que serviram de base ao apuramento da margem de lucro global, no que diz respeito às peças importadas;

- Relativamente às aquisições efectuadas a particulares, apresenta também os mesmos cálculos, juntando declarações de venda, comprovativas da aquisição por parte da reclamante;

- De onde resulta que do total de vendas efectuadas e reflectidas nas faturas nº 433, 434, 435 e 436, a reclamante não consegue determinar o custo de aquisição de bens vendidos pelo valor de € 120.405,00, devendo nesse caso ser aplicado o n.º 4 do art.º 4º do Regime Especial, ou seja, o preço de compra corresponderia a 50% do preço de venda;

- O afastamento da aplicação daquele regime apenas resultaria de opção expressa da própria reclamante (n.º1 artº 7º do diploma), ou tácita, se tivesse deduzido o IVA pago nas importações efetuadas (n.º 2 do mesmo preceito),o que não aconteceu;

- A inspeção tributária muniu-se de elementos que lhe permitiram determinar o valor médio da comissão obtida pela reclamante nas vendas de correntes de leilões (14% do preço de adjudicação do bem), resultando numa comissão de € 42.420,00 relativamente às vendas reflectidas nas faturas n.º433, 434, 435 e 436. A avaliação dos rendimentos ou valores sujeitos a tributação tem de se basear em critérios objectivos, como impõe o art.º 84º n.º 1 da LGT.

• Ponto F.1 – F.3

- Considera a AT que os pagamentos titulados por cheque nos montantes de € 7.750,00 e €1.000,00 constituem despesas não documentadas, quando na realidade respeitam ao pagamento de aquisições de bens em segunda mão efectuados pela reclamante, devendo por isso merecer o tratamento fiscal descrito no ponto D.

• Ponto F.2

- Considera a AT existirem despesas não documentadas pela reclamante no valor de € 98.494,28;

- O valor inicialmente considerado era de € 107.755,58, sendo que em sede de audição prévia apresentou mapa das referidas despesas, apesar de não ter junto todos os documentos a que se fazia alusão no referido quadro. Apresenta em anexo os documentos que dão resposta ao pretendido, demonstrando de forma inequívoca o destino das despesas efectuadas e que, por isso, à semelhança das demais já aceites pela inspecção, não podem ser consideradas como despesas não documentadas.

• Juros Indemnizatórios

- Reclama do pagamento de juros indemnizatórios nos termos do art.º 43º da LGT

 

Da acção de Inspecção

 

O reclamante foi sujeito a uma acção inspectiva, em cumprimento da Ordem de Serviço n.º OI2013… de 14/08/2013, da qual resultaram correcções em sede de IRC, do exercício de 2011, cfr Relatório da Inspecção Tributária.

De acordo com os Serviços de Inspecção Tributária verificaram-se as seguintes situações:

• IRC – Matéria Tributável

- Existência de rendimentos não reconhecidos na contabilidade;

- Valor deduzido aos rendimentos declarados / perdas por imparidade;

- Gastos não aceites fiscalmente;

- Omissão de rendimentos

• IRC – Tributação Autónoma

- Despesas não documentadas

 

Da apreciação do pedido

 

A análise do alegado será feita, tal como na petição inicial, de acordo com a estrutura do relatório de inspecção (RIT):

• Ponto A.2

- Quanto à transferência de € 6.860,20 de H…, apesar da referência à discriminação entre valor de adjudicação, comissão e IVA, continua a verificar-se a falta de emissão da fatura correspondente, ou seja, não é comprovadamente justificada a origem da transferência, mantendo-se por isso válidos os fundamentos para a correção efetuada por parte dos serviços de inspeção tributária;

- Relativamente ao recebimento de € 872,18 por parte da sociedade I… Lda e respectiva associação à fatura F1/1521, de referir que, de acordo com o RIT (página 19) a referida fatura foi emitida para “consumidor final” (baseados no anexo 27.1 apresentado pelo reclamante no exercício do direito de audição prévia), sem qualquer NIF. No entanto o reclamante junta como documento 1 cópia da fatura-recibo A/01521 (e respetivo cheque de pagamento), constando na fatura o nome e identificação fiscal da referida sociedade. Desta forma, será de considerar como rendimento apenas o valor da comissão, no montante de € 91,20 e não o valor total do recebimento.

- Sobre os recebimentos de € 8.000,00 e € 10.000,00 não foi acrescentado nada de novo

relativamente ao exposto no direito de audição ao RIT, mantendo-se válidos os fundamentos apontados pelos serviços de inspeção tributária para a correção efetuada.

• Ponto B

- Conforme referido no RIT (página 6), está em causa o reconhecimento a débito da conta 7211 –Prestações de Serviços / Mercado Nacional, em 31/12/2011, do montante de € 25.566,17;

- Apesar de referir que em 31/12/2011 estavam reunidos todos os requisitos exigidos pelo art.º 41º do CIRC (reacção da Lei 55-A/2010 de 31/12) para o reconhecimento do crédito incobrável respeitante às faturas emitidas a C…, não apresenta qualquer comprovativo da existência de processo de insolvência da referida sociedade;

- Desta forma não foi comprovado o alegado, concordando-se com a correcção efectuada.

• Ponto D

- O agora alegado não difere do constante no direito de audição exercido no âmbito do processo de inspecção tributária;

- A inspeção Tributária detetou que, relativamente à venda de peças próprias, só relevou contabilisticamente as comissões do comitente no valor de €30.139,46 e IVA liquidado sobre a comissão de € 6.932,07, e que mesmo o reconhecimento desses valores foi efetuado de forma a que, quer em termos contabilísticos, quer em termos fiscais tivesse um efeito inócuo;

- Desta forma, a contabilidade não evidenciou o apuramento do ganho com a venda de peças próprias, levando a que se concorde com a correcção efectuada pelos serviços da inspecção tributária, não sendo por isso de aceitar o alegado pelo reclamante.

• Ponto F.1 – F.3

- O alegado relativamente às duas situações em causa não difere do referido no direito de audição exercido no âmbito do processo de inspecção, não sendo apresentado qualquer documento comprovativo. Desta forma concorda-se com a correcção efectuada.

• Ponto F.2

- Apesar de referir que junta em anexo documentos comprovativos das despesas consideradas como documentadas (documento 2), para além das declarações de venda, constam apenas cópias de cheques emitidos ao portador, não sendo por isso de justificar o valor de € 98.494,28.

- Nesse sentido será de manter a correcção efectuada.

• Juros Indemnizatórios

- Nos termos do art.º 43º da LGT, são devidos juros indemnizatórios quando se determine que houve erro imputável aos serviços;

- Da análise do presente processo de reclamação graciosa, a única alteração aceite diz respeito ao Ponto A.2, sendo que a correcção efectuada pelos serviços da inspecção tributária ocorreu em resultado da documentação enviada pelo próprio reclamante (anexo 27.1 apresentado no exercício do direito de audição prévia);

- Desta forma, não existe erro imputável aos serviços, e como tal não há lugar ao pagamento de juros indemnizatórios.

Conclui-se pelo deferimento parcial do pedido, propondo-se a elaboração de um DC para correcção (a favor do reclamante) da matéria colectável do IRC do ano de 2011 em € 780,98 (€ 872,18 - €91,20).

 

  1. A Requerente efectuou o pagamento da liquidação de IRC n.º 2015 … (documento n.º 9 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido e afirmação da Requerente no artigo 9.º do pedido de pronúncia arbitral, que não é contestada pela Autoridade Tributária e Aduaneira);
  2. Em 29-03-2017, a Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral que deu origem ao presente processo.

 

 

2.2. Factos não provados

 

2.2.1. Não se provou que relativamente aos depósitos nos valores de 8.000,00 € e 10.000,00 referidos no ponto A.2 do Relatório da Inspecção Tributária corresponda a factura F1/1388, emitida em nome de J…, que apresenta como número fiscal um número inválido.

A factura referida tem o valor de € 23.005,84, pelo que do seu valor não resulta qualquer indício de que os pagamentos se refiram a esta factura.

Por outro lado, a numeração da factura F1/1388 é muito anterior às que foram emitidas nas datas dos pagamentos, como se vê pelo Anexo A.2, junto pela Requerente no exercício do direito de audição (documento “OI2013…_Part9.pdf” do processo administrativo):

 

 

Para além disso, a Requerente alega que se tratava de «fornecimentos em conta corrente», mas não apresentou qualquer conta corrente relativa ao referido cliente de que constem os pagamentos referidos.

Mais, a testemunha R… disse que foi um cliente que «apareceu a comprar» e facturaram, não fazendo referência a quaisquer pagamentos em numerário ocorridos em datas diferentes nem a qualquer conta corrente.

Neste contexto, não se pode considerar provado que os dois depósitos em numerário efectuados em 27-04-2011 e 29-04-2011 estejam relacionados com a factura n.º F1/1388.

O problema, em sede de IRC, não está em ter sido indicado como número fiscal um número inválido, ou em não ser aceite a factura, mas sim em não se poder considerar provado que os pagamentos referidos se reportem à factura indicada pela Requerente.

 

 

 

 

2.3. Fundamentação da fixação da matéria de facto

 

Os factos provados baseiam-se nos documentos juntos pela Requerente com o pedido de pronúncia arbitral e no processo administrativo, bem como na prova testemunhal.

            As testemunhas aparentaram depor com conhecimento directo dos factos sobre que se pronunciaram.

 

 

            3. Matéria de direito

           

            Está em causa, essencialmente, a prova da contabilização de transacções correspondentes a quantias recebidas pela Requerente.

Nesta apreciação, há que ter presente, em geral, que, como entendeu o Supremo Tribunal Administrativo, no acórdão de 05-07-2012, proferido no processo n.º 658/11, relativo ao regime vigente antes da reforma do CIRC de 2014, «em sede de IRC, o documento comprovativo e justificativo dos custos para efeitos do disposto nos arts. 23º, nº1, e 42º, nº 1, alínea g), do CIRC, não tem de assumir as formalidades essenciais exigidas para as facturas em sede de IVA, uma vez que a exigência de prova documental não se confunde nem se esgota na exigência de factura, bastando tão-só um documento escrito, em princípio externo e com menção das características fundamentais da operação, uma vez que ao contrário do que se passa com o IVA, em sede de IRC, a justificação do custo consubstancia uma formalidade probatória e, por isso, substituível por qualquer outro género de prova».

 

3.1. Questão do ponto A.2 do Relatório da Inspecção Tributária

 

            A posição assumida pela Autoridade Tributária e Aduaneira no projecto de Relatório da Inspecção Tributária, foi alterada após o exercício do direito de audição, sendo efectuada uma correcção por «rendimentos não reconhecidos na contabilidade» no montante de € 25.732,38, relativo a três situações:

– a quantia de € 6.860,20 que a Requerente identificou como sendo de uma transferência bancária de H…, relativamente à qual a Requerente reconhece não ter emitido factura;

– a quantia de € 872,18 que a Requerente identificou como respeitante recebimento de I… Lda e associa este recebimento à fatura F1/1521, que não tem NIF;

– a quantia de € 18.000,00 de depósitos em numerário, nos valores de € 8.000,00 e € 10.000,00 efectuados em 27-04-2011 e 29-04-2011, que a Requerente identificou como tendo sido efectuados por J…, sendo parte do montante da factura n.º F1/1388, no valor de € 23.005,84; a Autoridade Tributária e Aduaneira não aceitou esta factura por não o número fiscal indicado (número fiscal “E…") ser inválido; a Requerente diz que é o número de residente em Espanha do adquirente.

 

            No pedido de pronúncia arbitral, a Requerente nada diz quanto à quantia de € 872,18, limitando-se a impugnar o decidido pela Autoridade Tributária e Aduaneira quanto às quantias de € 8.0000,00 e € 10.000,00 (artigos 27.º a 36.º do pedido de pronúncia arbitral).

            Quanto ao valor de € 6.860,20 consta do Anexo A2.15 ao exercício do direito de audição que os objectos vendidos «foram faturados ao comitente pelas F2/446 e F2/462», o que não é contestado pela Autoridade Tributária e Aduaneira. Sendo assim, toda aquela quantia deve acrescer aos proveitos e não apenas a parte relativa a comissão, já que a facturação ao comitente pelas F2/446 e F2/462 é «negativa», representando valores que foram considerados como gastos.

            Por outro lado, se é certo que se tivesse sido emitida factura relativamente ao valor pago por H… deveria ter sido liquidado IVA, também o é que, não tendo havido facturação, a quantia paga entrou na totalidade na esfera patrimonial da Requerente, pelo que, para efeito de IRC, deve ser considerada proveito.

            Pelo referido Anexo 2.15, vê-se que o valor a facturar deveria ser de € 6.885,60 e não de € 6.860,20, como a Autoridade Tributária e Aduaneira considerou, mas, tendo sido este último o valor da correcção efectuada e que serviu de suporte a liquidação impugnada, é este que tem de ser considerado.

No que concerne ao caso dos pagamentos de € 8.000,00 e € 10.000,00, no ponto 2.2.1. não se considerou demonstrado que respeitem à factura n.º F1/1388.

É sobre a Requerente, que alega que os pagamentos se reportam a esta factura, que recai o ónus da prova, a face da regra do artigo 74.º, n.º 1, da LGT, que estabelece que «o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque».

Por isso, a dúvida quanto à contabilização destes pagamentos tem de ser valorada processualmente contra a Requerente.

A Requerente defende que, nestas condições, deveria ser desconsiderada a factura com consequente diminuição da matéria tributável.

Mas, o que se conclui, à face da prova produzida e da regra do ónus da prova, é que as quantias referidas foram recebidas e não foi emitida factura, pelo que deve acrescer à matéria tributável a quantia de € 18.000,00, cumulativamente com o valor da transacção a que se refere a factura n.º F1/1388, pois esta refere-se a uma transacção no valor de € 23.005,84.

Assim, quanto às correcções a que se refere o ponto A.2 do Relatório da Inspecção Tributária, conclui-se o seguinte:

– mantém-se a correcção quanto à quantia de € 6.860,20, relativamente à qual a Requerente reconhece não ter emitido factura e à quanto quantia de € 872,18, relativamente à qual a Requerente nada refere;

– improcede o pedido de pronúncia arbitral no que concerne às quantias de € 8.000,000 e € 10.000,00.

 

3.2. Questão do valor deduzido aos rendimentos declarados/perdas por imparidade

 

No ponto B. do Relatório da Inspecção Tributária, a Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma correcção ao lucro tributável no valor de valor de € 25.566,17, com o seguinte fundamento:

 

Na resposta prestada à notificação efetuada, o sujeito passivo vem, no respetivo ponto 6, afirmar que esse valor respeita a uma regularização relacionada com o reconhecimento de um crédito incobrável, relativo a C…, NIF…, para o qual foi proferida sentença de declaração de insolvência, no qual foi confirmado um crédito reclamado de € 19.101,17. Afirma, ainda, que 0 referido registo está errado pelo que deve ser estornado pretendendo, no entanto, que seja reconhecida uma divida incobrável, no montante de € 18.651,61, que deveria ter sido registada na conta 683 – Dívidas incobráveis.

Analisada a resposta prestada pelo sujeito passivo e os respetivos elementos que anexou, constata-se que o valor de € 25.566,17, respeita a faturas emitidas com um preço adjudicado (preço a martelo) de € 24.530,00, a que acresceu comissões de € 2.871,60 e IVA de € 660,47, num total de € 28.062,07. Deste valor o sujeito passivo, informa que recebeu € 2.495,90 e retomou peças, a que atribuiu um valor de € 6.465,00, considerando, por diferença um crédito incobrável de € 19.101,17.

Ora, não obstante o ganho relativo à sua atividade corresponda apenas à comissão de € 2.871,60, o sujeito passivo pretende considerar como crédito incobrável o valor total de venda das peças, mais a comissão, com o argumento de que tal valor não foi recebido na totalidade.

De acordo com o estipulado no art. 35.º do CIRC, com a redação vigente em 2011, "podem ser deduzidas para efeitos fiscais as perdas por imparidade contabilizadas no mesmo período de tributação ou em períodos de tributação anteriores:

a) As relacionadas com créditos resultantes da actividade normal que, no fim do período de tributação, possam ser considerados de cobrança duvidosa e sejam evidenciados como tal na contabilidade".

Como foi referido, o valor em causa não foi evidenciado como tal na contabilidade, sequer pelo montante da comissão faturada, no valor de € 2.871,60, valor este que corresponderia ao ganho/rendimento decorrente da atividade normal do sujeito passivo, considerando-se que esta apenas abrange operações envolvendo transações correntes, ou seja operações de natureza comercial relacionadas com a prestação de serviços.

Por outro lado o sujeito passivo também não contabilizou no período de tributação de 2011 ou, em períodos de tributação anteriores, a pretendida perda por imparidade, pelo que, não seria de aceitar esse pretendido reconhecimento uma vez que não se encontram cumpridos os requisitos necessários para que se possam deduzir para efeitos fiscais, nos termos do art. 35.º do CIRC.

 

A Requerente defende, em suma, que

– a partir do momento em que é realizada a venda em leilão e emitida a factura (da série 01), o risco do negócio corre exclusivamente pelo leiloador - no caso, a Requerente - que assume perante o comitente o pagamento da peça transaccionada;

– o que está em casa é a consideração de créditos, incobráveis ou de cobrança duvidosa (porque não ocorreu o seu recebimento) e não de ganhos de actividade;

– tendo as facturas em causa sido emitidas em 2011, nunca poderia ter sido relevada qualquer imparidade em crédito, nos termos do então vigente art. 36° do CIRC, nos exercícios anteriores, nem sequer no de 2011, por os créditos não terem ainda mora superior a seis meses, como exigia o n.º 2 daquele preceito legal;

– em 31-12-2011 estavam, pelo contrário, reunidos todos os requisitos exigidos pelo art. 41° do CIRC, na redacção da Lei 55-A2010, de 31 de Dezembro:

– os créditos em causa foram considerados incobráveis por sentença de 19-10-2011;

– não tinha sido admitida perda por imparidade, por esta não ser, à data, ainda possível.

 

 É manifesto que há erros da Autoridade Tributária e Aduaneira nesta correcção.

Por um lado, no caso de vendas de bens de terceiros efectuadas em leilão, a Requerente é responsável pelo pagamento ao vendedor do preço de venda, deduzida a comissão cobrada pela Requerente. Por isso, a falta de cobrança do preço de venda ao comprador, repercute-se na sua totalidade na esfera patrimonial da Requerente, pois está obrigada a pagar ao vendedor a parte do preço a que tem direito.

            Por outro lado, não se trata de uma situação enquadrável no artigo 35.º do CIRC, mas sim no artigo 41.º, que, na redacção vigente em 2011 (Redacção da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro), estabelece o seguinte:

 

            1 - Os créditos incobráveis podem ser directamente considerados gastos ou perdas do período de tributação desde que

     a) Tal resulte de processo de insolvência e de recuperação de empresas, de processo de execução, de procedimento extrajudicial de conciliação para viabilização de empresas em situação de insolvência ou em situação económica difícil mediado pelo IAPMEI - Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e ao Investimento, de decisão de tribunal arbitral no âmbito de litígios emergentes da prestação de serviços públicos essenciais ou de créditos que se encontrem prescritos de acordo com o respectivo regime jurídico da prestação de serviços públicos essenciais e, neste caso, o seu valor não ultrapasse o montante de (euro) 750; e

     b) Não tenha sido admitida perda por imparidade ou, sendo-o, esta se mostre insuficiente.

 

Por isso, há erro da Autoridade Tributária e Aduaneira ao fundamentar a correcção na falta dos requisitos previstos no artigo 35.º do CIRC para a relevância fiscal das perdas por imparidade, pois o regime aplicável é o do artigo 41.º e deste resulta que, na medida em que o crédito foi considerado incobrável em processo de insolvência, ele podia ser «directamente» considerado gasto do período de tributação, não sendo necessário o prévio reconhecimento como perda por imparidade.

            Assim, a correcção referida enferma de vício de erro sobre os pressupostos de facto e erro sobre os pressupostos de direito.

 

3.3. Questão da omissão de rendimentos referida no ponto D. do Relatório da Inspecção Tributária

 

A Requerente emitiu as facturas n.ºs 433 a 436 para si própria (autofacturação), relativas a vendas no valor total de € 301.715,00.

A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu, em suma, que «o sujeito passivo não procedeu ao registo do respectivo ganho no valor de € 301.715,00, pois, não tendo comprovado a origem e proveniência das mesmas, designadamente quanto aos respetivos comitentes ou eventuais fornecedores, não é de acolher como ganho sujeito a IRC, somente a eventual comissão faturada ao cliente final».

Isto é, a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que «não tendo comprovado a origem e proveniência» das peças vendidas, todo o valor da venda deve ser considerado como rendimento, para efeito do artigo 20.º, n.º 1, do CIRC.

A Requerente defende que apenas em relação a bens no valor de € 120.405,00 não foram identificadas as aquisições e que, quanto a este valor, apenas deve ser considerado o valor de 50% (60.202,50 €) de acordo com o disposto no artigo 4.°, n.° 4 do Regime Especial de Tributação dos Bens em Segunda Mão, Objectos de Arte, de Colecção e Antiguidades, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 199/96, de 18 de Outubro, que estabelece que «quando não for possível determinar exactamente o preço de compra de objectos de arte, considerar-se-á como tributável um valor igual a 50% da contraprestação, determinada nos termos do n.º 1».

Assim, a Requerente defende que «teve como margem tributável respeitante à referida venda de 301.715,00 €, o valor de 74.247,92 € para efeitos de IRC» (artigo 119.º do pedido de pronúncia arbitral, com a correcção do valor de 74.195,38 para 74.247,92 €, que foi requerida na reunião pelo Sujeito Passivo).

A Requerente imputa também à Autoridade Tributária e Aduaneira violação do artigo 58.º da LGT, por não ter realizado todos as diligências necessários para a descoberta da verdade quanto à aquisição destes bens revendidos.

A prova produzida confirma que a Requerente, para além de vender em leilão peças de clientes, adquiriu também peças e vendeu também em leilão sendo a estas últimas que se referem as facturas referidas.

Nos documentos n.ºs 16 e 17 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, a Requerente identifica a origem e valores de aquisição de muitas das peças referidas naquelas facturas.

De qualquer forma, é manifesto que não se pode considerar que, no caso de falta de documentos comprovativos do custo de aquisição de bens revendidos todo o valor da venda seja considerado proveito ou ganho, pois haverá naturalmente um custo de aquisição ou um valor patrimonial já adquirido na esfera jurídica do vendedor que não pode ser considerado rendimento do período de tributação.

Nesta linha, já decidiu o Supremo Tribunal Administrativo relativamente à determinação do valor tributável de IVA, mas a jurisprudência é aplicável por maioria de razão em sede de IRC, em face da referida menor exigência relativa a facturas:

1 – O valor tributável relativo a transmissões de bens em segunda mão feitas por sujeitos passivos do IVA que os tenham adquirido para revenda, deverá aproximar-se, tanto quanto possível, do valor resultante da diferença entre a contraprestação obtida ou a obter do cliente e o preço de compra dos mesmos bens.

2 – O princípio constitucional da proporcionalidade impede que os poderes conferidos à Administração Fiscal para suprir deficiências de escrita dos contribuintes de que resultem efeitos negativos para a Fazenda Pública sejam utilizados para permitir a cobrança de impostos em quantidades superiores às que presumivelmente resultariam da aplicação das normas de incidência e determinação da matéria colectável.

3 – Para determinação da diferente entre o preço de venda e o preço de compra de bens em segunda mão, à face do preceituado nos arts. 16.º, n.º 1, alínea f), do C.I.V.A. e 1.º, n.º 2, do DL n.º 504-G/85, de 31 de Dezembro, não é imprescindível que sejam exibidos à Administração Fiscal, quando efectua exame à escrita, documentos comprovativos do valor das aquisições, designadamente, facturas ou documentos equivalentes.

4 – A expressão «devidamente justificada», relativa à diferença dos valores de aquisição e de revenda, utilizada naquelas normas, é compatível com a utilização de qualquer meio de prova para a sua determinação.

 

 

Assim, é possível a aceitação fiscal de gastos sem que exista factura, designadamente nos casos de bens adquiridos peara revenda.

Por isso, a Autoridade Tributária e Aduaneira, se entendia que os documentos que foram apresentados não comprovavam adequadamente a origem e proveniência dos bens vendidos, deveria ter procurado apurar qual o valor de aquisição, nos termos do artigo 58.º da LGT (que a Requerente invoca), ou utilizar outros métodos para determinar a «diferença dos valores de aquisição e revenda» a que se refere a alínea f) do n.º 1 do artigo 16.º do CIVA, inclusivamente o método previsto no n.º 4 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 199/96, de 18 de Outubro, que estabelece que «quando não for possível determinar exactamente o preço de compra de objectos de arte, considerar-se-á como tributável um valor igual a 50% da contraprestação, determinada nos termos do n.º 1».

Por isso, a correcção efectuada enferma de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, designadamente sobre as normas referidas, para além de vício procedimental por não ter realizado, nos termos do artigo 58.º da LGT, todas as diligências necessários à descoberta da verdade material.

Consequentemente, procede o pedido de pronúncia arbitral quanto ao valor de € 227.467,08 que é impugnado quanto à impugnada correcção de € 301.715,00 (correspondente a 301.715,00 - 74.247,92, sendo este último o valor indicado no artigo 119.º do pedido de pronúncia arbitral com a correcção efectuada na reunião).

 

3.4. Questão do IRC devido por tributação autónoma: despesas não documentadas

 

No projecto de Relatório da Inspecção Tributária a Autoridade Tributária e Aduaneira considerava deverem ser aplicadas tributações autónomas no valor global de € 60.169,94, sendo € 60.127,94 correspondendo a despesas não documentadas no valor total de € 120.255,88 (taxa de 50%) e € 42,00 correspondendo a despesas de representação de € 420,00 (taxa de 10%).

O valor de € 120.255,88 foi determinado com base nas despesas referidas nos pontos F.1) (€ 7 750,00), F.2) (€ 107 755,50) e F.3) (€ 4.750,30).

Depois do exercício do direito de audição, a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que passaram a considerar-se documentadas despesas referidas no ponto F.2) nos valores de € 9.261,30 (= € 228,02 + € 5.000,00 + € 4.000,00 + € 33,28), continuando por justificar o valor de € 98.494,28, e no ponto F.3) no valor de € 2.050,30, continuando por justificar despesas no montante de € 2.700,00.

Isto é, as despesas não documentadas referidas no Relatório da Inspecção Tributária são no valor total de € 108.944.28 (7.750,00 + 98.494,28 + 2.700,00), a que corresponde a tributação autónoma de € 54.472,14.

A estas tributações autónomas relativas a despesas não documentadas acresce a de € 42,00 relativa a despesas de representação, pelo que o montante total das tributações autónomas é de € 54.514,14.

No presente processo, a Requerente nada diz quanto à tributação autónoma relativa a despesas de representação.

 

3.4.1. Despesas não documentadas referidas no ponto F.1.

 

A Requerente apenas diz que a Autoridade Tributária e Aduaneira considera que o pagamento titulado por cheques em nome de K…, no montante de 7.750,00 €, constituem despesas não documentadas e que as despesas se reportam a pagamento de aquisições de bens em segunda mão que efectuou, como explicou no exercício do direito de audição.

A Autoridade Tributária e Aduaneira, ao apreciar o exercício do direito de audição disse o seguinte, com fundamento para manter esta tributação autónoma:

O sujeito passivo vem alegar que tinha fornecido informação incorreta, identificando agora o pagamento a K…, não enquanto comitente, "mas como fornecedor de peça para revenda, de que não existe fatura, por o vendedor não ter essa obrigação".

Quanto ao alegado é de lembrar que na resposta à notificação pessoal efectuada para esclarecimento e justificação do movimento em causa, o sujeito passivo apenas juntou cópia da respetiva nota de lançamento (nota interna) e de um cheque emitido à ordem de K…, esclarecendo que se tratava de um pagamento a um comitente. Contudo, não apresentou ou identificou a respetiva fatura emitida ao comitente, vindo agora identificá-lo, não como comitente mas como fornecedor de peça para revenda, sem juntar qualquer documento comprovativo inequívoco que demonstre o alegado. Face ao exposto apenas se pode concluir que se trata de despesa não documentada pois o sujeito passivo não comprova documentalmente a natureza do pagamento titulado pelo cheque, no valor de € 7 750,00.

 

No pedido de pronúncia arbitral, a Requerente nada diz que contrarie esta conclusão da Autoridade Tributária e Aduaneira.

Consideram-se «não documentadas» as «despesas relativamente às quais não existe prova documental, embora não haja ocultação da sua natureza, origem ou finalidade» (acórdão do Pleno do Supremo Tribunal Administrativo de 28-01-2009, proferido no processo n.º 0575/08).

No contexto descrito, não sendo apresentada qualquer factura ou outro documento que confirme a que se refere a despesa de € 7.750,00, não pode deixar de considerar-se não documentada, o que justifica a tributação autónoma.

Improcede, assim, o pedido de pronúncia arbitral, quanto a esta correcção.

 

3.4.2. Despesas não documentadas referidas no ponto F.2.

 

No que concerne às despesas não documentadas referidas no ponto F.2. do Relatório da Inspecção Tributária, a Requerente não apresentou documentos no exercício do direito de audição, embora tivesse referido que os juntava, dizendo a Requerente que a não apresentação se deve a lapso.

Mas, na reclamação graciosa apresentou cópias de cheques e declarações de venda efectuadas por clientes seus.

Na decisão da reclamação graciosa, a Autoridade Tributária e Aduaneira nem sequer procede à análise das declarações de venda apresentadas, limitando-se a dizer, genericamente, que a Requerente «apesar de referir que junta em anexo documentos comprovativos das despesas consideradas como documentadas (documento 2), para além das declarações de venda, constam apenas cópias de cheques emitidos ao portador, não sendo por isso de justificar o valor de € 98.494,28».

Afigura-se que as declarações de venda, emitidas por terceiros, cuja correspondência à realidade não foi colocada em causa, são documentos comprovativos de terem sido efectuadas as despesas referidas, pelo que, nos casos em que existem tais declarações não se justifica a tributação autónoma.

No entanto, a soma dos valores indicados nas declarações de venda que se reportam ao ano de 2011 é apenas de € 82.880,00. ( [1] )

Assim, procede parcialmente o pedido de pronúncia arbitral, sendo ilegal a tributação autónoma relativamente ao montante de € 41.440,00 (50% de € 82.880,00).

 

 

 

3.4.3. Despesas não documentadas referidas no ponto F.3.

 

Depois do exercício do direito de audição foram consideradas não documentadas as despesas em que são indicados como beneficiários "F…” e "G…”, pelos valores de € 1.000,00 e € 1.700,00.

A Autoridade Tributária e Aduaneira refere no Projecto de Relatório da Inspecção Tributária que estas saídas não foram justificadas documentalmente, assim como não foram identificadas quais as despesas concretas que essas saídas de dinheiro visariam pagar.

No Relatório da Inspecção Tributária, depois do exercício do direito de audição, a Autoridade Tributária e Aduaneira refere o seguinte:

 

Relativamente ao cheque questionado de € 1.000,00 para "F…”, o sujeito passivo vem, em sede de direito de audição, argumentar que “está em causa a aquisição de peças para revenda de que não existe fatura, por a revendedora não ter essa obrigação”. Como não apresenta qualquer documento comprovativo do agora alegado será de manter a proposta do PRIT, quanto a este valor.

 

No presente processo, nada é dito pela Requerente que contrarie esta afirmação.

Não havendo qualquer documento que permita confirmar a que se reporta esta despesa, inclusivamente emitido pela Requerente no âmbito da série 02 de facturas, justifica-se que se considere que esta despesa de € 1.000,00 não está documentada.

Quanto à despesa de € 1.700,00, nada é alegado no procedente processo, pelo que também quanto a esta é de manter a correcção efectuada.

Improcede, assim, o pedido de pronúncia arbitral, na parte respectiva.

 

 

3.5. Juros compensatórios

 

Os juros compensatórios liquidados têm como pressuposto a liquidação de imposto (artigo 35.º, n.º 8, da LGT), pelo que os vícios de que enferma a liquidação de IRC se repercutem na liquidação de juros compensatórios, que, por isso, é ilegal na parte correspondente à parte daquela liquidação que é anulada.

Na liquidação n.º 2015 … foram calculados juros compensatórios de € 18.834,37 sobre o valor total de € 153.376,03 [valores de € 93.729,49 de IRC, de € 5.132,40 de derrama municipal (5.336,35 – 203,95 da liquidação anterior) e € 54.514,14 de tributações autónomas). 

Sendo procedente o pedido de pronúncia arbitral quanto à matéria tributável de € 253,033,25, a que corresponde o IRC de € 63.258,31 (taxa de 25%) e a derrama municipal de € 3.542,46 (taxa de 1,4%, como se infere da liquidação) e quanto às tributações autónomas no valor de € 41.440,00, conclui-se que os juros compensatórios correspondentes a este valor são de € 13.296,96, pelo que é nesta parte que a liquidação é ilegal.

 

 

3.6. Decisão da reclamação graciosa

 

A decisão da reclamação graciosa, que manteve a liquidação nas partes que na presente decisão arbitral se consideram ilegais, enferma dos mesmos vícios, pelo que se justifica a sua anulação na parte respectiva.

 

 

 4. Restituição do indevidamente pago e juros indemnizatórios

 

A Requerente pede a restituição do imposto indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios.

De harmonia com o disposto na alínea b) do artigo 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a Administração Tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito», o que está em sintonia com o preceituado no artigo 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT] que estabelece, que «a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto ou situação objecto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão».

Embora o artigo 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão «declaração de ilegalidade» para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que, em processo de impugnação judicial, são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira directriz, que «o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária».

O processo de impugnação judicial, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de actos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do artigo 43.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» e do artigo 61.º, n.º 4 do CPPT (na redacção dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, a que corresponde o n.º 2 na redacção inicial), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».

Assim, o n.º 5 do artigo 24.º do RJAT, ao dizer que «é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário», deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.

Sendo os juros indemnizatórios calculados com base no montante a restituir, insere-se no âmbito das competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD apreciar os pedidos de restituição de quantias que sejam consequência da anulação de actos de liquidação.

Cumpre, assim, apreciar os pedidos de restituição do imposto indevidamente pago e de juros indemnizatórios.

O regime substantivo do direito a juros indemnizatórios é regulado no artigo 43.º da LGT, que estabelece, no que aqui interessa, o seguinte:

 

Artigo 43.º

 Pagamento indevido da prestação tributária

 

1 – São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

2 – Considera-se também haver erro imputável aos serviços nos casos em que, apesar da liquidação ser efectuada com base na declaração do contribuinte, este ter seguido, no seu preenchimento, as orientações genéricas da administração tributária, devidamente publicadas.

 

Os erros da liquidação de IRC que se referiram são imputáveis à Autoridade Tributária e Aduaneira, que a efectuou por sua iniciativa.

Consequentemente, a Requerente tem direito à restituição da quantia de imposto correspondente às correcções que se consideraram ilegais que são, como se referiu no ponto 3.5, de € 63.258,31 de IRC, € de 3.542,46 de derrama municipal, de 41.440,00 de tributações autónomas e € 13.296,96 de juros compensatórios (total de 121.497,73).

Sobre esta quantia de € 121.497,73 são devidos juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º, n.º 1, da LGT e 61.º do CPPT desde a data do pagamento até ao reembolso.

 Os juros indemnizatórios são devidos à taxa legal supletiva, nos termos dos artigos 43.º, n.ºs 1, e 35.º, n.º 10 da LGT, do artigo 24.º, n.º 1, do RJAT, do artigo 61.º, n.ºs 3 e 4, do CPPT, do artigo 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril (ou outra ou outras que alterem a taxa legal), desde a data do pagamento até ao integral reembolso.

 

5. Decisão

 

Nestes termos, acordam neste Tribunal Arbitral em:

 

 

  1. Julgar parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral;
  2. Anular a liquidação de IRC n.º 2015…, bem como a liquidação de juros compensatórios nela incluída, na parte correspondente às seguintes correcções ao lucro tributável, no montante total de € 253.033,25:

– correcção no valor de valor de € 25.566,17 relativa a crédito incobrável, referida no ponto 3.2 deste acórdão;

– correcção no valor de € 227.467,08 referida no ponto 3.3. deste acórdão;

  1. Anular a liquidação referida na parte relativa a tributações autónomas, no valor de € 41.440,00, nos termos do ponto 3.4.2. deste acórdão;
  2. Condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a restituir à Requerente o montante de IRC e juros compensatórios correspondente às correcções referidas, bem como o montante de € 41.440,00 relativo a tributações autónomas, acrescido de juros indemnizatórios desde da data do pagamento até ao reembolso.

 

 

5. Valor do processo

 

 

De harmonia com o disposto no art. 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 267.742,55.

 

 

 

6. Custas

 

Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 4.896,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

6.1. Repartição do encargo das custas

 

Como se referiu o pedido de pronúncia arbitral procede, quanto à liquidação de IRC (incluindo derrama municipal e tributações autónomas), quanto ao valor total de € 121.497,73.

Sendo de € 267.742,55 o valor da causa, conclui-se que o pedido procede na percentagem de 45,38%.

Assim, cabe à Autoridade Tributária e Aduaneira a responsabilidade de 45,38% pelos encargos do processo cabendo a percentagem restante, de 54,62%, à Requerente.

 

 

Lisboa, 02-01-2018

 

Os Árbitros

 

 

(Jorge Lopes de Sousa)

 

 

 

(Ricardo Rodrigues Pereira)

 

 

 

(Jaime Carvalho Esteves)

Processo n.º 168/2017-T

 

1. A Requerente vem pedir a reforma da decisão arbitral por não conter decisão sobre a absolvição da instância quanto aos pedidos de declaração de ilegalidade das liquidações de IVA, o que entende constituir nulidade por omissão de pronúncia.

A nulidade por omissão de pronúncia não é fundamento de reforma da decisão como se infere dos artigos 613.º e 616.º do CPC, subsidiariamente aplicáveis, nos termos da alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT.

No entanto, da decisão sobre as consequências da opção da Requerente pelo não prosseguimento do processo em relação às liquidações de IVA não tinha de ser incluída na decisão arbitral final, pois objecto do processo ficou restringido às liquidações de IRC.

Porém, em relação às liquidações de IVA justifica-se uma decisão autónoma, que agora se profere.

 

   2. Foram efectuadas correcções em sede de IVA e IRC, com consequentes liquidações, que foram administrativamente impugnadas através de duas reclamações graciosas, uma relativa a IVA e outra a IRC.

No pedido de pronúncia arbitral, o Sujeito Passivo, A…, LDA., pediu a declaração de ilegalidade parcial dessas liquidações.

Por despacho de 13-09-2017 decidiu-se que a cumulação de pedidos não era admissível, à face do preceituado no artigo 3.º, n.º 1, do RJAT, pelo que foi julgada procedente a excepção de cumulação ilegal de pedidos invocada pela Autoridade Tributária e Aduaneira e ordenada a notificação do Sujeito Passivo, nos termos dos n.ºs 3 e 4 do artigo 4.º do CPTA, para indicar que pedidos de declaração de ilegalidade de liquidações pretendia que sejam apreciados no presente processo, sob a cominação de, não o fazendo, haver absolvição da instância em relação a todos os pedidos, sem prejuízo de, quanto aos pedidos em relação aos quais for decidida a absolvição da instância, poder ser apresentada nova ou novas petições no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado da decisão que vier a ser proferida, considerando-se estas apresentadas na data de entrada da primeira, para efeitos de tempestividade da sua apresentação.

Na sequência da notificação, o Sujeito Passivo A…, LDA. veio requerer o prosseguimento dos autos para apreciação do pedido relativamente ao IRC. 

Assim, nos termos daquelas normas, absolve-se da instância a Administração Tributária e Aduaneira, quanto aos pedidos relativos às liquidações de IVA impugnadas.

 

            Lisboa, 04-01-2018

 

Os Árbitros

           

Jorge Lopes de Sousa

 

 

 

(Ricardo Rodrigues Pereira)

 

 

 

(Jaime Carvalho Esteves)

 



[1] No documento n.º 2 junto com a reclamação graciosa são incluídas declarações de venda relativas ao ano de 2010, emitidas por R… e S…, o mesmo sucedendo com as incluídas no documento n.º 18 junto com o pedido de pronúncia arbitral, em que se inclui uma declaração de venda emitida por R… .