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Decisão Arbitral
I – RELATÓRIO
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A… CF[1] … e B…, CF…, ambos residentes em …– … …-…, Estados Unidos da América, apresentaram um pedido de pronúncia arbitral, ao abrigo do disposto na alínea a) do nº1 do artigo 2º,do nº 1 do artigo 3º e da alínea a) do nº 1 do artigo 10º, todos do RJAT[2], sendo requerida a ATA[3], com vista à apreciação da legalidade dos atos tributários de liquidações adicionais do ano de 2012, conforme liquidações nºs 2016… de IRS[4], 2016…, de juros compensatórios 2016… de demonstração e acerto de contas; do ano de 2013, conforme liquidações nºs 2016… de IRS, 2016… de Demonstração e acerto de contas, 2016…, de IRS e 2017… de juros compensatórios e, 2017… de Demonstração e acerto de contas; do ano de 2014, conforme liquidações 2016… de IRS, 2016… de Demonstração e acerto de contas, 2016…, de IRS,2017… de juros compensatórios e 2017… de Demonstração e acerto de contas, no valor global de € 19 198,21 visando a declaração da sua ilegalidade com a consequente anulação.
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O pedido foi feito sem exercer a opção de designação de árbitro, vindo a ser aceite pelo Exmo Senhor Presidente do CAAD[5] em 20/04/2017 e notificado à ATA na mesma data.
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Nos termos e para efeitos do disposto no nº2 do artigo 6º do RJAT, por decisão do Exmo Senhor Presidente do Conselho Deontológico, devidamente comunicado às partes, nos prazos legalmente aplicáveis, foi, em 12/06/2017, designado árbitro do tribunal Arlindo José Francisco, que comunicou a aceitação do encargo, no prazo legalmente estipulado.
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O tribunal foi constituído em 03/07/2017 de harmonia com as disposições contidas na alínea c) do nº 1 do artigo 11º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228º da Lei nº 66-B/2012, de 31 de Dezembro.
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Com o seu pedido, visam os requerentes, a anulação dos atos de tributação de IRS e juros compensatórios, já indicados e devidamente identificados no ponto 6 da petição que aqui se dá por integralmente reproduzido, para todos os efeitos legais, no valor global de € 19 198.21.
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Suportam o seu ponto de vista, em síntese, no entendimento de que a ATA, através do relatório da inspeção que suporta os atos tributários em crise, que está insuficientemente fundamentado, não logra cumprir o ónus da prova da verificação dos indícios da tributação que o nº1 do artigo 74º da LGT[6] lhe impõe, face à presunção legal da veracidade das declarações dos contribuintes, conforme artigo 75º da LGT.
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Isto é, a ATA não conseguiu provar os indícios fundados que levem a que os rendimentos em questão são rendimentos da categoria F e não categoria B, conforme declaração dos requerentes, sem fundamentarem esta requalificação.
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Consideram também haver violação da lei por erro quanto aos pressupostos de facto e de direito quando consideram os rendimentos recebidos enquadráveis na categoria F e não na categoria B, na verdade, os rendimentos em causa resultam da atividade de exploração turística, exercida pelos requerentes e devem ser tributados no âmbito da alínea a) do nº 1 do artigo 3º do CIRS[7] e não noutra categoria, nomeadamente na categoria F, como pretende a ATA.
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Os serviços de inspeção da ATA, fizeram a requalificação dos rendimentos em causa ao abrigo da circular administrativa 5/2013 de 2 de Julho e, sendo certo, que a ATA está adstrita ao cumprimento destas orientações administrativas, também é verdade que não têm caráter normativo direto para os contribuintes ou para os tribunais, pelo que se lhes afigura ilegítimo e ilegal que a ATA pretenda tributar pela categoria F, com base na referida circular, os rendimentos auferidos pelos requerentes no âmbito da alínea a) do nº1 do artigo 3º do CIRS e declarados na categoria B.
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Concluindo que a falta de fundamentação do relatório da inspeção tributária e a tributação, baseada na errada interpretação circulatória, só poderá conduzir à anulação dos atos tributários postos em crise.
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Na resposta, a requerida, e também em síntese, entende que o relatório da inspeção está devidamente fundamentado e permite a qualquer destinatário normal compreender o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do ato e, tanto assim é, que no caso concreto, os requerentes não só compreenderam o quadro fático e legal em que se baseou a decisão, dado que a contestaram ponto por ponto, concluindo que os atos de liquidação em crise não sofrem do vício de falta de fundamentação.
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E tanto assim é, que os requerentes não se socorreram do mecanismo previsto no artigo 37º do CPPT[8], por falta de fundamentação legalmente exigida, pelo que é forçoso concluir que os atos tributários em causa não sofriam, nem sofrem, do vício invocado ou se eventualmente sofriam o mesmo ficou sanado pelo não uso deste mecanismo.
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Quanto à alegada violação dos pressupostos, também considera que a mesma não se verifica e confronta o artigo 3º do CIRS, nº 1 alínea a) com o artigo com o artigo 8º do mesmo diploma com vista a justificar o preconizado no relatório da inspeção.
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Considera que para os rendimentos em causa, serem considerados empresariais e serem tributados pela categoria B, a lei exige o exercício de qualquer atividade empresarial o que no caso dos requerentes não se verifica.
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Os requerentes são apenas proprietários do imóvel e nada mais, dado que, desde logo, cederam o direito à sua exploração à sociedade gestora, não assumindo eles qualquer função responsável pela exploração do alojamento, pelo que os rendimentos auferidos só podem ser enquadrados na categoria F, concluindo pela manutenção os atos tributários em causa, uma vez que falecem integralmente as razões e argumentos expendidos pelos requerentes.
II - SANEAMENTO
O tribunal foi regularmente constituído, as partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas e encontram-se regularmente representadas de harmonia com os artigos 4º e 10º, nº2 do RJAT e artigo 1º da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de Março.
Junta a resposta da requerida, o tribunal proferiu, em 23/09/2017, o seguinte despacho: “Na resposta é suscitada a dispensa da produção da prova testemunhal oferecida pela requerente, por considerar que as questões a dirimir são apenas de direito, deste modo notifique-se a requerente para em 10 dias, querendo, se pronunciar sobre” este entendimento.
No mesmo prazo deverão as partes, querendo, pronunciarem-se sobre o entendimento do tribunal quanto à desnecessidade da reunião a que alude o artigo 18º do RJAT e ainda da produção de alegações orais ou escritas.”
Em 10/10/2017 vieram os requerentes informar o tribunal de que não prescindiam da prova testemunhal, proferindo o tribunal, em 13 do mesmo mês, o seguinte despacho:” Vistos os autos, nomeadamente o requerimento, junto em 10 do corrente, pelo autor, o tribunal designa o dia 30 deste mês de outubro pelas 10,30horas, para a realização da reunião a que alude o artigo 18º do RJAT e da inquirição das testemunhas oferecidas, devendo o requerente providenciar a sua presença na data e hora aprazada”.
Em 17/10/2017 o tribunal proferiu novo despacho:” Dada a impossibilidade logística do CAAD, as diligências marcadas no meu despacho de 13 do corrente, são remarcadas para o dia 15 de Novembro próximo, pelas 10,30 Horas”.
Na mesma data veio a requerida informar da impossibilidade absoluta de poder estar presente na diligência e em 18/10/2017, foram os requerentes a solicitar novo agendamento para a diligência, vindo a 19/10/2017, sugerir o dia 21 de Novembro de 2017.
Por despacho de 27/10/2017 foi reagendada a diligência para o dia 21/11/2017, que teve lugar nesse dia, pelas 10,30 horas.
O tribunal deu cumprimento ao nº 1 do artigo 18º do RJAT e a senhora mandatária dos requerentes solicitou que fosse autorizada a junção de documentos, o que foi concedido, após a audição da requerida que não se opôs.
Aprova testemunhal apresentada era apenas dos requerentes, sendo duas as testemunhas a ouvir, tendo o tribunal previamente questionado quais os artigos da petição de que se pretendia a prova testemunhal, tendo, a senhora mandatária, informado que eram os artigos 9º a29º, 31º,62º,68º, 112º,113º,115º e 118º.
Chamada a 1ª testemunha que se identificou e prestou juramento, o tribunal deu a palavra à senhora mandatária dos requerentes para que procedesse diretamente à inquirição, terminado o depoimento o tribunal deu a palavra às representantes da requerida para inquirirem diretamente a testemunha tendo estas prescindido de o fazerem.
Igual procedimento foi seguido em relação à segunda testemunha e também as representantes da requerida se declararam esclarecidas sem a inquirirem.
Terminada a inquirição que foi gravada o tribunal, concedeu o prazo de 10 dias para alegações escritas com trato sucessivo e deu cumprimento ao nº 2 do artigo 18º fixando o dia 03/01/2018 para a prolação da decisão
Deste modo, não enfermando o processo de nulidades, cumpre decidir.
III- FUNDAMENTAÇÃO
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– As questões a dirimir, com interesse para os autos, são as seguintes:
Os requerentes pretendem que sejam anulados os atos tributários de liquidação já identificados, com base na sua ilegalidade, sustentada nos seguintes fundamentos:
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Vício de falta de fundamentação do relatório da inspeção tributária que suporta os atos tributários em causa;
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Vício de violação da lei, por erro quanto aos pressupostos de facto e de direito, na parte em que os rendimentos auferidos são enquadrados na categoria F pela ATA, quando o deviam ser na categoria B;
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Subsidiariamente, caso se considere que os rendimentos deverão ser tributados pela categoria F, lhe sejam consideradas a totalidade das despesas no cálculo do respetivo rendimento, situação não verificada na produção dos atos tributários de liquidação em causa.
2 - Matéria de Facto
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Os atos tributários de liquidação de IRS, Demonstração de Acerto de contas e juros compensatórios estão devidamente identificados nos documentos I a V juntos pelos requerentes.
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Em 28 de Agosto de 2007 os requerentes celebraram um contrato de compra e venda com a sociedade C…,NIPC[9]…, tendo por objeto o imóvel designado por “Apartamento…”, inscrito na matriz predial urbana da atual União de freguesias de … e … sob o artigo …, letra B, sito no …–… …, no empreendimento “ …”, com a qual assinaram também um contrato de cessão de exploração turística da unidade já identificada, reservando-se esta o direito de nomear uma entidade gestora, que veio mais tarde a concretizar-se com a constituição da sociedade D…, SA NIPC …, doravante D… .
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Em 8 de fevereiro de 2008 foi depositado na então DGT[10] o título constitutivo dos “…” e em 7 de julho do mesmo ano a CMA[11], atribuiu a respetiva licença de utilização, sem qualquer intervenção dos proprietários aqui requerentes.
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A requerente mulher esteve registada entre 31 de janeiro de 2012 e 2 de janeiro de 2014 pela atividade de exploração de apartamentos turísticos sem restaurante CAE[12] 55123, enquadrada no regime normal de periodicidade trimestral em IVA[13] e no regime de contabilidade organizada, por opção, em sede IRS.
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Entre 30 de junho de 2008 e 31 de janeiro 2012 e ainda desde 2 de janeiro de 2014, o requerente marido esteve registado pela atividade de exploração de apartamentos turísticos sem restaurante CAE 55123, enquadrada no regime normal de periodicidade trimestral em IVA e no regime simplificado de tributação, em sede IRS.
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De acordo com o contrato de cessão de exploração já referido foi estabelecido que a exploração turística seria assegurada pela entidade gestora D…, a quem os proprietários requerentes ficaram obrigados a remunerar pelos serviços prestados.
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Os requerentes reconheceram e aceitaram que, durante toda a vigência do contrato, não explorariam, arrendariam ou por qualquer outro modo disponibilizariam a unidade a terceiro a troco de pagamento, renda, remuneração ou quaisquer outros meios de pagamento (inclusivamente de caráter gratuito), mais reconhecendo e aceitando não divulgar nem permitir que outra pessoa singular ou coletiva divulgue a unidade como estando, entre outras, disponível para ocupação.
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No âmbito do referido contrato à entidade gestora D… cumpre administrar o Programa de Exploração Turística, prestar os serviços de administração da propriedade, de manutenção e de limpeza e arrumação da unidade, tudo como melhor consta das seções, 3,4, 5 e 6, respetivamente.
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A entidade gestora D… ficou ainda obrigada a gerir os aspetos operacionais inerentes à exploração do apartamento turístico identificado, nomeadamente cobrança dos pagamentos devidos, cobrança de despesas, gestão de reservas e determinação de tarifas, bem como a administração geral da unidade, incluindo a contabilidade, vendas, marketing, custos das agências de viagens, comissões dos operadores turísticos e respetivas despesas incorridas, despesas com serviços centrais relacionados com o Programa de Exploração Turística e despesas de serviços de receção e outras despesas com ela relacionada.
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Nos serviços de Administração geral, a prestar pela D…, estão incluídos os serviços de manutenção de rotina que por ela sejam livremente considerados indispensáveis e apropriados à ocupação de hóspedes, tais como troca de lâmpadas, desentupir sanitas, restabelecer e ligar circuitos, manutenção de jardins, paisagem, arrumação e limpeza da unidade, roupas de casa, esvaziar lixo, trocar toalhas, panos de cozinha, roupa da cama, arrumação diária da cozinha, salas de jantar e de estar, casa de banho e quartos, limpeza de loiça, balcões, varrer o chão, limpar o pó, aspirar, limpeza de espelhos, fazer as camas, limpeza após saída de hóspedes e uma limpeza anual profunda designadamente com limpeza a vapor dos tapetes e estofos, enceramento do chão, limpeza externa das janelas , entre outros.
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Pela prestação dos serviços descritos a entidade gestora D… receberia 25% da receita bruta da exploração turística, ou outra percentagem que venha a ser acordada pelas partes e está obrigada a facultar um relatório mensal nos 15 dias seguintes ao mês a que respeita e ainda um relatório anual auditado.
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Aos requerentes cabiam as despesas não incluídas na gestão operacional da exploração turística e mobilar a unidade através de pacote standard de mobília que representou um gasto de € 40 660,00, realizar todas as despesas de todas as operações não relacionadas com a gestão operacional., tais como todos os encargos e despesas pendentes ou devidos relacionados com a unidade, como impostos, encargos cobrados por credores ou fornecedores, encargos de condomínio, custo de gestão e reservas, todos os prémios de seguros aplicáveis, honorários de auditores, contas telefónicas, custos de eletricidade, óleo, gás, água e outros serviços básicos.
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Os requerentes entregaram em conjunto nos anos de 2012, 2013 e 2014 as respetivas declarações de rendimentos, modelo 3 de IRS com os resultados tributáveis de € -37 750,32, € 1 192,15 e € 35,76, respetivamente, vindo posteriormente a serem objeto de procedimento inspetivo quanto aos referidos exercícios, conforme ordem de serviço O12016…/…/… de 29 de Agosto de 2016, tendo sido notificada do projeto de relatório pelo ofício … de 06 de dezembro de 2016, no qual foram propostas correções de rendimentos par o ano de 2012 de € 58 665,34, ano 2013 € 18 235,94 e 2014 € 26 695,38.
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Os serviços de inspeção qualificaram os rendimentos auferidos pelos requerentes como rendimentos da categoria F, por considerarem que os mesmos derivam apenas da disponibilização a terceiros do imóvel de forma passiva, isto é, sem a qualquer intervenção e resultaram de uma atividade comercial por parte da D… .
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Os encargos respeitantes a salários, limpeza, eletricidade, gás, água, não foram considerados pelos SIT[14], dado não os considerarem despesas de manutenção ou conservação, posição com a qual os requerentes não se conformaram e em 18 de outubro de 2016, apresentaram requerimento de audição prévia onde explanaram a sua discórdia, vindo posteriormente a serem notificados do relatório final da inspeção, no qual foram mantidas as correções, inicialmente propostas, à matéria coletável dos anos de 2012, 2013 e 2014, nos montantes já referidos, que deram origem às liquidações, respetivas, no montante global de € 19 198,21.
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Da prova testemunhal arrolada pelos requerentes e que incidiu sobre os artigos da petição 9º a 29º, 31º, 62º, 68º, 112º, 113º, 115º e 118º, confirmaram o que neles se aduzia e que não tinha sido posto em causa pela requerida, que convidada a pronunciar-se sobre os depoimentos das testemunhas nada disse.
Os factos descritos estão provados nos documentos juntos aos autos ou no processo administrativo, na prova testemunhal e não foram impugnados pelas partes, sendo os considerados relevantes, para a decisão da causa, pelo tribunal.
3- Matéria de Direito
3.1 – Violação do dever de fundamentação dos atos tributários praticados pela requerida
A fundamentação constante no relatório do SIT que serviu de base aos atos tributários aqui postos em crise, bem como a leitura que a ATA faz da aplicação da lei a esses factos, poder-se-á não concordar com ela, mas o tribunal não vislumbra incumprimento quer ao nº 3 do artigo 268º da CRP[15], quer ao artigo 77º da LGT, nem tão pouco à alínea a) do artigo 99 do CPPT.
Na verdade, os normativos referidos, exigem notificação aos interessados do procedimento, de forma expressa e fundamentada, ainda que esta consista em mera concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os relatórios dos serviços de inspeção.
A jurisprudência do STA[16], nomeadamente o seu acórdão de 11/11/1998, proferido no processo 31339, diz-nos que”… o dever de fundamentação exige que um destinatário normal, colocado na posição do recorrente, face ao teor expresso do acto, possa apreender o percurso lógico-jurídico trilhado pela autoridade recorrida para chegar a tal decisão, por forma a poder determinar-se, conscientemente, no sentido da impugnação ou não impugnação”
Também ainda no seu acórdão de 13/04/2000 no recurso 31616, refere que a densidade da fundamentação se pode situar <<…a um limite mínimo que a não descaracterize, ou seja, fique garantido o “quantum” indispensável ao cumprimento dos requisitos mínimos de uma fundamentação formal: a revelação da existência de uma reflexão e a indicação das razões principais que moveram o agente>>
Da análise da petição o tribunal conclui que a fundamentação posta em causa permitiu aos requerentes não só reagir contra os atos praticados pela ATA, bem como, ao mesmo tempo, revelaram uma completa compreensão das razões que levaram à prática dos mesmos pela requerida e que lhes possibilitou rebatê-los ponto por ponto.
Face a tais constatações o tribunal considera que improcede o vício de insuficiência de fundamentação invocada quanto ao relatório do SIT e que sustentaram os atos de liquidação aqui postos em crise.
3.2 – Vício de violação da lei, quanto à qualificação dos rendimentos auferidos
Os rendimentos das pessoas singulares encontram-se divididos em categorias, conforme artigo 1º do CIRS e a divergência existente entre os requerentes e a ATA, reside no facto destes entenderem que os rendimentos auferidos pela exploração do imóvel já identificado estão enquadrados na categoria B e a ATA considera que os mesmos estão enquadrados na categoria F.
Os requerentes, como já se viu, estiveram registados pela atividade de exploração de apartamentos turísticos sem restaurante CAE 55123, com tributação pela categoria B, registo levado a efeito, em consequência de declarações de início de atividade, por eles oportunamente apresentadas e que gozam de presunção de verdade, conforme artigo 75º nº 1 da LGT, porém a ATA, apesar de aceitar esse registo, veio, na sua ação de fiscalização, que lhe compete, desconsiderar tal registo, ilidindo essa presunção, dado concluir que os requerentes não só não exerceram tal atividade como não revelaram ter qualquer estrutura para o seu exercício.
Vejamos:
A alínea a) do nº 1 do artigo 3º do CIRS estabelece que são rendimentos empresariais e profissionais, com tributação pela categoria B, os decorrentes do exercício de qualquer atividade comercial, industrial, agrícola, silvícola ou pecuária. No nº 1 do artigo 4 º, do referido Código, em elenco aberto, enumeram-se uma série de atividades consideradas comerciais ou industriais entre as quais figura na alínea h) aquela pela qual os requerentes estiveram registados.
O nº 1 do artigo 8º do CIRS estabelecia, ao tempo, que são rendimentos prediais, com tributação pela categoria F, as rendas dos prédios rústicos, urbanos e mistos pagas ou colocadas à disposição dos respetivos titulares e o seu nº 2 diz-nos, alínea a), que são havidas como rendas as importâncias relativas à cedência do uso do prédio ou de parte dele e aos serviços relacionados com aquela cedência e na alínea b) que também são havidas como rendas as importâncias relativas ao aluguer de maquinismos e mobiliários instalados no imóvel locado.
Neste quadro teremos que apurar se os rendimentos em questão resultam do exercício de uma atividade comercial por parte dos requerentes conforme eles entendem, ou se, pelo contrário, resultam da mera cedência por eles do imóvel a terceiros, como entende a requerida.
Dos elementos juntos aos autos, desde o contrato de cessação de exploração turística, da prova testemunhal e da própria petição, conforme artigos 15 e 16º da mesma, a exploração é feita pela D… por conta dos respetivos proprietários, sendo que a expressão “por conta” não é equivalente à expressão “ em nome de”, aliás são figuras distintas que o CC[17] trata, a primeira, no seu artigo 1180º, e a segunda no nº 1 do artigo 1178º, institutos diferentes que nos permitem concluir, aliás como os requerentes que a exploração da fração em causa é feita pela D… por conta dos requerentes seus proprietários, mas não em nome deles.
Da matéria de facto provada pode-se concluir que os requerentes não exerceram a atividade para a qual se encontravam registados e que os SIT, no cumprimento das funções que, legalmente lhe estão atribuídas, isso constataram e corrigiram, conforme se alcança do respetivo relatório.
A jurisprudência do STA vem reiterando que o conceito de atividade comercial ou industrial será determinado pelo conceito económico de atividade comercial ou industrial, que abrange atividades de mediação entre a oferta e a procura e atividade de incorporação de novas utilidades na matéria, em ambos os casos com fins especulativos, com vista à obtenção de lucros (ver neste sentido o Ac. Do STA de 11/01/2017, proferido no âmbito do processo 01622/15).
Como já se concluiu, os requerentes não exerceram qualquer atividade comercial, sendo a mesma feita pela entidade gestora D… .
Saliente-se que estes contratos de exploração turísticas são regulados pelo RJIFET[18], ao tempo da instalação, aprovado pelo DL 167/97 de 4 de Julho, com as alterações introduzidas pelo DL 305/99 de 6 de Agosto e pelo DL 55/2002 de 11 de Março que no seu artigo 44º nº 1 estabelece que a exploração de cada empreendimento turístico deve ser da responsabilidade de uma única entidade e, o seu nº 2 diz que a exploração unitária não é impeditiva de a propriedade das várias frações imobiliárias que compõem o empreendimento serem pertença de uma ou mais pessoas.
Resumindo, a propriedade do empreendimento pode ser plural mas a sua exploração tem que ser feita por uma única entidade, daí que, por imperativo legal, decorre a indispensabilidade da celebração de contratos de cessão de exploração turística entre os proprietários das frações e a entidade responsável pela exploração, ficando eles arredados de qualquer atividade também por imposição legal.
Nesta perspetiva verifica-se que a exploração turística da fração em questão, propriedade dos requerentes, foi nos anos de 2012, 2013 e 2014, feita pela entidade gestora D…, limitando-se os requerentes a cede-la para exploração e auferindo em contrapartida os rendimentos que configuram a natureza de rendas previstas na alínea a) do nº 2 do artigo 8º do CIRS.
É patente que tais rendimentos não resultam de qualquer atividade exercida pelos requerentes que apesar de registados para o efeito, não a exerceram nem legalmente a podiam exercer relativamente a fração em questão, pelo que os rendimentos em questão só poderão ser qualificados e enquadráveis na categoria F de rendimentos das pessoas singulares, improcedendo também o vício da alegada violação da lei quanto à qualificação dos rendimentos.
3.3–Não aceitação pela ATA de determinadas despesas no apuramento do rendimento líquido da categoria F
Ainda que a título subsidiário os requerentes pretendem que a ATA, ao fazer o apuramento do rendimento líquido pela categoria F, aceite a dedução da totalidade das despesas suportadas com a manutenção e conservação do imóvel, tais como despesas com a mulher da limpeza, com o jardineiro, com a eletricidade, água, gás, reparações e pinturas.
O nº 1 do artigo 41º do CIRS determina que aos rendimentos brutos, a que alude o artigo 8º do mesmo diploma, deduzem-se as despesas de manutenção e de conservação que incumbam ao sujeito passivo, por ele suportadas e devidamente documentadas.
Mas, desde logo, as despesas com eletricidade, água e gás, são despesas de funcionamento, não se enquadrando no conceito de despesas de manutenção ou conservação, ficando assim afastadas da previsão da norma do nº1 do artigo 41º do CIRS, já referido.
Já as despesas com o pessoal de limpeza, jardinagem, reparações e pintura estão perfeitamente enquadráveis nas despesas de conservação e manutenção, importa saber se elas foram ou não suportadas pelos sujeitos passivos.
Ora, da matéria de facto considerada provada essas despesas estavam a cargo da entidade gestora D… (ver alínea j da matéria de facto), a quem incumbia fazer tais pagamentos e pelos quais era remunerada pelos proprietários, pelo que o custo dedutível é o correspondente à remuneração por eles paga à gestora e esse foi considerado conforme se alcança do relatório do SIT, através da aplicação da permilagem da unidade S502 (0,00556300), de que os requerentes são proprietários, aos valores evidenciados no anexo I do RIT[19].
Deste modo, improcede também o pedido dos requerentes, no que respeita, à não aceitação das despesas, pela ATA, no apuramento do rendimento líquido da categoria F.
IV – DECISÃO
Face ao exposto, o tribunal decide:
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Declarar o pedido de pronúncia arbitral totalmente improcedente e consequentemente manter na ordem jurídica os atos tributários de liquidação identificados e postos em crise nos presentes autos.
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Fixar o valor do Processo em € 19 198,21, considerando as disposições contidas nos artigos 299º nº 1 do CPC[20], 97-A do CPPT e 3º nº 2 do RCPAT[21].
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Fixar as custas, no montante de € 1 224,00 de acordo com o disposto na tabela I referida no artigo 4º do RCPAT, que ficam a cargo dos requerentes, ao abrigo do nº4 do artigo 22º do RJAT.
Notifique.
Lisboa, 03 Janeiro de 2018
Texto elaborado em computador, nos termos, nos termos do artigo 131º,nº 5 do CPC, aplicável por remissão do artigo 29º,nº1, alínea e) do RJAT, com versos em branco e revisto pelo tribunal.
O árbitro
Arlindo José Francisco
[1] Acrónimo de contribuinte fiscal
[2] Acrónimo de Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária
[3] Acrónimo de Autoridade Tributária e Aduaneira
[4] Acrónimo de Imposto sobre o Rendimento de pessoas Singulares
[5] Acrónimo de Centro de Arbitragem Administrativa
[6] Acrónimo de Lei Geral Tributária
[7] Acrónimo de Código do Imposto sobre Rendimento das Pessoas Singulares
[8] Acrónimo de Código de Procedimento e de Processo tributário
[9] Acrónimo de Número de Identificação de Pessoas Coletivas
[10] Acrónimo de Direção Geral do Turismo
[11] Acrónimo de Câmara Municipal de Albufeira
[12] Acrónimo de Código das Atividades Económicas
[13] Acrónimo de Imposto sobre o Valor Acrescentado
[14] Acrónimo de Serviços de Inspeção Tributária
[15] Acrónimo de Constituição da República Portuguesa
[16] Acrónimo de Supremo Tribunal Administrativo
[17] Acrónimo de Código Civil
[18] Acrónimo de Regime Jurídico da Instalação e do funcionamento dos empreendimentos turísticos
[19] Acrónimo de Relatório da Inspeção Tributária
[20] Acrónimo de Código de Processo Civil
[21] Acrónimo de Regulamento de Custas nos Procedimentos de Arbitragem Tributária
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