Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 326/2017-T
Data da decisão: 2017-11-27  IMT  
Valor do pedido: € 7.951,45
Tema: IMT – Prédios para revenda.
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DECISÃO ARBITRAL

 

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD, sendo, nos termos legais, notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira. O Conselho Deontológico designou como árbitro do Tribunal Arbitral singular, o signatário, notificando as partes dessa designação. Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66- B/2012, de 31 de dezembro, o Tribunal Arbitral ficou constituído em 16 de agosto de 2017.

 

 

I – RELATÓRIO

 

1- No 15.05.2017, “A...– LDA”, contribuinte n.º…, com sede na … nº…, …-… Lisboa, apresentou um pedido de constituição do Tribunal Arbitral singular, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por RJAT), sendo Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

2- Contesta o acto de liquidação de IMT n.º … no montante de € 7.951,45, com data limite de pagamento de 2017.03.02 e pago nesse prazo, cuja liquidação lhe foi comunicada através do oficio n.º…, de 10.01.2017, emitido pelo Serviço de Finanças de Lisboa … .

Refere-se a liquidação à aquisição do prédio do terreno para construção, inscrito na matriz sob o artigo n.º…, da freguesia de …, concelho de Setúbal.

 

3- Requer a anulação da liquidação, o reembolso da quantia “paga” e juros indemnizatórios, atenta a ilegalidade dos actos tributários de liquidação referidos.

 

4- Invoca, sucintamente, em seu favor:

Preterição do direito de audição prévia previsto no artigo 60.º da LGT, por entender que se devia ter pronunciado antes da notificação da liquidação do imposto, o que inquina o ato de ilegalidade, pois não ocorreu qualquer dos fundamentos constantes daquela norma para que a mesma pudesse ser dispensada, sendo certo que se estava perante um ato desfavorável em matéria tributária.

 

Vem, ainda, sustentar que o acto de liquidação de IMT é ilegal porque, aquando da aquisição, esta mostrava-se isenta, já que estavam preenchidos todos os requisitos do artigo 7.º do CIMT que lhe permitiam beneficiar da isenção que lhe foi conferida, inclusive a declaração de início de atividade de compra para revenda de imóveis iniciada em 2014.

 

Mais alega, que a AT não podia concluir pelo reconhecimento indevido da isenção, unicamente na cessação para efeitos de IVA.:

 (…) A cessação de atividade para efeitos de IVA não implica …a respectiva cessação também para efeitos de IRC.” E “decorre da remissão prevista no artigo 7.º do CIMT para o n.º 1 do artigo 109.º do Código do IRC que é um imposto sobre o rendimento, no caso o IRC, relativamente ao qual os sujeitos passivos devem manter atividade aberta.”

 

A existirem dúvidas teria de ser valoradas processualmente a favor da Requerente nos termos do artigo 100.º, n.º 1 do CPPT.

 

5- Por seu turno, a AT… alega que as liquidações em crise consubstanciam uma correta interpretação e aplicação do direito aos factos não padecendo de vício de violação de lei, ou outro, devendo, em consequência, ser declarada a total improcedência do pedido, mantendo-se o ato nos exatos termos em que foi praticado.

 

COM EFEITO, entende a AT…

A audiência prévia não pode ser vista como mera formalidade, a ser cumprida, tem de ser vista com um propósito, que será sempre permitir o contraditório, na expetativa que outros factos ou argumentos de direito possam inverter a proposta de decisão consubstanciada no projeto de indeferimento.

No caso, a liquidação de IMT com revogação da isenção, sendo efectivamente, um ato prejudicial para o contribuinte, baseou-se unicamente em facto/ato praticado pelo contribuinte- a cessação da atividade.

A intervenção da contribuinte, em sede de audiência prévia jamais poderia modificar o sentido da decisão, o que só seria, hipoteticamente, possível com a apresentação da declaração de reinicio da atividade, tal como acabou por fazer.

 

A liquidação efetuou-se, pois, porque o contribuinte declarou ter cessado a sua atividade, e sem direito, portanto a isenção, que é inerente à própria atividade de compra para revenda, e tendo os elementos para liquidar o imposto, tendo também estes sido fornecidos pelo contribuinte através da escritura de compra e venda, nada foi acrescentado pela AT, toda a informação foi trazida pelo contribuinte.

 

O reinício da atividade com efeitos a 1 de Novembro de 2016, apresentada em 10 de Janeiro de 2017, não tem a virtualidade de “reparar” a situação para efeitos da isenção, realizando assim uma espécie de “trato sucessivo “na atividade da empresa.

 

O direito aos benefícios fiscais deve reportar-se à data da verificação dos respetivos pressupostos, ainda que esteja dependente de reconhecimento declarativo pela administração fiscal.

 

Á data da celebração da escritura pública de compra e venda a contribuinte tinha cessado a atividade, logo o prédio não se destinava à sua atividade de compra para revenda, não se tendo por verificados verificaram os pressupostos da isenção do artigo 7.º do CIMT. 38.º E não verificada a isenção repõe-se a tributação-regra, em que de acordo com o artigo 18.º do CIMT: “1 - O imposto será liquidado pelas taxas em vigor ao tempo da ocorrência do facto tributário. 2 - Se ocorrer a caducidade da isenção, a taxa e o valor a considerar na liquidação serão os vigentes à data da liquidação.3 - Quando, no caso referido no número anterior e após a aquisição dos bens, tenham ocorrido factos que alterem a sua natureza, o imposto será liquidado com base nas taxas e valores vigentes à data da transmissão.”, 

 

O facto de o contribuinte ter vindo “a posterior” declarar que afinal a atividade sempre se manteve, não afasta as regras de constituição do direto aos benefícios fiscais, nem as regras de liquidação do imposto. Temos, mesmo de concluir que à data do facto tributário que ocorreu com a celebração do contrato de compra e venda, a isenção do artigo 7.º do CIMT não operou, porquanto o beneficiário já tinha cessado a atividade sendo este o pressuposto da isenção: a aquisição para revenda.

Não se tendo verificado a isenção temos, necessariamente, de concluir que o ato tributário em causa, não violou, nenhum preceito legal, devendo, assim, ser mantido

 

II- O processo não enferma de nulidades.

 

III- Não há qualquer obstáculo à apreciação do mérito da causa.

 

 

IV- MATÉRIA DE FACTO

 

1- A Requerente iniciou atividade para efeitos de IRC e IVA a 16 de Junho de 2014, indicando como atividade principal a “compra e venda de bens imobiliários” a que corresponde o CAE 68100;

 

2- A Requerente adquiriu por escritura pública datada de 29 de Dezembro de 2016, o prédio urbano sito freguesia de …, em Setúbal, inscrito na respetiva matriz sob o artigo … (terreno para construção);

 

3- A referida transmissão do imóvel, por despacho de 23.11.2016, beneficiou de isenção do pagamento de IMT, ao abrigo do disposto no artigo 7.º, n.º 1, do CIMT, em virtude de declarar destinado a revenda;

 

4- À data da transmissão, a Requerente dispunha de certidão passada por Serviço de Finanças, relativa a isenção de IMT nas aquisições para revenda efetuadas até 31 de Dezembro de 2016;

 

5- A referida certidão foi pedida e obtida a 23 de novembro de 2016, dela constando que a Requerente estava à data coletada para o exercício da atividade de compra para revenda de imóveis e que tinha exercido essa atividade no ano anterior;

 

6- A Requerente apresentou a declaração Modelo 1 prevista no Artigo 19.º do Código de IMT, relativamente à aquisição a realizar, tendo sido emitida pelo Serviço de Finanças de Lisboa … uma liquidação de IMT, sem imposto a pagar.

 

7- O Serviço de Finanças de Lisboa … notificou a Requerente para o pagamento de IMT, por considerar que o benefício havia sido atribuído indevidamente. Por ofício datado de 10 de janeiro de 2017, daquele Serviço, a Requerente foi notificada do respetivo ato tributário, com imposto a pagar no montante de € 7.951,45.

 

8- De acordo com a fundamentação apresentada pelos serviços da administração tributária, «O referido prédio foi adquirido para revenda em 29.12.2016 (…) com benefício da isenção prevista no artigo 7.º do CMIT. Tendo sido verificado posteriormente, pelos serviços, que o benefício terá sido atribuído indevidamente. Uma vez que o adquirente, à data da liquidação, não reunia os pressupostos previstos na conjugação do artigo 7.º do CIMT, com a alínea a) n.º 1 do artigo 117.º do CIMT, “…que a isenção de IMT para revenda depende da verificação da apresentação, antes da aquisição, da declaração de inscrição, alteração, nos termos dos artigos 118.º e 119-º do CIRC, relativo ao exercício da atividade de comprador de prédios para revenda”. Em resumo, tinha a actividade 68100 compra e venda de bens imobiliários, cessada em 31-10-2016. (…).

 

9- Em 31 de Outubro de 2016, a Requerente cessou atividade para efeitos de IVA, conforme comprovado pela cópia da declaração respetiva, tendo declarado o seu reinício, com efeitos a 1 de Novembro de 2016, em declaração apresentada em 10 de Janeiro de 2017.

 

 

V- Factos dados como provados

Todos os referidos.

Fundamentação da matéria de facto provada e não provada:

Relativamente à matéria de facto, o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. art.º 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).

Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. anterior artigo 511.º, n.º 1, do CPC, correspondente ao actual artigo 596.º, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).

 

Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do artigo 110.º/7 do CPPT, e a prova documental junta aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados.

 

VI- DO DIREITO

As questões centrais controvertidas no presente processo que impõem

apreciação, para decisão, são as seguintes:

 

a-      O alegado vício de preterição do exercício do direito de audiência prévia e quanto às consequências da sua verificação, sendo de ponderar o princípio do aproveitamento do acto e a sua aplicabilidade ao caso concreto.

b-      A questão de saber se as sociedades, com a atividade cessada, em termos de IVA, podem, ainda assim, beneficiar da isenção estauida no artigo 7.º do CIMT: compra para revenda de imóveis.

 

 

Vejamos,

 

O espirito subjacente á previsão do art. 124º do CPPT, aplicado ao caso concreto, impõe que seja apreciada primeiramente a questão de mérito suscitada e só depois a questão formal, (de falta de audiência prévia), já que a procedência dos vícios desta, determinam uma menos estável e eficaz tutela dos interesses ofendidos, atenta a possibilidade de renovação do ato e não condenação em juros compensatórios.

 

Assim

 

Dir-se-á quer as sociedades podem, a qualquer momen­to, dar/declarar a cessação de atividade em sede de IVA, sem que para isso tenha de se proceder à sua dis­solução e liquidação, devendo o sujeito passivo, entregar a respetiva declaração de cessação no serviço de finanças competente, no prazo de 30 dias a contar da data de cessação, nos termos do artigo 33.º do CIVA.

 

Essa cessação da atividade, em termos de IVA, não determina a extinção da empresa, a qual só se verifica no momento do encerramento da liqui­dação da sociedade, que precede a sua dissolução.

 

Nos termos do n.º 2 do artigo 146.º do Codigo das Sociedades Comerciais “a sociedade em liquidação mantém a personalidade jurídica e, salvo quando outra coisa resulte das disposições subsequentes ou da modalidade de liquidação, continuam a ser-lhe aplicáveis, com as neces­sárias adaptações, as disposições que regem as sociedades não dissolvidas.

 

Já no especifico domínio tributário, alude o artº 15.º da Lei Geral Tributária á “suscetibilidade de ser sujeito de relações jurídicas tributárias”, com a manutenção da personalidade jurídica e tributária por parte da empresa em situação de liquidação, subsistindo, sobretudo em termos de IRC, conforme o disposto no n.º 5 do artigo 8.º do CIRC, relativamente às en­tidades com sede ou direção efetiva em ter­ritório português.

A cessação ocorre na data do encerramento da liquidação, ou na data da fu­são ou cisão, quanto às sociedades extintas em consequência destas.

 

A cessação de atividade, em termos de IVA e em termos de IRC, poderá, assim, acontecer em momentos distintos, e surge por factos dis­tintos, sendo que uma empresa cessada em IVA poderá continuar com atividade em termos de IRC, cuja cessação, apenas ocorrerá no momento em que a empresa será encerrada em termos jurídicos, ou seja, quando ocorre o encerramento da liquidação.

 

Ou seja, estamos, nestas situações, perante sociedades que não foram liquidadas e dissolvidas, continuando a ter existência jurídica e personalidade tributária com algumas obrigações fiscais (nomeadamente as previstas nos artigos 112.º e 113.º do CIRC).

 

Não obstante, e sem prejuízo do referido, há que salientar que as sociedades que cessam a atividade em termos de IVA, ficam, por assim dizer, inativas, - no expressivo sentido de não ter qualquer atividade económica - que, por definição, na inatividade não existe.

 

Ora, com todo o respeito por opinião contrária, entende-se que, em caso algum, poderá conceber-se que haja lugar a uma isenção cujo pressuposto de base é, precisamente, o exercicio de uma especifica atividade, (neste caso o exercício de uma atividade de compra para revenda de imóveis) quando essa atividade se verifica não existir, (ou subsistir), ainda que exista uma declaração que, formalmente “ateste” o contrário.

 

Se a empresa cessada em IVA continuar com personalidade jurídica, poderá a todo o momen­to optar pelo reinício da atividade, com a entrega da declaração respetiva, nos prazos previstos no artigo 31.º do CIVA.

No caso, a contribuinte declarou o reinício da atividade, com efeitos a 1 de Novembro de 2016, em declaração apresentada em 10 de Janeiro de 2017.

 

Contudo, não pode a tal ato ser atribuído o valor que pretende a Requerente.

Com efeito, como bem se refere no AC.STJ 01654/15 de 26-10-2016, a intervenção da AT, no momento da declaração do início de atividade dos contribuintes, funda-se na realidade que lhe é apresentada pelos interessados, incumbindo-lhe sempre proceder às correções necessárias em momento posterior, sempre que verifique ter ocorrido uma desconformidade que implique o não pagamento, ou pagamento de menos imposto, do que aquele que seria devido.

 

Tem, assim, neste ponto, razão a AT, já que a Requerente, adquirente, à data da liquidação, não reunia os pressupostos previstos no artº 7.º do CIMT, relativos ao exercício da atividade de comprador de prédios para revenda, pois tinha a actividade cessada desde 31-10-2016. 

 

Improcede, nesta parte e razão, o requerido.

 

Vicio de falta de audição previa

 

Atento o disposto no artigo 60.º da LGT manifesto é que a audição do contribuinte pela Administração em momento anterior à liquidação não estava dispensada (cfr. o n.º 2 e 3 do artigo 60.º da Lei Geral Tributária), antes lhe era imposta pela alínea a) do n.º 1 do mesmo preceito legal.
 

O facto de ter sido a Reclamante a apresentar a declaração de cessação de atividade em termos de IVA, não tem obviamente, qualquer relevância no respeitante, pois não constitui base ou pressuposto direto, (sequer quantitativo), de tributação, resultando, quando muito, em indicio ou circunstância qualificadora de situação tributária que, nada tem a ver com a previsão do referido artº 60º da LGT.

 

Como habitualmente é referido, “ O interesse prosseguido pela figura em causa é, ainda e nuclearmente, o da descoberta da verdade material e da defesa antecipada dos interesses do contribuinte. Se a legalidade da liquidação depende do correcto apuramento da capacidade contributiva do contribuinte, compreende-se o interesse objectivo em que este colabore com a Administração fiscal a fim de prevenir futuros litígios.

 Por outro lado, do ponto de vista do contribuinte, este tem interesse em esclarecer as eventuais incertezas probatórias da Administração fiscal antes que as mesmas sejam resolvidas num sentido contrário aos seus interesses, evitando, desse modo, a necessidade de impugnar o de recorrer da liquidação.”, aqui se atestando a prossecução daquela referida dupla função – defensiva e preventiva.

 

Era, com efeito, sobre este prisma, necessária e obrigatória audição da contribuinte antes da liquidação.

 

Contudo,

Destinando-se a audiência dos interessados a permitir a sua participação nas decisões que lhes digam respeito (cfr. art. 267.º, n.º 5, da CRP), contribuindo para um cabal esclarecimento dos factos e uma mais adequada e justa decisão, a omissão dessa audição constitui preterição de uma formalidade legal conducente à anulabilidade da decisão (cfr. art. 163.º, n.º 1, do CPA), a menos que seja manifesto que esta só podia, em abstrato, ter o conteúdo que teve em concreto e que, por isso se impunha, o seu aproveitamento pela aplicação do princípio geral do aproveitamento do acto administrativo.

[Transcreveu-se parte do sumário do recente Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo Processo: 095/16 de 18-10-2017, que, com a devida vénia, continuaremos a seguir de perto]

 

A possibilidade de aplicação do princípio do aproveitamento do acto exige um exame casuístico, de análise das circunstâncias particulares e concretas de cada caso, com vista a aferir, num juízo de prognose póstuma, se se está ou não perante uma situação de absoluta impossibilidade de a decisão do procedimento ser influenciada pela participação da requerente.

 

Ou seja, continuando no sentido do Acórdão que vimos citando… a preterição do direito de audição, por via da aplicação do princípio do aproveitamento do acto administrativo, apenas é admissível quando a intervenção do interessado no procedimento tributário for inequivocamente insusceptível de influenciar a decisão final.

 

Ora, no caso, não é completamente inequívoco o sentido final da discussão pois é, pelo menos em abstrato, discutível, se a atividade de compra para revenda de imóveis se mantinha para efeitos da isenção já que, entre o mais, não obstante a cessação para efeitos de IVA, se mantinha em termos de IRC e havia uma declaração que, como se disse, “atestava” o exercício dessa atividade até 31 de Dezembro de 2016.

 

A análise deve atender ás circunstâncias particulares e concretas de cada caso, com vista a aferir, num juízo de prognose póstuma, independentemente do posterior facto de resultado dessa discussão, ou seja, independentemente da procedência ou improcedência dos vícios invocados na impugnação/contestação.

 

A pedra-de-toque para a aplicação do referido princípio é, pois, a insusceptibilidade de a participação do interessado influenciar a decisão final, seja no seu sentido seja nos seus fundamentos.

 

Sendo certo que, como referido, “a aplicação do princípio do aproveitamento do acto implica necessariamente um juízo a posteriori, «este deve ser um juízo de prognose póstuma, pelo que não pode nem deve ser influenciado pela improcedência dos demais vícios (para além da preterição do direito de audiência) invocados no processo em que o acto foi impugnado, sob pena de esvaziamento do direito de participação e de impossibilidade prática deste instituto.

(Cfr. No mesmo sentido o Acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 15 de Outubro de 2014, proferido no processo n.º 1374/13.).

 

Entende-se, assim, que não é possível afirmar que a participação da Requerente não poderia influir em termos de facto e de direito na decisão do procedimento, não podendo afirmar-se que o facto de a discussão da legalidade das liquidações (qualquer que tenha sido o resultado dessa discussão, ou seja, independentemente da procedência ou improcedência dos vícios invocados na impugnação judicial), ter sido efectuada em sede da ação arbitral degrada a formalidade (notificação para o exercício do direito de audiência prévia) em não essencial, sanando o vício decorrente.

 

 

PELO QUE PROCEDE o pedido de pronúncia arbitral já que a liquidação contestada enferma de vício formal de falta de audiência prévia estatuída no artº 60º da LGT, impondo-se anular o ato tributário respetivo.

 

Quanto ao pedido de juros indemnizatórios

 

Constitui jurisprudência consolidada, nomeadamente no STA, o entendimento que, quando o acto de liquidação objecto de impugnação é anulado apenas por vício de forma, não há suporte, ao abrigo do disposto no art. 43.º da LGT, para a atribuição de juros indemnizatórios.

 

A referida norma exige que haja erro imputável aos serviços do qual tenha resultado (à luz de um nexo de causalidade) o pagamento de imposto indevido.

E a existência desse erro não se considera verificado no caso em apreciação.

 

Conclui-se, efetivamente, que, nos casos, como o presente, em que a anulação da liquidação tenha por fundamento a preterição de formalidade por violação do direito de participação ou omissão do dever de audição prévia, carece de suporte legal a condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios ao abrigo do art. 43.º da LGT.


 

DECISÃO

 

Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral julgar parcialmente procedente o pedido arbitral formulado e, em consequência:

  a- Declarar a anulação do ato tributário de liquidação de IMT impugnado por vicio de forma;

b- Determinar o reembolso da importância indevidamente paga;

c- Não condenar a AT no pagamento de juros indemnizatórios;

d- Condenar a Requerente e Requerida nas custas do processo, abaixo fixadas.

 

Valor do processo

Fixa-se o valor do processo em € 7.951,45, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

Custas

Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em €612,00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pelas Requerida e Requerente, na proporção de 90/10, respetivamente, uma vez que o pedido foi considerado parcialmente procedente, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.

 

Lisboa, 27 de Novembro 2017

 

 

O Árbitro,

 

 

(Fernando Miranda Ferreira)