Decisão Arbitral
I-RELATÓRIO
1. A…, LDA., pessoa colectiva nº…, com sede na Rua …, nº…, …-… …(doravante designada por Requerente) apresentou em 19-01-2017, pedido de constituição de tribunal arbitral singular, nos termos do disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 2º e artigo 10º, nºs 1 e 2, ambos do Decreto Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante designado por RJAT), em que é requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada por AT ou Requerida), com vista à declaração de nulidade do acto de indeferimento da decisão da reclamação graciosa e consequentemente declaração de ilegalidade dos actos de liquidação adicional de IVA [1] e de juros de compensatórios, com referência ao ano de 2012, de onde resultou um valor total a pagar de 45.135,45 €.
2. O pedido de constituição do Tribunal Arbitral Singular foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Requerida em 31-01-2017.
3.Nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do nº 2 do artigo 6º do RJAT, por decisão do Exmo. Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, devidamente notificado às partes, nos prazos previstos, foi designado como árbitro o signatário da presente decisão que comunicou àquela Conselho a aceitação do encargo, no prazo estipulado no artigo 4º do Código Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa.
4. Em 15-03-2017 foram as partes notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a mesma, nos termos conjugados do artigo 11º, nº 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6º e 7º do Código Deontológico.
5. O Tribunal Arbitral Singular ficou constituído em 30-03-2017, em conformidade com a prescrição da alínea c) do nº 1 do artigo 11º do RJAT, na redacção que lhe foi conferida pelo artigo 228º da Lei nº 66-B/2012, de 31 de Dezembro.
6. A fundamentar o seu pedido a Requerente, invocou em síntese, e com relevo para o que aqui importa, o seguinte (que se menciona maioritariamente por transcrição);
6.1. “(…) na liquidação adicional do IVA notificada não são explicitados todos os seus fundamentos, quer de facto, quer de direito, apenas resultando da mesma que respeita ao IVA do período de Dezembro de 2012”, (cfr. artigo 8º do ppa)
6.2. “(…) não são identificadas as concretas disposições legais ao abrigo das quais o Imposto, e os Juros Compensatórios são liquidados”, (cfr. artigo 10º do ppa)
6.3. “não o tendo feito, a liquidação em causa é ilegal, por omissão de fundamentação legalmente exigida, assim resultando violados os artigos 268º, nº 3 da Constituição da República Portuguesa e 77º da LGT”, (cfr. artigo 32º do ppa)
6.4. “(…) a fundamentação das Conclusões do Relatório de Inspecção Tributária que foram notificadas (…) na eventualidade de esta consubstanciar a motivação do acto de liquidação de imposto e juros compensatórios (…) não é, congruente, nem, tão – pouco clara”,(cfr. artigo 42º do ppp)
6.5.”(…) no caso em apreço, a Autoridade Tributária e Aduaneira limita-se a elencar meros juízos conclusivos que, como pacífica e unanimemente é dito na doutrina e na jurisprudência, não representam a fundamentação legalmente exigida”, (cfr. artigo 54º do ppa)
6.6.”(…) a Autoridade Tributária e Aduaneira admite que as contas bancárias identificadas, sem prejuízo do respectivo titular estavam afectas à actividade do sócio, quer através da Autora, quer através da sua actividade pessoal enquanto professor”, (cfr. artigo 93º do ppa)
6.7. “(…) o sócio, no desenvolvimento da sua actividade nunca utilizou equipamentos da Autora, mantendo as respectivas devidamente separadas e autónomas”, (cfr. artigo 96º do ppa),
6.8.”(…) como decorre do próprio discurso da Autoridade Tributária e Aduaneira mesmo se existisse um rendimento tributável nos termos pretendidos (….) a verdade é que os factos tributários ter-se-iam distribuído ao longo dos diversos períodos de tributação do ano civil” ,(cfr.artigo 104º do ppa)
6.9. “os supostos (mas inexistentes) serviços tributáveis não se verificaram apenas no último período de tributação do respectivo ano civil”, (cfr. artigo 105º do ppa)
6.10.” ( …) a própria Autoridade Tributária e Aduaneira que o assume no relatório de conclusões da acção de inspecção, ao afirmar que a imputação do rendimento a cada um dos meses era complexa “, (cfr. artigo 110º do ppa)
6.11. (…) tal como vem sendo reconhecido pela generalidade da doutrina, a não averiguação dos elementos necessários à descoberta da verdade material, com a consequente violação do princípio do inquisitório, inquina de ilegalidade o acto tributário emitido nessa sequência“, (cfr. artigo 119º do ppa)
6.12. “(…) o acto de liquidação que também constitui o objecto do presente pedido de pronúncia arbitral é também ilegal por violação do disposto no artigo 87º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado”, (cfr. artigo 124º do ppa)
6.13 “ (…) o acto de liquidação em apreço encontra-se assinado, e portanto têm-se por praticado pela Senhora Directora – Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira do qual não consta qualquer menção sobre a existência da delegação ou subdelegação de competências”, (cfr. artigos 124º e 125º do ppa)
6.14. “(…) tendo o Decreto Lei nº 102/2008, de 20 de Junho, extravasado os termos da autorização legislativa ao abrigo da qual foi aprovado, o mesmo é inconstitucional por violação do disposto nos artigos 112º e 165º da Constituição da República Portuguesa, com a necessária inaplicabilidade das regras de competência em causa, devendo considerar-se competente para o efeito o Senhor Chefe do Serviço de Finanças ou o Senhor Director de Cobranças do Imposto sobre o Valor Acrescentado, conforme aliás redacção originária do actual artigo 87º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado” ,(cfr. artigo 138º do ppa)
6.15. “(…) à data em que foram praticados os actos de liquidação em apreço, a entidade competente para os praticar, era o Director de Serviços da referida Direcção de Serviços de Cobrança e não a mencionada Directora – Geral dos Impostos que, efectivamente, os praticou”, (cfr. artigo 140º do ppa)
6.16. “ O que torna os actos de liquidação sub judice ilegais e anuláveis por vício de incompetência relativa”, (cfr. artigo 141º do ppa)
6.17. “Atento o disposto no artigo 95º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado: “As liquidações referidas nos artigos 87º e 88º podem ser agregadas por anos civis num único documento de cobrança”, (cfr. artigo 145º do ppa)
6.18. “Todavia, terão que ser praticados tantos actos de liquidação quantos os períodos de imposto em causa, (....) parecendo resultar do acto de liquidação de IVA que tal não sucedeu, tendo a Autoridade Tributária e Aduaneira, ao que parece, praticado o acto de liquidação apenas por referência ao mês de Dezembro, assim resultando violado o disposto nas referidas disposições legais”, (cfr. artigos 146º e 147º do ppa)
6.19. “(…) a liquidação de Juros Compensatórios (…) é também ilegal, não apenas por força da respectiva falta de fundamentação e violação de lei, mas ainda por preterição de uma outra formalidade legal essencial, designadamente, por violação do disposto nos artigos 267º, nº 5 da Constituição da República Portuguesa e 60º, nº 1, alínea a) e nº 3 da Lei Geral Tributária”, (cfr. artigo 186º do ppa)
6.20. “Ao manter vigente na ordem jurídica, os actos de liquidação contestados, a Senhora Chefe de Divisão agiu em erro sobre os pressupostos de facto e de direito, sendo que os vícios imputados aos actos de liquidação se transmitem à própria decisão que os mantém”, (cfr. artigo 188º do ppa)
6.21. “(…) no que respeita aos erros sobre os pressupostos de facto e de direito, a Senhora Chefe de Divisão limita-se a reproduzir os elementos constantes de relatório de conclusões de inspecção tributária não se pronunciando circunstancialmente sobre as concretas ilegalidades apontadas” (cfr. artigo 190º do ppa),
6.22. “Deve pois, o referido Despacho da Senhora Chefe de Divisão ser anulado porque praticado com ofensa da normas e princípios jurídicos aplicáveis”, (cfr. artigo 135º do CPA), (cfr. artigo 191º do ppa)
7. A AT, devidamente notificada para o efeito, apresentou em 12-05-2017 a sua resposta (com a junção do processo administrativo) que fundamentalmente replica a posição por si já expressa em sede de conclusões do Relatório de Inspecção Tributaria, bem assim como no indeferimento da reclamação graciosa.
7.1. Alega ainda, em brevíssima síntese, em defesa da sua posição, e para o que aqui releva o seguinte:
7.2. (…) a fundamentação de facto e de direito das liquidações controvertidas consta do teor do relatório final da inspecção tributária, facto que a Requerente não pode desconhecer uma vez que a notificação do relatório menciona expressamente que dará origem à emissão de liquidações, contra as quais poderá reagir via administrativa (cfr. artigo 9 da resposta),
7.3. Mas ainda que assim não fosse, ou seja, mesmo que a Requerente não fosse notificada do relatório final, ainda assim podia ao abrigo do art. 37º do CPPT requerer à AT que a notificasse da fundamentação das liquidações controvertidas, o que não fez (cfr. artigo 10 da resposta),
7.4. (…) tendo a ora reclamante sido notificada no relatório de inspecção tributária, tal facto permitiu-lhe ter conhecimento efectiva e exaustivamente dos fundamentos da liquidação, o que se depreende pelos argumentos alegados pela ora reclamante em sede da presente reclamação graciosa, (cfr. páginas 9,10 e 11 da resposta),
7.5. (…) a fundamentação dos atos de liquidação controvertidos bem como do relatório de inspecção tributária, é expressa, clara, suficiente e congruente (cfr. páginas 9,10, e 11 da resposta).
7.6. (…) deve ser julgado improcedente o vício da falta de fundamentação dos actos de liquidação de IVA e de juros compensatórios (cfr. artigo 13 da resposta),
7.7. No que se refere a lições ministradas pelo sócio gerente a título pessoal, de acordo com o entendimento da Administração Fiscal beneficiam de isenção desde que não haja intervenção da qualquer entidade terceira, ora o sócio gerente presta serviços nas instalações pertencentes à A… beneficiando de todo o apoio logístico da sociedade, pelo que há efectivamente a intervenção de uma entidade terceira, e por conseguinte não poderá beneficiar a isenção (cfr. artigo 4.4.28 da resposta),
7.8. Acresce ainda que, a sociedade e o sócio gerente não mantinham separação patrimonial, já que eram utilizadas contas bancárias de particulares para a realização de pagamentos, e recebimentos respeitantes à actividade empresarial desenvolvida, não tendo por isso sido dado cumprimento ao disposto no artigo 63º - C da LGT, (cfr. artigo 4.4.29 da resposta),
7.9. Relativamente aos alegados erros sobre os pressupostos de facto e de direito, cumpre esclarecer, que contrariamente ao alegado pela Requerente, a Autoridade Tributária se baseou nos elementos de que dispôs, para a partir de uma lógica facilmente perceptível concluir pelas correcções propostas (cfr. artigo 21 da resposta),
7.10. Foi assumido pelo sócio gerente B… que a conta bancária titulada em nome do seu filho C…, foi movimentada nos anos de 2011,2012 e 2013, pelos rendimentos de categoria B por si auferidos e objecto de liquidação em sede de IRS, bem como pelo recebimento da faturação emitida pela sociedade A… (cfr. artigo 22 da resposta),
7.11. (….) a partir de aproximadamente julho de 2011, a conta de C… (filho), passou a ser movimentada como se da conta da Sociedade se tratasse, e que, assim passou a ser porque então B… (Pai) e esposa, tinham receio de que as suas constas pessoais pudessem ser penhoradas, o que permite também concluir que até então eram estas as contas de eram utilizadas como se de contas da sociedade de tratasse (cfr. artigo 23 da resposta);
7.12. Tendo em conta isso, foi feito um cálculo simples, como acima retratado, no qual de deduziu aos depósitos nas constas efectuados, os rendimentos declarados, quer pela sociedade quer pelo seu sócio B… (Pai), para concluir, visto outros rendimentos não existirem no agregado, pelo que se consideram ser os rendimentos omitidos (cfr. artigo 25 da resposta);
7.13. E estes foram imputados à sociedade, tendo em conta as declarações referidas, os descritivos das transferências apurados na investigação, a utilização da sociedade para a prestação de serviços por parte do seu sócio B… e o facto de este não manter separação patrimonial (cfr. artigo 26 da resposta);
7.14. (…) a Requerida procedeu ao longo de todo o procedimento inspectivo, em claro respeito pela prossecução do princípio da descoberta da verdade material realizando todas as diligências necessárias para a mesma (cfr. artigo 32 da resposta);
7.15. A Requerente alega que ao longo de todo o procedimento de inspecção sempre “refutou as acusações a apresentou sucessivamente elementos que contrariam o entendimento da Autoridade Tributária”, no entanto não resultou do mesmo, nem resulta dos presentes autos, que a mesmo tenha logrado sequer invocado um argumento, um facto ou indicado qualquer elemento probatória que pudesse apoiar os supostos “elementos” (cfr. artigo 33 da resposta);
7.16. Não logrando a Requerente trazer qualquer meio de prova, ou qualquer indiciador que pudesse sustentar as suas alegações, não se logra alcançar como é que o princípio do inquisitório pudesse levar a “averiguar”, “elementos”, que não encontravam nos factos quaisquer suporte (cfr. artigo 39 da resposta);
7.17. Não podendo assim, ser assacado ao acto o vício de ilegalidade por violação do princípio do inquisitório (cfr. artigo 40 da resposta);
7.18. (…) no caso em apreço, estamos perante uma liquidação adicional de IVA, nos termos do artº 87º do CIVA, e não perante uma liquidação oficiosa, nos termos dos art. 88º e 89º do mesmo código (cfr. artigo 42 da resposta):
7.19. A propósito da competência do ato de liquidação é claro o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, Processo: 01148/06, de 95-96-2007, que claramente determina que: O acto de liquidação é um acto da competência dos serviços centrais da Direcção Geral dos Impostos, podendo, nos termos do DL 275-A/93, de 9/8, ser utilizados meios informáticos nos quais se inclui a assinatura do respectivo director – geral (cfr. Portaria nº 797/99, de 15/9)- (cfr. artigo 43 da resposta);
7.20. (…) o acto impugnado foi praticado por entidade competente, não lhe podendo ser assacado o vício de incompetência (cfr. artigo 45º da resposta);
7.21. Quanto à alegada inconstitucionalidade do Decreto Lei nº 102/2008, de 20-06 invocada pela ora reclamante, cumpre observar que não cabe à Administração Fiscal pronunciar-se sobre a mesma, sendo essa apreciação da competência do Tribunal Constitucional, nos termos dos artº 276º e seguintes da CRP, encontrando-se a Administração Fiscal vinculada ao Princípio da Legalidade Tributária, nos termos do artº 8º da LGT (cfr. artigo 46 da resposta)
7.22. A Requerida apurou e demonstrou, cabalmente, o imposto cuja liquidação se encontra em falta durante o ano. Não tendo conseguindo imputar a parcela referente a cada um dos períodos, só teria duas hipóteses, liquidar ou não liquidar o imposto em falta (cfr. artigo 49 da resposta);
7.23. (…) ainda que não conseguisse concretizar as parcelas correspondentes a cada um dos períodos (cfr. artigo 54 da resposta);
7.24. (…) a escolha pelo último período de tributação do ano, teve em conta os interesses da Requerente, que visou respeitar (cfr. artigo 55 da resposta);
7.25. Na verdade, se a Requerida fizesse uma distribuição com base num qualquer critério que determinasse, poderia incorrer na imputação a períodos anteriores, de imposto que só deveria ser liquidado e só se mostraria, por via disso, devido em períodos posteriores, originando na esfera da Requerente o ónus com o pagamento de juros que não seriam devidos se fossem completamente apurados os períodos e respectivas parcelas. (cfr. artigo 56 da resposta);
7.26. Assim, aceitando a frustração de algum juros a que tivesse direito, acautelou a Requerida, que com toda a certeza, não pode a Requerente alegar com esta actuação qualquer prejuízo, pelo que, também por esta via não assiste qualquer razão à Requerente ,(cfr. art 57 da resposta);
7.27 . Quanto à fundamentação da liquidação de juros compensatórios, decorre das correcções efectuadas pela AT que a Requerente liquidou imposto em montante inferior ao legalmente devido, sendo imputável ao contribuinte o retardamento na entrega do imposto, nos termos do nº 1 do art- 35º da LGT , (cfr. artigo 58 da resposta);
7.28.(…) verifica-se que a ora reclamante não cumpriu o disposto no artº 27º do CIVA, dado que se constatou em sede de ação inspectiva, haver IVA não liquidado e não entregue nos Cofres do Estado; (cfr. página 24 da resposta)
7.29. A Administração Fiscal encontra-se sujeita ao Princípio da Legalidade Tributária, nos termos do artº 8º da LGT, no que diz respeito à taxa, à base de cálculo e ao período de tempo a que se referem os juros compensatórios; (cfr. página 24 da resposta)
7.30. (…) será de julgar improcedente a ilegalidade dos juros compensatórios, nos quais foram liquidados ao abrigo do disposto no artº 35º da LGT (cfr. artigo 60 da resposta);
7.31. Quanto à pretendida ilegalidade da decisão que indeferiu a reclamação graciosa ora em apreço, deve a mesma ser julgada improcedente por todas as razões de facto e de direito a que supra se aludiu (cfr. artigo 61 da resposta).
8. Por despacho arbitral proferido em 15-05-2017, e pelas razões que do mesmo constam, foi dispensada a realização da realização da reunião a que alude o artigo 18º do RJAT
9. Veio a Requerente em requerimento apresentado em 05-06-2017 justificar o interesse na audição da testemunha arrolada
10. Por despacho de 06-06-2017, solicitou o tribunal que a Requerente viesse indicar os factos essenciais que por remissão para o articulado do pedido de constituição arbitral sobre os quais pretendia o depoimento oportunamente requerido,
11. Nesse mesmo despacho foi desconsiderado todo o articulado apresentado pela Requerente que não tivesse a ver estritamente com a questão da prova testemunha.
12. Em 20-06-2017 veio a Requerente proceder à identificação da matéria sobre a qual pretendia a inquirição da testemunha, dando conta de que afinal a indicada tinha prestado declarações de parte nos termos do disposto no artigo 466º do Código de Processo Civil no âmbito do processo do CAAD nº 69/2017-T, requerendo o aproveitamento de prova no presente processo da já produzida naquele.
13. Notificada a AT da pretensão da Requerente veio informar nada ter a opor ao aproveitamento da prova produzida no processo 69/2017-T, prescindindo da inquirição da testemunha que apresentou com a sua resposta, pugnando ainda pela apresentação de alegações,
14. Por despacho de 18-07-2017 o Tribunal solicitou ao CAAD que procedesse ao envio para o tribunal e para as partes da acta de inquirição e gravação do depoimento em causa, obtida que foi a autorização para tanto por parte do Exmo. Senhor Árbitro titular do processo em causa.
15. Por despacho proferido em 02-10-2017 e pelas razões que do mesmo decorrem foi prorrogado o prazo para a prolação da decisão.
16. Tendo-se verificado que a procuração junta pela Requerente com o seu pedido de pronúncia arbitral não se encontrava outorgada por esta, mas sim por terceiro, foi notificada por despacho exarado em 10-10-2017 no sentido de proceder à junção de procuração em conformidade, com vista a assegurar a sua representação legitimidade processuais.
17. Em resultado, procedeu a Requerente em 16-10-2017, à junção de procuração por si outorgada a favor dos seus Ilustres mandatários, com ratificação do processado.
18. As partes não apresentaram alegações escritas para o que haviam sido convidadas no âmbito do despacho proferido em 18-07-2017.
19. O Tribunal Arbitral Singular é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2º, nº 1, alínea a) 5º e 6º do RJAT.
20.As partes têm personalidade e capacidade judiciária, são legítimas e estão devida e legalmente representadas (artigo 3º, 6. e 15º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, ex vi artigo 29º alínea a) do nº 1.
21. Não foram suscitadas quaisquer excepções e o processo não enferma de nulidades,
II- FUNDAMENTAÇÃO
A. MATÉRIA DE FACTO
A.1. Factos dados como provados
a. a Requerente é uma sociedade por quotas que iniciou a sua actividade em 08 de Maio de 2000 que exerce a sua actividade económica com o CA 85593 – Outras Atividades Educativas NE, enquadrada no regime geral de IRC, sendo para efeitos de IVA um sujeito passivo de imposto nos termos da alínea a) do nº1 do artigo 2, enquadrada no regime normal com periodicidade trimestral em conformidade com o disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 41º, ambos do CIVA,
b. foi sujeita a uma acção inspectva através das Ordens de Serviço números OI 012013…, OI2014… e OI 2014…, com referência aos anos de 2011, 2012 e 2013, de natureza externa e âmbito geral,
c. em resultado da acção inspectiva foi emitido pela AT o documento de correcção nº … referente ao período de 12-12T,
d. com data de 2016-01-14 a AT procedeu à emissão da liquidação adicional de IVA nº 2016…, no valor de 40.513,58 €, e liquidação de juros compensatórios nº 2016…, no montante de 4.621,87 €,
e. a Requerente tem um capital social de cem mil euros, com a seguinte distribuição:
-B…, com uma quota de cinquenta mil euros,
-D…, com uma quota de cinquenta mil euros,
f. a gerência da Requerente está a cargo dos supra referidos sócios,
g. à data dos factos (2012) o sócio B…, para além do exercício da função de gerente da Requerente, prestava serviços que consistiam em ministrar lições a título pessoal sobre matérias do ensino secundário e superior, as quais declarou como isentas de IVA nos termos do nº 1 do artigo 9º do CIVA,
h. tendo declarado para o ano de 2012 o montante de 32.156,38 €,
i. no Relatório de Inspecção Tributária, consta como relevo, a fls. 70, o seguinte:
- “(…) foi assumido pelo sócio gerente B… que a conta bancária titulada em nome do seu filho C… foi movimentada nos anos de 2011, 2012 e 2013, pelos rendimentos de categoria B por si auferidos e objeto de liquidação em sede de IRS, bem como pelo recebimento da faturação emitida pela sociedade A… .
-Nos termos do nº 12 do artigo 9º do CIVA estão isentas do imposto” as prestações de serviços que consistam em lições ministradas a título pessoal sobre matérias do ensino escolar ou superior”
- Atendendo que a atividade desenvolvida pela “A…”, consiste no acompanhamento e orientação escolar, mas sem reconhecimento do ministério competente, as aulas ministradas quer individualmente, quer em grupos, não beneficiam de isenção de IVA, porque não tem enquadramento no nº 10 nem no nº 12, ambos do artº 9º do CIVA
- No que se refere a lições ministradas pelo sócio gerente a título pessoal, de acordo com entendimento da Administração Fiscal beneficiam de isenção desde que não haja intervenção de qualquer entidade terceira.
- Ora, o sócio gerente presta serviços nas instalações pertencentes à A…, beneficiando de todo o apoio logístico da sociedade, pelo que há efetivamente a intervenção de uma entidade terceira, e por conseguinte não poderá beneficiar de isenção
- Acresce ainda que, a sociedade e o sócio gerente não mantinham separação patrimonial, já que eram utilizadas contas bancárias de particulares para a realização de pagamentos e recebimentos respeitantes à atividade empresarial desenvolvida, não tendo por isso sido dado cumprimento ao disposto no artigo 63º C da LGT”.
j. retiram-se ainda do Relatório de Inspecção Tributária a fls 72 verso, as seguintes considerações da autoria da AT na sequência do exercício do direito de audição levado a cabo pela Requerente:
“ O sujeito passivo não invoca factos e muito menos provas, que ponham em causa a análise de rendimentos feita no projeto de relatório”,
“ O único argumento que a este nível, merece referência é o de que os rendimentos omitidos devem ser imputados, a título pessoal, ao gerente do sujeito passivo e não ao sujeito passivo (com a consequência de sendo a imputação feita a título pessoal ao gerente não haver lugar a IVA). No entanto, esse argumento não pode ser acolhido, pois a verdade é que o gerente do sujeito passivo prestou os serviços que geraram os rendimentos no quadro da atividade do sujeito passivo, usando os meios deste”
k. em 2016-07-12, a Requerente apresentou junto do Serviço de Finanças de Cascais …, reclamação graciosa contra as liquidações de IVA e juros compensatórios relativos ao ano de 2012 que lhe foram dirigidas, à qual veio a caber o nº …2016…,
m. reclamação esta indeferida por despacho proferido pela Senhora Chefe de Divisão (em substituição) e devidamente notificado à Requerente, com data de 21-10-2016,
n. em 19-01-2017 a Requerente apresentou o seu pedido de pronúncia arbitral junto do CAAD, que deu origem ao presente processo,
o. encontra-se incorporada nos presentes autos a acta da reunião arbitral ocorrida em 06-06-2017, no âmbito do processo nº 69/2017-T.
A.2. Factos dados como não provados
Com relevo para a decisão, inexistem factos que devam considerar-se como não provados.
A.3. Fundamentação da matéria dada como provada e não provada
Relativamente à matéria de facto, o tribunal não tem que pronunciar-se sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe sim, o dever de seleccionar os factos que importam para a decisão, de discriminar a matéria provada da não provada [(cfr. artº 123º, nº 2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário e artigo 697º, nº 3 do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi do artigo 29, nº 1, alíneas a) e e) do RJAT)].
Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa, são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis, da(s) questão (ões) de direito, (cfr. artigo 596º do Código de Processo Civil aplicável ex vi do artigo 29º, nº 1 alínea e) do RJAT).
Assim sendo, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, os documentos juntos aos autos, e o processo administrativo, consideram-se provados com relevo para a decisão os factos supra elencados.
O depoimento de parte prestado pela sócia da Requerente, D…, no âmbito do processo nº 69/2017-T, alvo de aproveitamento de prova nos presentes autos face ao disposto no nº 1 do artigo 421º do Código de Processo Civil, ex vi, alínea e) do nº 1 do artigo 29º do RJAT, (não tendo havido oposição nesse sentido por parte do Exmo. Senhor Árbitro a quem tal processo foi distribuído), não se mostrou essencial à fixação dos factos pertinentes, que por sua natureza são demonstrados documentalmente.
B.DO DIREITO
NOTA PRÉVIA
A Requerente em data contemporânea à dos presentes autos, invocando essencialmente, os mesmos argumentos e fundamentação, submeteu junto do CAAD pedido de pronúncia arbitral, que teve subjacente as mesmas ordens de serviço, e o mesmo relatório de inspecção tributária do qual resultaram liquidações em sede de IVA, com referência ao ano de 2013.
A tal processo veio a caber o nº 71/2017-T, cuja decisão foi já publicada nos termos do disposto na alínea g) do artigo 16º do RJAT.
Trata-se, portanto, de processo em tudo similar ao presente, com a única diferença de relevo no facto de no indicado estarem em causa as liquidações de IVA e juros associados, referentes ao ano de 2013, e nos presentes autos o pedido de pronúncia arbitral incidir sobre as liquidações de IVA e juros compensatórios reportadas ao ano de 2012, com valores de liquidação contestados obviamente diferentes.
Identificando-se este Tribunal quer quanto à fundamentação, quer quanto ao sentido da decisão arbitral aí proferidas, aos quais se adere por inteiro, seguir-se-ão de perto as mesmas nos presentes autos, com ligeiríssimas alterações de pormenor contribuindo-se também assim, (ao que modestamente se julga) para uma interpretação e aplicação uniforme do direito (artigo 8º, nº 3 do Código Civil).
A Requerente, invoca no seu pedido de pronúncia arbitral vários vícios a saber: falta, incongruência ou insuficiência de fundamentação do relatório de conclusões da acção de inspecção, erro sobre os pressupostos de facto e de direito, violação do princípio do contraditório e prossecução da verdade material, incompetência do autor do acto, violação do disposto no artigo 95º do Código do IVA, ilegalidade da liquidação de juros compensatórios, e ilegalidade da decisão da reclamação graciosa.
Impor-se-á assim, tendo em conta as questões que foram suscitadas pela Requerente ao longo do seu articulado. que delas se conheça desde já em resultado do disposto nos artigos 124º do Código de Procedimento e de Processo Tributário e artigo 608º do Código de Processo Civil e determinar a ordem do seu conhecimento.
Artigo 124º
Ordem de conhecimento dos vícios na sentença
“1.Na sentença, o tribunal apreciará prioritariamente os vícios que conduzam à declaração de inexistência ou nulidade do acto impugnado e, depois, os vícios arguidos que conduzem à sua anulação.
2.Nos referidos grupos a apreciação dos vícios é feita pela ordem seguinte:
a) No primeiro grupo, o dos vícios cuja procedência determine, segundo o prudente critério do julgador, mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos;
b) No segundo grupo, a indicada pelo impugnante, sempre que este estabeleça entre eles uma relação de subsidiariedade e não seja, arguidos outros vícios pelo Ministério Público ou, nos demais casos, a fixada na alínea anterior”.
Face ao que antecede, o Tribunal apreciará prioritariamente o vício de violação de lei, concretamente por erro sobre os pressupostos de direito.
De acordo com a formulação do nº 3 do artigo 18º da LGT, é sujeito passivo da relação tributária a “pessoa singular ou colectiva, o património ou a organização de facto ou de direito que, nos termos da lei, está vinculado ao cumprimento da prestação tributária, seja como contribuinte directo, substituto ou responsável.
Densificando, para o que aqui importa, o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, no seu artigo 2º quem são os sujeitos passivos do imposto.
Pois bem;
Dos sinalizados pontos que se extraíram do Relatório de Inspecção Tributária, que aqui se reescrevem, e em grande parte replicados em sede de resposta a AT, resulta que:
- “(…) foi assumido pelo sócio gerente B… que a conta bancária titulada em nome do seu filho C… foi movimentada nos anos de 2011, 2012 e 2013, pelos rendimentos de categoria B por si auferidos e objeto de liquidação em sede de IRS, bem como pelo recebimento da faturação emitida pela sociedade A… .
-Nos termos do nº 12 do artigo 9º do CIVA estão isentas do imposto” as prestações de serviços que consistam em lições ministradas a título pessoal sobre matérias do ensino escolar ou superior”
- Atendendo que a atividade desenvolvida pela “A…”, consiste no acompanhamento e orientação escolar, mas sem reconhecimento do ministério competente, as aulas ministradas quer individualmente, quer em grupos, não beneficiam de isenção de IVA, porque não tem enquadramento no nº 10 nem no nº 12, ambos do artº 9º do CIVA
- No que se refere a lições ministradas pelo sócio gerente a título pessoal, de acordo com entendimento da Administração Fiscal beneficiam de isenção desde que não haja intervenção de qualquer entidade terceira.
- Ora, o sócio gerente presta serviços nas instalações pertencentes à A…, beneficiando de todo o apoio logístico da sociedade, pelo que há efetivamente a intervenção de uma entidade terceira, e por conseguinte não poderá beneficiar de isenção
- Acresce ainda que, a sociedade e o sócio gerente não mantinham separação patrimonial, já que eram utilizadas contas bancárias de particulares para a realização de pagamentos e recebimentos respeitantes à atividade empresarial desenvolvida, não tendo por isso sido dado cumprimento ao disposto no artigo 63º C da LGT”.
Não podemos senão subscrever, com a devida vénia, e como antes referido, o quanto vem dito no segmento decisório do processo nº 235/2017-T, ao qual, sem quaisquer reservas, aderimos:
“ Estas asserções da AT (mantidas em sede de Resposta, contêm, de modo claro, a afirmação de que os serviços em causa foram prestados pelo sócio gerente da Requerente a título individual, embora a AT considera que tais serviços não estão isentos de IVA, por ter ocorrido a intervenção duma entidade terceira, neste caso a Requerente a ainda pelo facto da sociedade e o sócio não manterem separação patrimonial.
À face do Código do Imposto Sobre o Valor Acrescentado, o sujeito passivo duma concreta relação jurídico tributária, emergente da prestação de serviços sujeito ao imposto, nos termos dos artigos 1º e 4º do Código é, salvo situações excecionais que no caso se não verificam, como é apodíctico, o prestador dos referidos serviços, inexistindo norma que vincule ao pagamento do imposto por tais serviços uma pessoa jurídica pelo facto de tais serviços terem sido prestados, total ou parcialmente, nas suas instalações ou com utilização dos seus equipamentos [2]
Assim, como é bom de ver, não pode a Requerida pretender que sejam tributados na esfera jurídica da Requerente os serviços prestados pelo seu sócio B…, por entender que os serviços prestados por este não estão isentos de imposto. Se assim é, deve a Requerida promover a tributação na esfera jurídica deste uma vez que, em tal caso, será ele o sujeito passivo da relação jurídico – tributária em causa. No caso que nos ocupa, de acordo com a versão da Requerida, o alegado facto tributário em causa não ocorreu tendo como sujeito passivo a Requerente, mas sim o seu sócio B…, assim carecendo de base legal a liquidação do imposto em causa, bem como os respectivos juros compensatórios.
Estamos perante vício violação da lei, por erro nos pressupostos de direito, entendido este como verificado “sempre que na prática do actos tenha sido feita errada interpretação ou aplicação das normas legais, como as norma de incidência objectiva ou subjectivam as que fixam taxas ou as quês conferem isenções ou outros benefícios fiscais ou as que determinam a matéria tributável” [3], a determinar a anulação dos actos de liquidação aqui em crise, ficando deste modo prejudicado o conhecimento dos demais vícios invocados pela Requerente.
III- DECISÃO
De harmonia com o exposto decide este Tribunal Arbitral Singular em;
-
julgar procedentes os pedidos formulados pela Requerente, anulando-se, em consequência as liquidações de IVA e juros compensatórios, assim como a decisão que incidiu sobre a reclamação graciosa,
-
condenar a Requerida no pagamento das custas do processo.
IV- VALOR DO PROCESSO
De conformidade ao estatuído nos artigos 296º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, 97º A, nº 1, alínea a) do Código de Procedimento e de Processo Tributário, e artigo 3º, nº2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao valor do processo 45.135,45 €.
V- CUSTAS
Nos termos do disposto nos artigos 12º, nº 2, 22º, nº 4 do RJAT, e artigos 2º e 4º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, e Tabela I a este anexa, fixa-se o montante das custas em 2.142,00 €.
NOTIFIQUE-SE
Texto elaborado em computador, nos termos do disposto no artigo 131º do Código de Processo Civil, aplicável por remissão do artigo 29º, nº 1, alínea e) do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, com versos em branco e revisto pelo árbitro.
A redacção da presente decisão, rege-se pela ortográfica anterior do Acordo Ortográfico de 1990, excepto no que respeita às transcrições efectuadas.
Trinta de Novembro de dois mil e dezassete
O árbitro
(José Coutinho Pires)
[1] Certamente por lapso, a Requerente no cabeçalho do seu pedido de pronúncia arbitral, identifica as liquidações aqui em causa como provindas de IRC quando, efectivamente, e como decorre dos articulados e prova documental, estar-se-á face a liquidações em sede de IVA.
[2] Sem prejuízo de, a ser exata a versão da Requerida, poder ter ocorrido o facto tributário previsto no art.4º, nº 2, al, a) do CIVA, que estabelece ser considerada prestação de serviços a utilização de bens da empresa para uso próprio do seu titular, do pessoal, ou em geral para fins alheios à mesma (com o valor tributável previsto no art. 16º, nº 2,al c) do código)).Todavia, não foi esse o facto tributário invocado pela Requerida para a prática do ato tributário sub judice.
[3] Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, 6ª Edição, Áreas Editora, 2011, página 114.