DECISÃO ARBITRAL-TRIBUTÁRIA
1 RELATÓRIO
1.1 – A…, S.A., Pessoa Coletiva com o nº: …, Reclamante no procedimento tributário, acima e à margem referenciado, doravante, denominada “Requerente”, veio, invocando o disposto nos artigos 2º, nº 1, alínea a) e 10º do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante RJAT) e, no artigo 99º do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT) e nos números 1 e 2 alínea d) do artigo 95º da Lei Geral Tributária (LGT), requerer a constituição do Tribunal Arbitral Singular, com vista a:
- A anulação dos atos de liquidação relativo ao Imposto Único de Circulação (doravante designado por IUC), referente aos anos fiscais de 2009 e 2012 (cfr., documento nº 1, junto a PI e, que se dão por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).
- O reembolso do valor total de €4 870,61, acrescidos dos respetivos juros indemnizatórios previstos nos artigos 43º da LGT e no artigo 61º do CPPT.
1.2 Nos termos do disposto na alínea a) do nº 2 do artigo 6º e da alínea b) do nº 1 do artigo 11º do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro, na redacção introduzida pelo artigo 228º da Lei nº 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitro singular Maria de Fátima Alves, que comunicou a aceitação do encargo, no prazo aplicável:
- Em 21-12-2015 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do artigo 11º nº 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6º e 7º do Código Deontológico;
- Pelo que, o tribunal arbitral foi constituído, conforme o preceituado na alínea c) do nº 1 do artigo 11º do Decreto-Lei nº10/2011, de 20 de Janeiro, na redacção introduzida pelo artigo 228º da Lei 66-B/2012, de 31 de Dezembro;
- Consequentemente foi determinado a prolação da Decisão Arbitral para o dia 01-02-2016.
1.3 A Requerente, na fundamentação do seu pedido de pronúncia arbitral, afirma, em resumo, o seguinte:
- As viaturas, a que respeitam o imposto único de circulação liquidado, não eram, à data, do facto tributário, propriedade da Requerente, não sendo, a mesma, sujeito passivo do imposto, facto que lhe veda qualquer responsabilidade subjectiva pelo seu pagamento;
- A Requerente fundamenta a sua posição no facto de os referidos veículos automóveis tributados, se encontrarem ao abrigo de Contratos de Locação Financeira, cfr., o descrito nos documentos probatórios nº 1 a 43 (anexos I a IV e anexo V) junto à Reclamação Graciosa, constantes do PA, que se dão por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais);
- Que o CIUC é um imposto de circulação com o pressuposto do princípio da equivalência, previsto no nº1º do mesmo Diploma Legal (CIUC);
- Pelo que, não pode ser imputado à Requerente a propriedade dos referidos veículos, uma vez que, aquando dos “contratos de locação financeira” se deu a transmissão da respetiva propriedade para o actual proprietário;
- Uma vez que, ao verificar-se a transferência do veículo, o mesmo deixou de estar na sua posse, facto que lhe retira a figura do “poluidor/pagador, não podendo, assim, ser sujeito passivo do imposto, face à letra e espírito do artigo 3º do Código do Imposto Único de Circulação;
- É um facto que o artigo 3º do CIUC, considera a propriedade do veículo automóvel, a pessoa em nome do qual o mesmo se encontre registado;
- Contudo, os registos dos veículos na competente Conservatória do Registo Automóvel, não é condição de transmissão de propriedade, uma vez que tal registo visa, somente, dar publicidade à situação jurídica dos bens, conforme resulta, designadamente, do preceituado no artigo nº 1 do Decreto-Lei nº 54/75, de 12 de Fevereiro;
- Assim, a tributação tributária relativa ao CIUC não pode apenas incidir sobre quem conste no registo como proprietário dos veículos, há que considerar os seus efetivos proprietários, mediante presunção ilidível.
1.4 A Requerida, Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada por AT), procedeu à junção do Processo Administrativo Tributário e apresentou Resposta, onde alega a existência de uma exceção, no âmbito da caducidade do pedido de pronúncia arbitral, devido ao facto da Requerente “peticionar unicamente que o tribunal se digne apreciar a legalidade dos atos de liquidação oficiosa juntos como documentos nº 1 a 43”, não invocando o indeferimento das correspondentes reclamações graciosas (situação a ser apreciada, mais à frente, no ponto adequado da presente Decisão Arbitraria) e, alega, por impugnação que, os atos tributários, em crise, não enfermam de qualquer vício de violação de Lei, pronunciando-se pela improcedência da requerida e pela manutenção dos atos de liquidação controvertidos, defendendo, sumariamente o seguinte:
- Os sujeitos passivos do imposto único de circulação são as pessoas que figuram no registo como proprietários dos veículos, conforme o disposto no nº1 do artigo 3º do CIUC, o que no caso, “sub judice”, são de aplicar à Requerente;
- Acrescendo que ao verificar-se que o registo do veículo esteja em nome de uma determinada pessoa a mesma corporize a posição de sujeito passivo da obrigação fiscal de IUC;
- Que notoriamente é errada a interpretação que a Requerente faz do preceituado no artigo 3º do CIUC, na medida em que incorre numa” interpretação enviesada da letra lei” e na adoção “de uma interpretação que não atende ao elemento sistemático, visando a unidade do regime consagrado em todo o CIUC e, mais amplamente, em todo o sistema jurídico-fiscal”, seguindo, ainda, a Requerente, uma “interpretação que ignora a ratio do regime consagrado no artigo, em apreço e, bem assim em todo o CIUC”;
- Pelo que, baseando-se nos motivos, supra expostos, a Requerida não se conformando com a Decisão Arbitral Tributária, de 01-02-2016, interpôs recurso para o 2º Juízo da 2ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul, que julgou procedente a “impugnação da decisão arbitral” com predominância no facto da supra citada Decisão não se ter pronunciado sobre a exceção de caducidade invocada pela AT.
Assim, Reconhecendo e Acolhendo a Decisão e as Argumentações consubstanciadas no Douto Acórdão, vai este Tribunal Arbitral pronunciar-se, nos termos legais, assentes na Boa-Fé objectiva, segundo o espirito do artigo 8º do novo código do processo civil ( NCPC), ex vi, do artigo 29º do RJAT.
2 QUESTÕES DECIDENDAS
2.1 Face ao exposto nos números anteriores, relativamente à exposição escrita, das partes e, aos argumentos apresentados, as principais questões a decidir são as seguintes:
- A questão prévia, da exceção, invocada pela AT;
- A impugnação feita pela Requerente relativa à liquidação material dos atos de liquidação, relativamente aos anos de 2009 a 2012, referente ao IUC sobre os veículos melhor referenciados nos autos;
- A errada interpretação e aplicação das normas de incidência subjetiva do imposto único de circulação liquidado e cobrado, o que constitui, a questão central a decidir no presente processo;
- O valor jurídico do registo do veículo automóvel.
3 FUNDAMENTOS DE FACTO
3.1 Em matéria de facto, relevante para a decisão a proferir, dá o presente Tribunal por assente, face aos elementos existentes nos autos, os seguintes factos:
- A Requerente apresentou elementos probatórios dos veículos automóveis, em questão, cfr. Documentos nºs 1 a 43, consubstanciados nas correspondentes Reclamações Graciosas - anexos, I a IV e V (constantes no PA), que se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais;
- Provando que os referidos veículos se encontravam abrangidos juridicamente pelos Contratos de Locação Financeira (Anexo V);
- Considerando-se, por isso, que os titulares da propriedade serão os locatários por serem os seus verdadeiros possuidores dos veículos automóveis, “in casu” (nº 2 do artigo 3º do CIUC).
3.1.1 FUNDAMENTAÇÃO DOS ATOS PROVADOS
- Os factos dados como provados estão baseados nos anexos I a IV e V, juntos às Reclamações Graciosas (constantes do PA e PI), que se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais.
3.1.2 FACTOS NÃO PROVADOS
- Não existem factos dados como não provados, dado que todos os factos tidos como relevantes para a apreciação do pedido foram provados.
4 FUNDAMENTOS DE DIREITO
4.1 O Tribunal é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2º nº 1, alínea a), 5º nº 2, alínea a), 6º nº 1, 10º nº1,alínea a) e nº 2 do RJAT:
- As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são legítimas, ex vi, artigos 4º e 10º, nº 2, do RJAT e artigo nº 1 da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de Março;
- O processo não enferma de nulidades;
- Existindo uma questão prévia sobre a qual o Tribunal se deve pronunciar.
QUESTÃO PRÉVIA
1º A Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), Requerida no presente processo, Vem,
No âmbito da sua Resposta, apresentada, nos termos do disposto e para os efeitos previstos no artigo 17º do RJAT, invocar uma exceção perentória, nos termos do disposto no artigo 576º nº 3 do CPC, ex vi, artigo 29º do RJAT, que importa a absolvição da AT, do Pedido, uma vez que impede o efeito jurídico dos factos articulados pela Requerente;
2º Assenta a sua alegação no facto da Requerente formular o objecto do Pedido de Pronuncia Arbitral, “unicamente baseado na declaração da ilegalidade dos Atos de Liquidação Oficiosa do Imposto Único de Circulação, relativo aos anos fiscais de 2009 a 2012, juntos como documentos nº 1 a 43”;
3º Sendo que “ o objeto do pedido de pronúncia arbitral deveria ser o indeferimento das reclamações graciosas, apresentadas pela Requerente”, verificando-se, assim, a intempestividade do Pedido de Pronuncia Arbitral.
4º Ora, este Tribunal Arbitral ao analisar o Pedido de Pronúncia, apresentado pela Requerente, conjugado com os anexos I a IV e V, não teve dúvidas de que se tratava do pedido de indeferimento das Reclamações Graciosas, e, que os elementos nºs 1 a 43, deram azo às Reclamações Graciosas, em causa, como é óbvio;
5º Porque doutra forma as Reclamações Graciosas, não tinham “Razão de Ser”, aliás, foi com base na dedução lógica que este Tribunal Arbitral não se pronunciou (reconhecendo, agora, que se deviria ter pronunciado), pois ficou convicto que teria havido um lapso na interpretação por parte da AT (salvo o devido respeito);
6º- Porque senão vejamos: A Requerente, nos pontos 1 a 3, da PI, refere-se ao indeferimento das Reclamações Graciosas;
7º No ponto 4, da PI refere:” Compulsadas as diversas decisões de indeferimento das Reclamações Graciosas juntos, anexos I a IV, verifica-se que a Requerente foi notificada do primeiro indeferimento da Reclamação Graciosa no dia 2 de Janeiro de 2014, sendo que as restantes foram notificadas em data posterior”;
8º Acresce o ponto 5 da PI:” pelo que o prazo para apresentação do pedido de constituição de tribunal arbitral termina no próximo dia 2 de Abril de 2015”;
9º De qualquer forma, há que considerar que o pedido e a causa de pedir consubstanciam o objeto do processo, quando não se verifica ininteligibilidade entre eles;
10º E, como está inteligível que os elementos correspondentes aos nºs 1ª 43, foram Reclamados mediante as Reclamações Graciosas e que só através do indeferimento das RG, se podia interpor o Pedido de Pronuncia Arbitral, este tribunal entendeu que o facto concreto alegado pela Requerente, na PI, tem a ver com os factos constitutivos da situação material que em concreto fazem parte do indeferimento das RG, in casu.
Perante o contextualmente exposto e com assento no nº 8º do NCPC, ex vi, artº 29º do RJAT (enquanto regra de conduta, que impõe às partes “um honeste procedere”, transpondo valores éticos da comunidade para o ordenamento processual), entende este tribunal improceder a exceção da caducidade, alegada pela AT, referente à extemporaneidade do Pedido de Pronuncia Arbitral.
4.2 O pedido, objecto do presente processo é a declaração de anulação dos atos de liquidação do IUC relativo aos veículos automóveis melhor identificado nos autos, anexos I a IV e V.
4.2.1 Condenação da AT ao reembolso do montante do imposto relativo a tal liquidação no valor de € 4 870,61;
4.2.2 Condenação da AT ao pagamento de juros indemnizatórios sobre o mesmo montante.
4.3 Segundo o entendimento da AT, basta que no registo, o veículo conste como propriedade de uma determinada pessoa, para que essa pessoa seja o sujeito passivo da obrigação tributária.
4.4 A matéria de facto está fixada, tal como consta do nº 3.1 supra, importando, agora, determinar o Direito aplicável aos factos subjacentes, de acordo com as questões decidendas, identificadas no nº 2.1 supra, sendo certo que a questão central, em causa, nos presentes autos, relativamente à qual existem entendimentos absolutamente opostos entre a Requerente e a AT, consiste em saber se o nº 1 do artigo 3º do CIUC relativo à incidência subjetiva do imposto único de circulação consagra ou não uma presunção ilidível.
4.5 Tudo analisado e, tendo em conta, por um lado, as posições das partes em confronto, mencionadas nos pontos 1.3 e 1.4 supra e, considerando, por outro lado que a questão central a decidir é a de saber se o nº 1 do artigo 3º do CIUC consagra ou não uma presunção legal de incidência tributária, cumpre, neste contexto, apreciar e proferir decisão.
5 QUESTÃO DA ERRADA INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO DA NORMA DE INCIDÊNCIA SUBJETIVA DO IUC
5.1 Considerando ser pacífico o entendimento, na doutrina, de que na interpretação das leis fiscais valem plenamente os princípios gerais de interpretação os quais serão, apenas e naturalmente, limitados pelas exceções e particularidades ditadas pela própria Lei, objeto de interpretação. Trata-se de um entendimento que tem vindo a merecer acolhimento nas Leis Gerais Tributárias de outros países e que veio também a ter assento no artigo 11º da nossa Lei Geral Tributária, o que vem, aliás, sendo frequentemente sublinhado pela jurisprudência.
É consensualmente aceite que tendo em vista a apreensão do sentido da lei, a interpretação socorre-se, a priori, em reconstruir o pensamento legislativo através das palavras da lei, o que significa, procurar o seu sentido literal, valorando-o e aferindo-o à luz de outros critérios, intervindo, os designados elementos de natureza lógica, racional ou teleológicos e de ordem sistemática:
- A propósito da interpretação da lei fiscal, há a considerar a jurisprudência, nomeadamente, os Acórdãos do STA de 05-09-2012, processo nº 0314/12 e de 06-02-2013, processo 01000/12, disponíveis em www.dgsi.pt, a importância do disposto no artigo 9º do Código Civil (CC), enquanto elemento fundamental da hermenêutica jurídica;
- Dispõe o nº 1 do artigo 3º do CIUC que “ São sujeitos passivos do imposto os proprietários dos veículos, considerando-se como tais as pessoas singulares ou coletivas, de direito público ou privado, em nome das quais os mesmos se encontrem registados”;
- A formulação usada no referido, artigo, socorre-se da expressão “considerando-se” o que suscita a questão de saber se, a tal expressão pode ser atribuído um sentido presuntivo, equiparando-se à expressão “presumindo-se”, trata-se de expressões frequentemente utilizadas, com sentidos equivalentes;
- Como ensina Jorge Lopes de Sousa, in Código do Procedimento e do Processo Tributário, Anotado e Comentado, volume I , 6ª Edição, Área Editora, SA, Lisboa 2011, p. 589, que em matéria de incidência tributária, as presunções podem ser reveladas pela expressão “presume-se” ou por expressão semelhante, aí se mencionando diversos exemplos dessas presunções, referindo-se a constante no artigo 40º, nº 1 do CIRS, em que se usa a expressão “ presume-se” e a constante no artigo 46º nº 2, do mesmo Código, em que se faz uso da expressão “considera-se”, enquanto expressão com um efeito semelhante àquela e consubstanciando, igualmente, uma presunção;
- Na formulação legal exarada no nº 1 do artigo 3º do CIUC, em que se consagrou uma presunção, revelada pela expressão “considerando-se”, de significado semelhante e de valor equivalente à expressão “presumindo-se”, em uso desde a criação do imposto em questão;
- O uso da expressão “considerando-se” mais não visou do que o estabelecimento de uma aproximação mais vincada e nítida entre o sujeito passivo do IUC e o efectivo proprietário do veículo, o que está em sintonia com o reforço conferido `a propriedade do veículo, que passou a constituir o facto gerador do imposto, nos termos do artigo 6º do CIUC;
- A relevância e o interesse da presunção, em causa, que historicamente foi revelado por intermédio da expressão “presumindo-se” e que agora, se serve da expressão “considerando-se”, reside na verdade e na justiça que, por essa via, se confere às relações fiscais e, que corporizam valores fiscais fundamentais, permitindo tributar o real e efectivo proprietário e não aquele que, por circunstâncias de diversa natureza, não passa, por vezes, de um aparente e falso proprietário. Se o caso, assim não fosse considerado, não se admitindo e relevando a apresentação de elementos probatórios destinados à demonstração de que o efectivo proprietário é, afinal, pessoa diferente da que consta do registo e, que inicialmente, e em princípio, se supunha ser o verdadeiro proprietário, aqueles valores seriam objectivamente postergados.
5.2 Há a considerar, também, o princípio da equivalência, inscrito no artigo 1º do CIUC, que tem subjacente o princípio do poluidor-pagador e, concretiza a ideia nele inscrita de que quem polui deve, por isso, pagar. O referido principio tem assento constitucional, na medida em que representa um corolário do disposto na alínea h) do nº 2 do artigo 66º da constituição, tendo, também, assento no direito comunitário, seja ao nível do direito originário, artigo 130º-R, do Tratado de Maastrich (Tratado da União Europeia, de 07-02-1992), onde o aludido principio passou a constar como suporte da Politica Comunitária, no domínio ambiental e que visa responsabilizar quem contribui com os prejuízos que advêm para a comunidade, decorrentes da utilização dos veículos automóveis, sejam assumidos pelos seus proprietários-utilizadores, como custos que só eles devem suportar.
5.3 Atentos os factos supra descritos, importa salientar que os já referidos elementos de interpretação, sejam os relacionados com a interpretação literal, apoiada nas palavras legalmente utilizadas, sejam as respeitantes aos elementos lógicos de interpretação, de natureza histórica ou de ordem racional, apontam, todos eles, no sentido de que a expressão “considerando-se” tem um sentido equivalente à expressão “presumindo-se”, devendo, assim entender-se que o disposto no nº 1 do artigo 3º do CIUC consagra uma presunção legal que, face ao artigo 73º da LGT, onde se estabelece que “As presunções consagradas nas normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário”, será necessariamente ilidível, o que significa que os sujeitos passivos são, em princípio, as pessoas em nome de quem tais veículos estejam registados. Serão, pois, essas pessoas, identificadas nessas condições a quem a AT se deve, necessariamente, dirigir;
- Mas será, em princípio, dado que no quadro de audição prévia, de carácter obrigatório, face ao disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 60º da LGT, a relação tributária poderá ser reconfigurada, validando-se o sujeito passivo inicialmente identificado ou redireccionando-se o procedimento no sentido daquele que for, afinal, o verdadeiro e efectivo, sujeito passivo do imposto em causa;
- O contribuinte tem o direito de ser ouvido, mediante audição prévia (José Manuel Santos Botelho, Américo Pires Esteves e José Cândido de Pinho, in Código do Procedimento Administrativo, Anotado e Comentado, 4ª edição, Almedina, 2000, anotação 8 do artigo 100º);
- A audição prévia que, naturalmente, se há de concretizar em momento imediatamente anterior ao procedimento da liquidação, corresponde à sede e altura própria para, com certeza e segurança se identificar o sujeito passivo do IUC.
6 SOBRE O VALOR JURÍDICO DO REGISTO
6.1 Relativamente ao valor jurídico do registo, importa notar o que estabelece o nº 1 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 54/75, de 12 de Fevereiro (diversas vezes alterado, sendo a última por via da Lei nº 39/2008, de 11 de Agosto), quando estatui que “ o registo de veículos tem essencialmente por fim dar publicidade à situação jurídica dos veículos a motor e respectivos reboques, tendo em vista a segurança do comércio jurídico”:
- O artigo 7º do Código do Registo Predial (CRP), aplicável, supletivamente, ao registo de automóveis, por força do artigo 29º do CRA, dispõe que” O registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define”;
- O registo definitivo não constitui mais do que uma presunção ilidível, admitindo, por isso, contraprova, como decorre da lei e a jurisprudência vem assinalando, podendo ver-se, entre outros os Acórdãos do STJ nº 03B4369 de 19-02-2004 e nº 07B4528, de 29-01-2008, disponíveis em: www.dgsi.pt;
- Portanto, a função legalmente reservada ao registo é por um lado a de publicitar a situação jurídica dos bens, no caso em apreço, dos veículos e, por outro lado, permite-nos presumir que existe o direito sobre esses veículos e que o mesmo pertence ao titular, como tal inscrito no registo, não tem uma natureza constitutiva do direito de propriedade, mas apenas declarativa, daí que o registo não constitua condição de validade da transmissão do veículo do vendedor para o comprador;
- Os adquirentes dos veículos tornam-se proprietários desses mesmos veículos por via da celebração dos correspondentes contratos de compra e venda, com registo ou sem ele, bem como, ex vi, dos contratos de locação financeira ( nº 2 do artigo 3º do CIUC);
- Neste contexto cabe lembrar que, face ao disposto no nº 1 do artigo 408º do CC, a transferência de direitos reais sobre as coisas, pelo que, no âmbito do caso controvertido, o veículo automóvel, é determinado por mero efeito do contrato, sendo que nos termos do disposto na alínea a) do artigo 879º do CC, entre os efeitos essenciais do contrato de compra e venda e de Locação Financeira, avulta a transmissão da coisa;
- Face ao exposto, torna-se claro que o pensamento legislativo aponta no sentido de que o disposto no nº 1 do artigo 3º do CIUC, consagra uma presunção “juris tantum, consequentemente ilidível, permitindo, assim, que a pessoa, que, no registo, está inscrita como proprietária do veículo, possa apresentar elementos de prova destinados a demonstrar que tal propriedade está inserida na esfera jurídica de outra pessoa, para quem a propriedade foi transferida.
7 A PRESUNÇÃO DO ARTIGO 3ºDO CIUC E A DATA EM QUE O IUC É EXIGIVEL
7.1 A PRESUNÇÃO DO ARTIGO 3º DO CIUC
- A AT considera que a presunção que existe no nº 1 do artigo 3º do CIUC é decorrente de uma interpretação contra legem, decorrente de uma leitura enviesada da letra da lei e, por isso, violadora da unidade do sistema jurídico, contudo, e salvo o respeito devido, o entendimento da jurisprudência vai no sentido de que se deve considerar a existência de uma presunção legalmente ilidível, pelo que, consequentemente, serve os valores e interesses questionados, quer ao nível da justiça fiscal material, quer ao nível das finalidades ambientais visadas pelo IUC;
- No referente à unidade do sistema jurídico é de relevar tudo o que foi supracitado, nomeadamente, sobre o ratio do artigo 1º do CIUC; sobre as normas e princípios da LGT; sobre as normas pertinentes e aplicáveis ao registo de veículos automóveis, sobre a interpretação que melhor serve e alcança a mencionada unidade e assegura a conexão dessas mesmas normas, considerando-se a presunção legal que se encontra preceituado no artigo 3º do CIUC.
7.2 DATA EM QUE O IUC É EXIGÍVEL
- O IUC é um imposto de tributação periódica, cuja periodicidade corresponde ao ano que se inicia no ato da matrícula ou em cada um dos seus aniversários, conforme o disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 4º do CIUC;
- É exigível nos termos do nº 3 do artigo 6º do referido Código;
- Sendo de referir que, quanto à liquidação do IUC tributado à Requerente sobre os veículos, supra referenciados, nos anos de 2009 a 2012, não é de considerar, porque ao momento do facto tributário as viaturas já não lhe pertenciam, uma vez que os referidos veículos, estavam na posse dos locatários/utilizadores das correspondentes viaturas, cfr. os documentos probatórios, já supra citados e, anexos às reclamações graciosas (constante no PA e da PI) que se dão por integralmente reproduzidas para todos os efeitos legais.
7.2.1 Em relevância sobre o ónus da prova, estipula o artigo 342º nº 1 do CC: “àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado”;
7.2.2 Também o artigo 346º do CC (contra prova) determina, que “à prova que for produzida pela parte sobre quem recai o ónus probatório pode a parte contrária opor contra prova a respeito dos mesmos factos, destinados a torná-los duvidosos; se o conseguir, é a questão decidida contra a parte onerada com a prova.” (Como afirma Anselmo de Castro, A., 1982, ED. Almedina Coimbra, “Direito Processual Civil Declaratório”, III, p. 163, “recaindo sobre uma das partes ónus probatório, à parte contrária basta opor contra prova, sendo esta uma prova destinada a tornar duvidosa os factos alegados pela primeira”.
Assim, no caso dos autos, o que a Requerente tem que provar, afim de ilidir a presunção que decorre quer do artigo 3º do CIUC quer do próprio Registo Automóvel, é que ela Requerente não era proprietária do veículo, em causa, no período a que dizem respeito as liquidações impugnadas. Propõe provar, segundo resulta dos autos, é que a propriedade dos correspondentes veículos, não lhe pertenciam no período a que as liquidações dizem respeito, cfr., documentos anexos às Reclamações Graciosas, constantes do PA e da PI, que se dão por integralmente reproduzidas para todos os efeitos legais.
7.3 ILISÃO DA PRESUNÇÃO
- A Requerente, como se refere em 3.1., relativamente aos factos provados, alegou, com o propósito de afastar a presunção, não ser proprietária dos correspondentes veículos, aquando da ocorrência do facto tributário, oferecendo para o efeito o seguinte documento;
- Documentos probatórios, nºs 1 a 43, junto aos autos;
- Desta forma, a propriedade do referido veículo, já não lhe pertenciam, não podendo, por isso usufruir da sua utilização, desde data anterior aquela em que o IUC era exigível, corporizando, assim, meios de prova com força bastante e adequada para ilidir a presunção fundada no registo, conforme o preceituado no nº 1 e 2 do artigo 3º do CIUC, documentos, esses, que gozam, da presunção da veracidade prevista no nº 1 do artigo 75º da LGT. Decorrendo daqui, que à data em que o IUC era exigível quem detinha a propriedade do veículo automóvel não era a Requerente
8 OUTRAS QUESTÕES RELATIVAS À LEGALIDADE DOS ATOS DE LIQUIDAÇÃO
- Relativamente à existência de outras questões atinentes à legalidade dos atos de liquidação, tendo em conta que está ínsito no estabelecimento de uma ordem de conhecimentos dos vícios, tal como o previsto no artigo 124º do CPPT, que procedendo o pedido de pronúncia arbitral baseado em vícios que impedem a renovação das liquidações impugnadas, fica prejudicado, porque inútil, o conhecimento de outros vícios, não se afigura necessário conhecer das demais questões suscitadas.
9 REEMBOLSO DO MONTANTE TOTAL PAGO
- Nos termos do disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 24º do RJAT e, em conformidade com o aí estabelecido, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação, vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exatos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários “Restabelecer a situação que existiria se o ato tributário, objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os atos e operações necessários para o efeito”
- Trata-se de comandos legais que se encontram em total sintonia com o disposto no artigo 100º da LGT, aplicável ao caso, ex vi, do disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 29º do RJAT, no qual se estabelece que “ A administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, correspondendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei”.
- O caso constante nos presentes autos, suscita a manifesta aplicação das mencionadas normas, posto que na sequência da ilegalidade dos atos de liquidação, referenciados, neste processo, terá, por força dessas normas, de haver lugar ao reembolso dos montantes pagos, seja a título do imposto pago, seja dos correspondentes juros compensatórios, como forma de alcançar a reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade.
10 DO DIREITO A JUROS INDEMNIZATÓRIOS
- A declaração da ilegalidade e consequente anulação do ato administrativos confere ao destinatário do ato o direito à reintegração da situação em que o mesmo se encontraria antes da execução do ato anulado.
- No âmbito da liquidação do imposto, a sua anulação confere ao sujeito passivo o direito à restituição do imposto pago e, em regra o direito a juros indemnizatórios, nos termos do nº 1 do artigo 43º da LGT e artigo 61º do CPPT.
- Pelo que tem, a Requerente, direito a juros indemnizatórios sobre o montante de imposto pago, referente às liquidações anuladas.
11 DECISÃO
Face ao exposto, este Tribunal Arbitral decide:
- Julgar procedente o pedido de declaração da ilegalidade da liquidação do IUC, respeitante aos anos de 2009 a 2012 (consubstanciados nas citadas Reclamações Graciosas) relativamente aos veículos automóveis identificados e controvertidos no presente processo, anulando-se, consequentemente, os correspondentes atos tributários;
- Julgar procedente o pedido de condenação da Administração Tributária no reembolso da quantia indevidamente paga, no montante de 4 870,61 Euros, acrescidos dos respetivos juros indemnizatórios, legalmente devidos, condenando a Autoridade Tributária e Aduaneira a efectuar estes pagamentos.
VALOR DO PROCESSO:
- Em conformidade com o disposto nos artigos 306º nº 2 do CPC e 97º-A, nº 1 do CPPT e no artigo 3º, nº 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de 4 870,61 Euros.
CUSTAS:
- De harmonia com o nº 4 do artigo 22º do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 612,00, nos termos da Tabela I, anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária Aduaneira.
Notifique-se, as partes.
Lisboa, 10-11-2017
O Árbitro
Maria de Fátima Alves
(o texto da presente decisão foi elaborado em computador, nos termos do artigo 131, nº 5 do Código do Processo Civil, aplicável por remissão do artigo 29º, nº 1 alínea e) do Decreto-Lei 10/2011, de 20 de Janeiro (RJAT), regendo-se a sua redacção pela ortografia atual)
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Decisão Arbitral
1 RELATÓRIO
11.1 – A..., S.A., Pessoa Coletiva com o nº: ..., Reclamante no procedimento tributário, acima e à margem referenciado, doravante, denominada “Requerente”, veio, invocando o disposto nos artigos 2º, nº 1, alínea a) e 10º do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante RJAT) e, no artigo 99º do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT) e nos números 1 e 2 alínea d) do artigo 95º da Lei Geral Tributária (LGT), requerer a constituição do Tribunal Arbitral Singular, com vista a:
- A anulação dos atos de liquidação relativo ao Imposto Único de Circulação (doravante designado por IUC), referente aos anos fiscais de 2009 e 2012 (cfr.,documento nº 1, junto a PI e, que se dão por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).
- O reembolso do valor total de €4 870,61, acrescidos dos respetivos juros indemnizatórios previstos nos artigos 43º da LGT e no artigo 61º do CPPT.
11.2 Nos termos do disposto na alínea a) do nº 2 do artigo 6º e da alínea b) do nº 1 do artigo 11º do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro, na redacção introduzida pelo artigo 228º da Lei nº 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitro singular Maria de Fátima Alves, que comunicou a aceitação do encargo, no prazo aplicável:
- Em 21-12-2015 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do artigo 11º nº 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6º e 7º do Código Deontológico,
- Pelo que, o tribunal arbitral foi constituído, conforme o preceituado na alínea c) do nº 1 do artigo 11º do Decreto-Lei nº10/2011,de 20 de Janeiro, na redacção introduzida pelo artigo 228º da Lei 66-B/2012, de 31 de Dezembro;
- Consequentemente foi determinado a prolação da Decisão Arbitral para o dia 01-02-2016.
11.3 A Requerente, na fundamentação do seu pedido de pronúncia arbitral, afirma, em resumo, o seguinte:
- As viaturas, a que respeitam o imposto único de circulação liquidado, não eram, à data, do facto tributário, propriedade da Requerente, não sendo, a mesma, sujeito passivo do imposto, facto que lhe veda qualquer responsabilidade subjectiva pelo seu pagamento;
- A Requerente fundamenta a sua posição no facto de os referidos veículos automóveis tributados, se encontrarem ao abrigo de Contratos de Locação Financeira, cfr., o descrito nos documentos probatórios nº 1 a 43 (anexos I a IV e anexo V) junto às Reclamação Graciosa, constantes do PA, que se dão por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais);
- Que o CIUC é um imposto de circulação com o pressuposto do princípio da equivalência, previsto no nº1º do mesmo Diploma Legal (CIUC);
Pelo que, não pode ser imputado à Requerente a propriedade dos referidos veículos, uma vez que, aquando dos “contratos de locação financeira” se deu a transmissão da referida propriedade para o actual proprietário;
Com a transferência do veículo, o mesmo deixou de estar na sua posse o que lhe retira a figura do “poluidor/pagador, não podendo, assim, ser sujeito passivo do imposto, face à letra e espírito do artigo 3º do Código do Imposto Único de Circulação;
- É um facto que o artigo 3º do CIUC, considera a propriedade do veículo automóvel, a pessoa em nome do qual o mesmo se encontre registado;
- Contudo, os registos dos veículos na competente Conservatória do Registo Automóvel, não é condição de transmissão de propriedade, uma vez que tal registo visa, somente, dar publicidade à situação jurídica dos bens, conforme resulta, designadamente, do preceituado no artigo nº 1 do Decreto-Lei nº 54/75, de 12 de Fevereiro;
- Pelo que a tributação tributária relativa ao CIUC não pode apenas incidir sobre quem conste no registo como proprietário dos veículos, há que considerar os seus efetivos proprietários, mediante presunção ilidível.
11.4 A Requerida, Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada por AT), procedeu à junção do Processo Administrativo Tributário e apresentou Resposta, da qual se retira que, os atos tributários, em crise, não enfermam de qualquer vício de violação de Lei, pronunciando-se pela improcedência da requerida e pela manutenção dos atos de liquidação questionado, defendendo, sumariamente o seguinte:
- Os sujeitos passivos do imposto único de circulação são as pessoas que figuram no registo como proprietários dos veículos, conforme o disposto no nº1 do artigo 3º do CIUC, o que no caso, “sub judice”, se verifica quanto à Requerente;
- Verificando-se, para tal, que o registo do veículo esteja em nome de uma determinada pessoa para que a mesma corporize a posição de sujeito passivo da obrigação fiscal de IUC;
- Que notoriamente é errada a interpretação que a Requerente faz do preceituado no artigo 3º do CIUC, na medida em que incorre numa” interpretação enviesada da letra lei” e na adoção “ de uma interpretação que não atende ao elemento sistemático, visando a unidade do regime consagrado em todo o CIUC e, mais amplamente, em todo o sistema jurídico-fiscal”, seguindo, ainda, a Requerente, uma “interpretação que ignora a ratio do regime consagrado no artigo, em apreço e, bem assim em todo o CIUC”.
12 QUESTÕES DECIDENDAS
12.1 Face ao exposto nos números anteriores, relativamente à exposição escrita, das partes e, aos argumentos apresentados, as principais questões a decidir são as seguintes:
- A impugnação feita pela Requerente relativa à liquidação material dos atos de liquidação, relativamente aos anos de 2009 a 2012, referente ao IUC sobre os veículos melhor referenciados nos autos;
- A errada interpretação e aplicação das normas de incidência subjetiva do imposto único de circulação liquidado e cobrado, o que constitui, a questão central a decidir no presente processo;
- O valor jurídico do registo do veículo automóvel.
13 FUNDAMENTOS DE FACTO
13.1 Em matéria de facto, relevante para a decisão a proferir, dá o presente Tribunal por assente, face aos elementos existentes nos autos, os seguintes factos:
- A Requerente apresentou elementos probatórios dos veículos automóveis, em questão, cfr. Documentos nºs 1 a 43, consubstanciados nos anexos, I a IV e V (constantes no PA), que se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais;
- Provando que os referidos veículos se encontravam abrangidos juridicamente pelos Contratos de Locação Financeira (Anexo V);
- Considerando-se, por isso, que os titulares da propriedade serão os locatários por serem os seus verdadeiros possuidores dos veículos automóveis, “in casu”(nº 2 do artigo 3º do CIUC).
3.1.1 FUNDAMENTAÇÃO DOS ATOS PROVADOS
- Os factos dados como provados estão baseados nos anexos I a IV e V, juntos às Reclamações Graciosas (constantes do PA e PI), que se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais.
3.1.2 FACTOS NÃO PROVADOS
- Não existem factos dados como não provados, dado que todos os factos tidos como relevantes para a apreciação do pedido foram provados.
14 FUNDAMENTOS DE DIREITO
14.1 O Tribunal é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2º nº 1, alínea a), 5º nº 2, alínea a), 6º nº 1, 10º nº1,alínea a) e nº 2 do RJAT:
- As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária e são legítimas, ex vi, artigos 4º e 10º, nº 2, do RJAT e artigo nº 1 da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de Março;
- O processo não enferma de nulidades;
- Não existindo questão prévia sobre a qual o Tribunal se deva pronunciar.
14.2 O pedido, objecto do presente processo é a declaração de anulação dos atos de liquidação do IUC relativo aos veículos automóveis melhor identificado nos autos.
14.2.1 Condenação da AT ao reembolso do montante do imposto relativo a tal liquidação no valor de € 4 870,61;
14.2.2 Condenação da AT ao pagamento de juros indemnizatórios sobre o mesmo montante.
14.3 Segundo o entendimento da AT, basta que no registo, o veículo conste como propriedade de uma determinada pessoa, para que essa pessoa seja o sujeito passivo da obrigação tributária.
14.4 A matéria de facto está fixada, tal como consta do nº 3.1 supra, importando, agora, determinar o Direito aplicável aos factos subjacentes, de acordo com as questões decidendas, identificadas no nº 2.1 supra, sendo certo que a questão central, em causa, nos presentes autos, relativamente à qual existem entendimentos absolutamente opostos entre a Requerente e a AT, consiste em saber se o nº 1 do artigo 3º do CIUC relativo à incidência subjetiva do imposto único de circulação consagra ou não uma presunção ilidível.
14.5 Tudo analisado e, tendo em conta, por um lado, as posições das partes em confronto, mencionadas nos pontos 1.3 e 1.4 supra e, considerando, por outro lado que a questão central a decidir é a de saber se o nº 1 do artigo 3º do CIUC consagra ou não uma presunção legal de incidência tributária, cumpre, neste contexto, apreciar e proferir decisão.
15 QUESTÃO DA ERRADA INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO DA NORMA DE INCIDÊNCIA SUBJETIVA DO IUC
15.1 Considerando ser pacífico o entendimento, na doutrina, de que na interpretação das leis fiscais valem plenamente os princípios gerais de interpretação os quais serão, apenas e naturalmente, limitados pelas exceções e particularidades ditadas pela própria Lei, objeto de interpretação. Trata-se de um entendimento que tem vindo a merecer acolhimento nas Leis Gerais Tributárias de outros países e que veio também a ter assento no artigo 11º da nossa Lei Geral Tributária, o que vem, aliás, sendo frequentemente sublinhado pela jurisprudência.
É consensualmente aceite que tendo em vista a apreensão do sentido da lei, a interpretação socorre-se, a priori, em reconstruir o pensamento legislativo através das palavras da lei, o que significa, procurar o seu sentido literal, valorando-o e aferindo-o à luz de outros critérios, intervindo, os designados elementos de natureza lógica, racional ou teleológicos e de ordem sistemática:
- A propósito da interpretação da lei fiscal, há a considerar a jurisprudência, nomeadamente, os Acórdãos do STA de 05-09-2012, processo nº 0314/12 e de 06-02-2013, processo 01000/12, disponíveis em www.dgsi.pt, a importância do disposto no artigo 9º do Código Civil (CC), enquanto elemento fundamental da hermenêutica jurídica;
- Dispõe o nº 1 do artigo 3º do CIUC que “São sujeitos passivos do imposto os proprietários dos veículos, considerando-se como tais as pessoas singulares ou coletivas, de direito público ou privado, em nome das quais os mesmos se encontrem registados”;
- A formulação usada no referido, artigo, socorre-se da expressão ”considerando-se” o que suscita a questão de saber se, a tal expressão pode ser atribuído um sentido presuntivo, equiparando-se à expressão “presumindo-se”, trata-se de expressões frequentemente utilizadas, com sentidos equivalentes;
- Como ensina Jorge Lopes de Sousa, in Código do Procedimento e do Processo Tributário, Anotado e Comentado, volume I, 6ª Edição, Área Editora, SA, Lisboa 2011, p. 589, que em matéria de incidência tributária, as presunções podem ser reveladas pela expressão “presume-se” ou por expressão semelhante, aí se mencionando diversos exemplos dessas presunções, referindo-se a constante no artigo 40º, nº 1 do CIRS, em que se usa a expressão “ presume-se” e a constante no artigo 46º nº 2, do mesmo Código, em que se faz uso da expressão “considera-se”, enquanto expressão com um efeito semelhante àquela e consubstanciando, igualmente, uma presunção;
- Na formulação legal exarada no nº 1 do artigo 3º do CIUC, em que se consagrou uma presunção, revelada pela expressão “considerando-se”, de significado semelhante e de valor equivalente à expressão” presumindo-se”, em uso desde a criação do imposto em questão;
- O uso da expressão “considerando-se” mais não visou do que o estabelecimento de uma aproximação mais vincada e nítida entre o sujeito passivo do IUC e o efectivo proprietário do veículo, o que está em sintonia com o reforço conferido `a propriedade do veículo, que passou a constituir o facto gerador do imposto, nos termos do artigo 6º do CIUC;
- A relevância e o interesse da presunção, em causa, que historicamente foi revelado por intermédio da expressão “presumindo-se” e que agora, se serve da expressão “considerando-se”, reside na verdade e na justiça que, por essa via, se confere às relações fiscais e, que corporizam valores fiscais fundamentais, permitindo tributar o real e efectivo proprietário e não aquele que, por circunstâncias de diversa natureza, não passa, por vezes, de um aparente e falso proprietário. Se o caso, assim não fosse considerado, não se admitindo e relevando a apresentação de elementos probatórios destinados à demonstração de que o efectivo proprietário é, afinal, pessoa diferente da que consta do registo e, que inicialmente, e em princípio, se supunha ser o verdadeiro proprietário, aqueles valores seriam objectivamente postergados.
15.2 Há a considerar, também, o princípio da equivalência, inscrito no artigo 1º do CIUC, que tem subjacente o princípio do poluidor-pagador e, concretiza a ideia nele inscrita de que quem polui deve, por isso, pagar. O referido princípio tem assento constitucional, na medida em que representa um corolário do disposto na alínea h) do nº 2 do artigo 66º da constituição, tendo, também, assento no direito comunitário, seja ao nível do direito originário, artigo 130º-R, do Tratado de Maastrich (Tratado da União Europeia, de 07-02-1992), onde o aludido princípio passou a constar como suporte da Politica Comunitária, no domínio ambiental e que visa responsabilizar quem contribui com os prejuízos que advêm para a comunidade, decorrentes da utilização dos veículos automóveis, sejam assumidos pelos seus proprietários-utilizadores, como custos que só eles devem suportar.
15.3 Atentos os factos supra descritos, importa salientar que os já referidos elementos de interpretação, sejam os relacionados com a interpretação literal, apoiada nas palavras legalmente utilizadas, sejam as respeitantes aos elementos lógicos de interpretação, de natureza histórica ou de ordem racional, apontam, todos eles, no sentido de que a expressão “considerando-se” tem um sentido equivalente à expressão “presumindo-se”, devendo, assim entender-se que o disposto no nº 1 do artigo 3º do CIUC consagra uma presunção legal que, face ao artigo 73º da LGT, onde se estabelece que “As presunções consagradas nas normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário”, será necessariamente ilidível, o que significa que os sujeitos passivos são, em princípio, as pessoas em nome de quem tais veículos estejam registados. Serão, pois, essas pessoas, identificadas nessas condições a quem a AT se deve, necessariamente, dirigir;
- Mas será, em princípio, dado que no quadro de audição prévia, de carácter obrigatório, face ao disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 60º da LGT, a relação tributária poderá ser reconfigurada, validando-se o sujeito passivo inicialmente identificado ou redireccionando-se o procedimento no sentido daquele que for, afinal, o verdadeiro e efectivo, sujeito passivo do imposto em causa.
- O contribuinte tem o direito de ser ouvido, mediante audição prévia (José Manuel Santos Botelho, Américo Pires Esteves e José Cândido de Pinho, in Código do Procedimento Administrativo, Anotado e Comentado, 4ª edição, Almedina, 2000, anotação 8 do artigo 100º).
- A audição prévia que, naturalmente, se há de concretizar em momento imediatamente anterior ao procedimento da liquidação, corresponde à sede e altura própria para, com certeza e segurança se identificar o sujeito passivo do IUC.
16 SOBRE O VALOR JURíDICO DO REGISTO
16.1 Relativamente ao valor jurídico do registo, importa notar o que estabelece o nº 1 do artigo 1º do Decreto-Lei nº 54/75, de 12 de Fevereiro (diversas vezes alterado, sendo a última por via da Lei nº 39/2008, de 11 de Agosto), quando estatui que “o registo de veículos tem essencialmente por fim dar publicidade à situação jurídica dos veículos a motor e respectivos reboques, tendo em vista a segurança do comércio jurídico”:
- O artigo 7º do Código do Registo Predial (CRP), aplicável, supletivamente, ao registo de automóveis, por força do artigo 29º do CRA, dispõe que” O registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define”;
- O registo definitivo não constitui mais do que uma presunção ilidível, admitindo, por isso, contraprova, como decorre da lei e a jurisprudência vem assinalando, podendo ver-se, entre outros os Acórdãos do STJ nº 03B4369 de 19-02-2004 e nº 07B4528, de 29-01-2008, disponíveis em: www.dgsi.pt;
- Portanto, a função legalmente reservada ao registo é por um lado a de publicitar a situação jurídica dos bens, no caso em apreço, dos veículos e, por outro lado, permite-nos presumir que existe o direito sobre esses veículos e que o mesmo pertence ao titular, como tal inscrito no registo, não tem uma natureza constitutiva do direito de propriedade, mas apenas declarativa, daí que o registo não constitua condição de validade da transmissão do veículo do vendedor para o comprador;
- Os adquirentes dos veículos tornam-se proprietários desses mesmos veículos por via da celebração dos correspondentes contratos de compra e venda, com registo ou sem ele, bem como, ex vi, dos contratos de locação financeira (nº 2 do artigo 3º do CIUC);
- Neste contexto cabe lembrar que, face ao disposto no nº 1 do artigo 408º do CC, a transferência de direitos reais sobre as coisas, pelo que, no âmbito do caso controvertido, o veículo automóvel, é determinado por mero efeito do contrato, sendo que nos termos do disposto na alínea a) do artigo 879º do CC, entre os efeitos essenciais do contrato de compra e venda e de Locação Financeira, avulta a transmissão da coisa;
- Face ao exposto, torna-se claro que o pensamento legislativo aponta no sentido de que o disposto no nº 1 do artigo 3º do CIUC, consagra uma presunção “juris tantum, consequentemente ilidível, permitindo, assim, que a pessoa, que, no registo, está inscrita como proprietária do veículo, possa apresentar elementos de prova destinados a demonstrar que tal propriedade está inserida na esfera jurídica de outra pessoa, para quem a propriedade foi transferida.
17 A PRESUNÇÃO DO ARTIGO 3ºDO CIUC E A DATA EM QUE O IUC É EXIGIVEL
17.1 A PRESUNÇÃO DO ARTIGO 3º DO CIUC
- A AT considera que a presunção que existe no nº 1 do artigo 3º do CIUC é decorrente de uma interpretação contra legem, decorrente de uma leitura enviesada da letra da lei e, por isso, violadora da unidade do sistema jurídico, contudo, e salvo o respeito devido, o entendimento da jurisprudência vai no sentido de que se deve considerar a existência de uma presunção legalmente ilidível, pelo que, consequentemente, serve os valores e interesses questionados, quer ao nível da justiça fiscal material, quer ao nível das finalidades ambientais visadas pelo IUC;
- No referente à unidade do sistema jurídico é de relevar tudo o que foi supracitado, nomeadamente, sobre o ratio do artigo 1º do CIUC; sobre as normas e princípios da LGT; sobre as normas pertinentes e aplicáveis ao registo de veículos automóveis, sobre a interpretação que melhor serve e alcança a mencionada unidade e assegura a conexão dessas mesmas normas, considerando-se a presunção legal que se encontra preceituado no artigo 3º do CIUC.
17.2 DATA EM QUE O IUC É EXIGÍVEL
- O IUC é um imposto de tributação periódica, cuja periodicidade corresponde ao ano que se inicia no ato da matrícula ou em cada um dos seus aniversários, conforme o disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 4º do CIUC;
- É exigível nos termos do nº 3 do artigo 6º do referido Código;
- Sendo de referir que, quanto à liquidação do IUC tributado à Requerente sobre os veículos, supra referenciados, nos anos de 2009 a 2012, não é de considerar, porque ao momento do facto tributário as viaturas já não lhe pertenciam, uma vez que os referidos veículos, estavam na posse dos locatários/utilizadores das correspondentes viaturas, cfr. os documentos probatórios, já supra citados e, anexos às reclamações graciosas (constante no PA e da PI) que se dão por integralmente reproduzidas para todos os efeitos legais.
17.2.1 Em relevância sobre o ónus da prova, estipula o artigo 342º nº 1 do CC: “àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado”;
17.2.2 Também o artigo 346º do CC (contra prova) determina, que “à prova que for produzida pela parte sobre quem recai o ónus probatório pode a parte contrária opor contra prova a respeito dos mesmos factos, destinados a torná-los duvidosos; se o conseguir, é a questão decidida contra a parte onerada com a prova.” (Como afirma Anselmo de Castro, A., 1982, ED. Almedina Coimbra, “Direito Processual Civil Declaratório”, III, p. 163, “recaindo sobre uma das partes ónus probatório, à parte contrária basta opor contra prova, sendo esta uma prova destinada a tornar duvidosa os factos alegados pela primeira”.
Assim, no caso dos autos, o que a Requerente tem que provar, afim de ilidir a presunção que decorre quer do artigo 3º do CIUC quer do próprio Registo Automóvel, é que ela Requerente não era proprietária do veículo, em causa, no período a que dizem respeito as liquidações impugnadas. Propõe provar, segundo resulta dos autos, é que a propriedade dos correspondentes veículos, não lhe pertenciam no período a que as liquidações dizem respeito, cfr., documentos anexos às Reclamações Graciosas, constantes do PA e da PI, que se dão por integralmente reproduzidas para todos os efeitos legais.
17.3 ILISÃO DA PRESUNÇÃO
- A Requerente, como se refere em 3.1., relativamente aos factos provados, alegou, com o propósito de afastar a presunção, não ser proprietária dos correspondentes veículos, aquando da ocorrência do facto tributário, oferecendo para o efeito o seguinte documento:
- Documentos probatórios, nºs 1 a 43, junto aos autos;
- Desta forma, a propriedade do referido veículo, já não lhe pertenciam, não podendo, por isso usufruir da sua utilização, desde data anterior aquela em que o IUC era exigível, corporizando, assim, meios de prova com força bastante e adequada para ilidir a presunção fundada no registo, conforme o preceituado no nº 1 e 2 do artigo 3º do CIUC, documentos, esses, que gozam, da presunção da veracidade prevista no nº 1 do artigo 75º da LGT. Decorrendo daqui, que à data em que o IUC era exigível quem detinha a propriedade do veículo automóvel não era a Requerente
18 OUTRAS QUESTÕES RELATIVAS À LEGALIDADE DOS ATOS DE LIQUIDAÇÃO
- Relativamente à existência de outras questões atinentes à legalidade dos atos de liquidação, tendo em conta que está ínsito no estabelecimento de uma ordem de conhecimentos dos vícios, tal como o previsto no artigo 124º do CPPT, que procedendo o pedido de pronúncia arbitral baseado em vícios que impedem a renovação das liquidações impugnadas, fica prejudicado, porque inútil, o conhecimento de outros vícios, não se afigura necessário conhecer das demais questões suscitadas.
19 REEMBOLSO DO MONTANTE TOTAL PAGO
- Nos termos do disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 24º do RJAT e, em conformidade com o aí estabelecido, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação, vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exatos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários ”Restabelecer a situação que existiria se o ato tributário, objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os atos e operações necessários para o efeito”
- Trata-se de comandos legais que se encontram em total sintonia com o disposto no artigo 100º da LGT, aplicável ao caso, ex vi, do disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 29º do RJAT, no qual se estabelece que “A administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, correspondendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei”.
- O caso constante nos presentes autos, suscita a manifesta aplicação das mencionadas normas, posto que na sequência da ilegalidade dos atos de liquidação, referenciados, neste processo, terá, por força dessas normas, de haver lugar ao reembolso dos montantes pagos, seja a título do imposto pago, seja dos correspondentes juros compensatórios, como forma de alcançar a reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade.
20 DO DIREITO A JUROS INDEMNIZATÓRIOS
- A declaração da ilegalidade e consequente anulação do ato administrativos confere ao destinatário do ato o direito à reintegração da situação em que o mesmo se encontraria antes da execução do ato anulado.
- No âmbito da liquidação do imposto, a sua anulação confere ao sujeito passivo o direito à restituição do imposto pago e, em regra o direito a juros indemnizatórios, nos termos do nº 1 do artigo 43º da LGT e artigo 61º do CPPT.
- Pelo que tem, a Requerente, direito a juros indemnizatórios sobre o montante de imposto pago, referente às liquidações anuladas.
21 DECISÃO
Face ao exposto, este Tribunal Arbitral decide:
- Julgar procedente o pedido de declaração da ilegalidade da liquidação do IUC, respeitante aos anos de 2009 a 2012, relativamente aos veículos automóveis identificados e controvertidos no presente processo, anulando-se, consequentemente, os correspondentes atos tributários;
- Julgar procedente o pedido de condenação da Administração Tributária no reembolso da quantia indevidamente paga, no montante de 4 870,61 Euros, acrescidos dos respetivos juros indemnizatórios, legalmente devidos, condenando a Autoridade Tributária e Aduaneira a efectuar estes pagamentos.
VALOR DO PROCESSO:
- Em conformidade com o disposto nos artigos 306º nº 2 do CPC e 97º-A, nº 1 do CPPT e no artigo 3º, nº 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de 4 870,61 Euros.
CUSTAS:
- De harmonia com o nº 4 do artigo 22º do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 612,00, nos termos da Tabela I, anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária Aduaneira.
Notifique-se, as partes.
Lisboa, 01-02-2016
O Árbitro
Maria de Fátima Alves
(o texto da presente decisão foi elaborado em computador, nos termos do artigo 131, nº 5 do Código do Processo Civil, aplicável por remissão do artigo 29º, nº 1 alínea e) do Decreto-Lei 10/2011, de 20 de Janeiro (RJAT), regendo-se a sua redacção pela ortografia atual)