Decisão Arbitral
Os árbitros Sra. Conselheira Fernanda Maçãs (árbitro-presidente), Sra. Doutora Carla Castelo Trindade e Sr. Doutor Daniel Taborda (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral Coletivo, constituído em 26-04-2017, acordam no seguinte:
I. Relatório
1. A A…, S.A. (Requerente), pessoa coletiva n.º … veio, ao abrigo das disposições dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 10.º, n.º 1, alínea a) do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”), apresentar pedido de pronúncia arbitral com vista à anulação do ato de liquidação de IRC do ano de 2011 (nota de liquidação n.º 2015…), pretensão que a reclamação graciosa n.º …2016… indeferiu.
É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, doravante “ATA”.
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e notificado à ATA em 27-01-2017.
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral coletivo a Sra. Conselheira Fernanda Maçãs, a Sra. Doutora Carla Castelo Trindade e o Sr. Doutor Daniel Taborda e notificou as partes dessa designação em 13-03-2017, que não manifestaram vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Tribunal Arbitral Coletivo foi constituído em 26-04-2017.
Nestes termos, o Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído para apreciar e decidr o objeto do processo.
2. A fundamentar o pedido a Requerente alega, em síntese:
A) Em relação à “anulação ambulatório e anulação acréscimo SNS 2010”, cuja similitude justifica uma abordagem conjunta:
a) no âmbito do financiamento dos hospitais públicos, bem como dos estabelecimentos hospitalares em regime de parceria público-privada, a cargo do Serviço Nacional de Saúde (“SNS”), através das suas Administrações Regionais de Saúde (“ARS”), as respetivas verbas são alocadas tendo em consideração determinadas variáveis, nomeadamente os Grupos de Diagnóstico Homogéneo (“GDH”);
b) no fim dos exercícios de 2009 (primeiro ano de atividade da B…) e de 2010, a B… ainda estava em negociações com a ARSN relativamente à valorização de cada um dos GDH pelo que não podia estimar de forma exata a remuneração a receber da ARSN relativamente à produção daqueles períodos;
c) apesar de no final do exercício de 2011, a B… ainda não dispôr de informação exata sobre aquela remuneração, fruto dos contatos mantidos e da experiência acumulada, foi possível adquirir um maior conhecimento relativamente à interpretação das diversas normas constantes do contrato celebrado com a ARSN;
d) em 2011, a B… decidiu ajustar em baixa o acréscimo de rendimentos contabilizado (e tributado) nos exercícios de 2009 e 2010, no sentido de melhorar esta estimativa registada anteriormente;
e) em 2012 ocorreu a reconciliação dos valores relativos ao exercício de 2009, 2010 e 2011, mediante a validação definitiva pelo SNS do montante da remuneração a atribuir à B… enquanto entidade gestora. Nesse exercício, resultou uma variação patrimonial negativa de 22 787 987 euros, o que revela que a “ora Requerente foi sujeita a tributação em sede de IRC tendo por base um resultado fiscal muito superior àquele que, na prática, deveria ter sido contabilizado” (ponto 58.º da Petição Inicial, doravante “PI”);
f) a aceitação fiscal desta variação patrimonial negativa foi objeto de submissão pela B… de um Pedido de Informação Vinculativa, que obteve um entendimento positivo por parte da ATA, segundo o qual «face ao exposto, e pela leitura do "Contrato de Gestão", verifica-se que a faturação dos serviços em causa é complexa, uma vez que é feita com base nas cláusulas contratuais que a regulamentam, podendo haver divergência de interpretação entre a requerente e a ASRN entidade contratante, tendo a requerente tido conhecimento da interpretação do clausulado por parte daquela entidade apenas em 2012, aquando da reconciliação, pelo que se nos afigura de aceitar a anulação/redução dos rendimentos relativos a 2009, 2010 e 2011 como uma variação patrimonial negativa no período de tributação de 2012, nos termos do art. 24.º conjugado com o n.º 2 do art. 18.º, ambos do Código do IRC» (ponto 69.º da PI).
B) A Requerente argumenta em relação ao “internato médico” que:
a) a B… constituiu-se a 2 de fevereiro de 2009 com o objetivo de fazer a gestão hospitalar do C…, em regime de parceria público-privada, nos termos e âmbito do Contrato de Gestão celebrado em 2009 com o Estado português, representado pela ARSN;
b) uma das obrigações decorrentes desse contrato determina que a B… assegure as condições de funcionamento do regime de internato médico mas não atribuía explicitamente a obrigação de pagamento das remunerações dos profissionais em regime de internato médico a nenhuma das partes. Interpretando que esse pagamento não era da sua responsabilidade e, com base na experiência acumulada em outras parcerias público-privadas no setor da saúde, a B… emitiu faturas à ARSN em cada um dos períodos compreendidos entre 2009 e 2011 inclusivé, respeitantes aos rendimentos que estimava receber daquela entidade como forma de compensar os gastos incorridos com as remunerações dos profissionais enquadrados no primeiro e segundo ano do regime de internato médico;
c) estes valores faturados com referência a 2009 e 2010 ascenderam a 1 746 770.10 euros e foram sujeitos a tributação nesses excercícios;
d) conforme Ofício do Ministério da Saúde (relativo ao processo …/2011, de Maio de 2011) a B… tomou conhecimento da interpretação da ARSN sobre o funcionamento do regime de internato médico e da sua decisão de não suportar o valor correspondente aos encargos por si incorridos com as remunerações dos profissionais integrados no segundo ano do internato médico;
e) com base nessa nova informação, a B…, no exercício de 2011, emitiu notas de crédito associadas às faturas de 2009 e 2010, anulando-as, e emitiu faturas referentes apenas aos gastos associados ao primeiro ano do internato médico. Este efeito conjunto foi classificado na rúbrica de gastos de exercícios anteriores no total de 255 538.26 euros: 1 746 770.10 de notas de crédito (a débito) e 1 491 231.84 de novas faturas referentes aos encargos suportados com os alunos do primeiro ano (a crédito);
f) as faturas no total de 1 491 231.84 euros foram depois anuladas em 2013, quando a ARSN assume, definitivamente, que suportará os encargos relativos ao primeiro ano de internato. Tal motivou um pedido de informação vinculativa, por referência ao exercício de 2013, para garantir a aceitação fiscal, em sede de IRC, da anulação dos montantes faturados relativamente ao primeiro ano de internato médico. Teve por base o valor das novas faturas emitidas em 2011 relativas aos exercícios de 2009 e 2010 (1 491 231.84 euros) e obteve um entendimento favorável por parte da ATA.
C) A Requerente argumenta em relação a “outros” que:
a) tratam-se de gastos operacionais respeitando a serviços de comunicações, assessoria jurídica, medicamentos e aparelhos médicos;
b) o seu registo nos exercícios anteriores não aconteceu por desconhecimento do seu montante e receção dos documentos posterior ao fecho de contas do exercício;
c) nesta rubrica estavam também contabilizadas duas faturas referentes a prestações de serviços de acreditação de saúde e qualidade, em que o prestador de serviços é residente fiscal no Reino Unido, no montante de 19 029.92 euros, que a ATA aceitou no âmbito do procedimento de inspeção;
d) não se vislumbram motivos para que as restantes faturas (no total de 722 573.08 euros) não sejam aceites, uma vez que decorrem da mesma realidade: de imprevisibilidade/desconhecimento nas datas de encerramento das contas do exercício.
D) Relativamente ao adicional de tributação autónoma, a Requerente entende que apenas as sociedades dominadas que apurem prejuízos fiscais sejam sujeitas ao agravamento das taxas de tributações autónomas em 10% e que o n.º 20 do artigo 88.º do CIRC tem um cariz efetivamente inovador.
E) Por fim, a Requerente alega, ainda, que a nota de liquidação que lhe foi notificada não a informa de todas as correcções efectuadas, não cumprindo os requisitos exigidos pelo n.º 2 do artigo 36.º do CPPT.
a) a Requerente não se considera validamente notificada e, nesta sequência, a liquidação não pode produzir qualquer efeito,
b) em função do período de caducidade plasmado na LGT, o direito a qualquer tipo de nova liquidação por referência ao exercício de 2011 terminou no passado dia 31 de dezembro de 2015, pelo que este deve ser considerado encerrado, sem que as correções propostas pela AT produzam os seus efeitos, dada a ilegalidade da liquidação.
F) A Requerente termina pedindo:
-
A declaração de ilegalidade do acto tributário de liquidação de IRC, por referência ao exercício fiscal de 2011; e, consequentemente,
-
A desconsideração de quaisquer ajustamentos propostos pela ATA ao resultado fiscal apurado pelo consolidado fiscal dominado pela requerente por referência ao exercício de 2011 e, bem assim, ao montante de tributações autónomas a pagar.
3. A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta e juntou processo instrutor, invocando, em síntese:
A) Por impugnação
a) Relativamente à rubrica “anulação ambulatório médico 2009” e “anulação acréscimo SNS 2010” sinteticamente a requerida sustenta que:
b) Quer em sede de procedimento inspectivo quer em sede de reclamação graciosa, a B… não conseguiu demonstrar como obteve o valor da reversão (anulação) de rendimentos tributados em anos anteriores;
c) Em 2011, as negociações com a ARSN ainda estavam em curso e só em 2012 foi possível fechar as contas relativamente aos exercícios de 2009, 2010 e 2011, fazendo uma reconciliação (com o valor efetivamente recebido do SNS). Logo, “só nesse ano seria legítimo à requerente contabilizar ou fazer a reconciliação anulando o ganho em claro afastamento do princípio da especialização dos exercícios” (ponto 87.º da Resposta).
d) Os mesmos argumentos apontados pela Requerida são válidos para o internato médico (ponto 93.º da Resposta), ressalvando que, apenas em 2013, o gasto/variação patrimonial negativa resultante da anulação do rédito realizado em períodos anteriores poderia concorrer negativamente para a formação do lucro tributável.
e) No que respeita à rubrica “Outros”, a ATA entende que a documentação apresentada pela Requerente é “insuficiente para comprovar que “os gastos eram manifestamente desconhecidos e imprevisíveis em 2009 ou 2010, desconhecendo-se quando é que os serviços foram efectivamente prestados e se os mesmos se reportam aos gastos em causa” (ponto 98.º da Resposta).
f) Relativamente ao adicional de tributação autónoma, a Requerida contrapõe que atenta a substância do RETGS, em que o lucro tributável/prejuízo fiscal das dominadas concorre para o lucro tributável/prejuízo fiscal do grupo, apurado pela sociedade dominante, não faz sentido que as taxas de tributação autónoma sejam aplicadas ao prejuízo fiscal apurado individualmente.
g) A Requerida defende, ainda, que o “ato de liquidação não se confunde com a notificação do mesmo, concretizada pelo envio da nota de liquidação” (ponto 47.º da Resposta) e que este ato “está devidamente fundamentado, de facto e de direito, constando tal fundamentação do Relatório Final de Inspecção Tributária” (ponto 54.º da Resposta).
B) Por exceção
Na defesa por exceção a Requerida veio invocar a incompetência material do Tribunal Arbitral, aduzindo, em síntese:
Pede a Requerente que o Tribunal Arbitral condene a ATA à: «desconsideração de quaisquer ajustamentos propostos ao resultado fiscal apurado pelo consolidado fiscal dominado pela requerente, por referência ao exercício de 2011 e, bem assim, ao montante de tributação autónoma a pagar.”
“Ora, ainda que tal pretensão pudesse eventualmente decorrer de uma hipotética execução de julgados que viesse a ser efetuada em caso de a decisão arbitral proferida ser de procedência do pedido, o que só por mera hipótese académica se equaciona, o que é certo é que tal pedido extravasa a competência do presente Tribunal.
Na verdade, a competência dos tribunais arbitrais é, desde logo, circunscrita às matérias indicadas no n.º 1 do artigo 2.º do RJAT.”
4. Tendo havido lugar a contraditório em matéria de exceção e não havendo lugar a prova testemunhal, o Tribunal, por despacho, de 9 de julho de 2017, prescindiu da reunião prevista no art.º 18.º do RJAT, o que fez ao abrigo dos princípios da autonomia na condução do processo. Foi também fixado o dia 26 de outubro de 2017 para a prolação da decisão arbitral. Prazo que foi prorrogado para o dia 26 de dezembro, por despacho de 28 de setembro de 2017.
5. Ambas as Partes apresentaram alegações reiterando, no essencial, os argumentos já veiculados nos articulados iniciais.
5.1. A Requerida reiterou que “efectivamente, nos termos do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT, bem como da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, ex vi artigo 4.º do RJAT, inexiste qualquer suporte legal que permita que sejam proferidas pelos tribunais arbitrais condenações de outra natureza que não as decorrentes dos poderes fixados no RJAT: poderes declaratórios com fundamento em ilegalidade.
“Assim, a vinculação da AT à tutela arbitral pressupõe uma limitação das situações em que esta pode plenamente decidir se deve ou não interpor recurso de uma decisão judicial desfavorável, ou seja, do poder de optar entre abdicar definitivamente da cobrança do crédito tributário ou adoptar o comportamento potencialmente adequado a procurar efectivá-la.
A Requerida termina, de forma inovadora, alegando que “(…), é constitucionalmente vedada, por força dos princípios constitucionais do Estado de direito e da separação dos poderes (cf. artigos 2.º e 111.º, ambos da CRP), bem como do direito de acesso à justiça (artigo 20.º da CRP) e da legalidade [cf. artigos 3.º, n.º 2, 202.º e 203.º da CRP e ainda o artigo e 266.º, n.º 2, da CRP], no seu corolário do princípio da indisponibilidade dos créditos tributários ínsito no artigo 30.º, n.º 2 da LGT, uma interpretação que amplie a vinculação da AT à tutela arbitral fixada legalmente.
“Porquanto, tal interpretação implicará a dilatação das situações em que a AT obrigatoriamente se submete a tal regime, renunciando nessa mesma medida ao recurso jurisdicional pleno [cf. artigo 124.º, n.º 4, alínea h) da Lei n.º 3-B/2010 e artigos 25.º e 27.º do RJAT, que impõe uma restrição dos recursos da decisão arbitral].”
6. Considerando a questão de inconstitucionalidade suscitada de forma inovadora pela entidade Requerida e dado as alegações terem sido sucessivas, por despacho, de 17 de outubro, foi dada a oportunidade de exercício do contraditório por parte da Requerente. No mesmo despacho foi solicitado à Requerente a indicação do valor da causa, com contraditório da Requerida.
7.Em ambos os casos a Requerente nada adiantou.
II. Saneamento
1.As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
2. Da exceção de incompetência do tribunal arbitral
A Requerida veio invocar a exceção de incompetência do Tribunal Arbitral, com base no artigo 2.º, n.º 1 do RJAT. Alega que a desconsideração de ajustamentos ao resultado fiscal apurado pelo consolidado fiscal dominado pela Requerente excede o âmbito da competência deste Tribunal.
O pedido de pronúncia arbitral foi interposto contra o ato expresso de indeferimento da reclamação graciosa, processo n.º …2016…, interposta, por seu turno, contra a liquidação adicional de IRC do ano de 2011 (n.º 2015…), emitida na sequência de uma ação inspetiva aberta pela ordem de serviço n.º OI2015… . Assim, o objeto do pedido é constituído pelo ato de liquidação decorrente da desconsideração por parte da ATA de um conjunto de deduções à matéria coletável a que a Requerente considera ter direito e do agravamento (em dez pontos percentuais) das taxas de tributação autónoma no âmbito do lucro consolidado.
Portanto, está em causa um pedido de declaração de ilegalidade de atos de liquidação de tributos, que integra o âmbito de competência da jurisdição arbitral.
Não se ignora que a Requerente termina pedindo, além da declaração de ilegalidade do ato tributário de liquidação [alínea a)], “A desconsideração de quaisquer ajustamentos propostos pela AT ao resultado fiscal apurado pelo consolidado fiscal dominado pela requerente por referência ao exercício de 2011 e, bem assim, ao montante de tributações autónomas a pagar.” [alínea b)].
No entanto, como observa a Requerente, na resposta às exceções, o pedido referenciado na alínea b), vem formulado na sequência do referido na alínea a) onde expressamente se refere à “ilegalidade do ato tributário de liquidação de IRC, por referência ao exercício fiscal de 2011”. Neste sentido é, aliás, expressivo, o uso do advérbio «consequentemente».
Leitura integral do pedido da Requerente não permite extrair, ao contrário do que defende a Requerida, que se tenha em vista que este tribunal profira sentenças de condenação a um comportamento nem tão pouco sentenças de reconhecimento de direitos.
Veio a Requerida nas contra-alegações acrescentar que uma interpretação que amplie a vinculação da AT à tutela arbitral fixada legalmente, está constitucionalmente vedada por força dos princípios constitucionais do Estado de direito e da separação dos poderes (cf. artigos 2.º e 111.º, ambos da CRP), bem como do direito de acesso à justiça (artigo 20.º da CRP) e da legalidade [cf. artigos 3.º, n.º 2, 202.º e 203.º da CRP e ainda o artigo e 266.º, n.º 2, da CRP], no seu corolário do princípio da indisponibilidade dos créditos tributários ínsito no artigo 30.º, n.º 2, da LGT.
Para além da alegação em abstrato das referidas inconstitucionalidades, não se vislumbra em que medida a interpretação sufragada do pedido arbitral aponte para uma ampliação da vinculação da Requerida à tutela arbitral legalmente fixada, no artigo 2.º do RJAT. Cai, assim, por terra, a alegada violação de princípios constitucionais, tais como os do Estado de Direito, da separação de poderes e da legalidade.
Acresce que, como ficou demonstrado supra, o pedido da Requerente, não comportando qualquer condenação da Requerida na “desconsideração de ajustamentos ao resultado fiscal apurado pelo consolidado fiscal dominado pela Requerente nem a condenação a aceitar os ajustamentos de gastos em 2012”, mas tão só a declaração de ilegalidade do ato tributário em causa, não colide com quaisquer princípios constitucionais, nem põe em crise a “indisponibilidade dos créditos tributários”.
Aliás a invocação do princípio da indisponibilidade dos créditos tributários será possivelmente um lapso, já que ao decidir sobre a sua competência, relevante apenas enquanto pressuposto processual, o Tribunal Arbitral não está seguramente a praticar qualquer ato de disposição de um crédito tributário, no sentido do invocado art. 30.º n.º 2 LGT. Mas quanto à questão da discussão teórica que se colocou relativamente ao princípio da indisponibilidade dos créditos tributários e à forma como se ultrapassou a eventual não conformidade com a CRP de um regime de arbitragem tributária, veja-se o ponto 5.2.3 da anotação do artigo 1.º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária Anotado, de Carla Castelo Trindade, da editora Almedina, em páginas 46 e seguintes, a fim de se compreender que esta é uma temática há muito ultrapassada.
Termos em que improcede a exceção de incompetência formulada pela Requerida.
3. Quanto ao valor da causa, como vimos, a Requerente não procedeu à indicação do valor da causa no pedido arbitral.
O tribunal, por despacho de 17 de outubro de 2017, solicitou que nos termos do princípio da cooperação e boa-fé processuais previstos no artigo 16.º do RJAT e bem assim do princípio da livre condução do processo previsto no artigo 19.º também do RJAT, viesse a Requerente no prazo de 10 dias fazer essa indicação. A este despacho não houve resposta.
Porém, por indicação do CAAD, efectuada em 6 de Novembro, o sujeito passivo terá indicado qual o valor do pedido aquando do preenchimento do formulário do pedido de constituição de Tribunal Arbitral ao qual importa a indicação (obrigatória) do valor do processo.
Porém pedido de constituição do tribunal arbitral e o pedido de pronúncia arbitral são coisas distintas “o pedido de constituição do tribunal arbitral materializa-se no preenchimento de um requerimento electrónico que será dirigido ao presidente do CAAD. Desse requerimento electrónico deve constar obrigatoriamente, entre outros elementos elencados nas alíneas do n.o 2 do artigo 10.o, o pedido de pronúncia arbitral. Esse pedido de pronúncia arbitral é, este sim, a verdadeira petição inicial em sentido material, sendo, inclusive, essa, a designação utilizada no formulário on-line quando se solicita ao utilizador que anexe o pedido de pronúncia arbitral. Assim, o pedido de pronúncia arbitral é um documento autónomo que deve ser anexado electronicamente, claro está, ao pedido de constituição do tribunal arbitral. É do pedido de pronúncia arbitral porém que devem então constar as questões de facto e de direito que o fundamentam, não fosse esse pedido uma verdadeira petição inicial. A petição inicial da arbitragem, onde constam os fundamentos de facto e de direito que motivam a pretensão do sujeito passivo, onde consta o pedido e a causa de pedir, é, portanto, anexa ao pedido de constituição de tribunal arbitral.” (cfr. páginas 270 e 271 do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária Anotado, de Carla Castelo Trindade, da editora Almedina).
Não obstante, tendo em consideração o valor da utilidade económica do pedido que se encontra fixado no sistema de gestão processual, no montante de € 886.736,57, o tribunal chegou à conclusão que este valor resultará do facto de haver correções fiscais no montante de 3 700 332,08 €, do facto de em 2015, data da liquidação, vigorar uma taxa de 21% e uma derrama de 1,5% (em …) cujo somatório resultará num valor de 832 574,72€. Ora se a este montante se somar a liquidação de tributação autónoma no valor de 54 161,85 € alcançasse o valor indicado pela Requerente de 886 736,57€.
Porém este valor não está correcto na medida se por um lado porque havia prejuízos fiscais não devendo portanto haver derrama devendo consequentemente o valor desta (55.504,98€) ser expurgado do valor da utilidade económica do pedido, por outro lado, no ano de 2011, vigorava a taxa de 25% ao invés da taxa de 21% aplicável no ano da liquidação – 2015. Em face do exposto, o valor correcto do presente processo serão € 925.083,02 (3 700 332,08 €*25%) aos quais deverão acrescer os 54 161,85 € do valor da tributação autónoma o que resultará num montante de € 979.244,87.
Com efeito, a doutrina tem entendido que, perante um erro na determinação ou na indicação do valor da utilidade económica do pedido pelo sujeito passivo, o tribunal arbitral deverá corrigir oficiosamente o erro, assim que se aperceba do mesmo, podendo fazê-lo por despacho, decisão interlocutória ou mesmo na decisão final (Cf. Carla Castelo Trindade (2016), “Regime Jurídico da Arbitragem Tributária Anotado”, 284).
Perante o exposto, considera-se fixado o valor da causa em € 979.244,87.
4. O processo não enferma de nulidades.
5. Não se verificam quaisquer outras circunstâncias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
Compete ao Tribunal Arbitral apreciar e decidir do mérito do pedido.
III.Mérito
III.1. Matéria de facto
1.1. Factos provados
Com base nos elementos que constam do processo e documento juntos com o pedido de pronúncia arbitral, consideram-se provados os seguintes factos:
A) A Requerente é a sociedade dominante de um grupo de sociedades que optou pela tributação em IRC pelo regime especial de tributação dos grupos de sociedades (“RETGS”);
B) O perímetro fiscal é composto pela sociedade dominante (requerente) e pelas seguintes sociedades (dominadas), cujos resultados relativos a 2011 são apresentados no quadro seguinte:
NIPC Sociedades Resultado do Exercício de 2011
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… A…, SA (DOMINANTE) -470.267,38
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… D…, SA 3.082.049,99
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…. E…, SA 9.260.896,63
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… F… SGPS, SA -5.028,33
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… G…, SA 568.344,32
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… H…, SA -852.345,26
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… I…, LDA 37.959,63
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… J…, SA 851.646,06
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… B…, SA -15.645.731,77
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… K…, SA -13.813.860,76
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… L…, SA 52.346,00
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… M…, SA 629.617,63
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… N…, SA 3.656.729,85
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LUCRO / PREJUIZO DECLARADO PELO GRUPO -12.647.643,39
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C) O prejuízo fiscal declarado pelo grupo, no exercício de 2011, foi de 12 647 643.39 euros, que resultou da soma algébrica dos resultados fiscais apurados em cada uma das sociedades que constituem o Grupo;
D) Na sequência das ações de fiscalização, referentes ao exercício de 2011, efetuadas aos elementos contabilístico-fiscais individuais das sociedades B…, S.A. (ordem de serviço n.º OI2014…) e A…, S.A. (ordem de serviço n.º OI2015…) , a ATA detetou inexatidões no apuramento das respetivas matérias coletáveis;
E) Assim, foi aberta a ordem de serviço nº OI2015…, a fim de reflectir aquelas correções na declaração de rendimentos Modelo 22 do Grupo (declaração liquidável). Consequentemente, foi proposta uma correção à matéria coletável em sede de IRC de 3 847 933.24 euros, composta por duas correções individuais: uma de 147 601.16 euros na esfera individual da Requerente, que a aceitou voluntariamente através da submissão da declaração de rendimentos Modelo 22 de substituição, e outra na sociedade B… no valor de 3 700 332.08 euros, respeitante exclusivamente às correções relativas a exercícios anteriores, que ora se controverte.
F) A não aceitação fiscal de gastos contabilísticos referentes a correções de exercícios anteriores no valor total de 3 700 332.08 euros na esfera da B… decompõe-se da seguinte forma:
Tipo de correção Valor (Euros)
Internato Médico 255 538
Anulação Acréscimo SNS 2010 1 303 533
Anulação Ambulatório 2009 1 418 688
Outros 722 573.08
G) Estes valores estão suportados em diversos documentos:
- Listagem das faturas emitidas em 2009 e 2010 e anuladas no exercício de 2011 (reversão do acréscimo de SNS 2010 e reversão do ambulatório médico 2009);
- Cópia das notas de crédito emitidas em 2011 relativas aos exercícios de 2009 e 2010 e das faturas emitidas em 2011 por referência a 2009 e 2010 (internato médico);
- Listagem e cópia das faturas contabilizadas em gastos de exercícios anteriores (outros);
H) No âmbito do procedimento de inspeção, os documentos e argumentos carreados pela B… não foram aceites pela ATA, mantendo-se o projeto de decisão, com o qual a Requerente não se conforma. Já as propostas de correção dos resultados individuais da Requerente foram aceites e regularizadas;
I) A Requerente foi notificada do projecto de relatório de inspeção para exercer o direito de audição sobre as correcções propostas pela ATA à declaração do grupo, dispensando-o;
J) A Requerente apurou prejuízo fiscal em 2011, pelo que os ajustamentos decorrentes do procedimento inspetivo não implicam qualquer montante a pagar. Mas têm um impacto significativo nos prejuízos fiscais reportáveis nos exercícios subsequentes;
L) Acresce que no âmbito do procedimento de inspeção apurou-se imposto em falta, no montante de 54 161.85 euros.
M) Este imposto em falta decorrerá do agravamento das taxas de tributação autónomas aplicáveis no âmbito do RETGS, nos termos do n.º 14 do artigo 88. º do CIRC;
N) Assim, foi emitida a liquidação n.º 2015…, que foi notificada à Requerente através do registo datado de 2015-11-30, RY … PT, tendo sido rececionado em 01/12/15;
O) Desta liquidação foi deduzida reclamação graciosa pela Requerente, em 30/03/16, a qual foi indeferida pela ATA, com base nos seguintes argumentos:
“Analisada a mesma pela Divisão de Justiça Administrativa, da DF de Lisboa, foi entendido, designadamente, cfr. fls. 13 da informação de 14/07/16, que:
- Quanto aos gastos relativos a anos anteriores:
“ O documento apresentado como número 3 é um mapa a comparar a revalorização efectuada em 2011 com o valor que se encontrava contabilizado (cf. fl. 195 dos autos);
- O documento apresentado como número 4 é uma ata de fecho de contas (cf.fl. 197 a 199 dos autos);
- Documento 5 – resposta a um pedido de informação vinculativa (cf. fl.201 a 204 dos autos);
- Apresenta uma série de facturação emitida e de gastos efectuados (cf. fl. 205 a 832 dos autos).
“Com as alegações apresentadas afigura-se tratar-se de reversão (anulação) de proveitos tributados em anos anteriores, todavia a reclamante não demonstra como obtém os valores em apreço, não comprova o que alega. (…) Assim verificamos que a pretensão da reclamante não poderá ser aceite porquanto, não vem juntar aos autos prova documental efectiva que permita confirmar de forma clara e inequívoca o alegado na sua petição.”
Quanto à tributação autónoma:
“Ora, com o OE 2016, Lei nº 7-A/2016, de 30 de março, foi aditado o nº 20 relacionado com o nº 14, ambos do mencionado artigo, o qual refere que no RETGS, o prejuízo fiscal a considerar é o prejuízo fiscal do grupo, apurado nos termos do art.º 70.º do CIRC, sendo a redação deste preceito de natureza interpretativa.
Nesta senda, afigura-se-nos que a correcção efectuada pelos Serviços de Inspeção Tributária se encontra correta.”
P) Como a Requerente, ainda que devidamente notificada, não exerceu o direito de audiência, o projeto de Decisão foi convolado em definitivo e indeferida a reclamação.
1.2. Factos não provados
Não há factos relevantes para a decisão da causa que não se tenham provado.
1.3.Fundamentação da matéria de facto provada e não provada
A factualidade provada teve por base a apreciação crítica da posição assumida por cada uma das partes, bem como a análise crítica dos documentos juntos aos autos, cuja autenticidade e veracidade não foram impugnadas por nenhuma das partes.
III.2. Matéria de direito
III.2.1. Da ilegalidade da liquidação
São as seguintes as questões a apreciar:
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Vício de ilegalidade/caducidade por a notificação não ter sido acompanhada da respetiva fundamentação, nos termos exigidos no artigo 36.º, n.ºs 1 e 2, do CPPT;
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Apreciação da legalidade das correções à matéria coletável;
-
Agravamento das taxas de tributação autónoma.
Vejamos.
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Vício de ilegalidade/caducidade, por a notificação não ter sido acompanhada da respetiva fundamentação
O artigo 36.º do CPPT estabelece que os atos tributários que “afetem os direitos e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados” (n.º 1) e que “as notificações conterão sempre a decisão, os seus fundamentos e meios de defesa e prazo para reagir contra o ato notificado, bem como a indicação da entidade que o praticou e se o fez no uso de delegação ou subdelegação de competências” (n.º 2).
Argumenta a Requerente, em síntese, que, no caso, a nota de liquidação não cumpre estes requisitos e, logo, sofre do vício de ilegalidade e não pode produzir quaisquer efeitos, com reflexos no prazo de caducidade.
Há quanto a esta questão que fazer desde já um ponto de ordem recorrendo para o efeito a páginas 289, 290 e 291 do manual de Serena Cabrita Neto e de Carla Castelo Trindade – Contencioso Tributário, Volume I, Procedimento, Princípios e Garantias onde se diz que:
“Por força do artigo 36.º do CPPT o acto de notificação tem que conter sempre a decisão, os seus fundamentos e meios de defesa e os prazos para reagir contra o acto notificado, bem como a indicação da entidade que o praticou e se o fez no uso de delegação ou subdelegação de competências. Se não contiver a decisão, os seus fundamentos e meios de defesa e os prazos para reagir contra o acto notificado, a notificação será meramente irregular. (…)
Coisa diferente dos vícios da notificação são os vícios do acto notificado. Este terá que conter a fundamentação de facto e de direito, sob pena de se considerar ilegal e consequentemente anulável, por ausência ou vício de fundamentação legalmente exigida nos termos do artigo 99.º, alínea c) do CPPT. O que é fundamental reter é que da invalidade da notificação apenas decorre a ineficácia – e nunca a ilegalidade - do acto notificado, na medida em que a sua eficácia depende da válida notificação nos termos do artigo 77.º, n.º 6 da LGT.
Olhemos primeiro aos vícios da notificação para de seguida os relacionarmos com os do acto notificado.
Assim, a falta de qualquer um dos requisitos substanciais acima referidos pode afectar a validade da notificação e consequentemente a eficácia do acto notificado. Deste modo, o acto cuja eficácia depender de uma notificação que não contenha determinado requisito exigido pelo artigo 36.º, n.º 2 do CPPT, não produzirá efeitos em relação aos seus destinatários. Consoante o requisito em falta, a notificação pode enfermar de dois vícios diferentes. (…)
Já se faltar qualquer outro requisito previsto no artigo 36.º do CPPT, como a decisão, a fundamentação legalmente exigida ou a indicação dos meios de defesa e prazos para reagir contra o acto notificado, o acto de notificação será meramente irregular. Assim, LOPES DE SOUSA defende que, em princípio, a notificação irregular produzirá todos os efeitos para os quais é idónea. Esta só não produzirá efeitos em relação àquilo que não comunicou, por exemplo, a decisão ou os prazos para reagir, se o destinatário vier a utilizar a faculdade prevista no artigo 37.º do CPPT. Se o destinatário do acto não utilizar o mecanismo previsto no artigo 37.º do CPPT, como se verá mais à frente, sana-se a irregularidade da notificação pelo que o acto de notificação que não contenha todos os requisitos exigidos pelo artigo 36.º, n.º 2 do CPPT continuará a valer como acto de comunicação ao destinatário quanto a tudo o que comunicou. Neste sentido, veja-se o acórdão do STA de 29 de Outubro de 2014, proferido no âmbito do processo n.º 01381/12, no qual se reiterou o entendimento deste autor:
“ (…) a notificação irregular não deixa de produzir efeitos para que é idónea, que é dar conhecimento ao destinatário da existência de uma decisão da administração tributária, e apenas não produzindo os efeitos para que é inidónea (os de iniciar os prazos de impugnação administrativa ou contenciosa) se o interessado usar da referida faculdade (se o interessado não vier a utilizar esta faculdade, mesmo estes efeitos para que a notificação é inidónea se produzirão com a notificação irregular, pois a irregularidade considera-se sanada pela falta de uso daquela faculdade no prazo legal).”
Assim, a conclusão da Requerente assenta em erro quanto às consequências jurídicas de a notificação do ato tributário não ser eventualmente acompanhado da fundamentação integral do mesmo.
Constitui jurisprudência reiterada e uniforme do Supremo Tribunal Administrativo Administrativo que a forma de comunicação da fundamentação (ao contrário da falta de fundamentação) não afeta a validade do ato de liquidação. Neste sentido, conclui o seu Acórdão da 2ª Secção, de 16/11/16, Proc. n.º 0954/16, “uma coisa é a fundamentação do acto e outra é a comunicação desses fundamentos ao interessado: enquanto aquela constitui um vício susceptível de determinar a anulação do acto que dela padeça, o incumprimento ou cumprimento defeituoso do dever de comunicação dos fundamentos não se podem reflectir na validade do acto comunicado”.
No caso concreto, admite-se que a nota de liquidação não contenha toda a fundamentação integral da liquidação, mas a liquidação impugnada baseia-se no projeto de relatório e no relatório final do procedimento de inspecção, que foram devidamente comunicados à Requerente. Portanto, a nota de liquidação não sofre do alegado vício de ilegalidade, por falta de fundamentação.
Por conseguinte, o ato tributário, logo que notificado ao destinatário, nos termos legais, produz imediatamente os efeitos jurídicos a que tende, mesmo que não seja acompanhado de toda a fundamentação que o sustenta e mesmo que se considere ilegal.
Assim, recorrendo uma vez mais ao manual de Serena Cabrita Neto e de Carla Castelo Trindade – Contencioso Tributário, Volume I, Procedimento, Princípios e Garantias - desta feita em página 299, temos dois regimes distintos: “Caso o acto de notificação não contenha a decisão, os meios de defesa e os prazos para reagir e o destinatário do acto não recorra ao mecanismo do artigo 37.º do CPPT – i.e. o único elemento em falta seja a fundamentação - os vícios da notificação irregular considerar-se-ão sanados, pelo que o acto tributário notificado será eficaz em relação ao seu destinatário relativamente a tudo o que comunicou. Se, pelo contrário, faltar a fundamentação da decisão, como, por um lado, a falta de fundamentação pode constituir um vício do acto notificado gerador da sua ilegalidade e, por outro, sem conhecimento da fundamentação o destinatário do acto não pode aferir da legalidade do mesmo, este vício da notificação não se sana pela não utilização do mecanismo previsto no artigo 37.º do CPPT. A notificação será irregular e o acto notificado ilegal por vício de falta de fundamentação, nos termos do artigo 99.º, n.º 1, alínea c) do CPPT. Todavia o acto não será ineficaz. O particular não poderá alegar a ineficácia do acto relativamente a si pese embora a falta de fundamentação. Tudo porque não utilizou o mecanismo previsto no artigo 37.º do CPPT. Pode porém solicitar a fundamentação e alegar a sua ilegalidade, isto pese embora não tenha não utilizado o mecanismo previsto no artigo 37.º do CPPT.” (destacado nosso)
Assim sendo, a eventual circunstância de a notificação do ato tributário não ser acompanhada da comunicação de toda a fundamentação não afeta a eficácia do mesmo e, logo, não tem qualquer repercussão no prazo de caducidade.
Termos em que não assiste à Requerente qualquer razão.
B.Apreciação da legalidade das correções à matéria colectavel
A correção à matéria coletável da sociedade B… compõe-se de várias rúbricas, que foram qualificadas pela ATA como gastos não aceites fiscalmente por respeitarem a exercícios anteriores:
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Anulação do rendimento relativo ao ambulatório médico registado em 2009: 1 418 688 euros
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Anulação do rendimento relativo ao acordo estabelecido com o Sistema Nacional de Saúde (SNS) registado em 2010: 1 303 533 euros.
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Anulação do rendimento relativo ao internato médico registado em 2009 e 2010: 255 538 euros.
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Outros gastos: 722 573.08 euros.
Os dois primeiros ajustamentos dizem respeito à correção de estimativas de rendimentos tributados em anos anteriores. Com efeito, nos exercícios de 2009 e 2010, correspondentes aos dois primeiros anos de atividade da B…, a valorização da produção desta entidade ainda estava a ser negociada com a ARSN. Assim, foram reconhecidos réditos relativos ao ambulatório médico e ao acordo estabelecido com o SNS, com base numa valorização preliminar, obtida em conformidade com a informação disponível e com a interpretação dos acordos celebrados pela B…. Com este acréscimo de rendimentos, sujeitos a tributação, nos exercícios de 2009 e 2010, a B… recorreu a estimativas uma vez que a negociação dos valores definitivos com a ARSC estava em curso e, portanto, quando do encerramento das contas, desconhecia a remuneração exata dos serviços de saúde prestados naqueles exercícios. Ou seja, apesar de nas datas de prestação de contas, os valores dos réditos não serem definitivos, com base na informação disponível e na interpretação dos acordos vigentes, a B… decidiu, e bem, refletir na sua contabilidade uma estimativa desses montantes.
No decurso das negociações, a informação disponível revelou-se mais completa e rigorosa, o que permitiu ajustar as estimativas feitas anteriormente. Foi o que a B… fez quando do encerramento das contas de 2011. Esta revisão das estimativas foi feita em baixa, traduzindo-se num lançamento contabilístico na rubrica “correções de exercícios anteriores”. Em 2012, ano em que as negociações com a ARSN foram concluídas, esta revisão em baixa do valor da remuneração dos serviços prestados em anos anteriores veio a revelar-se insuficiente, na medida em que, nesse exercício, foram reconhecidos ajustamentos adicionais, convertendo os valores dos réditos estimados em exercícios anteriores em definitivos.
O terceiro ajustamento foi feito no exercício de 2011, porque foi nesse exercício que a Requerente tomou conhecimento da posição (parcial) da ARSN em relação à remuneração dos profissionais integrados no segundo ano do internato médico.
Quer na estimativa inicial do valor dos réditos, quer na sua revisão subsequente (que originou gastos na conta de correções de exercícios anteriores), baseada na melhoria da qualidade e da quantidade de informação disponível na data de encerramento das contas de 2011, a B… cumpriu o disposto na legislação contabilística.
Em primeiro lugar, seguiu o regime do acréscimo. Trata-se de um dos dois pressupostos subjacentes à elaboração das demonstrações financeiras, integrando a Estrutura Conceptual do Sistema de Normalização Contabilística (Aviso n.º 8254/2015, de 29 de Julho)[1] (embora mantendo o sentido essencial, veio substituir a denominado princípio da especialização dos exercícios constante no revogado Plano Oficial de Contas).
Segundo o parágrafo 22 da referida Estrutura Conceptual, “a fim de satisfazerem os seus objetivos, as demonstrações financeiras são preparadas de acordo com o regime contabilístico do acréscimo. Através deste regime, os efeitos das transações e de outros acontecimentos são reconhecidos quando eles ocorram (e não quando caixa ou equivalentes de caixa sejam recebidos ou pagos) sendo registados contabilisticamente e relatados nas demonstrações financeiras dos períodos com os quais se relacionem. As demonstrações financeiras preparadas de acordo com o regime de acréscimo informam os utentes não somente das transações passadas envolvendo o pagamento e o recebimento de caixa mas também das obrigações de pagamento no futuro e de recursos que representem caixa a ser recebida no futuro. Deste modo, proporciona-se informação acerca das transações passadas e outros acontecimentos que seja mais útil aos utentes na tomada de decisões económicas”.
Adicionalmente, a B… observou os requisitos de reconhecimento de elementos nas demonstrações financeiras (parágrafos 80 e seguintes da Estrutura Conceptual). Um deles estabelece que o custo ou o seu valor seja mensurado com fiabilidade (alínea b) do parágrafo 81).
O recurso a estimativas na mensuração integra o processo de reconhecimento, conquanto não prejudique a fiabilidade. É o que resulta do parágrafo 84 da Estrutura Conceptual, segundo o qual “o segundo critério para o reconhecimento de um item é que este possua um custo ou um valor que possa ser mensurado com fiabilidade como referido nos parágrafos 31 a 38 desta Estrutura Conceptual. Em muitos casos, o custo ou o valor precisam de ser estimados; o uso de estimativas razoáveis é uma parte essencial da preparação das demonstrações financeiras e não destrói a sua fiabilidade. (…)”. Por se tratar de estimativas, devem ser permanentemente revistas com base na informação disponível. As alterações nos factos e circunstâncias devem conduzir a ajustamentos, por forma a aproximá-las dos resultados reais futuros (que, necessariamente, diferirão das estimativas).
Como é caraterístico do mundo empresarial, a B… opera em ambiente de incerteza, agravado pela circunstância de a negociação com a ARSN perdurar durante vários exercícios económicos o que se refletiu na impossibilidade de, nas datas das respetivas prestações de contas, conhecer o valor definitivo da remuneração dos serviços que prestara em cada um deles. Este constrangimento exigiu o recurso a estimativas iniciais e subsequentes na mensuração réditos, baseadas no melhor conhecimento existente em cada momento conforme a informação disponível e a melhor interpretação dos acordos em vigor, cumprindo com o pressuposto do acréscimo[2].
Depois deste enquadramento contabilístico, justificado pelo facto de, segundo o modelo da dependência parcial, que consta expressamente do ponto 10.º do preâmbulo do Decreto-Lei que aprova o CIRC, as normas contabilísticas influenciarem fortemente o apuramento do lucro real, importa observar o disposto naquele Código.
Já se referiu que o regime do acréscimo desempenha um papel central no apuramento do lucro do exercício. Portanto, é compreensível que o CIRC retome e densifique aquele pressuposto subjacente à elaboração das demonstrações financeiras. Sob a designação do “Periodização do lucro tributável”, o artigo 18.º do CIRC estabelece que “os rendimentos e os gastos, assim como as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao período de tributação em que sejam obtidos ou suportados, independentemente do seu recebimento ou pagamento, de acordo com o regime de periodização económica” (n.º 1).
Concretizando esta regra, a alínea b) do n.º 3 estabelece que “os réditos relativos a prestações de serviços consideram-se em geral realizados, e os correspondentes gastos suportados, na data em que o serviço é concluído, excepto (…)”.
A Requerente prestou serviços nos exercícios de 2009 e 2010 e imputou esses rendimentos aos exercícios em que foram realizados, seguindo o disposto no artigo 18.º do CIRC. Uma vez que recorreu a estimativas para a mensuração dos réditos dos serviços prestados, no exercício de 2011 procurou ajustar essas estimativas com base nas informações que foi recolhendo nos contactos estabelecidos com o seu cliente, disponiveis à data de encerramento de contas.
Acresce que a Requerente emitiu faturas à ARSN em 2009 e 2010 de forma a compensar os gastos suportados com o internato médico, garantindo o chamado “balanceamento entre gastos e rendimentos”. Em 2011, com base em informações prestadas pelo seu cliente, emitiu notas de crédito associadas às faturas de 2009 e 2010, anulando-as, e emitiu faturas referentes apenas aos gastos associados ao primeiro ano do internato médico. Também neste exercício, com base na informação que dispunha, tentou fazer/corrigir a imputação dos gastos e dos rendimentos ao exercício a que dizem respeito. Aliás, se estas operações contabilísticas não fossem executadas, isto é, se não tivesse havido estimativas e correções na contabilização dos réditos, estaria em causa uma violação do princípio da periodização do lucro tributável.
A inobservância da regra da periodização económica prevista no CIRC propiciaria a transferência de resultados de um período para o outro. Tendo como referência o revogado Plano Oficial de Contas, Tavares (1999:85)[3] defende que “os princípios contabilístico e fiscal da especialização dos exercícios possuem, portanto, uma matriz de base comum. As divergências situam-se, apenas, ao nível da densidade vinculativa, especialmente nos casos patológicos de omissão, por mero lapso, na inscrição de determinadas rubricas (positivas ou negativas) no balanço competente”. Segundo o Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul, de 30/6/2009, Proc. n.º 02475/08, “o princípio da tributação do lucro real não conflitua, antes está intimamente relacionado com o princípio da especialização de exercícios e ambos estão conexionados com o princípio da anualidade, segundo o qual as empresas deverão apurar, no fim de cada ano, os resultados do exercício da atividade durante o mesmo período e decidir, desde logo, sobre o destino a dar aos mesmos resultados, quando positivos”.
Porém, o n.º 2 do artigo 18.º do CIRC reconhece que o princípio da periodização económica admite algumas exceções: “as componentes positivas ou negativas consideradas como respeitando a períodos anteriores só são imputáveis ao período de tributação quando na data de encerramento das contas daquele a que deviam ser imputadas eram imprevisíveis ou manifestamente desconhecidas”. O Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 25/6/2008, Proc. n.º 0291/08, refere que «“as componentes positivas ou negativas” não são “imprevisíveis ou manifestamente desconhecidas” quando a sua não consideração, no exercício a que respeitam, se deve a erro contabilístico ou outro, do próprio contribuinte, já que tal norma há-de interpretar-se no sentido de que tais pressupostos, para serem relevantes, hão-de decorrer de situações externas que aquele não pode controlar». Segundo o Acórdão do CAAD n.º 367/2014-T, de 24-11-2014, «o Supremo Tribunal Administrativo tem (...) decidido, relativamente ao princípio da especialização dos exercícios, que “esse princípio deve tendencialmente conformar-se e ser interpretado de acordo com o princípio da justiça, com conformação constitucional e legal (artigos 266.º, n.º 2 da CRP e 55.º da LGT), por forma a permitir a imputação a um exercício de custos referentes a exercícios anteriores, desde que não resulte de omissões voluntárias e intencionais, com vista a operar a transferência de resultados entre exercícios”».
Os factos provados em relação aos três primeiros ajustamentos vieram demonstrar que decorreram de situações exógenas, fora do controlo da B… e que esta não procurou transferir resultados entre exercícios.
Relativamente ao quarto ajustamento (“outros”), os argumentos expendidos são aplicáveis, reiterando-se, dada a sua pertinência e relevância para este caso concreto, que a imputação a um período de tributação diferente é possível na hipótese de os gastos serem imprevisíveis ou manifestamente desconhecidos à data de encerramento de contas.
Ou seja, a contabilização na rubrica de gastos designada “correções de exercícios anteriores” em 2011 encontra acolhimento nas justificadas exceções ao princípio da especialização dos exercícios previstas na lei: a imprevisibilidade ou manifesto desconhecimento das componentes positivas ou negativas quando do encerramento de contas. Acresce que a ATA não teve qualquer prejuízo com o procedimento contabilístico adotado, que se afigura adequado às circunstâncias e que não decorre de omissões intencionais com vista a operar transferências de resultados entre exercícios.
C. Apreciação do agravamento das taxas de tributação autónoma
O n.º 14 do artigo 88.º do CIRC prevê o agravamento das taxas de tributação autónoma aplicáveis, em dez pontos percentuais, nos períodos de tributação em que o sujeito passivo apure prejuízo fiscal. Prescreve que “as taxas de tributação autónoma previstas no presente artigo são elevadas em 10 pontos percentuais quanto aos sujeitos passivos que apresentem prejuízo fiscal no período a que respeitem quaisquer dos factos tributários referidos nos números anteriores relacionados com o exercício de uma atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola não isenta de IRC”. Esta norma vigora desde 2010, mas apenas com a Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março, foi introduzido o n.º 20, ao qual se atribuiu uma natureza interpretativa. O número aditado refere que “para efeitos do disposto no n.º 14, quando seja aplicável o regime especial de tributação dos grupos de sociedades estabelecido no artigo 69.º, é considerado o prejuízo fiscal apurado nos termos do artigo 70.º”.
Até 2016, apesar de a informação vinculativa relativa ao processo n.º 2011004399, com Despacho do Subdiretor-Geral, de 2012-03-30, sustentar que “para efeitos de aplicação do disposto no n.º 14 do art.º 88.º do CIRC, nos casos em que os sujeitos passivos integram um grupo abrangido pelo regime especial de tributação das sociedades (RETGS), deve ser considerado o resultado (lucro tributável ou prejuízo fiscal) apurado na declaração do Grupo referente ao período de tributação a que respeitem quaisquer dos factos tributários passíveis de tributação autónoma e não o lucro tributável ou o prejuízo fiscal apurado por cada uma das sociedades que integram o perímetro de consolidação abrangido pelo regime”, subsistia a dúvida de saber se o agravamento das taxas de tributação autónoma era aplicável ao resultado individual de cada uma das sociedades participantes ou ao resultado fiscal do Grupo. Dito de outro modo, se o n.º 14 deveria ser interpretado no sentido dado pelo n.º 20, introduzido em 2016.
O RETGS é um modelo opcional, que determina que o cálculo do lucro tributável do Grupo seja feito através da soma algébrica dos lucros tributáveis e dos prejuízos fiscais apurados por cada uma das sociedades participantes no perímetro fiscal. Como nota o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 23-02-2017, Proc. 05493/12, “(…) o regime jurídico-fiscal do grupo de sociedades funda-se na denominada teoria da unidade, na qual se pugna pela consideração, para efeitos fiscais, do grupo de sociedades como uma unidade jurídica fictícia, deixando as sociedades integradas de ser sujeitos jurídicos diferentes, fruto da unidade económica que as congrega. Nesse sentido, a matéria coletável deve ser calculada de forma conjunta, dando lugar a uma única liquidação e eliminando a dupla tributação, sendo a respectiva base tributável apurada com recurso a dois tipos de operações, a saber: a) a eliminação das operações internas realizadas no seio do grupo, só relevando as praticadas com terceiras entidades; b) a compensação de perdas das várias sociedades componentes do grupo”.
Por outra banda, cumpre salientar que as tributações autónomas são uma componente integrante do IRC com caraterísticas especiais, o que suscitou muita polémica na Jurisprudência e na Doutrina. Em resumo, seguindo o disposto no Acórdão do CAAD relativo ao Processo n.º 567/2016-T, de 13 de Março de 2017, «já anteriormente se detetou, por um lado, a futilidade de procurar um conceito unitário de IRC que acomode, coerentemente, o regime das tributações autónomas, e que, por outro, a via metodologicamente mais profícua de gerar soluções juridicamente adequadas para a problemática em causa passa por compreender o regime do IRC actual como produto de uma evolução historicamente explicada que conduziu à edificação de uma estrutura de natureza dual ou híbrida, compreendendo um núcleo principal correspondente ao IRC tradicional, e uma parte adjacente, conexionada com aquele e fazendo parte da mesma realidade normativa global, com especificidades próprias das quais resulta um afastamento, em vários e substanciais aspetos, do regime principal, em termos de os princípios e soluções gerais, não obstante, por vezes, se aplicarem, por outras vezes, serem contraditórios, e como tal inaplicáveis, com a natureza própria dessa tal “normação adjacente” que se consubstancia nas designadas tributações autónomas».
O Grupo assume-se como uma unidade fiscal autónoma, incumbindo à sociedade dominante o pagamento em primeira linha do IRC e bem assim a submissão da declaração do Grupo. Havendo prejuízo fiscal do Grupo será com base neste montante que deve ser determinada a aplicação do artigo 88.º do CIRC. As tributações autónomas têm características próprias mas integram o IRC, pelo que devem ser consideradas sob uma ótica de Grupo, e não de modo casuístico, sociedade a sociedade. Assim, a aplicação da taxa agravada em dez pontos percentuais aplica-se ao prejuízo fiscal do Grupo.
Termos em que assiste, nesta sede, razão à Requerida.
IV. Decisão
Nestes termos, acordam neste Tribunal Arbitral em:
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Julgar improcedente a exceção de incompetência do Tribunal suscitada pela Requerida;
-
Julgar procedente o pedido de anulação da liquidação decorrente das correções à matéria coletável da sociedade B…, com impacto no prejuízo fiscal do Grupo, com a consequente anulação parcial da liquidação impugnada;
-
Julgar improcedente o pedido de anulação de liquidação relativamente ao agravamento das taxas de tributação autónoma aplicáveis ao prejuízo fiscal do grupo, absolvendo a Requerida desta parte do pedido.
V. Valor do processo
Fixa-se o valor do processo no valor dos actos tributários anulados em
€ 979.244,87, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
VI. Custas
Tendo em conta o valor da causa indicado, nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em 13 770 euros, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a suportar pela Requerente e Requerida, em função do respetivo decaimento. Cabendo à Requerente 761.62 euros e à ATA o remanescente.
Lisboa, 17 de novembro de 2017
Os Árbitros
(Fernanda Maçãs)
(Carla Castelo Trindade)
(Daniel Taborda)
[1] Pelo Despacho n.º 264/2015- XIX do Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, de 16 de julho de 2015, foi homologada a Estrutura Conceptual do Sistema de Normalização Contabilística, aprovado pelo Decreto- Lei n.º 158/2009, de 13 de julho, alterado pelo Decreto- Lei n.º 98/2015, de 2 de junho.
[2] Esta incerteza mantém-se na atualidade, uma vez que é intrínseca à atividade da B… . No Relatório de Demonstrações Financeiras 2016, que faz parte do Relatório Integrado 2016 da A…, p. 93, pode ler-se na nota 2.3. (“Julgamentos críticos/estimativas”) que «decorrem nesta data processos de conferência com a Administração Regional de Saúde do Norte, I.P. (“ARS Norte”), relativamente aos acertos de contas dos exercícios de 2014, 2015 e 2016 do Estabelecimento Hospitalar de … . Em relação aos acertos de contas dos exercícios de 2014 e 2015, estão a esta data, em processo de encerramento de apuramento da Produção real, sendo que o mesmo já deveria ter sido concluído em junho de 2015 e junho de 2016, respetivamente. Segundo o previsto no contrato de gestão, o acordo referente ao exercício de 2016, deverá ocorrer até final de junho de 2017». Esta questão merece reparo na Certificação Legal das Contas e Relatório de Auditoria (demonstrações financeiras consolidadas de 2016) no parágrafo intitulado “Matérias Relevantes de Auditoria”. A primeira matéria relevante divulgada diz respeito ao “reconhecimento e mensuração do rédito e cumprimento dos requisitos contratuais e regulamentares de prestação pública dada a complexidade dos Contratos de Gestão das Parcerias Público-Privadas do Hospital de … e do Hospital de …”. O primeiro risco de distorção material significativo é assim descrito: “(…) O Grupo tem sob gestão o serviço de dois hospitais públicos: o Hospital de … e o Hospital de … . A atividade e o rédito destas duas unidades são apurados de acordo com o estipulado nos Contratos de Gestão de Parceria Público-Privada, celebrados com as Administrações Regionais de Saúde (…)”. Conclui que “o processo de reconhecimento e mensuração da receita da prestação pública envolve por isso, um julgamento significativo do Órgão de Gestão conforme divulgado na Nota 2.3 das Notas às Demonstrações Financeiras Consolidadas, no que diz respeito, em particular, à determinação da produção elegível e sua mensuração.” (https://www.A....pt/Section/... /Relat%c3%b3rios+e+Contas/173, acedido em 5-10-2017).
[3] Tavares, T.M.C.C, 1999, “Da Relação de Dependência Parcial entre a Contabilidade e o Direito Fiscal na Determinação do Rendimento Tributável das Pessoas Colectivas: Algumas Reflexões ao Nível dos Custos”, Ciência e Técnica Fiscal, 396, pp.7-177.