Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 174/2017-T
Data da decisão: 2017-10-27  IRC  
Valor do pedido: € 59.291,31
Tema: IRC – benefícios fiscais, artigo 19.º EBF.
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Decisão Arbitral

 

 

I - Relatório

 

1. A A..., pessoa coletiva n.º…, com sede na Rua … n.º…, …-… Sintra, (doravante designada por “Requerente”) apresentou, em 15-03-2017, ao abrigo do artigo 2.º n.º 1, alínea a) e do artigo 10.º, n.ºs 1 e 2 do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, previsto no Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66- B/2012, de 31 de Dezembro (doravante abreviadamente designado “RJAT”) e dos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março, pedido de pronúncia arbitral no qual solicita a declaração de ilegalidade da decisão de indeferimento do Recurso Hierárquico, que não considerou a dedução relativa ao benefício fiscal para a criação liquida de postos de trabalho, e o consequente reembolso do imposto indevidamente pago em excesso no montante total de € 59.291,31 (cinquenta e nove mil duzentos e noventa e um euros e trinta e um cêntimos), acrescido dos respetivos juros indemnizatórios.

 

2. É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (adiante designada por “Requerida”).

 

3. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira, em 24-03-2016.

 

4. Nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico do CAAD designou como árbitro do tribunal arbitral singular o Exmo. Senhor Dr. Olívio Mota Amador que, no prazo aplicável, comunicou a aceitação do encargo.

 

5. As partes foram notificadas, em 11-05-2017, da designação do árbitro, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

 

6. De acordo com o disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Tribunal Arbitral foi constituído em 26-05-2017.

 

7. A Requerida, devidamente notificada através do despacho arbitral, de 06-06-2017, apresentou, em 29-06-2017, a sua Resposta e remeteu o Processo Administrativo.

 

8. O Tribunal Arbitral por despacho, de 17-08-2017, dispensou a realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, por não ter sido invocada matéria de exceção, solicitada a realização de diligências probatórias adicionais, nem suscitadas questões que obstassem ao conhecimento do mérito do pedido, o que fez ao abrigo dos princípios da autonomia do Tribunal na condução do processo, e em ordem a promover a celeridade, simplificação e informalidade deste (vd., artigos 19.º, n.º 2, e 29.º, n.º 2, do RJAT).

O Tribunal mandou também notificar as Partes para, no prazo de 5 dias, declararem se pretendiam produzir alegações. Caso houvesse lugar a alegações, o Tribunal determinou que estas deveriam ser produzidas no prazo de 15 dias a partir da notificação do despacho, concedendo-se à Requerida, caso assim entendesse, a possibilidade de juntar as suas alegações com caracter sucessivo relativamente às produzidas pela Requerente.

O Tribunal Arbitral designou o dia 18-10-2017 como prazo limite para a prolação da decisão arbitral.

9. A Requerente, em 11-09-2017, declarou que pretendia apresentar alegações por escrito.

10. A Requerente apresentou as suas alegações em 18-09-2017.

11. As alegações da Requerida foram apresentadas em 03-10-2017.

12. Por despacho do Tribunal Arbitral, de 18-10-2017, foi estabelecido o dia 27-10-2017 como nova data limite para ser proferida a decisão arbitral.

13. A posição da Requerente, de harmonia com o disposto no pedido de constituição do Tribunal Arbitral e nas alegações escritas, é, em síntese, a seguinte:

13.1. O artigo 19.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), tem como ratio incentivar a criação de postos de trabalho. Ocorrendo essa criação, os encargos correspondentes à mesma são majorados em 150%, conforme o disposto no n.º 1 do artigo 19.º do EBF.

13.2. O n.º 3 do artigo 19.º do EBF refere-se apenas que o montante máximo da majoração anual, por posto de trabalho, é de 14 vezes a retribuição mínima mensal garantida. O limite previsto nesta norma aplica-se independentemente do número de meses que o colaborador prestou trabalho na empresa.

13.3. Nem a letra nem o espírito da lei pretenderam limitar a utilização do benefício pelo facto de o trabalhador não concorrer para ele nos 365 dias do ano.

13.4. O entendimento da Autoridade Tributária não interpreta qualquer norma jurídica, mas antes cria uma nova norma.

13.5. A Lei n.º 72/98, de 3 de novembro, que introduziu este benefício, e os diplomas que posteriormente o vieram alterar não fazem qualquer referência à delimitação/ajustamento proporcional do benefício fiscal.

13.6. Foi precisamente neste sentido que decidiu o Tribunal Arbitral na Decisão no processo n.º 212/2013-T.

13.7. Além disso, a interpretação da Autoridade Tributária e Aduaneira é restritiva do artigo 19.º do EBF, sendo que esta interpretação, no âmbito dos benefícios fiscais, é proibida.

13.8. A procedência do pedido não só deverá determinar o reembolso do imposto indevidamente pago e entregue nos cofres do Estado, como ainda o pagamento dos juros indemnizatórios incidentes sobre aqueles, nos termos do disposto no artigo 43.º e 100.º da LGT e no artigo 61.º do CPPT.

14. A posição da Requerida, expressa na resposta e nas alegações escritas, pode ser sintetizada no seguinte:

14.1. Decorre do disposto no n.º 3 do artigo 19.º do EBF que o benefício fiscal em causa pode refletir-se em 6 exercícios económicos, sempre que o início do contrato de trabalho não coincida com o início do exercício económico, sendo certo, contudo, que o cômputo do benefício fiscal não pode exceder 5 anos. Nos períodos de tributação em que se verificar o início ou o fim das condições de elegibilidade do trabalhador para efeitos deste benefício fiscal, o limite deve ser ajustado proporcionalmente ao período de tempo em que se verificam as condições.

14.2. A Requerida teve um entendimento correto expresso na autoliquidação do IRC, referente ao ano de 2012.

14.3. Assim, no exercício em que se verificar o início ou o fim das condições de elegibilidade do trabalhador para o benefício, o limite máximo da majoração anual deve ser ajustado proporcionalmente ao tempo em que se mantiverem essas condições.

14.4. Nos casos em que o benefício fiscal se reflete por 6 anos económicos, o cômputo do mesmo não pode, nos termos legais, exceder 5 anos havendo, portanto, que fazer um ajustamento em conformidade.

14.5. Dito de outra forma, no exercício em que se verificar o início ou o fim das condições de elegibilidade do trabalhador para o benefício, o limite máximo da majoração anual deve ser ajustado proporcionalmente ao tempo em que se mantiverem essas condições.

14.6. De acordo com o exposto, se o trabalhador é admitido pela Requerente em Dezembro, para efeitos desse exercício económico, apenas releva esse mês e os dois meses seguintes do próximo ano (atento o período de tributação).

14.7. A não ser assim, o benefício fiscal referente a esse trabalhador no período de tributação de 2012, seria, proporcionalmente, 12 vezes superior ao de um trabalhador cujo início do contrato de trabalho por tempo indeterminado tivesse ocorrido em 1 de março de 2012, o que, de facto, redundaria num enviesamento da norma.

14.8. A perfilhar-se o entendimento da Requerente, o benefício fiscal ocorreria por um período de 6 anos, o que não tem qualquer aderência na letra do artigo 19.º do EBF, refletindo uma situação de desigualdade face a outros sujeitos passivos em que existe uma coincidência entre o período durante o qual usufrui do benefício fiscal e o período de tributação.

14.9. A Requerente sustenta a sua argumentação, na decisão proferida no Proc.º n.º 212/2013-T. Contudo, em tal decisão arbitral, como, aliás, foi notado no Proc.º n.º 129/2016-T, “há uma circunstância ponderosa, que não foi, pelo menos de forma perceptível, considerada na decisão do processo 212/2013T, nem na argumentação da Requerente, que é a circunstância de a interpretação que fez vencimento naquele aresto, e em que aquela se ancora, encerrar uma violação directa e assinalável do princípio constitucional da igualdade”.

 

II - Saneamento

15. As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas e encontram-se regularmente representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O tribunal é competente e encontra-se regularmente constituído.

O processo não enferma de nulidades.

Não foram suscitadas exceções.

Não se verificam quaisquer outras circunstâncias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.

Nestes termos, o Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído para apreciar e decidir o objeto do processo.

III - Mérito

III.1. Matéria de facto

16. Factos provados

16.1. Com relevo para a apreciação e decisão das questões suscitadas dão-se como assentes e provados os seguintes factos:

  1. A Requerente opera na área da distribuição alimentar e procede ao recrutamento de colaboradores, nos termos definidos pelo artigo 19.º do EBF.

 

  1. A Requerente adota um período de tributação diferente do ano civil, compreendido entre 1 de março e 28 de fevereiro, ou seja, para efeitos de análise dos presentes autos o período de tributação iniciou-se em 01-03-2012 e terminou em 28-02-2013.

 

  1. A Requerente procedeu à entrega tempestiva da Declaração de Rendimentos Modelo 22 do IRC, referente ao período de 2012, na qual majorou o benefício fiscal, constante do artigo 19.º do EBF, de modo proporcional ao período anual de trabalho prestado pelos seus colaboradores.

 

  1. A Requerente adotou o entendimento, expresso na alínea anterior, apesar de não concordar com o mesmo, mas para evitar a existência e manutenção de contencioso tributário com a AT.

 

  1. No exercício de 2012, a Requerente para efeitos de determinação da matéria coletável deduziu, a título de benefício fiscal relativo à criação líquida de postos de trabalho, o montante de € 1.364 063,50.

 

  1. A Requerente apresentou a reclamação graciosa da autoliquidação de IRC relativa ao exercício de 2012, que recebeu o n.º …2015…, por considerar ter efetuado uma dedução, ao resultado liquido para efeitos de apuramento do lucro tributável (a título de benefício fiscal previsto no artigo 19.º do EBF), de valor inferior ao legalmente devido.

 

  1. A reclamação graciosa, identificada na alínea anterior, foi indeferida por despacho do Chefe de Divisão da Divisão de Gestão e Assistência Tributária da Unidade dos Grandes Contribuintes, em 11-11-2015.

 

  1. A Requerente interpôs recurso hierárquico para o Ministro das Finanças, que recebeu o n.º …2015…, da decisão de indeferimento, identificada na alínea anterior.

 

  1. Por despacho da Direção de Serviços do IRC, de 02-12-2016, exarado na Informação n.º…, de 08-06-2016, o recurso hierárquico foi parcialmente deferido, mas na parte respeitante à majoração do benefício fiscal, constante do artigo 19.º do EBF, manteve o indeferimento da pretensão da Requerente.

16.2. Inexistem outros factos com relevo para apreciação do mérito da causa que não se tenham provado.

16.3. Fundamentação da matéria de facto

Quanto à matéria de facto dada como provada a convicção do Tribunal Arbitral fundou-se na livre apreciação da prova documental junta aos autos, cuja autenticidade não foi colocada em causa, bem como na análise do processo administrativo remetido pela Requerida.

III.2. Matéria de Direito

17. A questão em causa nos presentes autos arbitrais consiste em saber se o benefício fiscal, previsto no artigo 19.º do EBF, deve ser ajustado proporcionalmente, para efeitos do limite máximo da majoração, nos casos em que os contratos de trabalho elegíveis cessem ou se iniciem durante o respetivo período de tributação.

Cumpre apreciar.

18. A Lei n.º 72/98, de 3 de novembro, criou o incentivo à criação de emprego para jovens, tendo aditado o artigo 48.º-A ao EBF, que sofreu diversas alterações ao longo tempo.

As normas legais que relevam para o presente caso, na redação em vigor à data dos factos, têm o seguinte teor:

 “Artigo 19.º
Criação de emprego

1 - Para a determinação do lucro tributável dos sujeitos passivos de IRC e dos sujeitos passivos de IRS com contabilidade organizada, os encargos correspondentes à criação líquida de postos de trabalho para jovens e para desempregados de longa duração, admitidos por contrato de trabalho por tempo indeterminado, são considerados em 150 % do respectivo montante, contabilizado como custo do exercício.

(…)

3 - O montante máximo da majoração anual, por posto de trabalho, é o correspondente a 14 vezes a retribuição mínima mensal garantida.

(…)

5 - A majoração referida no n.º 1 aplica-se durante um período de cinco anos a contar do início da vigência do contrato de trabalho, não sendo cumulável, quer com outros benefícios fiscais da mesma natureza, quer com outros incentivos de apoio ao emprego previstos noutros diplomas, quando aplicáveis ao mesmo trabalhador ou posto de trabalho.”

 

Note-se que antes da republicação do EBF, operada pelo Decreto-Lei n.º 108/2008, de 26 de junho, a norma atrás transcrita constava do artigo 17.º.

 

19. Da leitura da norma reproduzida no n.º anterior resulta que estamos perante um benefício fiscal. Nos termos do artigo 2.º, n.º 1, do EBF, consideram-se benefícios fiscais as medidas de caracter excecional. A este respeito concordamos inteiramente com CASALTA NABAIS quando afirma que não é de aceitar a natureza excecional das normas jurídicas que preveem benefícios fiscais “(…) já que, embora os benefícios fiscais sejam despesas fiscais  (que são pela sua própria natureza, despesas passivas) que integram uma disciplina jurídica derrogatória da disciplina ordinária do respectivo imposto, reveladora dum regime mais favorável para o contribuinte do que o implicado no seu tratamento ordinário e expressão duma função promocional, eles constituem um instrumento normal de política económica e social do Estado social contemporâneo e não um instrumento excepcional à maneira do entendimento próprio do Estado liberal.” (vd., Direito Fiscal, 10.ª ed., Almedina, 2017, pp. 402).

Relativamente à interpretação das normas que estabelecem benefícios fiscais, de acordo com o disposto no artigo 10.º do EBF a integração analógica encontra-se vedada. Porém, é admissível a interpretação extensiva, ou seja, se o intérprete concluir que a letra da lei se quedou aquém do seu espírito, haverá que adequar a letra ao respetivo espírito por via da interpretação extensiva (vd. BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, 13.ª reimpressão, Coimbra, Almedina, 2002, pp. 185).

Importa sublinhar que a especificidade da situação jurídica que fundamenta a criação do benefício fiscal impõe ao intérprete especiais cuidados na preservação da mens legis. Efetivamente, ao representarem uma derrogação dos princípios da igualdade e da capacidade contributiva, as normas criadoras de benefícios fiscais devem ser justificadas por um interesse público constitucionalmente relevante superior ao correspondente interesse tutelado pela tributação (vd., NUNO SÁ GOMES, Teoria Geral dos benefícios Fiscais, Cadernos de Ciência e Técnica fiscal, n.º 165, 1991, pp. 62).

20. O artigo 19.º do EBF cria um benefício fiscal que consiste, no âmbito do IRC, em contabilizar como custo de exercício, em 150% do respetivo montante, os encargos correspondentes à criação líquida de postos de trabalho para jovens e para desempregados de longa duração, admitidos por contrato de trabalho por tempo indeterminado.

Conforme resulta do disposto no artigo acima referido o legislador estabelece limites de montante e de duração neste benefício fiscal.

Primeiro, nos termos do n.º 3, limita o montante da majoração anual, por posto de trabalho, a 14 vezes a retribuição mínima mensal garantida. A lei refere-se ao montante máximo da majoração anual (14 vezes a retribuição mínima mensal garantida) veiculando a ideia de que o valor dessa majoração é variável podendo ser inferior ao limite máximo estabelecido.

Depois, nos termos do n.º 5, limita a duração da majoração a um período de cinco anos a contar do início de vigência do contrato de trabalho. Estabelecendo esta norma um limite temporal para o benefício fiscal, calculado tendo por base o início da vigência do contrato de trabalho, faz todo o sentido que a majoração máxima, a que se refere o n.º 3 do artigo 19.º, deva ter por base o mesmo período. Consequentemente, o limite máximo de majoração anual deve ser ajustado proporcionalmente no exercício em que ocorre o início ou o fim das condições de ilegibilidade do trabalhador para o referido beneficio.

21. Como, de forma pertinente, salienta a Decisão Arbitral n.º 129/2016-T, de 16 de outubro de 2016, e para cujo teor desde já aqui remetemos, aceitando-se que o limite máximo à majoração consagrado no n.º 3 do artigo 19.º do EBF é aplicável a todos os exercícios, maxime, ao primeiro e ao último exercício, quando a admissão do trabalhador elegível para efeitos do benefício fiscal em causa não se dê no primeiro dia do exercício fiscal da entidade empregadora, “(…) estar-se-á a gerar uma situação de desigualdade, entre os destinatários do benefício fiscal, sem fundamento axiológico que o justifique e de um modo absolutamente arbitrário.  Que assim é, basta atentar no exemplo limite de duas entidades empregadoras, que empreguem um trabalhador elegível para o benefício fiscal, pagando-lhes o mesmo salário (p. ex. duas vezes o salário mínimo nacional), mas em que uma emprega o seu trabalhador no primeiro dia do seu exercício fiscal, e outra a meio. Neste exemplo, enquanto que a primeira entidade irá ter um benefício fiscal igual a 5 vezes 14 salários mínimos nacionais, a segunda irá ter um benefício igual a 5 vezes 14 salários mínimos nacionais. A questão, aqui chegados, torna-se a de saber se esta solução se justifica e terá sido querida pelo legislador, sendo que a resposta a tal questão não poderá deixar de ser, julga-se, negativa. Com efeito, a situação de desigualdade entre as duas entidades empregadoras, no exemplo, ou, em geral, entre entidades empregadoras em função da data, mais ou menos próxima do meio do exercício fiscal em que admitam trabalhadores elegíveis para o benefício fiscal, não colhe qualquer justificação material “

Além disso, a citada Decisão Arbitral acrescenta que “ (…)o elemento racional ou teleológico da interpretação aponta efectivamente para uma interpretação que restrinja o alcance do benefício fiscal, tendo-se de concluir que o legislador terá, porventura, na norma em causa, exprimido o seu pensamento de maneira imperfeita, e existindo uma justificação racional razoável – a afirmação cabal do princípio da igualdade – para operar uma interpretação restritiva, que implique que, quando se prolongue por seis exercícios fiscais, o montante máximo do benefício fiscal consagrado no artigo 19.º/3 do EBF seja proporcionalmente reduzido à duração do prazo de 5 anos do contrato do trabalhador que o justifica, no primeiro e no sexto exercício”

22. O princípio da igualdade, entendido como limite objetivo da discricionariedade legislativa, proíbe a adoção de medidas que estabeleçam distinções discriminatórias, ou seja, desigualdades de tratamento manifestamente infundadas, destituídas de fundamento razoável ou justificação mínima.

Em síntese, o princípio da igualdade, enquanto princípio vinculativo da lei, traduz-se na ideia de proibição do arbítrio (vd., acórdão do Tribunal Constitucional n.º 186/90, de 06-06-1998).

Como salienta o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 211/03, de 28 de abril, a violação do princípio constitucional da igualdade implica uma concreta e efetiva situação de diferenciação injustificada ou discriminatória.

Daí que aquele princípio não proíba que se criem distinções, desde que estas não sejam arbitrárias ou desprovidas de fundamento material bastante.

Como foi referido no n.º anterior e exposto detalhadamente na Decisão Arbitral proferida no proc.º n.º 129/2016-T, o entendimento da Requerente cria uma desigualdade sem qualquer fundamento que acarreta diretamente uma violação do princípio constitucional da igualdade.

Atendendo ao exposto no n.º 19 supra acerca das normas sobre benefícios fiscais, justifica-se, no presente caso, uma interpretação restritiva do artigo 19.º do EBF resultante da afirmação do princípio constitucional da igualdade.

23. Face ao exposto, conclui-se ter sido correta a aplicação do Direito efetuada pela AT, pelo que a decisão do recurso hierárquico não enferma do vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito na interpretação do artigo 19.º do EBF, improcedendo o pedido formulado pela Requerente.

24. Cabe agora proceder à análise do pedido da Requerente, formulado no Pedido de Pronuncia Arbitral e nas Alegações, para o pagamento de juros indemnizatórios.

Com fundamento no artigo 24.º, n.º 5, do RJAT tem-se entendido que é possível o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios em processos arbitrais.

Nos termos do artigo 43.º, n.º 1, da LGT são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, ter havido erro imputável aos serviços do qual resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

A condição necessária para a atribuição dos juros indemnizatórios consiste na demonstração da existência de erro sobre os pressupostos de facto ou de direito imputável aos serviços da Administração Fiscal o que no presente caso não aconteceu. Assim, conclui-se, sem necessidade de mais considerações, pela improcedência do pedido de pagamento de juros indemnizatórios à Requerente.

IV - Decisão

Em face do exposto, o Tribunal Arbitral decide julgar improcedente o pedido arbitral e, em consequência, absolver a Requerida do pedido e condenar a Requerente nas custas do processo.

V - Valor do Processo

Atendendo ao disposto nos artigos 32.º do CPTA, 306.º, n.º 2, do Código do Processo Civil e 97.º-A do CPPT, aplicáveis por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT, e no artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT) fixa-se o valor do processo em € 59.291,31 (cinquenta e nove mil duzentos e noventa e um euros e trinta e um cêntimo), 

 

VI - Custas

Custas a cargo da Requerente, no montante de € 2.142,00 (dois mil cento e quarenta e dois euros), nos termos da Tabela I do RCPAT, em cumprimento do disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, bem como do disposto no artigo 4.º, n.º 4, do RCPAT.

Notifique-se.

Lisboa, Centro de Arbitragem Administrativa, 27 de outubro de 2017

 

O Árbitro

 

Olívio Mota Amador