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DECISÃO ARBITRAL
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RELATÓRIO
Em 23 de março de 2017, A…, SA, com o NIPC … e sede na Rua …, …-… Barcelos (doravante designada por Requerente), veio, ao abrigo do disposto no artigo 10.º, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), requerer a constituição de Tribunal Arbitral, em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (adiante AT ou Requerida), tendo em vista a declaração de ilegalidade e consequente anulação da liquidação de Imposto do Selo (Verba 28.1, da TGIS) referente ao ano de 2013 e ao prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de …, concelho de ..., sob o artigo …, no valor global de € 10 304,87 (dez mil, trezentos e quatro euros e oitenta e sete cêntimos), valor económico que atribui ao pedido.
Síntese do pedido:
Como fundamentos do pedido de anulação do ato de liquidação de Imposto do Selo (verba 28.1, da TGIS) referente ao ano de 2013 e ao imóvel identificado no pedido de pronúncia arbitral, invoca a Requerente que o mesmo se encontra classificado como “terreno para construção”, sendo a liquidação impugnada ilegal, por erro nos pressupostos de direito, já que a Lei n.º 55-A/2012 veio sujeitar a tributação, em sede de Imposto do Selo, os prédios urbanos “com afetação habitacional”, com um VPT superior a € 1 000 000,00, pretendendo assim tributar a propriedade de imóveis de luxo.
Que resulta do artigo 6.º, do Código do IMI, que os prédios urbanos podem ter uma das seguintes classificações: a) habitacionais, b) comerciais, industriais ou para serviços, c) terrenos para construção e d) outros, devendo concluir-se que prédios habitacionais e terrenos para construção são de natureza absolutamente distinta, havendo terrenos para construção que nem sequer se destinam à construção de edifícios habitacionais.
Que apenas com a nova redação introduzida à verba 28, da TGIS, pela lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, à qual não foi atribuído caráter interpretativo, os terrenos para construção passaram a ficar abrangidos por aquela norma de incidência objetiva.
Que a AT perfilha entendimento diverso, ao indeferir a reclamação graciosa apresentada contra a liquidação em análise, bem como o subsequente recurso hierárquico daquela decisão de indeferimento.
II. SANEAMENTO
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O tribunal arbitral singular é competente e foi regularmente constituído em 7 de junho de 2017, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º e 6.º, todos do RJAT.
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As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º, do RJAT, e do artigo 1.º, da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março.
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O processo não padece de vícios que o invalidem.
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Notificada nos termos e para os efeitos previstos no artigo 17.º, do RJAT, veio a AT, por requerimento de 4 de agosto de 2017, comunicar que “por despacho de 11.07.2017, da Exma. Sr.ª Diretora de Serviços da DSIMT - Direção de Serviços do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis, do Imposto do Selo, do Imposto Único de Circulação e das Contribuições Especiais foi proposta a revisão do ato sub judice, com a consequente anulação da liquidação n.º 2013…, em conformidade com o entendimento constante do Despacho n.º 6/2017-XXI de janeiro, do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais”, tendo o Serviço de Finanças competente procedido ao registo que iria “despoletar de imediato uma liquidação corretiva em sede de Verba 28 TGIS”.
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Por despacho de 1 de setembro de 2017, foi a Requerente notificada para informar o tribunal arbitral sobre se se conformava com a decisão da Requerida, com a consequente extinção do processo, por inutilidade superveniente da lide, ou se pretendia que o mesmo prosseguisse para prolação de decisão sobre o mérito da causa.
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Em requerimento apresentado em 13 de setembro de 2017, veio a Requerente requerer a extinção do processo, por inutilidade superveniente da lide, com pedido de condenação da Requerida na totalidade das custas.
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FUNDAMENTAÇÃO
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Matéria de facto:
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Factos provados
Tendo-se procedido à análise dos documentos juntos pela Requerente à P. I., não contestados pela Requerida, considera-se provada a factualidade que segue:
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O prédio urbano a que respeita a liquidação de Imposto do Selo (verba 28.1, da Tabela Geral do Imposto do Selo) impugnada nos autos encontrava-se inscrito na matriz da freguesia de …, concelho de ..., sob o artigo …;
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De acordo com a respetiva caderneta predial (Doc. 1), emitida em 11 de abril de 2014, o referido prédio estava descrito como “Terreno para Construção”;
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Sobre o valor patrimonial tributário de € 1 030 486,50, a AT emitiu, em 17 de março de 2014, a liquidação de Imposto do Selo, pela quantia de € 10 304,87, pagável em três prestações, em abril, julho e novembro e 2014 (Doc.s 2 e 3, correspondentes às cópias das notas de cobrança n.º 2014 … (1.ª Prestação) e 2014 … (2.ª Prestação);
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Através do ofício n.º … do Serviço de Finanças de ... …, datado de 23 de dezembro de 2016, foi a Requerente notificada da decisão de indeferimento do Recurso Hierárquico n.º …2014…, apresentado na sequência do indeferimento do procedimento de Reclamação Graciosa n.º …2014…, tendo por objeto a liquidação ora impugnada (Doc. 5).
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Factos não provados
Não existem factos que devam considerar-se como não provados.
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Do direito: a inutilidade superveniente da lide.
A inutilidade superveniente da lide constitui causa de extinção da instância, nos termos da alínea e) do artigo 277.º, do Código de Processo Civil (CPC), aplicável subsidiariamente ao processo arbitral tributário, ex vi do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT, que ocorre “no caso de a lide vir a terminar, por falta de algum pressuposto ou elementos essencial”[1].
Tendo a Requerida vindo comunicar aos autos que “por despacho de 11.07.2017, da Exma. Sr.ª Diretora de Serviços da DSIMT - Direção de Serviços do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis, do Imposto do Selo, do Imposto Único de Circulação e das Contribuições Especiais foi proposta a revisão do ato sub judice, com a consequente anulação da liquidação n.º 2013…, em conformidade com o entendimento constante do Despacho n.º 6/2017-XXI de janeiro, do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais”, deverá considerar-se satisfeita a pretensão da Requerente, aliás, por esta confirmada, tendo o processo perdido o seu objeto.
De facto, a aludida “anulação da liquidação” objeto dos autos, enquanto revogação de um ato inválido – o princípio da indisponibilidade dos créditos tributários, consagrado no artigo 30.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária, veda à AT a revogação de atos de liquidação válidos –, tem, salvo disposição especial, efeitos retroativos (artigo 171.º, n.º 3, do Código de Procedimento Administrativo – CPA), constituindo a Administração no dever de reconstituir a situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado (artigo 172.º, n.º 1, do CPA), “consequência necessária do princípio da legalidade”[2].
Revogada a liquidação impugnada, cessa o interesse processual da Requerente, “que constitui um pressuposto processual ou condição da ação, que «consiste na necessidade de usar do processo, de instaurar ou fazer prosseguir a ação». (…) esse interesse tem de existir no momento em que o processo se inicia, mas tem de manter-se a longo dele, justificando a sua falta a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide”[3].
Sendo a causa da inutilidade superveniente da lide imputável à Requerida, que voluntariamente procedeu à revogação do ato tributário impugnado, após a constituição do Tribunal Arbitral, quando poderia tê-lo feito em data anterior, ou seja, no prazo de 30 dias a contar do conhecimento do pedido da sua constituição, nos termos do artigo 13.º, do RJAT, fica esta responsável pelas custas processuais, conforme o disposto nos n.ºs 3 e 4 do artigo 536.º, do CPC (ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).
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DECISÃO
Pelos motivos que antecedem, decide-se:
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Declarar extinta a presente instância arbitral, por inutilidade superveniente da lide (nos termos do artigo 277.º, alínea e), do CPC, ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT);
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Condenar a AT no pagamento da taxa de arbitragem (nos termos do artigo 536.º, n.ºs 3 e 4, do CPC (ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).
VALOR DO PROCESSO: De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 10 304,87 (dez mil, trezentos e quatro euros e oitenta e sete cêntimos).
CUSTAS: Calculadas de acordo com o artigo 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e da Tabela I a ele anexa, no valor de € 918,00 (novecentos e dezoito euros), a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.
Lisboa, 6 de outubro de 2017.
O Árbitro,
/Mariana Vargas/
Texto elaborado em computador, nos termos do n.º 5 do artigo 131.º do CPC, aplicável por remissão da alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do DL 10/2011, de 20 de janeiro.
A redação da presente decisão rege-se pelo acordo ortográfico de 1990.
[1] MENDES, João de Castro, “Direito Processual Civil”, II volume, AAFDL, 1987, pág. 444.
[2] SOUSA, Marcelo Rebelo e MATOS, André Salgado de, “Direito Administrativo Geral – Tomo III – Atividade Administrativa”, D. Quixote, 2009, pág. 208.
[3] SOUSA, Jorge Lopes de, “Código de Procedimento e de Processo Tributário”, Anotado e Comentado, Volume II, Áreas Editora, 6.ª Edição, 2011, pág. 307.
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