Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 165/2017-T
Data da decisão: 2017-09-12  IRS  
Valor do pedido: € 58.369,54
Tema: IRS – mais-valias mobiliárias
Versão em PDF

 

DECISÃO ARBITRAL

 

 

1.      RELATÓRIO

 

1.1.A… e B…, casados entre si, contribuinte n.º … e …, respectivamente, residentes na Rua …, …, …– Porto, doravante designados por Requerentes, apresentaram em 09/03/2017 pedido de constituição de tribunal e de pronúncia arbitral, no qual solicitam a anulação da decisão de indeferimento parcial da reclamação graciosa que tem por objecto a  liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) do ano  de 2014 (2016…) e respectivos juros compensatórios.

 

1.2.O Exmo. Senhor Presidente do Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) designou em 05/05/2017 como árbitro Francisco Nicolau Domingos.

 

1.3.No dia 22/05/2017 ficou constituído o tribunal arbitral.

 

1.4.Cumprindo a estatuição do art. 17.º, n.º 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (RJAT) foi a Requerida, em 22/05/2017 notificada para, querendo, apresentar resposta, solicitar a produção de prova adicional e remeter o processo administrativo (PA).

 

 

1.5.Em 27/06/2017 a Requerida apresentou resposta, na qual defende a improcedência dos pedidos formulados nos autos.

 

 

1.6.O tribunal em 30/06/2017 perante a ausência de prova  a produzir, a inexistência de matéria de excepção a conhecer antes de apreciado o mérito e a desnecessidade de convidar as partes a corrigirem as suas peças processuais decidiu dispensar a realização da reunião a que o art. 18.º, n.º 1 do RJAT se refere, com fundamento no princípio da autonomia do tribunal arbitral na condução do processo e na determinação das regras a observar com vista à obtenção, em prazo razoável, de uma pronúncia de mérito sobre as pretensões formuladas, cfr. art. 16.º, al. c) do RJAT, concedeu 8 dias para que as partes, querendo, apresentassem as alegações finais escritas e designou data limite para proferir a decisão arbitral.

 

1.7.As partes apresentaram as alegações finais escritas em 11/07/2017 e 12/07/2017, respectivamente, mantendo as suas posições iniciais.

 

 

2.      POSIÇÕES DAS PARTES

 

Os Requerentes começam por alegar que, na sequência de uma acção inspectiva ao IRS de 2014 foi emitida uma liquidação de € 62 516,22 (2016…) alicerçando-se a mesma nas seguintes correcções ao anexo G – quadro 8:

 

Campo

Valor Declarado

Valor da correcção a efectuar

Valor final

801

€ 37 146,29

€ 37 146,29

€ 0,00

802

€ 7 000,00

€ 7 000,00

€ 0,00

803

€ 8 000,00

€ 8 000,00

€ 0,00

804

€ 95 090,00

€ 95 090,00

€ 0,00

805

0,00

€ 54 335,09

€ 54 335,09

806

0,00

€ 24 571,75

€ 24 571,75

 

A liquidação foi impugnada administrativamente através de reclamação graciosa n.º …2016…, tendo esta sido parcialmente deferida em relação às correções dos campos 802 e 803, pelo que o objecto do pedido de pronúncia arbitral consiste na ilegalidade do indeferimento parcial - liquidação emergente das correções descritas nos campos 801, 804, 805 e 806.

 

i)                   Campo 801

 

Sustentam os Requerentes que o campo em análise se reporta a menos-valias com a venda de acções, visto que em 17/12/2014 venderam 3 lotes de acções do C… (340 658 acções) pelo valor total de € 24 391,11, que haviam sido adquiridas em Fevereiro e Julho de 2014, pelo valor integral de € 37 146,29.

Neste domínio referem que a argumentação vertida na decisão de indeferimento parcial da reclamação graciosa, no sentido de que os códigos internos das operações indicadas pelos Requerentes são dissemelhantes não pode proceder.

Para tanto concretizam a sua pretensão com os seguintes argumentos: i) em termos cronológicos ninguém pode vender em 17/12/2014 acções do C… que comprou em 19/12/2014; ii) a verdade é a de que os Requerentes tinham adquirido dois lotes de 340 658 acções do C…, um em Fevereiro/Julho de 2014 e outro em Dezembro de 2014, sendo certo que o art. 43.º, n.º 6, al. d) do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS) obriga a considerar que as acções alineadas foram aquelas adquiridas há mais tempo; iii) o argumento de que não há coincidência entre os códigos internos dos valores mobiliários não tem qualquer valor jurídico, na medida em que se trata de um código meramente interno e o efeito fiscal em sede de IRS não pode ficar dependente do comportamento organizativo de terceiros – sistema financeiro e o fisco; iv) se no objecto do processo não consta um comportamento pretensamente abusivo dos Requerentes – «descarregar» a menos-valia e recomprar no mesmo dia os  títulos – então esse comportamento não o integra e v) existirá sempre uma menos-valia, a  Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) estabelece um valor final de zero, pelo que, todo o preço de venda foi uma mais-valia. Mas mesmo na visão desta (AT), se o sujeito passivo havia adquirido as acções do C… por € 24 459,24 e alienou-as por € 24 391,11, teria uma menos-valia no montante de € 68,13.

 

ii)                 Campo 804

 

Quanto a esta correcção defendem que a operação foi documentada da única forma que lhes foi possível, isto é, com os documentos bancários entregues pelo C…, onde os valores mobiliários estiveram associados à sua conta bancária. Os documentos juntos sob os números 6 e 7 permitem fazer uma ligação inequívoca entre a operação de compra e a de venda. Bem como o C… declara que cumpriu a obrigação declarativa de envio dos formulários Modelo 13 e 33 com a operação aqui em causa.

Mas mesmo que assim não fosse, se o C… não tivesse cumprido a obrigação de envio do formulário Modelo 13, o ónus não seria dos contribuintes, ou seja, a AT teria de indagar junto do C… acerca dos motivos da omissão.

 

iii)               Campo 805

 

O Requerente A… confessa que não declarou três operações de venda de valores mobiliários em 2014, cujo total de valores de realização é de € 54 335,09. 

Sucede que, durante a inspecção e reclamação graciosa foi apresentado documento bancário em que se comprovam os dados para o correcto e exacto apuramento da mais-valia, com a aceitação do custo de aquisição de € 24 380,80 e encargos.

Em segunda linha, defende que o facto de não existir coincidência entre os códigos de valores mobiliários é irrelevante de um ponto de vista jurídico, visto que estes são meramente internos e não possuem qualquer valor legal. A lei, para a determinação da mais ou menos-valia, apenas enumera a obrigatoriedade de valores mobiliários de idêntica natureza e o efeito fiscal em sede de IRS não pode ficar dependente do comportamento organizativo de terceiros.

O Requerente, apesar de não ter esse ónus, mostrou que as acções em causa foram adquiridas no âmbito de uma oferta pública de troca realizada em 2013, pela qual os valores mobiliários emitidos pelo D… foram trocados por capital da mesma instituição (acções).

Por último defende que o poder judicial deve limitar-se a anular a liquidação sem efectuar quaisquer cálculos correctivos, porquanto consubstanciam uma operação vedada a esse poder.

 

iv)               Campo 806

 

Quanto a este campo, a Requerente B… confessa que não declarou duas operações de venda de valores mobiliários em 2014, cujo total dos valores de realização é de € 24 571,75.

Sucede que, durante a inspecção e reclamação graciosa foi apresentado documento bancário em que se comprovam os dados para o correcto e exacto apuramento da mais-valia.

O acto impugnado liquida fiscalmente duas operações, mas atribui às mais-valias um custo de aquisição de zero, ou seja, o valor da venda é igual ao da mais-valia.

            A Requerida defende que o acto tributário impugnado dever-se-á manter na ordem jurídica.

            Em concreto defende-se da seguinte forma:

a)      Campo 801

Quanto à venda de 340 658 títulos, código mobiliário …, pelo valor total de € 24 391,11, não existe uma coincidência de códigos mobiliários em relação à compra. Isto é, embora exista coincidência do número total dos títulos comprados e adquiridos (340 658), o lote de 211 750 e 7 908 títulos evidencia um código mobiliário diferente.

Assim, quanto à venda de 340 658 títulos com o código mobiliário…, pelo valor de € 24 391,11, ocorrida em Dezembro de 2014, corresponde à aquisição do mesmo número de títulos (340 658), com o mesmo código mobiliário, mas no valor de € 24 459,24 e não de € 37 146,29.

Relativamente aos códigos advoga que não constituem um comportamento burocrático ou organizativo, mas a representação cartular que permite a distinção e individualização dos activos financeiros.

b)     Campo 804

            Quanto à operação de compra no valor de € 95 090,00, a que corresponde a venda no montante de € 99 400,00, os documentos juntos aos autos só discriminam o valor de aquisição e o valor da realização da operação em causa, não permitindo que se estabeleça a ligação entre ambas as operações, quer em termos de número de títulos, quer em termos de código mobiliário, os quais não se encontram ali referidos.

Pelo que entende que, à luz do art. 74.º, n.º 1 da Lei Geral Tributária (LGT) só aos Requerentes competia fazer prova da ligação entre a operação de compra e a de venda no que respeita ao mesmo número de títulos e código mobiliário.

c)      Campo 805 e 806

No que tange às operações de compra e venda ocorridas em Outubro de 2013 e Março de 2014, a informação constante do projecto de despacho respeitante à operação em análise foi retirada da «Declaração Modelo 13 – Valores Mobiliários, Warrants Autónomos e Instrumentos Financeiros derivados» constante do sistema informático da AT, a qual constitui uma obrigação declarativa a cargo das instituições bancárias de informá-la sobre os movimentos financeiros de compra e venda de títulos. A informação que as instituições financeiras enviam para a AT terá de coincidir sempre com a que fornecem os sujeitos passivos, o que não acontece na presente hipótese.

Por outro lado, do anúncio de lançamento de Oferta Pública de Troca de Valores Mobiliários que os Requerentes juntaram aos autos em sede de reclamação graciosa, não resulta que o código mobiliário em causa é o mesmo, isto é, que o … corresponde ao … .

            Deste modo, é esta a questão que o tribunal deve conhecer:

i)                   Se o indeferimento parcial da reclamação graciosa e, consequentemente, da liquidação de IRS, deve ser anulado por erro nos pressupostos de facto e de direito.

 

3.       SANEAMENTO

 

O processo não enferma de nulidades, o tribunal arbitral encontra-se regularmente constituído e é materialmente competente para conhecer e decidir o pedido, verificando-se, consequentemente, as condições para ser proferida a decisão final.

 

4. MATÉRIA DE FACTO

4.1. Factos que se consideram provados

4.1.1. Os Requerentes adquiriram em 07/02/2014, 23/07/2014 e 24/07/2014 o total de 340 658 acções nos montantes de € 22 868,52, € 13 763,75 e € 514,02, respectivamente.

4.1.2. No dia 17/12/2014 venderam 340 658 acções do C…, por € 24 391,11.

4.1.3. Em 17/12/2014 os Requerentes compraram 340 658 acções do C… por € 24 459,24, tendo pago ainda € 127,19, a título de comissão de corretagem e de Imposto do Selo.

4.1.4. O Requerente A… adquiriu em 07/09/2006 100 obrigações E… (Main Cap. Fund. 5,5%), com o ISIN…, por € 95 090,00.

4.1.5. O custo de aquisição foi de € 95 090,00 e o juro corrido (€ 1 039,73), comissões (€ 332,82) e Imposto do Selo (€ 13,31) suportados no montante total de € 1 385,86.

4.1.6. Em 09/04/2014, o Requerente A… alienou 100 obrigações E… (Main Cap. Fund. 5,5%), com o ISIN…, por € 99 400,00, tendo suportado uma comissão no valor de € 745,50, a que acresceu Imposto do Selo no montante de € 29,82.

4.1.7. Os Requerentes não declararam 3 operações de venda de valores mobiliários respeitantes ao Requerente A… (€ 54 335,09) e 2 operações da Requerente B… (€ 24 571,75) na declaração de IRS do ano de 2014.

4.1.8. As operações de venda respeitantes ao Requerente A… são as seguintes: i) 07/03/2014 – 2 438 080 acções do D…, pelo valor de € 28 769,34; ii) 12/02/2014 – 13 obrigações do C…– TV09.05.2014, pelo valor de € 12 922,00 e iii) 12/02/2014 – 1 250 000 -  OT - 4,375% - Junho 2003/2014, pelo valor de € 12 643,75.

4.1.9. As acções descritas em 4.1.8. foram adquiridas nas seguintes condições: i) 15/10/2013 – 2 438 080 acções do D…, pelo valor de € 24 380,80 com encargos de € 175,54; ii) 12/03/2012 – 13 obrigações do C…– TV09.05.2014, pelo valor de € 10 432,50 com encargos de € 33,23 e iii) 12/03/2012  – 1 250 000 –  OT –  4,375% - Junho 2003/2014, pelo valor de € 10 218,75 com encargos de € 32,53.

4.1.10. A Requerente B… alienou os seguintes valores mobiliários: i) 12/02/2014 – 12 obrigações do C…– TV09.05.2014, pelo valor de € 11 928,00 e ii) 12/02/2014 – 1 250 000 OT – 4,375% – Junho 2003/2014, pelo valor de € 12 643,75.

4.1.11. Os valores descritos em 4.1.10 foram adquiridos nas seguintes condições: i) 12/03/2012 – 12 obrigações do C…– TV09.05.2014, pelo valor de € 9 630,00 com encargos de € 30,67 e ii) 12/03/2012 – 1 250 000 OT - 4,375% - Junho 2003/2014, € 10 218,75 com encargos de € 32,53.

4.1.12. Os serviços da Requerida constataram em 2016 que existiam rendimentos omissos na declaração de IRS de 2014 dos Requerentes e foi aberta a divergência D 09 – Incrementos Patrimoniais.

4.1.13. Os Requerentes em 02/12/2016 foram notificados do projecto de decisão administrativa, no qual a Requerida se propunha efectuar as seguintes correcções ao anexo G da declaração de IRS do ano de 2014:

Campo

Valor Declarado

Valor da correcção a efectuar

Valor final

801

€ 37 146,29

€ 37 146,29

€ 0,00

802

€ 7 000,00

€ 7 000,00

€ 0,00

803

€ 8 000,00

€ 8 000,00

€ 0,00

804

€ 95 090,00

€ 95 090,00

€ 0,00

805

0,00

€ 54 335,09

€ 54 335,09

806

0,00

€ 24 571,75

€ 24 571,75

 

4.1.14. Os Requerentes exerceram o seu direito de audição por articulado apresentado em 19/12/2016.

4.1.15. Os Requerentes foram notificados da liquidação adicional de IRS (n.º 2016 …) de 2014 no montante global de € 62 516,22, sendo que neste valor se encontram incluídos € 2 143,64 a título de juros compensatórios.

4.1.16. Os Requerentes apresentaram reclamação graciosa de tal acto em 20/06/2016 no qual solicitaram a anulação das seguintes correcções ao anexo G:

Campo

Valor Declarado

Valor da correcção a efectuar

Valor final

801

€ 37 146,29

€ 37 146,29

€ 0,00

802

€ 7 000,00

€ 7 000,00

€ 0,00

803

€ 8 000,00

€ 8 000,00

€ 0,00

804

€ 95 090,00

€ 95 090,00

€ 0,00

805

0,00

€ 54 335,09

€ 54 335,09

806

0,00

€ 24 571,75

€ 24 571,75

 

4.1.17. A reclamação graciosa n.º …2016… foi parcialmente indeferida, tendo sido unicamente deferidas as correcções efectuadas aos campos 802 e 803.

4.1.18. O pedido de constituição de tribunal e de pronúncia arbitral foi apresentado no dia 09/03/2017.

4.2. Factos que não se consideram provados

Não existem quaisquer outros factos com relevância para a decisão arbitral que não tenham sido dados como provados.

4.3. Fundamentação da matéria de facto que se considera provada

            A matéria de facto dada como provada tem génese nos documentos utilizados para cada um dos factos alegados.

 

5. MATÉRIA DE DIREITO

 

As mais-valias inserem-se na categoria G de IRS que, na lição de XAVIER DE BASTO[1], constituem aumentos inesperados do valor dos activos patrimoniais. Em bom rigor, tal categoria incorpora uma lista de realidades heterogéneas quanto à natureza e fonte, mas que se unificam enquanto rendimento sujeito a tributação.

A questão central dos autos consiste em apurar se as correcções promovidas pela AT são ilegais e, assim, determinar se existem mais-valias sujeitas a tributação.

Para tal finalidade é necessário, em primeiro lugar, enumerar as regras gerais da tributação das mais-valias em IRS aplicáveis ao caso sub judice, ou seja, os artigos 10.º, 43.º, 44.º e 48.º, todos do CIRS, na redacção em vigor no ano de 2014.

 

Art. 10.º

1 - Constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de:

a) Alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis e afectação de quaisquer bens do património particular a actividade empresarial e profissional exercida em nome individual pelo seu proprietário;

b) Alienação onerosa de partes sociais, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital, e de outros valores mobiliários, a extinção ou entrega de partes sociais das sociedades fundidas, cindidas ou adquiridas no âmbito de operações de fusão, cisão ou permuta de partes sociais, bem como o valor atribuído em resultado da partilha nos termos do artigo 81.º do Código do IRC; …

 

Art. 43.º

 

1 - O valor dos rendimentos qualificados como mais-valias é o correspondente ao saldo apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano, determinadas nos termos dos artigos seguintes.

2 - O saldo referido no número anterior, respeitante às transmissões efectuadas por residentes previstas nas alíneas a), c) e d) do n.º 1 do artigo 10.º, positivo ou negativo, é apenas considerado em 50% do seu valor.

3 - O saldo referido no n.º 1, respeitante às transmissões previstas na alínea b) do n.º 1 do artigo 10.º, relativo a micro e pequenas empresas não cotadas nos mercados regulamentado ou não regulamentado da bolsa de valores, quando positivo, é igualmente considerado em 50 % do seu valor. 

4 - Para efeitos do número anterior entende-se por micro e pequenas empresas as entidades definidas, nos termos do anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007, de 6 de Novembro. 

5 - Para apuramento do saldo positivo ou negativo referido no n.º 1, respeitante às operações efectuadas por residentes previstas nas alíneas b), e), f) e g) do n.º 1 do artigo 10.º, não relevam as perdas apuradas quando a contraparte da operação estiver sujeita no país, território ou região de domicílio a um regime fiscal claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças.


6 - Para efeitos do número anterior, considera-se que:

 

a) A data de aquisição dos valores mobiliários cuja propriedade tenha sido adquirida pelo sujeito passivo por incorporação de reservas ou por substituição daqueles, designadamente por alteração do valor nominal ou modificação do objecto social da sociedade emitente, é a data de aquisição dos valores mobiliários que lhes deram origem;

b) A data de aquisição de acções resultantes da transformação de sociedade por quotas em sociedade anónima é a data de aquisição das quotas que lhes deram origem;

c) A data de aquisição das acções da sociedade oferente em oferta pública de aquisição lançada nos termos do Código dos Valores Mobiliários cuja contrapartida consista naquelas acções, dadas à troca, é a data da aquisição das acções das sociedades visadas na referida oferta pública de aquisição;

d) Tratando-se de valores mobiliários da mesma natureza e que confiram idênticos direitos, os alienados são os adquiridos há mais tempo;

e) Nas permutas de partes de capital nas condições mencionadas no n.º 5 do artigo 73.º e no n.º 2 do artigo 77.º do Código do IRC, o período de detenção corresponde ao somatório dos períodos em que foram detidas as partes de capital entregues e as recebidas em troca;

f) O regime da alínea anterior é aplicável, com as necessárias adaptações, à aquisição de partes sociais nos casos de fusão ou cisão a que seja aplicável o artigo 74.º do Código do IRC.

 

Art. 44.º

 

1 – Para a determinação dos ganhos sujeitos a IRS, considera-se valor de realização:


a) no caso de troca, o valor atribuído no contrato aos bens ou direitos recebidos, ou o valor de mercado, quando aquele não exista ou este for superior, acrescidos ou diminuídos, um ou outro, da importância em dinheiro a receber ou a pagar;

b) no caso de expropriação, o valor da indemnização;

c) no caso de afetação de quaisquer bens do património particular do titular de rendimentos da categoria B a atividade empresarial e profissional, o valor de mercado à data da afetação;

d) no caso de valores mobiliários alienados pelo titular do direito de exercício de warrants autónomos de venda, e para efeitos da alínea b) do n.º 1 do artigo 10.º, o preço de mercado no momento do exercício;

e) tratando-se de bens ou direitos referidos na alínea d) do n.º 4 do artigo 24.º, quando não exista um preço ou valor previamente fixado, o valor de mercado na data referida;

f) nos demais casos, o valor da respetiva contraprestação.


2 – Nos casos das alíneas a), b) e f) do número anterior, tratando-se de direitos reais sobre bens imóveis, prevalecerão, quando superiores, os valores por que os bens houverem sido considerados para efeitos de liquidação de imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis ou, não havendo lugar a esta liquidação, os que devessem ser, caso fosse devida.

3 – No caso de troca por bens futuros, os valores referidos na alínea a) do n.º 1 reportam-se à data da celebração do contrato.

4 – No caso previsto na alínea c) prevalecerá, se o houver, o valor resultante da correção a que se refere o n.º 4 do artigo 29.º.


 

 

Art. 48.º

 

No caso da alínea b) do n.º 1 do artigo 10.º, o valor de aquisição, quando esta haja sido efetuada a título oneroso, é o seguinte:


a) Tratando-se de valores mobiliários cotados em bolsa de valores, o custo documentalmente provado ou, na sua falta, o da menor cotação verificada nos dois anos anteriores à data da alienação, se outro menos elevado não for declarado;

b) Tratando-se de quotas ou de outros valores mobiliários não cotados em bolsa de valores, o custo documentalmente provado ou, na sua falta, o respectivo valor nominal;

c) Tratando-se de bens ou direitos referidos na alínea a) do n.º 4 do artigo 24.º, o quantitativo que tiver sido considerado como valor do bem ou direito na data aí referida;

d) Tratando-se de bens ou direitos referidos na alínea b) do n.º 4 do artigo 24.º, o preço de subscrição ou de exercício do direito para a generalidade dos subscritores ou dos titulares do direito ou o valor de mercado.

e) Tratando-se de bens ou direitos referidos na alínea e) do n.º 4 do artigo 24.º, o valor de mercado na data referida;

f) Tratando-se de valores mobiliários adquiridos pelo titular do direito de exercício de warrants autónomos de compra, o preço de mercado no momento do exercício.

 

 

Deste modo, é possível dizer que a mais-valia é, por via de regra, a diferença entre o valor de aquisição e o de realização, estabelecendo a lei as definições do que constituem esses valores, o que se compreende perante as realidades heterogéneas que integram a categoria G de IRS.

            O art. 10.º, n.º 1, al. b) do CIRS sujeita a tributação as mais-valias resultantes de valores mobiliários. Mas poder-se-á questionar: como se determina o ganho sujeito a IRS? Qual o valor de aquisição e de realização a considerar?

O art. 10.º, n.º 4, al. a) do CIRS responde à primeira questão, prevendo que o ganho sujeito a IRS é constituído: «Pela diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição (sublinhado nosso), líquidos da parte qualificada como rendimentos de capitais, sendo caso disso, nos casos previstos nas alíneas a), b) e c) do n.º 1».

No que tange ao valor de aquisição de valores mobiliários a considerar na operação de determinação de mais-valias é o custo documentalmente provado -  art. 48.º, al. a) e b) do CIRS. Já relativamente ao valor de realização, o montante a considerar poderá ser o da contraprestação ou o preço de mercado no momento do exercício, no caso de valores mobiliários alienados pelo titular do direito de exercício de warrants autónomos de venda  – art. 44.º, n.º 1, al.  f) e d) do CIRS.

Importa ainda destacar a regra prevista no art. 43.º, n.º 6, al. d) do CIRS, ou seja, a FIFO (first in, first out) que determina que as acções alienadas foram as adquiridas há mais tempo, desde que revistam a mesma natureza (acções, obrigações, títulos de participação) e confiram os mesmos direitos (por exemplo quanto à atribuição de dividendos nas acções).

O legislador, consciente que neste âmbito podem existir comportamentos de evitação fiscal e com a finalidade de promover a transparência do mercado de capitais, consagra no art. 125.º do CIRS a obrigação das instituições de crédito comunicarem à AT as operações efectuadas. Ou, dito de outro modo, a declaração entregue permitirá, não só controlar eventuais omissões na declaração de rendimentos, como também a própria aplicação da regra FIFO.

Mas nos presentes autos os Requerentes não colocam em causa a sujeição a tributação das mais-valias, mas sim a correcta inserção dos valores de aquisição ou de realização nos campos 801, 804, 805 e 806 do quadro 8 da declaração de IRS controvertida, cujo montante, no seu juízo não se afigura correcto.

Deste modo, há que formular a seguinte questão:  a quem incumbia na presente hipótese o ónus da prova?

Os Requerentes entendem, desde logo, que existe uma divergência entre a realidade e a matéria de facto utilizada como pressuposto para a prática da liquidação de IRS e dissentem igualmente quanto à interpretação das normas legais aplicáveis.

Por via de regra é àquele que invoca um direito que cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado; a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito alegado cabe àqueles contra quem essa invocação é feita.

Assim, no procedimento tributário, o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos recai sobre quem os invoque, ou seja, a administração tributária ou o contribuinte – art. 74.º, n.º 1 da LGT.

A este respeito, o art 75.º, n.º 2 da LGT determina que quando se verificarem algumas das hipóteses aí descritas há inversão do ónus da prova. Nestas incluem-se as declarações que revelem omissões.

Apesar dos artigos 74.º e 75.º da LGT se reportarem ao procedimento tributário, a aplicação dos normativos estende-se ao processo judicial.  Nesta linha e por referência à impugnação judicial, meio processual a partir do qual o legislador ficou vinculado a densificar o regime jurídico da arbitragem tributária – art. 124.º, n.º 2 da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, a doutrina[2] defende que: «No n.º 1 do presente artigo estabelece-se o princípio de que as dúvidas sobre a existência e quantificação do facto tributário são valoradas a favor do contribuinte, conduzindo à anulação do acto impugnado.

Trata-se da concretização prática da eliminação no domínio do contencioso tributário da presunção da legalidade dos actos da administração tributária, substituída por uma presunção de veracidade dos actos do cidadão-contribuinte, que foi anunciada no ponto 1 do preâmbulo do CPT.

Esta regra consubstancia uma aplicação no processo de impugnação judicial da regra geral sobre o ónus da prova no procedimento tributário enunciada no art. 74.º, n.º 1 da LGT, em que se estabelece que o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.

Embora esta regra esteja prevista para o procedimento tributário, o seu conteúdo deve ser transposto para o processo judicial que se lhe seguir, por forma a que quem tinha o ónus da prova de certos factos no procedimento tributário tenha o respectivo ónus no processo judicial tributário.

Na verdade, a ponderação de interesses, baseada em regras da normalidade, que justifica a repartição do ónus da prova no procedimento tributário, é a mesma que se deve fazer no processo judicial, pelo que o critério de repartição deverá ser o mesmo, como impõe a coerência valorativa e axiológica imposta pelo princípio da unidade do sistema jurídico, que é o elemento primordial da interpretação jurídica (art. 9.º, n.º 1, do C.C.).

(…)

Assim, pelo facto de o impugnante no processo de impugnação judicial surgir processualmente numa posição em que vem invocar vícios de um acto tributário, não se lhe deve imputar o ónus de prova de factos que não tinha de provar no procedimento tributário, designadamente o de provar que não se verificam os factos constitutivos dos direitos da administração tributária, factos estes cuja verificação competia provar a esta no procedimento tributário

Em resumo, a presunção de legalidade dos actos da administração tributária é substituída, no domínio do contencioso tributário, por uma presunção da legalidade dos actos do contribuinte.  Em segundo lugar, os factos constitutivos dos direitos recaem sobre quem os invoque, ou seja, o contribuinte ou a administração tributária.

Nos presentes autos, a Requerida coloca em causa na correcção ao campo 801 e 804, os valores de aquisição inscritos pelos Requerentes na sua declaração de IRS de 2014, pelo que é sobre a Requerida que recai o ónus da prova.

 Por outro lado, quanto às correcções aos campos 805 e 806, os Requerentes confessam a omissão de rendimento na sua declaração de IRS do ano de 2014, pelo que, o ónus impende sobre a sua esfera jurídica.

Importa assim conhecer se, em relação a cada uma das correcções à declaração de IRS controvertida, os Requerentes/Requerida lograram cumprir o seu ónus.

Principiemos pelo campo 801, a Requerida defende que à venda de 340 658 títulos com o código mobiliário…, pelo valor de € 24 391,11, corresponde a aquisição do mesmo número de títulos, com o mesmo código mobiliário, mas no valor de € 24 459,24 e não de € 37 146,29. Ou seja, não há coincidência entre códigos nas operações de compra e venda que foram inscritas pelos Requerentes na sua declaração de rendimentos (€ 37 146,29 e € 24 391,11).

Os artigos 10.º, 43.º, 44.º e 48.º, todos do CIRS não exigem que para a determinação da mais ou menos-valia exista uma correspondência entre códigos de valores mobiliários exigem, isso sim, que os valores de aquisição e de realização correspondam aos mesmos valores mobiliários.

Ora, os Requerentes juntam com o pedido de pronúncia arbitral o documento n.º 4 emitido pelo F…– «Mais e menos-valias previstas no artigo 10.º do Código do IRS» que permite que se estabeleça uma ligação entre as acções alienadas (17/12/2014) e as adquiridas em 07/02/2014, 23/07/2014 e 24/07/2014 no que respeita ao número e natureza. Na verdade, se se compreende a preocupação do legislador em determinar a obrigação de comunicação à AT do registo de operações mobiliárias, com vista à luta contra a evasão fiscal, por outro lado, consultando  as instruções do formulário Modelo 13 e 33  constata-se que no campos 10 e 7  se diz: «Indique o código do valor mobiliário segundo a codificação ISIN (Número Internacional de Identificação de Valores Mobiliários), ou 999 999 999 999 para os casos em que não se disponha de código ISIN e se trate de valores mobiliários emitidos por entidades residentes, ou 000 000 000 000 para os casos em que não se disponha de código ISIN e se trate de valores mobiliários emitidos por entidades não residentes». Ou, dito de outro modo, a inserção não será obrigatória quando não se disponha do referido código.

Para além do mais, consultando o Regulamento da Interbolsa n.º 10/2003, com as alterações introduzidas pelo Regulamento n.º 4/2010, no seu art. 4.º verifica-se que os códigos podem ser definitivos, provisórios ou temporários. A tal circunstância adiciona-se que, nos termos do art. 8.º do referido regulamento, o código ISIN pode ser alterado: i) sempre que a entidade emitente decida substituir os títulos antigos por novos títulos e ii) sempre que seja alterada a forma de representação dos valores, por conversão dos mesmos de titulados em escriturais ou destes em titulados ou ocorra uma conversão de valores nominativos em valores ao portador ou destes em nominativos.

 Assim, perante o supra exposto, o teor do documento 4 junto pelos Requerentes com o pedido de pronúncia arbitral permite concluir que a correcção empreendida em relação a este campo é ilegal.

No âmbito da correcção respeitante ao campo 804 a Requerida defende que os documentos juntos pelos Requerentes não permitem estabelecer uma ligação inequívoca entre a operação de compra e de venda, porquanto não há discriminação de número de títulos ou de código de valor mobiliário.

Toda a fundamentação jurídica expendida a propósito da correcção anterior é aqui aplicável.

Os próprios serviços da AT na apreciação da reclamação graciosa referem quanto a esta correcção que: «De facto, só se poderá estabelecer aquela ligação se à operação de compra e de venda corresponder o mesmo número de títulos, com o mesmo código mobiliário. Sendo certo que, tal como já afirmado no projecto de decisão, não contemplando a “modelo 13” a operação de compra dada a antiguidade da operação em questão, sempre teria que ser o Reclamante a juntar a prova necessária de acordo com o exigido  pelo disposto no art. 74.º n.º 1 da LGT, o que aquele não fez, continuando a não fazê-lo nesta sede». Ou, dito de outro modo, a data de aquisição dos valores mobiliários em causa não permite ter acesso à operação de compra e, consequentemente, ao código mobiliário associado.

Sucede que, com o pedido de pronúncia arbitral os Requerentes juntaram o documento n.º 6, sendo certo que analisando o seu teor é possível demonstrar que a natureza, quantidade e ISIN das obrigações alienadas em 09/04/2014 correspondem àquelas que foram adquiridas em 07/09/2006. Ora se assim o é, também aqui a correcção ao valor de aquisição é ilegal.

Finalmente, quanto aos campos 805 e 806 são os próprios Requerentes que confessam a omissão das operações de venda na declaração de IRS do ano de 2014.

Quanto ao campo 805 defendem  que  as operações de venda:  i) 07/03/2014 – 2 438 080 acções do D… pelo valor de € 28 769,34; ii) 12/02/2014 – 13 obrigações do C…– TV09.05.2014 pelo valor de € 12 922,00 e iii) 12/02/2014 – 1 250 000 –  OT – 4,375% – Junho 2003/2014 pelo valor de € 12 643,75 têm correspondência em número e natureza com as adquiridas nas seguintes condições: i) 15/10/2013 – 2 438 080 acções do D… pelo valor de € 24 380,80 com encargos de € 175,54; ii) 12/03/2012 – 13 obrigações do C…– TV09.05.2014 pelo valor de € 10 432,50 com encargos de € 33,23 e iii) 12/03/2012 OT – 4,375% – Junho 2003/2014  por € 10 218,75 com encargos de € 32,53.

Quanto à soma dos valores de realização (€ 54 335,09), aqueles que foram objecto de correcção perante o teor do documento junto sob o n.º 2 com o pedido de pronúncia arbitral, não há nenhuma censura a efectuar à referida correcção, os próprios Requerentes confessam a sua omissão, pelo que a mesma é legal e dever-se-á manter na ordem jurídica.

Relativamente aos valores de aquisição aqui em causa – operação i) do parágrafo anterior, a Requerida defende na apreciação da reclamação graciosa a propósito de tal operação que, apesar da junção aos autos do anúncio de lançamento da Oferta Pública de Troca de Valores Mobiliários, não se retira de forma inequívoca que o código mobiliário em causa na operação é o mesmo, isto é, que o … corresponde ao … .

Como já se referiu, um dos fundamentos para a alteração do código ISIN consiste na substituição de títulos antigos por novos títulos, art. 8.º, n.º 1 do Regulamento da Interbolsa n.º 10/2003.

No caso sub judice há uma Oferta Pública de Troca de Valores Mobiliários, o que, à luz do direito, justificará a divergência.

Mas se dúvidas existissem, pela consulta ao documento junto com o pedido de pronúncia arbitral com o n.º 8 verifica-se quanto à operação em análise correspondência em número e natureza dos valores mobiliários em relação à compra e à venda. Assim, o valor de € 24 380,80 concorre para o valor de aquisição e, como tal, a sua não consideração é ilegal.

Finalmente, em relação ao campo 806, o valor de realização, aquele que foi objecto de correcção perante o teor do documento junto sob o n.º 2 com o pedido de pronúncia arbitral, não há nenhuma censura a efectuar, os próprios Requerentes confessam a sua omissão, pelo que tal correcção é legal e dever-se-á manter na ordem jurídica.

Relativamente a valores de aquisição deste campo, nada é referido na apreciação da reclamação graciosa, como também o documento que suporta a liquidação em crise - junto sob o n.º 2 do pedido de pronúncia arbitral, apenas se refere à correcção do valor de realização de 0 para € 24 571,7. Contudo, pela consulta ao documento junto com o pedido de pronúncia arbitral com o n.º 8 verifica-se quanto ao campo em análise  correspondência em número e natureza dos valores mobiliários. Assim, o valor de € 24 380,80 concorre para o valor de aquisição e, deste modo, a sua não consideração é ilegal.

Perante a manutenção de algumas das correcções coloca-se a questão da anulação parcial da liquidação subjacente ao indeferimento parcial da reclamação graciosa. A tal propósito ensina a doutrina[3]: «Nos termos do art. 100.º da LGT, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, a administração tributária está obrigada à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto ou situação objecto do litígio. Desta norma infere-se a possibilidade de anulação parcial dos actos tributários. O STA tem entendido, em geral, que os actos de liquidação, por definirem uma quantia, são naturalmente divisíveis, sendo-o também juridicamente, por a lei prever a possibilidade de anulação parcial daqueles actos, no referido art. 100.º, ao prever a procedência parcial de meios processuais impugnatórios (como anteriormente, previa o art. 145.º do CPT). Porém tal anulação parcial só poderá ser juridicamente admissível quando o fundamento da anulação valha apenas em relação a uma parte do acto, isto é, quando haja uma ilegalidade apenas parcial. Será o que acontece quando um acto de liquidação se baseia em determinada matéria colectável e se vem a apurar que parte dela foi calculada ilegalmente, por não dever ser considerada. Nestes casos, não há qualquer obstáculo a que o acto de liquidação seja anulado relativamente à parte que corresponda à matéria colectável cuja consideração era ilegal, mantendo-se a liquidação na parte que corresponde a matéria colectável que não é afectada…».

Ora, é precisamente o que acontece no caso sub judice em que o tribunal entendeu que a correcção foi ilegal em relação aos campos 801 e 804 da declaração de IRS do ano de 2014 e, parcialmente, no que concerne aos valores de aquisição dos campos 805 e 806.  Assim, anula-se o acto de liquidação relativamente à parte em que considerou as correcções declaradas ilegais.

 

6. DECISÃO

 

Nestes termos e com a fundamentação acima descrita decide-se anular o acto de indeferimento parcial da reclamação graciosa, na parte em que manteve as correcções aos campos 801, 802 e aos valores de aquisição aos campos 805 e 806 da declaração de IRS do ano de 2014, com todas as consequências legais.

 

7. VALOR DO PROCESSO

 

Fixa-se o valor do processo em € 58 369,54, nos termos do art. 97.º - A do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), aplicável por força do disposto no art. 29.º, n.º 1, al. a) do RJAT e do art. 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT).

 

8. CUSTAS

Custas no montante de € 2142, a suportar proporcionalmente pela Requerente (37,37%) e pela Requerida (62,63%) em função da manutenção/anulação das correcções à declaração de IRS de 2014 – documento 2 junto pelos Requerentes, cfr. art. 22.º, n.º 4 do RJAT e da Tabela I anexa ao RCPAT.

 

Notifique.

 

Lisboa, 12 de Setembro de 2017

 

 

O árbitro,

 

 

 

 

(Francisco Nicolau Domingos)

 

 

 

 

 



[1] JOSÉ GUILHERME XAVIER DE BASTO, IRS: Incidência real e determinação dos rendimentos líquidos, Coimbra Editora, 2007, pág. 379 e seguintes.

[2] JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário – Anotado e Comentado, Volume II, 6.ª edição, Áreas Editora, 2011, pág. 131 e 132.

[3] JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário – Anotado e Comentado, Volume II, 6.ª edição, Áreas Editora, 2011, pág. 342.