Decisão Arbitral
RELATÓRIO
A -PARTES
A…, não residente, com o NIF…, com domicílio fiscal na Rua …, …- Apartado …-…, doravante designada de Requerente ou sujeito passivo.
AUTORIDADE TRIBUTARIA E ADUANEIRA (que sucedeu à Direcção-Geral dos Impostos, por meio do Decreto-Lei n.º 118/2011, de 15 de Dezembro) doravante designada por Requerida ou AT.
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Presidente do CAAD, e o Tribunal Arbitral foi regularmente constituído, no dia 19-04-2017, para apreciar e decidir o objeto do presente processo, e automaticamente notificado a Autoridade Tributaria e Aduaneira no dia 19-04-2017, conforme consta da respetiva ata.
A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico, designou o Árbitro Paulo Ferreira Alves, tendo a nomeação sido aceite nos termos legalmente previstos.
Em 03-04-2017 as partes foram devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos do artigo 11.º n.º 1, alínea a) e b), do RJAT e dos Artigos 6.º e 7º do Código Deontológico.
Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral singular fica regularmente constituído em 19-04-2017.
Ambas as partes concordam com a dispensa da realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT.
Devidamente notificada a Requerida foi concedido o prazo de 10 dias para apresentação e alegações escritas. A requerida apresentou as suas alegações escritas.
O tribunal arbitral encontra-se regularmente constituído. É materialmente competente, nos termos dos art.ºs 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se legalmente representadas (art.ºs 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art.º 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O processo não enferma de vícios que o invalidem.
B – PEDIDO
1. O ora Requerente, pretende a declaração de ilegalidade dos atos tributários de liquidação adicional em sede de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares de 2012, 2013, 2014, com os números 2016…, n.º 2016… e 2016…, que fixou um imposto global a pagar de 8.107,06€ (oito mil cento e sete euros e seis cêntimos).
C – CAUSA DE PEDIR
2. A fundamentar o seu pedido de pronúncia arbitral, a Requerente alegou, com vista a declaração de ilegalidade do ato tributário de liquidação em sede de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, já descritos no ponto 1 deste Acórdão, síntese, o seguinte:
2.1. A requerente é um sujeito passivo não residente nos termos do artigo 13.º n.º 1 do CIRS.
2.2. A Requerente auferiu rendimentos com o aluguer de um dos seus imoveis localizado em Portugal.
2.3. A Requerente sustenta pelo vício de forma e falta de fundamentação do relatório de inspeção.
2.4. Sustenta que o relatório de inspeção obstante de indicar quais são em concreto as despesas que não são dedutíveis quando o descritivo não permite enquadrar o bem/prestação de serviços suportado, aquelas que não são dedutivas por se tratem de despesas correntes, ou as outras despesas não dedutíveis.
2.5. Alega a Requerente que a AT baseia a obrigação de imposto numa alegada proporcionalidade que deverá existir entre as despesas incorridas e os períodos em que o imóvel da Requerente gera rendimentos.
2.6. Defende a Requerente, que impor o ónus de arrendar o seu imóvel em todos os dias do ano para que as despesas de manutenção e conservação possam ser dedutíveis nos termos do artigo 41.º do CIRS, não só é, uma realidade que a Requerente não pode controlar, mas também uma interferência supérflua e desadequada na gestão quotidade da mesma.
2.7. A Requerente forneceu à AT os elementos probatórios que lhe eram exigidos demonstrando, designadamente, as faturas das despesas de manutenção e conservação em que incorreu.
2.8. Defende a Requerente, que demonstrou que as despesas se encontram documentalmente provadas, e cujo descritivo das faturas e respetivos documentos de suporte são claros e são efetivamente de manutenção e/ou conservação, razão pela qual deveriam ter sido considerada dedutíveis por parte da AT.
2.9. Mais alega a Requerente que o entendimento da AT pela proporcionalidade das despesas viola o princípio da legalidade.
D- DA RESPOSTA DA REQUERIDA
3. A Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou tempestivamente a sua resposta na qual, em síntese abreviada, alegou o seguinte:
3.1. Sobre a falta de fundamentação, sempre se dirá que, com o devido respeito por entendimento diverso, não tem qualquer sustentação a tese da Requerente relativamente à falta de fundamentação do ato tributário.
3.2. Sustenta a Requerida que a Requerente não pode pretender ver ou fazer crer ao Tribunal, que as liquidações, demonstração de liquidação e demonstrações de acerto de contas que recebeu, estão isoladas no procedimento, uma vez que, sabe perfeitamente que todas as notificações que lhe foram efetuadas, o foram como consequência de um procedimento inspetivo – aliás como cabalmente demonstra na sua prolixa dissertação –, no âmbito do qual, em estrito cumprimento dos ditames legais, notificada para o exercício do direito de audição, optou por não o exercer.
3.3. Ficando também demonstrado que a fundamentação é clara, suficiente e congruente, pelo menos a ponto de ser percetível à luz do homem médio e, mais importante, percetível à leitura da Requerente.
3.4. De facto, não é possível afirmar que determinado ato se encontra infundamentado quando, no caso concreto, a motivação contextual permitiu ao seu destinatário ficar a saber as razões de facto e de direito que levaram a
3.5. Defende a Requerida que a despesas de conservação, manutenção e IMI pago relativamente a imóvel arrendado durante alguns meses - Uma vez que, para efeitos de tributação em sede da Categoria F do Código do IRS, se atende ao rendimento líquido obtido, i.e., às rendas recebidas deduzidas das despesas e encargos suportados para produzir os rendimentos prediais englobados e para manter íntegra a respetiva fonte produtora, ou seja, os prédios objeto de arrendamento, afigurasse deverem tais despesas ser proporcionalmente consideradas tendo por base o número de meses de arrendamento.
3.6. Do que decorre que, na inexistência de rendimentos, i.e., na inexistência de um rendimento bruto, não possa ser considerado um qualquer encargo suportado, por, em tal situação, não haver de se proceder à determinação de um rendimento líquido sujeito a tributação em sede da Categoria F do Código do IRS.
3.7. Nessa mesma ordem de ideias e numa situação de arrendamento parcial, ou seja, em que o imóvel se encontra arrendado apenas durante parte do ano, apenas poderão ser consideradas como elegíveis para efeitos do estabelecido no artigo 41.° do Código do IRS as despesas que, proporcionalmente, se mostrem imputáveis ao número de meses do arrendamento.
3.8. Defende a Requerida que a correção dos montantes dedutíveis com referência às despesas que realmente se enquadram nos encargos dedutíveis para este tipo de rendimentos, teve em consideração que o imóvel apenas esteve ocupado uma parte do ano, não podendo ser deduzidas todas as despesas, pelo que procedeu-se à contabilização das noites em que o imóvel se encontrou ocupado por clientes.
3.9. Na redação então vigente, o art. 41º do Código do IRS, n.º 1, prevê deduzirem-se aos rendimentos brutos referidos no artigo 8º as despesas de manutenção e de conservação que incumbam ao sujeito passivo, por ele sejam suportadas e se encontrem documentalmente provadas, bem como a contribuição autárquica que incide sobre o valor dos prédios ou parte dos prédios cujo rendimento tenha sido englobado.
3.10. O n.º 2 referiria deduzirem-se também, no caso de fração autónoma de prédio em regime de propriedade horizontal, os encargos de conservação, fruição e outros que, nos termos da lei civil, o condómino deva obrigatoriamente suportar, por ele sejam suportados, e se encontrem documentalmente provados.
3.11. Para efeitos de tributação em sede de categoria F do Código do IRS, haverá que atender ao rendimento líquido obtido, isto é, ao rendimento global obtido, deduzido das despesas e encargos suportados para produzir os rendimentos prediais englobados e para manter integra a fonte produtora de rendimentos, ou seja, o imóvel em causa o que implica a existência de uma correspondência e proporcionalidade dos encargos e despesas suportados.
3.12. Não são, pois, de considerar todos e quaisquer encargos suportados pela requerente.
3.13. As despesas respeitantes à conservação, manutenção e IMI pago relativamente ao imóvel, desde que devidamente documentadas e que devam ser consideradas como custos hão-de conter uma relação e ou correspondência com a obtenção dos rendimentos prediais englobados para efeitos da categoria F do Código do IRS.
3.14. Nos períodos em que o imóvel não esteve ocupado e, por tal razão, não produziu qualquer rendimento predial, não existindo um rendimento bruto a que possa ser deduzido qualquer encargo suportado, pelo que, na circunstância, não será possível apurar um rendimento líquido sujeito a tributação em sede de categoria F do Código do IRS.
3.15. Assim, as despesas de manutenção, conservação e imposto pago deverão ser proporcionalmente consideradas tendo por base os períodos em que o imóvel esteve ocupado e nessa medida gerou os rendimentos prediais.
3.16. Só através da consideração do coeficiente de ocupação foi possível à administração fiscal estabelecer uma adequação e proporcionalidade entre os rendimentos prediais ilíquidos e os encargos e despesas dedutíveis para efeitos da categoria F do IRS para assim obter os rendimentos prediais líquidos.
3.17. Aliás, qualquer outra interpretação que não sufrague a posição vertida no RIT, e que é a interpretação da AT, viola frontalmente preceitos Constitucionais, nomeadamente o principio da igualdade (art.º 13.º CRP) e, bem assim, o da capacidade contributiva (104.º CRP), ao discriminar aqueles que arrendam um imóvel por escassos dias, deduzindo todas e quaisquer despesas previstas no art.º 41.º sem qualquer limite, daqueles que, usando constantemente e durante todo o ano fiscal o imóvel para arrendamento, se vêm na contingência de serem colocados no mesmo patamar de capacidade contributivo (que não é de todo igual) que aqueles outros.
3.18. A interpretação dada pela AT e que aliás vem vertida nas instruções de preenchimento da MOD. 3 que expressamente refere que no quadro 5 do Anexo F «… devem ser declarados os gastos efetivamente suportados e pagos no ano pelo sujeito passivo, pelo período em que o prédio esteve arrendado, nomeadamente os que digam respeito a conservação e manutenção do prédio, a despesas de condomínio, a impostos e a taxas autárquicas. O valor do Imposto Municipal sobre Imóveis a mencionar é o que foi pago no ano a que os rendimentos respeitam.»
3.19. Termina a Requerente sustentando a improcedência o presente pedido de pronúncia arbitral, mantendo-se na ordem jurídica o ato tributário de liquidação e absolvendo-se, em conformidade, a Entidade Requerida do pedido.
E- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
4. Antes de entrar na apreciação destas questões, cumpre apresentar a matéria factual relevante para a respetiva compreensão e decisão, efetuou-se com base na prova documental, e tendo em conta os factos alegados.
5. Os factos que são dados como provados com base na prova documental que as partes juntaram ao presente processo, o Requerente juntamente com o pedido arbitral deduzido e a Requerida com a junção do respetivo processo administrativo.
6. De salientar que, relativamente à matéria de facto, o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada, conforme resulta do disposto no art.º 123.º, n.º 2, do CPPT e no art.º 607.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi art.º 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT. Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de direito (cfr. artigo 596.º, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.
7. Em matéria de facto relevante, dá o presente tribunal por assente os seguintes factos:
8. Em 17 de Setembro de 2015, a AT efetuou uma ação inspetiva interna a Requerente relativa aos exercícios de 2012, 2013 e 2014.
9. Em 21 de Dezembro de 2015, a Requerente foi notificada do Projeto de Conclusões de inspeção tributaria.
10. A Requerente não exerceu o direito de audição prévia sobre o projeto de conclusões.
11. A Requerente foi notificada do Relatório de Inspeção através do ofício n.º … de 18 de Janeiro de 2016.
12. Em 22 de Janeiro, a Requerente foi notificada da demonstração de liquidação de IRS e das demonstrações de liquidação de juros compensatórios e das demonstrações de acerto de contas, respetivamente:
12.1. Relativo ao ano 2012, demonstração de liquidação de IRS n.º 2016…, demonstrações de liquidação de juros compensatórios n. º 2016…, e da demonstração de acerto de contas n.º 2016…;
12.2. Relativo ao ano 2013, demonstração de liquidação de IRS n.º 2016 500013904 demonstrações de liquidação de juros compensatórios n.º 2016… e da demonstração de acerto de contas n.º 2019…;
12.3. Relativo ao ano 2014, demonstração de liquidação de IRS 2016 … demonstrações de liquidação de juros compensatórios n.º 2016 … e da demonstração de acerto de contas n.º 2016 … .
13. Em 6 de Julho de 2016, a Requerente apresentou reclamação graciosa dos atos supra descritos.
14. Em 6 de Novembro formou-se a presunção de indeferimento tácito da reclamação graciosa.
F- FACTOS NÃO PROVADOS
15. Dos factos com interesse para a decisão da causa, constantes da impugnação, todos os objetos de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita.
G- QUESTÕES DECIDENDAS
16. Atenta as posições das partes assumidas nos argumentos apresentados, constituem questões centrais dirimendas a seguinte, as quais cumpre, pois, apreciar e decidir:
a. A alegada pela Requerente:
(i) Declaração de ilegalidade dos atos tributários de liquidação em sede de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares de 2012, 2013, 2014, com os números 2016…, n.º 2016 … e 2016 …, que fixou um imposto global a pagar de 8.107,06€ ((oito mil cento e sete euros e seis cêntimos).
(ii) Condenação no pagamento de juros indemnizatórios.
H MATÉRIA DE DIREITO
17. Atendendo às posições das partes assumidas nos articulados apresentados, a questão central a dirimir pelo presente tribunal arbitral consiste em apreciar a legalidade dos atos de liquidação de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, 2012, 2013, 2014, com os números 2016 …, n.º 2016 … e 2016 …, que fixou um imposto global a pagar de 8.107,06€, por vício de violação de lei.
18. A questão de fundo no presente processo arbitral, prende-se com a aplicação do regime jurídico do Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares e em especial do regime jurídico tributário dos rendimentos Prediais consagrado no artigo 8.º e o regime das deduções aos rendimentos prediais consagrado no artigo 41.º ambos do CIRS.
19. Sobre o Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, o mesmo tem natureza anual, conforme a regra geral consagrada no artigo 1.º n.º 1 “O imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS) incide sobre o valor anual dos rendimentos”, por outras palavras, o IRS incide sobre o valor anual dos rendimentos provenientes de determinadas categorias, depois de efetuadas as correspondentes deduções e abatimentos.
20. Não suscita qualquer duvida que o imposto incide sobre o valor anual dos rendimentos, quer sejam eles obtidos num único só momento ou faseadamente durante a duração do ano respetivo.
21. A Requerente durante os períodos de 2012, 2013 e 2014, recebeu rendimentos de Categoria F ou Rendimentos prediais, por incidência do artigo 8.º n.º 1 e n.º 2 aliena a) do CIRS, para o qual se remete:
“1 - Consideram-se rendimentos prediais as rendas dos prédios rústicos, urbanos e mistos pagas ou colocadas à disposição dos respectivas titulares.
2 - São havidas como rendas:
a) As importâncias relativas à cedência do uso do prédio ou de parte dele e aos serviços relacionados com aquela cedência;”.
22. Sobre os rendimentos prediais brutos é legalmente admissível nos termos do artigo 41.º do CIRS, proceder as seguintes deduções:
“Artigo 41.º - Deduções
1 – Aos rendimentos brutos referidos no artigo 8.º deduzem-se as despesas de manutenção e de conservação que incumbam ao sujeito passivo, por ele sejam suportadas e se encontrem documentalmente provadas, bem como o imposto sobre imóveis e o imposto do selo que incide sobre o valor dos prédios ou parte dos prédios cujo rendimento seja objeto de tributação no ano fiscal.
2 – No caso de fração autónoma de prédio em regime de propriedade horizontal, deduzem-se também os encargos de conservação, fruição e outros que, nos termos da lei civil, o condomínio deva obrigatoriamente suportar, por ele sejam suportados, e se encontrem documentalmente provados.
3 – Na sublocação, a diferença entre a renda recebida pelo sublocador e a renda paga por este não beneficia de qualquer dedução”. (nosso negrito).
23. Resulta do disposto no artigo 41.º do CIRS, um conjunto de requisitos e consentâneas deduções permissíveis aos rendimentos brutos da categoria F (rendas), respetivamente:
a) As despesas de manutenção e de conservação desde que documentalmente provadas.
b) O imposto sobre imóveis e o imposto do selo; e
c) O rendimento seja objeto de tributação no ano fiscal, ou seja, pago no ano dos rendimentos a tributar em IRS.
24. Face a factualidade provada e conforme a posição da Requerida e Requerente as despesas dedutíveis apresentadas pela Requerente, as mesmas preenchem os requisitos do artigo 41.º do CIRS, ou seja, são despesas de manutenção e de conservação documentalmente provadas, e os respetivos impostos sobre imóveis e o imposto do selo.
25. Contudo, sendo as despesas legalmente aceites como dedutíveis aos rendimentos brutos da Categoria F nos termos do artigo 41.º, suscitasse a questão de se pode ser aplicada as respetivas despesas o coeficiente de proporcionalidade.
26. Por outras palavas, cabe ao presente tribunal decidir se as despesas do artigo 41.º do CIRS, apenas podem ser dedutíveis aos rendimentos brutos da Categoria F de forma proporcional face ao período em que o imóvel arrendado se encontra efetivamente arrendado durante o ano fiscal respetivo.
27. Assim, as despesas sendo na sua natureza legalmente admissíveis, a AT argumenta que com base no “coeficiente de ocupação”, invoca que essas despesas apenas podem ser dedutíveis na proporção do período em que o imóvel esteve arrendado.
28. Nos presentes autos o imóvel esteve arrendado pelo seguinte período: em 2012 por 16 dias, em 2013 por 36 dias e em 2014 por 21 dias.
29. A regra de dedutibilidade dos custos da categoria F esta sempre esta associada aos custos de manutenção necessários para a obtenção dos rendimentos prediais tributáveis, que o legislador nunca, nem sequer a título exemplificativo, tipificou.
30. Ou seja são dedutíveis os encargos necessários para a manutenção da fonte produtiva do rendimento.
31. Necessariamente existe uma relação de custo indispensável à obtenção do rendimento, quando documental comprovado e efetivamente suportado pelo titular do bem.
32. Não ficou demonstrado, que as despesas não preenchem essa indispensável, pelo contrário, são aceites pela AT, que as aceita quanto a sua natureza dedutível ao rendimento, pese embora apenas proporcionalmente.
33. Esta proporcionalidade dedutibilidade das despesas face ao número de dias de ocupação do imóvel arrendado invocado pela AT ou o argumento inovador do “coeficiente de ocupação” a jurisprudência já se pronunciou sobre o mesmo no âmbito do Processo nº 294/2015-T do CAAD , o qual refere
33.1. “No que se refere à redução das despesas e encargos mediante aplicação de um "coeficiente de ocupação", não pode tal procedimento ser aceite, porquanto todas as despesas realizadas, tais como, limpeza das habitações e da piscina e respetivo tratamento de salubridade, água, luz, seguro, IMI e outros, terão sempre que ser suportadas, independentemente da taxa de ocupação. Tal "coeficiente de ocupação", como se referiu, um fundamento “sui generis” que aparentemente não tinha até agora sido utilizado pela Inspeção, não tem, no entender deste tribunal, qualquer base legal.”
34. Posição que subscrevemos, visto que não resulta do Regime Tributário do IRS ou do próprio regime tributário dos rendimentos prediais, a referência a proporcionalidade ou coeficiente de ocupação.
35. Não podendo de tal forma aceitar que despesas legalmente admissíveis e indispensáveis a persecução e obtenção de um rendimento são proporcionais aos dias em que tal rendimento é obtido.
36. Tal entendimento viola os princípios da legalidade e o próprio Regime Tributário do IRS.
37. Poder-se-ia eventualmente invocar que as despesas incorridas pela Requerida não preenchem o requisito da indispensabilidade, face ao número de dias de arrendamento, contudo tal não foi feito ou provado.
38. De importante relevo para o presente decisão, a jurisprudência constante no Processo nº 201/2015-T do CAAD, sobre questão idêntica quanto ao período de referência da dedutibilidade das despesas e custos previstos no artigo 41.º do CIRS, da qual salientamos:
“A desconsideração das despesas relativas ao prédio da freguesia de Carnide baseia-se em qualquer dos casos no argumento de as despesas terem sido efetuadas fora do período em que o imóvel esteve arrendado (N da matéria assente). O mesmo fundamento é afinal invocado para recusar a dedução das despesas em causa do prédio urbano na freguesia do … (O da matéria assente).
Há assim que apurar qual o período temporal em que as despesas materialmente dedutíveis ao rendimento bruto da categoria F podem afinal ser consideradas. Dito de outro modo, há que ver como deve balizar-se o período em que se devem considerar as despesas para efeitos de determinação do rendimento.
É pacífico afirmar que o IRS incide sobre o valor anual dos rendimentos provenientes de determinadas categorias, depois de efetuadas as correspondentes deduções e abatimentos (artigo 1º-1CIRS). Não parece que a norma básica da determinação do imposto ofereça grandes questões; o IRS incide pois sobre o valor anual dos rendimentos e este apura-se relativamente a cada ano fiscal, que para efeitos deste imposto coincide com o ano civil (1º-1, 22º-1 e 143º do CIRS).
Ora, como a operação elementar do cálculo do imposto consiste em determinar o rendimento tributável, através das deduções e abatimentos ao rendimento bruto, não se vê razão para que estas componentes negativas não tenham afinal o mesmo período de referência que tem o rendimento bruto, que é a componente positiva. No fundo, os rendimentos (brutos) auferidos em cada ano constituem os elementos positivos que contribuem para apurar o rendimento tributável anual, havendo também que considerar os elementos negativos do mesmo período, que são as deduções e abatimentos. Há assim que concluir que a regra geral do IRS afirma que o imposto tem natureza anual e é relativamente a cada ano civil que devem ser considerados os elementos que permitem determinar a incidência, designadamente rendimento bruto, deduções e abatimentos.
Concomitantemente, também a regra que preside às obrigações declarativas, disciplina no sentido de dever ser apresentada uma única declaração para todo o período anual (57º-1 CIRS).
No entanto, estas regras gerais da anualidade do IRS comportam especialidades, como se vê, entre outros exemplos, na limitação ao período de quatro anos da imputação dos rendimentos das categorias A e H (74º-1 CIRS), na imputação ao ano do trânsito em julgado da decisão de ação sobre rendimentos litigiosos, mesmo que se reportem a vários anos anteriores (62º CIRS) ou na possibilidade de dedução de perdas de anos anteriores (55º -2 e 3 CIRS). Importa por isso verificar se a disciplina dos rendimentos da categoria F contém alguma especialidade que imponha a aplicação de algum comando especial.
(…)
Não parece que este artigo 41º, ou qualquer outro, possa conduzir a um regime de exceção relativamente à citada regra geral da anualidade do IRS. Com efeito, este dispositivo mais não faz do que afirmar a regra geral: aos rendimentos brutos deduzem-se as despesas de manutenção e de conservação, bem como a contribuição autárquica. Claro que nada se refere quanto ao período a considerar, pois este já foi afirmado logo no artigo 1º; trata-se do período anual.
Não ficam assim dúvidas que não há que fazer qualquer outra correspondência temporal entre o rendimento bruto e as despesas a deduzir. Há apenas que assegurar que as deduções dizem respeito ao ano civil em que foram pagos ou colocados à disposição os rendimentos prediais.
Uma outra questão deve ainda ser colocada, para rigorosa determinação da janela temporal em que se devem situar as despesas e que é a de saber se o momento relevante, que permite ligar as despesas a determinada data, é a sua efetiva ocorrência ou se é antes aquele em que as deduções são suportadas. Como a experiência tem demonstrado, acontece por vezes que determinada obra é efetuada e faturada em determinado ano civil e que determinado imposto ou taxa é liquidado nesse mesmo ano mas só são pagos, ou satisfeitos por outra forma, em ano civil posterior. Crê-se que na lei só há um critério e importa apurá-lo pois, no caso presente, a questão colocar-se-á, como veremos.
Ao nível dos rendimentos brutos, cujo paradigma da categoria F são as rendas, a resposta parece facilitada pela clareza da norma; o artigo 8º-1 do CIRS refere, expressamente que o imposto incide sobre as rendas pagas ou postas à disposição, deixando claro que não constituem rendimento de determinado ano nem as rendas cobradas antecipadamente em ano anterior (v.g. a renda de janeiro de um ano que a tradição manda pagar no início do mês de dezembro antecedente, é rendimento do ano em que é efetivamente paga) nem aquelas rendas que o inquilino não tenha chegado a pagar nem a colocar à disposição do senhorio (v.g. através de depósito), por não as ter satisfeito. Aliás, as rendas que o inquilino não satisfaça e que hajam de ser cobradas judicialmente, constituirão, sem margem para dúvidas, rendimento do ano em que transite em julgado a decisão judicial que permita determinar qual é afinal o valor do rendimento (62º CIRS) e não são rendimento do ano em que deveriam ter sido pagas de acordo com o contrato de arrendamento.
A mesma linha de raciocínio é também seguida para as deduções, como resulta claramente das disposições concretas da lei. A norma do artigo 41º-1 do CIRS deixa claro que ao rendimento deduzem-se as despesas que sejam suportadas e se encontrem documentalmente provadas; dito de outro modo, deduzem-se as despesas que tenham sido suportadas no período anual em causa, ainda que a obrigação tenha sido constituída em anos anteriores. Parece assim claro que o momento relevante para determinação dos rendimentos brutos e das despesas a deduzir obedece a uma ótica de tesouraria e não atende ao momento da constituição nem é seguido o princípio da especialização dos exercícios.
Determinada a interpretação das normas em causa – que constam dos n.ºs 1 e 2 do artigo 41º CIRS – importa aplicá-las aos factos apurados, embora respeitando sempre a efetiva invocação de ambos pelos Requerentes, no cumprimento do princípio do dispositivo.”
39. Da referida sentença, elencamos que e posição da jurisprudência no qual escreve o “artigo 41º, ou qualquer outro, possa conduzir a um regime de exceção relativamente à citada regra geral da anualidade do IRS. Com efeito, este dispositivo mais não faz do que afirmar a regra geral: aos rendimentos brutos deduzem-se as despesas de manutenção e de conservação, bem como a contribuição autárquica. Claro que nada se refere quanto ao período a considerar, pois este já foi afirmado logo no artigo 1º; trata-se do período anual.”
40. Perante o exposto, não resulta da letra da lei uma exceção a dedutibilidade das despesas fundada num “coeficiente de ocupação”, pelo que as despesas apresentadas pela Requerente nos anos de 2012, 2013 e 2014, no âmbito do artigo 41.º do CIRS, são legalmente aceites na sua totalidade, improcedendo o argumento de proporcionalidade dedutibilidade das despesas face ao período de arrendamento.
41. Nestes termos é ilegal por violação de lei, atos tributários de liquidação em sede de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, de 2012, 2013 e 2014, formalizados, quanto ao incorreta aplicação do artigo 1.º n.º1, artigo 8.º e artigo 41.º todos do CIRS .
J - QUESTÕES DE CONHECIMENTO PREJUDICADO
42. Na sentença, deve o juiz pronunciar-se sobre todas as questões que deva apreciar, abstendo-se de se pronunciar sobre questões de que não deva conhecer (segmento final do n.º 1 do artigo 125.º, do CPPT), sendo que as questões sobre que recaem os poderes de cognição do tribunal, são, de acordo com o n.º 2 do artigo 608.º, do CPC, aplicável subsidiariamente ao processo arbitral tributário, por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT, “as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (…)”.
43. Em face da solução dada à questão relativa aos pressupostos da tributação do rendimento da Requerente pelo regime aplicável, fica prejudicado o conhecimento das restantes questões incluídas no pedido de pronúncia arbitral.
I - DOS JUROS INDEMNIZATÓRIOS.
44. Peticiona, ainda, a Requerente o pagamento de juros indemnizatórios.
45. Perante o exposto, a liquidação do IRS, na parte abrangida pela anulação, que se decretará, resultam de erros de facto e de direito imputáveis exclusivamente à administração fiscal, na medida em que a Requerente cumpriu o seu dever de declaração e foram por aquela cometidos e não poderia a mesma desconhecer entendimentos diferentes.
46. Na verdade, estando demonstrado que a requerente pagou o imposto impugnado na parte superior ao que é devido, por força do disposto nos art.ºs 61.º do CPPT e 43.º da LGT, tem a Requerente direito aos juros indemnizatórios devidos, juros esses a serem contados desde a data do pagamento do imposto indevido (anulado) até à data da emissão da respetiva nota de crédito, contando-se o prazo para esse pagamento do início do prazo para a execução espontânea da presente decisão (art.º 61.º, n.ºs 2.ºa 5, do CPPTRIB), tudo à taxa apurada de harmonia com o disposto no n.º 4.ºdo artigo 43.º da LGT.
47. Dá-se provimento ao pedido da requerente.
L - DECISÃO
Destarte, atento a todo o exposto, o presente Tribunal Arbitral, decide-se:
Julgar procedentes o pedido de declaração de ilegalidade dos atos tributário de liquidação em sede de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares n.º 2016…, n.º 2016 … e 2016 …, que fixou um imposto global a pagar de 8.107,06€ (oito mil cento e sete euros e seis cêntimos), por vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, que justifica a declaração da sua ilegalidade e anulação.
Condena a Requerida, a restituir à Requerente essa quantia indevidamente liquidada e paga acrescida do pagamento de juros indemnizatórios já vencidos relativos ao período que mediou entre a data de pagamento do imposto a calcular sobre a quantia de 8.107,06€ (oito mil cento e sete euros e seis cêntimos), até a data da efetiva restituição, nos termos dos n.ºs 2.º a 5.º do art.º 61.º do CPPT e à taxa apurada de harmonia com o disposto no n.º 4.º do art.º 43.º da LGT até integral reembolso.
Fixa-se o valor do processo em 8.107,06€ (oito mil cento e sete euros e seis cêntimos) do valor da liquidação atendendo ao valor económico do processo aferido pelo valor das liquidações de imposto impugnadas, e em conformidade fixa-se as custas, no respetivo montante em 918,00 € (novecentos e dezoito euros), a cargo da Requerida de acordo com o artigo 12.º, n.º 2 do Regime de Arbitragem Tributária, do artigo 4.ºdo RCPAT e da Tabela I anexa a este último. – n.º 10 do art.º 35º, e n.º 1, 4 e 5 do art.º 43º da LGT, art.ºs 5.º, n.º, al. a) do RCPT, 97.º-A, n.º 1, al. a) do CPPT e 559.º do CPC).
Notifique.
Lisboa, 26 de Junho de 2017
O Árbitro
Dr. Paulo Ferreira Alves