CAAD: Arbitragem Tributária
IRC: prestações suplementares / acessórias; dedutibilidade fiscal dos juros suportados; art. 23.º do CIRC e art. 32.º, n.º 2, do EBF
Processo n.º 12/2013-T
DECISÃO ARBITRAL
Requerente: A... – Gestão e Participações, SGPS, SA, contribuinte …, com sede no …, em Lisboa (doravante Requerente);
Requerida: Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante AT ou Requerida).
I – RELATÓRIO
1. A Requerente apresentou pedido de constituição de Tribunal Arbitral, nos termos do disposto nos artigos 2º e 10º do Decreto-Lei 10/2011 de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante RJAT).
2. Como optou por não designar árbitro, a constituição do Tribunal Arbitral processou-se nos termos do n.º 1 do artigo 6.º e no n.º 1 do artigo 11.º do RJAT. Mediante decisão do Presidente do Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa foi designado árbitro Tomás Maria Cantista de Castro Tavares, ora signatário.
3. O tribunal arbitral foi constituído no dia 27/3/2013 e a reunião prevista no art. 18.º do RJAT teve lugar no dia 23/5/2013.
4. A Requerente argui a ilegalidade parcial da liquidação de IRC de 2007 (2011 …) e compensação (2011 …), na parte correspondente aos encargos financeiros de 185.887,30€, alegando em síntese o seguinte (cuja retórica será desenvolvida adiante – parte IV):
(i) Os encargos financeiros por si suportados com a realização de prestações suplementares (acessórias sem juros) são dedutíveis nos termos do art. 23.º do CIRC, porque indispensáveis para a obtenção dos seus proveitos e manutenção da sua fonte produtora.
(ii) Os encargos financeiros suportados com a realização de prestações suplementares (acessórias sem juros) são dedutíveis em termos fiscais, porque as prestações suplementares se reconduzem à noção de “outros ativos” e não se subsumem no conceito de “partes de capital” descrita no art. 31.º, n.º 2, do EBF (atual art. 32.º, n.º 2, do EBF).
(iii) A AT, com a liquidação em causa, alterou o entendimento que vinha preconizando sobre esta questão, em violação dos artigos 55.º, 68.º-A e 77.º da LGT, artigos 266.º e 103.º da CRP e artigo 6.º-A, do CPA.
5. A AT sustenta a legalidade da liquidação. Rebate toda a retórica invocada pela Requerente, invocando, em síntese os seguintes argumentos (desenvolvidos adiante – Parte IV):
(i) Os encargos financeiros suportados com a realização de prestações suplementares (acessórias sem juros) não são dedutíveis nos termos do art. 23.º do CIRC – por não serem indispensáveis para a organização: a Requerente não gera quaisquer proveitos com os mesmos e não tem qualquer benefício próprio com esta operação (mas apenas do grupo).
(ii) Os encargos financeiros suportados com a realização de prestações suplementares (acessórias sem juros) não são dedutíveis em termos fiscais, nos termos do art. 31.º, n.º 2, do EBF (atual art. 32.º, n.º 2, do EBF), porque as prestações suplementares se subsumem no conceito de “partes de capital”, atenta a interpretação de base contabilística que é necessário trilhar.
(iii) A AT pode alterar a sua posição e os prévios entendimentos do Fisco (omissivos) não criam qualquer expetativa ou direito adquirido merecedor de tutela para a Requerente: não há, por isso, qualquer violação do princípio da boa-fé ou imparcialidade.
6. Ambas as partes realizaram alegações orais.
II – SANEAMENTO
O Tribunal é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, 5.º, 6.º do RJAT.
As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011 de 22 de Março.
O processo não enferma de vícios que o invalidem.
III – FACTOS PROVADOS
1. A Requerente encabeça um grupo de sociedades (descrito no art. 1.º da sua PI), de que é a sociedade dominante, sujeito ao Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades (RETGS), previsto e regulado nos artigos 69º e seguintes do CIRC.
2. A Requerente (e o Grupo) foi alvo de inspeções várias (OI …) que conduziram à liquidação impugnada.
3. A Requerente é uma Sociedade Gestora de Participações Sociais.
4. A Requerente suportou juros de empréstimos que lhe foram concedidos e concedeu prestações suplementares / prestações acessórias sem juros a entidades por si totalmente dominadas, que o utilizaram na sua atividade.
5. Na aplicação da Circular 7/2004, a Requerente incluiu prestações suplementares e acessórias (sem juros) como encargos (custos) não imputáveis a partes de capital, concorrendo assim para o lucro tributável.
6. A Requerente foi alvo de uma liquidação de IRC do ano de 2007 (2011 …) e compensação (2011 …) – correção, por dedução, dos prejuízos fiscais declarados, com tributação residual (fora do objeto do processo) de 834,75€.
7. Inconformada, deduziu Reclamação Graciosa (em 9/4/2012) onde solicitou a ilegalidade parcial da liquidação na parte correspondente à desconsideração fiscal dos encargos financeiros suportados de 185.887,30€.
8. A Reclamação Graciosa foi expressamente indeferida e desse indeferimento a Requerente deduziu a presente ação arbitral.
9. A AT, noutras inspeções tributárias (cfr art. 27.º e ss. da PI), assumiu, por não haver corrigido, que as prestações suplementares se reconduzem a outros ativos e não se subsumem no conceito de partes de capital.
Os factos acima mencionados resultam provados pelos documentos e declarações das partes (não contestados ou impugnados), não se tendo provado outros factos considerados relevantes para a decisão objeto do presente processo.
IV – FUNDAMENTOS DE DIREITO
1. Introdução (as questões decidendi)
São três, no essencial, as questões decidendi (aliás devidamente expostas e formuladas pelas partes, na PI e contestação [resposta]).
Primeira: Os encargos financeiros suportados pela requerente com a realização de prestações suplementares (acessórias sem juros) são ou não dedutíveis nos termos do art. 23.º do CIRC? São ou não indispensáveis para a obtenção dos seus proveitos ou manutenção da sua fonte produtora?
Segunda: Os encargos financeiros suportados pela requerente com a realização de prestações suplementares (acessórias sem juros) são ou não dedutíveis em termos fiscais, nos termos do art. 31.º, n.º 2, do EBF (atual art. 32.º, n.º 2, do EBF)? As prestações suplementares reconduzem-se à noção de “outros ativos” ou ao conceito de “partes de capital”?
Terceira: A AT, ao alterar o seu entendimento quanto à circunscrição fiscal de uma dada situação, viola ou não os artigos 55.º, 68.º-A e 77.º da LGT, artigos 266.º e 103.º da CRP e artigo 6.º-A, do CPA?
Responderemos, de seguida, a cada uma destas questões – fundamentando a nossa decisão e trazendo à colação os argumentos invocados pelas partes.
2. Prestações suplementares e acessórias sem juros e o art. 23.º do CIRC
Os termos da questão explicam-se facilmente: uma sociedade (como a Requerente) que obtém crédito junto de terceiros (e paga juros), pode ver esses juros serem fiscalmente deduzidos ao seu rendimento se utiliza os fundos mutuados em empréstimos a dominadas sem vencimento de juros (via prestações suplementares e ou prestações acessórias sem juros)?
Note-se, desde já, que os dados da questão não têm esta linearidade ou simplicidade: não há uma relação factual direta entre os fundos obtidos (com pagamento de juro) e os fundos concedidos (sem juro) – mas apenas a aplicação de uma fórmula aproximativa descrita na Circular 7/2004 (até por causa da fungibilidade do dinheiro), no sentido de se apurar, na aplicação do art. 32.º, n.º 2, do EBF, quais os “encargos financeiros suportados” com a aquisição de partes de capital.
Para a resolução desta questão importa introduzir quatro considerações prévias muito relevantes:
Primeira: “A capacidade das sociedades comerciais compreende os direitos e obrigações necessários ou convenientes à prossecução do seu fim” (art. 6.º do Código das Sociedades Comerciais – doravante CSC). Ora, a lei comercial, esclarece expressamente que a realização de prestações suplementares (figura prevista no CSC, art. 210.º e ss.) se insere na capacidade da sociedade, no seu escopo lucrativo, na lícita circunscrição da sua atividade, mesmo que (ainda que) não possam vencer quaisquer juros, por expressa imposição da lei (art. 210.º, n.º 5, do CSC). O que vale para as prestações suplementares, vale igualmente para as prestações acessórias, figura prevista para as sociedades anónimas, relativamente às prestações acessórias sem vencimento de juros, por obrigação contratual (art. 287.º do CSC).
Assim, uma sociedade que efetue prestações sem vencimento de juros (acessórias ou suplementares) está, por essa forma, a atuar objetivamente dentro da sua capacidade (dentro do seu perfil lucrativo), mesmo quando não tenha (não queira usar) fundos próprios para efetuar essas prestações, e tenha, por isso, de se socorrer de fundos de terceiros (e, com isso, tenha de pagar os correspondentes juros).
Para a lei comercial, um negócio aparentemente insólito (emprestar dinheiro sem juros, ainda que os tenha de suportar para obter os fundos a mutuar) insere-se, no entanto, no escopo das sociedades comerciais, desde que se reconduzam à figura das prestações suplementares / acessórias. E isto é assim, por uma razão simples – devidamente reconhecido pela lei comercial: a sociedade ao efetuar essas prestações está a prosseguir a sua atividade egoística, com interesse próprio, na valorização (rentabilização) das suas participadas e ulterior obtenção de rendimentos, via receção de dividendos ou realização de mais-valias.
Segunda: a Requerente é uma sociedade gestora de participações sociais, entidade que tem, como único objeto contratual, a gestão de participações sociais noutras sociedades, como forma indireta do exercício de atividades económicas (art. 1.º, n.º 1, do Dec. Lei n.º 495/88, de 30/12). A sua atividade central circunscreve-se, pois, à gestão das sociedades dominadas – e em que um dos núcleos contrais consiste em dotá-las da estrutura financeira adequada, com entrega de fundos das formas mais díspares, desde aumentos de capital, meros empréstimos, suprimentos e prestações acessórias / suplementares (cfr. art. 5.º, n.º 1, al. c) e n.º 2 e 3 do Dec. Lei n.º 495/88).
Terceira: a lei comercial não contém quaisquer regras gerais (imperativas ou sequer opinativas) quanto à estrutura (e proporção) e composição da dotação de fundos a favor das sociedades dominadas. Uma sociedade é livre de canalizar o seu investimento numa sociedade filha, exclusivamente através de um aumento de capital; como é igualmente livre de o fazer via empréstimos, suprimentos ou prestações suplementares (desde que possua um mínimo de investimento de capital que lhe permita o controlo). Claro está, obviamente, que de essas livres opções resultarão diversos resultados jurídicos, em face da díspar natureza de cada um desses institutos.
Mas o ponto principal é este: a lei comercial conferiu ampla liberdade à sociedade quanto à forma de dotar de fundos as entidades por si dominadas, numa clara não ingerência nas livres opções dos sujeitos, e na suposição de que essa liberdade asseguraria da melhor forma o interesse principal de capitalização das sociedades.
Quarta: tirando o caso da subcapitalização (agora designada por limitação à dedução dos gastos de financiamento – art. 67.º do CIRC) – não aplicável ao caso dos autos – a lei fiscal não contém igualmente qualquer regra específica (norma anti abuso ou outra) que impeça ou cerceie esta liberdade de gestão. Não existe qualquer regra tributária que defina uma proporção da estrutura de capitais e financiamento das dominadas.
Do mesmo modo – e este ponto é muito relevante – a lei fiscal não contém qualquer regra concreta ou princípio específico de desconsideração fiscal dos custos, se os fundos deles obtidos não gerarem quaisquer proveitos tributados.
E não o contém por razões de simplicidade e de adesão à verdade.
A simplicidade ancora-se na dificuldade de estabelecer uma relação causal direta entre um custo e um proveito financeiro, numa organização, como uma sociedade comercial, cujos financiamentos concedidos se destinam, por regra, à totalidade da sua atividade e que se socorre indistintamente de fundos próprios e de terceiros para prosseguir o seu escopo – e é impossível aferir, por isso, se os fundos das prestações sem juros concedidos às dominadas provêm de financiamento de terceiro ou próprio e em que proporção ocorreu cada um deles… é este o motivo que preside, aliás, à Circular 7/2004, para as SGPS (e que não se verte na resolução do art. 23.º do CIRC), como se abordará mais à frente…
A adesão à verdade percebe-se com as considerações anteriores: uma sociedade pode obter fundos (e pagar juros) e depois entregar esses fundos a uma filial sem qualquer remuneração causal e direta – e ainda assim exercer adequadamente a sua atividade, dentro da sua capacidade e escopo lucrativo: pode efetuar um aumento de capital (art. 25.º do CSC), prestações suplementares ou acessórias sem juros (art. 210 e 287.º do CSC) ou suprimentos sem juros (art. 243.º do CSC) – e em qualquer desses casos atua totalmente dentro da sua capacidade de exercício e com um ânimo lucrativo e no exercício da sua atividade.
Ora:
É com base nestas quatro considerações que se tem de interpretar o art. 23.º, n.º 1, do CIRC, que dispõe: consideram-se custos ou gastos os que “sejam indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, nomeadamente: c) […] juros de capitais alheios aplicados na exploração”.
Tendo em conta a jurisprudência dos tribunais superiores (devidamente citada pelas partes, em especial pela Requerida [nomeadamente, Acórdão do STA 186/06, de 12/7/2006; 107/11 de 30/11/2011; 1077/08, de 20/5/2009; 246/02, de 10/7/2002 e Acórdão do TCA Sul 5251/11, de 24/4/2012, consultados em www.dgsi.pt]) e os ensinamentos da doutrina que se debruçou sobre o assunto (abundantemente citada pelas partes, nomeadamente pela Requerida) inclusive um trabalho de que o árbitro é autor (Tomás Cantista Tavares, Da relação de dependência parcial entre a contabilidade e o Direito Fiscal na Determinação do Rendimento Tributável das Pessoas Coletivas: algumas reflexões ao nível dos custos, CTF 396, Outubro-Dezembro de 1999 e António Portugal, A dedutibilidade dos custos na Jurisprudência Fiscal Portuguesa, Coimbra Editora, 2004), podemos estabelecer os seguintes corolários, aceites por todas estas fontes, relativamente ao caso dos autos:
1. O art. 23.º do CIRC contém uma cláusula aberta, que carece de interpretação e aplicação ao caso concreto (sem que o Fisco possa entrar num juízo de oportunidade ou de discricionariedade técnica), pela qual só são fiscalmente aceites os custos indispensáveis para a realização dos proveitos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.
2. A indispensabilidade entre custos e proveitos afere-se num sentido económico: os custos indispensáveis são os contraídos no interesse da empresa, que se ligam com a sua capacidade, por inserção no seu escopo lucrativo (de forma mediata ou imediata) e no exercício da sua atividade concreta.
3. A Autoridade Tributária não pode sindicar a bondade e oportunidade das decisões económicas da gestão da empresa. Não se pode intrometer na liberdade e autonomia de gestão da sociedade. Um custo será aceite fiscalmente caso seja adequado à estrutura produtiva da empresa e à obtenção de lucros, ainda que se venha a revelar uma operação económica infrutífera ou economicamente ruinosa.
4. O gasto imprescindível equivale a todo o gasto contraído em ordem à obtenção dos proveitos e que represente um decaimento económico para a empresa.
5. O art. 23.º do CIRC intima não apenas uma conexão causal adequada entre o custo e o proveito (nos referidos termos económicos), mas conexiona-se também alternativamente (como indica o vocábulo “ou”) com a manutenção da fonte produtora – no sentido de uma ligação económica entre a despesa e a vigência e manutenção da sociedade e sua atividade.
6. No que tange aos encargos financeiros, são custos fiscais os juros de capitais alheios aplicados na exploração – como indica a al. c) do n.º 1, do art. 23.º do CIRC, que na estrutura da norma (exemplos nas alíneas e princípio geral no corpo do n.º 1) se assume como a concretização do princípio geral: o juro é indispensável quando o capital alheio for aplicado na exploração.
7. O art. 23.º do CIRC quer apenas recusar a aceitação fiscal dos custos, que embora assim contabilizados pela empresa, não são na realidade custos empresariais. Trata-se de situações claramente abusivas, pois tais gastos não se inscrevem no âmbito da sua atividade – foram contraídos não no interesse da sociedade, mas para a prossecução de objetivos alheios (por exemplo, camuflar gastos pessoais dos administradores).
8. O custo fiscal exige um interesse próprio e egoístico da sociedade que regista o custo: esse interesse tem de existir autonomamente e não pode ser diluído no interesse coletivo ou do grupo.
Estas considerações habilitam a resolução da situação concreta.
Os encargos financeiros em causa assumem-se como custos fiscalmente dedutíveis nos termos do art. 23.º do CIRC.
A Requerente aplica os capitais alheios (sobre os quais paga juros) na sua exploração – o critério legal de aceitação fiscal dos juros vertido no art. 23.º, n,º 1, al. c), do CIRC. Com esses fundos constitui prestações suplementares / acessórias, como forma de exercício e manutenção da sua atividade e fonte produtora e procura do seu escopo lucrativo.
Com efeito, sendo a Requerente uma SGPS, a sua atividade e exploração radica exclusivamente na gestão das suas participadas e dominadas – entre outras formas, dotando-as de prestações suplementares ou acessórias para prosseguirem a sua atividade operacional. É este o objeto social da SGPS e esta operação insere-se no núcleo da sua atividade, exploração e no seu escopo lucrativo. Com isso, a SGPS está a contrair custos indispensáveis para aos proveitos ou para a manutenção da sua fonte produtora.
Como se viu supra, a realização de prestações (acessórias / suplementares) sem juros corresponde a um instituto previsto e regulado pelo direito comercial. As sociedades que os utilizam nas suas operações financeiras estão a efetuar negócios lícitos e inseridos na sua capacidade, ainda que não lucrativos no curto prazo, porque não geram qualquer rédito no imediato. Ora, se esta operação é consentida pelo Direito Comercial, nos seus exatos termos – inexigibilidade de juros nestas prestações – é então evidente que a mesma se insere num perfil lucrativo (pois essa é a bitola da capacidade das sociedades). De facto, não faria sentido que o CSC consentisse operações cujos termos revelassem que os sujeitos não visam um intuito lucrativo, porque extravasariam a capacidade dos entes morais. O art. 210.º do CSC não pode estar em contradição com o art. 6.º do CSC – mas o instituto da prestação suplementar (em todas as suas feições, inclusive na inexistência de juros) concretiza e torna operativo o princípio da capacidade descrito no art. 6.º do CSC.
A sociedade (a Requerente), na sua liberdade de gestão, pode dotar as dominadas com os fundos que carecem, das formas mais díspares. E os interesses (comercial e fiscal) têm de aceitar qualquer dessas opções. Apesar da inexigibilidade imediata de rendimento (juro), a verdade é que o prestador (requerente) tem um interesse próprio e egoístico nestas operações, via aumento e rentabilização do valor da participação e possibilidade ulterior de receção de rendimentos, via dividendos (por lucros distribuídos da filial) ou mais-valias (por alienação onerosa, com ganho dessas participações).
A Requerida objeta que esses rendimentos (dividendos e mais valias) não são por regra tributados, dado a requerente ser uma SGPS, cujas mais-valias estão por regra isentas de imposto, com condicionamento temporal (art. 32.º, n.º 2, do EBF) e cujos dividendos têm idêntico resultado (art. 51.º do CIRC). Esta argumentação não procede.
Desde logo, porque a não tributação não é direta e imediata mas condicional. Depois, e sobretudo, porque não há qualquer regra ou princípio fiscal que exija a desconsideração fiscal do custo se o proveito correlativo não originar qualquer tributação. O art. 23.º do CIRC, no que tange aos encargos financeiros exigiu apenas que o capital mutuado seja utilizado na exploração (como sucede manifestamente), prescindindo de uma ulterior indagação de correlação entre proveitos e gastos. Da mesma forma, o corpo do artigo 23.º do CIRC intima apenas que esses custos se relacionem causalmente (numa aceção económica) com a manutenção da fonte produtora (o que sucede in casu dado que a prestação acessória / suplementar conserva e valoriza a participação financeira na dominada). E isso basta sem ulteriores considerações para a aceitação fiscal dos juros em causa.
Mas frise-as ainda o seguinte: a aceitação fiscal do custo financeiro (juro) exige alternativamente uma relação com os proveitos “sujeitos a imposto”. Ora, as mais-valias obtidas por SGPS estão sujeitas a imposto. Simplesmente, surge depois uma isenção (com vários requisitos) que impede em segunda linha a tributação. O rendimento está sempre sujeito a imposto; e ou é tributado ou não tributado, caso não se cumprem ou se preenchem os requisitos da isenção. Mas, e é isto que importa, o rédito isento está sempre sujeito a tributação (cfr. art. 1.º a 3º do EBF e Alberto Xavier, Manual de Direito Fiscal, Lisboa, 1981, p. 283 e 284). O que vale para a mais-valias, vale igualmente para o regime fiscal dos dividendos auferidos pelas SGPS.
A requerente tem um interesse próprio na realização de prestações (acessórias / suplementares) sem juros. Não há apenas um interesse da sociedade recetora ou do grupo. O interesse próprio da requerente decorre, desde logo, dos ensinamentos e corolários do direito comercial. As prestações efetuadas pela Requerente inserem-se na sua capacidade, são atos adequados à sua atividade e com perfil lucrativo.
E isso é assim, mesmo que numa lógica imediatista se revelem aparentemente como maus negócios (que o art. 23.º do CIRC não pode aliás censurar): entregam-se fundos, sem juros, durante um certo prazo, recebendo-se no final da operação apenas o dinheiro entregue (sem juro e sem atualização da inflação) e suportando-se juros relativamente aos capitais alheios objeto de prestação a favor da dominada.
Mas o direito comercial (e fiscal) releva antes o seguinte: com a prestação sem juros, a sociedade concedente valoriza a sua participação financeira; dota a filial dos fundos necessários para que possa exercer melhor a sua atividade, com vantagens próprios e egoísticas também da concedente, via valorização da participação de capital e assunção de um risco empresarial que lhe permitirá no futuro, assim se espera, rentabilizar esse ativo com retorno valorizado do investimento (via mais valias ou dividendos).
E note-se que o art. 23.º do CIRC não se pode imiscuir nas livres e lícitas opções económicas do sujeito (dotar fundos via aumento de capital, empréstimo com juros ou prestações em juros) nem no grau de risco económico (maior ou menor) que o mesmo quer emprestar às suas decisões (alavancagem financeira dos fundos utilizados na prestação suplementar).
Esses juros só não seriam um custo fiscal se a requerente, apesar de os contabilizar, não tivesse realmente aplicado tais verbas nas prestações que declara; ou aplicando-as, se a dominada não os utilizasse na sua atividade operacional, mas por exemplo, na satisfação ilícita de interesses de terceiro, em investimentos não empresariais, mas meramente privados. Mas a AT nada alega que possa incluir-se neste tipo de situações. Reconhece que as prestações foram realizadas e que a dominada utilizou o dinheiro na sua atividade, sem qualquer fraude ou intuito abusivo.
Por todos estes motivos, os encargos financeiros suportados pela requerente cujo capital seja aplicado em prestações suplementares ou acessórias sem juros a favor de sociedades dominadas (de forma direta ou por quantificações proporcionais tal como sucede na Circular 7/2004) assumem-se como um custo fiscal, nos termos do art. 23.º do CIRC.
3. Prestações sem juros e o art. 31.º, n.º 2 EBF (atual art. 32.º, n.º 2 EBF)
Esta questão, nos seus contornos gerais e enquadramento jurídico, já foi devidamente tratada nos processos 9/2012-T e 69/2012-T do CAAD. Concorda-se com os raciocínios, julgamento, ponderação, corolários e conclusões que esses acórdãos dão às questões suscitadas. A presente Sentença seguirá de perto, com a devida vénia, o teor dessas Sentenças que sistematizam e decidem as questões com clareza e justeza.
Na aplicação da Circular 7/2004, a Requerente incluiu prestações suplementares e acessórias (sem juros) como encargos não imputáveis a partes de capital, concorrendo assim para o lucro tributável.
O art. 32.º, n.º 2, do EBF dispõe que “as mais-valias e as menos-valias realizadas por SGPS […] de partes de capital de que sejam titulares […] e, bem assim, os encargos financeiros suportados com a sua aquisição não concorrem para a formação do lucro tributável dessas sociedades”.
A Circular 7/2004 (de 30/4 da DSIRC) introduz uma métrica para quantificar os encargos financeiros suportados com a aquisição de partes de capital. Diz-se no ponto 7 que dada a dificuldade de utilização de um método de afetação direta (o dinheiro é fungível e por regra os empréstimos não possuem uma afetação concreta) e dada a possibilidade de manipulação que um método direto permitiria, a imputação deve ser efetuada com base numa fórmula: os passivos remunerados devem ser em primeiro lugar afetos aos empréstimos remunerados concedidos às empresas participadas e aos outros investimentos geradores de juros, afetando-se o remanescente aos restantes ativos, nomeadamente participações sociais, proporcionalmente ao respetivo custo de aquisição.
A Circular estabelece, pois, um método que permite a afetação dos passivos aos diferentes ativos da SGPS: primeiro afetam-se os passivos remunerados das SGPS aos investimentos geradores de juros; depois afeta-se o remanescente dos passivos aos restantes ativos, proporcionalmente ao respetivo custo de aquisição. Este método permite apurar quais os montantes dos encargos financeiros suportados pelas SGPS que não são dedutíveis.
As mais-valias obtidas pelas SGPS com partes de capital estão isentas de tributação se a parte de capital for detida por mais de 1 ano. Mas nesse caso, não se podem deduzir fiscalmente os encargos financeiros que suportam a aquisição dessas partes de capital (que por isso, não concorrem para a formação do lucro tributável).
O legislador não quis que se cumulassem dois benefícios. A SGPS já vê as suas mais-valias de partes de capital estarem isentas de imposto; mas quando tal suceder, não pode cumular com o benefício de aceitação fiscal dos juros suportados com o financiamento para a aquisição dessas partes de capital.
Ora, a questão sub judice (e as partes concordam aliás que é este o objeto da disputa) resume-se a saber se uma prestação suplementar ou acessória é ou não uma “parte de capital” para efeitos do art. 32.º do CIRC: se o for, a Requerida tem razão na sua pretensão; se o não for, a requerente deve ver anulada a liquidação impugnada.
Dito ainda por outras palavras: saber se o conceito de partes de capital do art. 32.º do CIRC deve ser interpretado em sentido contabilístico (como advoga a requerida), integrando a noção contábil de capital próprio (onde se integra a figura da prestação suplementar); ou ao invés, como sustenta a requerente, se a noção de parte de capital deve ser interpretada num sentido de direito comercial, equivalendo à noção de capital social.
A noção de “parte de capital” do art. 32.º do EBF tem de ser interpretada segundo as ferramentas jurídicas ao dispor do intérprete, com o auxílio do elemento literal, sistemático e teleológico.
Vejamos:
Quanto ao elemento literal: a lei fiscal não contém qualquer definição sobre o que entende por “parte de capital” – nem no EBF, nem no CIRC; por outro lado, utiliza por vezes, quer a expressão “capital próprio” (art. 45.º, n.º 3, do CIRC e sobretudo art. 67.º, n.º 5, do CIRC [na versão à data dos factos], quer a expressão de capital social (entrada de capital) – art. 21.º do CIRC.
Com isso, o legislador toma uma opção clara: quando se refere à noção de capital próprio, está a circunscrevê-la ao seu sentido contabilístico; do mesmo modo, quando utiliza a expressão capital social está a empregá-la na precisa base comercial e contabilística.
Mas a noção de “parte de capital” empregue na lei fiscal em vários domínios (por exemplo, art. 23.º, n.º 3 e 5 do CIRC à data dos factos, art. 45.º, n.º 5, do CIRC, art. 32.º do EBF) deve ser interpretada com o auxílio do elemento sistemático e teleológico, na obtenção de uma solução que respeitando aqueles elementos, caiba legitimamente na letra da lei.
O elemento sistemático (e ainda com base literal) descortina-se sobretudo na análise do atual art. 45.º, n.º 3, do CIRC (anterior art. 42.º, n.º 3, do CIRC). Este preceito, na redação introduzida pela Lei n.º 60-A/2005, de 30/12, vem estabelecer que o saldo das “mais-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital […] bem como outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes de capital próprio, designadamente prestações suplementares”, concorrem em metade do seu valor para a formação do lucro tributável.
Este preceito, no que importa ao caso dos autos, cria duas categorias de situações:
a) Partes de capital no sentido de participações sociais (quotas ou ações) – quando refere as mais-valias e menos-valias por “transmissão onerosa de partes de capital, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital ” – aliás estes últimos casos só se aplicam a quotas e ações;
b) Perdas relativas a outras componentes de capital próprio, designadamente prestações suplementares.
Deste preceito retiram-se duas ilações fulcrais para o nosso caso:
1. Para o legislador fiscal, as prestações suplementares não se subsumem no conceito de “partes de capital”. São categorias diversas. Para lá das partes de capital (ações e quotas), existem ainda as outras componentes de capital próprio, onde se incluem designadamente as prestações suplementares. Esta norma (com a redação introduzida para 2006) tem natureza inovatória e não interpretativa da norma anterior (Acórdão 9/2012-T do CAAD). A prestação suplementar não está incluída no conceito de partes de capital; subsume-se no conceito de outras componentes de capital próprio, como introduzido na nova lei, que antes de entrar em vigor não considerava em metade as perdas com prestações suplementares, por falta de lei aplicativa.
2. Por outro lado, é este aspeto é muito relevante, a lei fiscal, quando quis regular fiscalmente as prestações suplementares, teve o cuidado de o prever expressamente – e não quis que tal conteúdo estivesse incluído no conceito de partes de capital. Ora, no nosso caso, como o art. 32.º, n.º 2, do EBF fala apenas de partes de capital, sem o estender às prestações suplementares, é porque só quis regular e abranger esta situação (ações e quotas). Só os juros ligados à aquisição de partes de capital (ação e quotas) não são aceites em termos fiscais; os conexos com os capitais alheios utilizados em prestações suplementares revestem a natureza de custo fiscalmente dedutível.
Advogamos uma interpretação uniforme dos conceitos empregues na lei fiscal (identidade do conceito de partes de capital no art. 45.º do CIRC e art. 32.º do EBF), exceto se o elemento teleológico o contrariar; ou seja, se pela análise da ratio do art. 32.º, n.º 2, do EBF se acabasse por concluir que a noção de partes de capital aí empregue deve ter um sentido diverso do utilizado no art. 45.º do CIRC.
Mas não é o caso. O conceito de partes de capital empregue no art. 32.º, n.º 2, do EBF tem o mesmo sentido que no art. 45.º, n.º 3, do CIRC: cinge-se a noção de partes de capital a participações de capital (ações ou quotas), sem se estender à figura das prestações suplementares e ou acessórias.
O elemento teleológico corrobora esta tese: o art. 32.º. n.º 2, do EBF radica na não duplicação de benesses tributárias às SGPS: à isenção das mais-valias com a venda das partes de capital (ações e quotas) não se quis associar a benesse fiscal de permitir a dedução dos juros do financiamento para a aquisição dessas participações sociais.
Esta lógica não se aplica às prestações suplementares, pois aí não existe por regra qualquer rendimento e se acaso houver – em situações excecionais e não previsíveis – o mesmo não se reconduz à categoria fiscal das mais-valias.
Por regra geral (e a lei fiscal esculpe-se na normalidade), a prestação suplementar não gera qualquer rédito: quem a efetua fica com o direito de receber no futuro o mesmo e exato montante da prestação. Não regista por isso qualquer rendimento. Mais ainda: é concebível falar-se em perdas, nos casos em que o devedor não consiga reembolsar total ou parcialmente a prestação suplementar, por se encontrar em dificuldades financeiras (e aí há um custo); mas nunca existem réditos positivos: se o devedor estiver em excelente situação financeira, tem apenas a obrigação de pagar o valor nominal da prestação, sem que exista qualquer rendimento.
E por isso, o art. 32.º, n.º 2, do EBF, quando fala em rendimentos positivos ou negativos das partes de capital, não está a pensar nos réditos das prestações suplementares, mas apenas das ações e quotas – onde a volatilidade do título (ascendente e descendente) constitui o seu ADN genético (e a isenção associada pretende que as SGPS não sejam penalizadas na lógica de substituição de participações).
Claro está que é concebível pensar-se em réditos positivos no mercado secundário: na aquisição abaixo do par de prestações suplementares que são depois devolvidas ao par. Mas o art. 32.º, n.º 2, do EBF não está a pensar nestas situações: quer por serem tão inusuais ou insólitas (e a lei esculpe-se nos casos usuais), quer sobretudo porque esse rédito não assume a natureza fiscal de uma mais-valia (a única realidade abrangida pelo art. 32.º, n.º 2, do EBF), mas de outro tipo de rendimento (não subsumível no art. 32.º, n.º 2, do EBF).
O art. 45.º, n.º 3, do CIRC – relativo a custos – fala de menos valias para se referir rendimento às perdas com as partes de capital (ação e quotas) e “outras perdas” ou “variações patrimoniais negativas” para se referir às demais componentes do capital próprio, incluindo as prestações suplementares.
E compreende-se que assim seja: em geral, o regime das mais-valias visa conceder um regime especial favorável aos imobilizados tangíveis e financeiros (ações e quotas) das sociedades, como forma de combater o efeito de lock-in – fenómeno que no sistema fiscal da realização condiciona o racional fluir económico dos ativos (compra e venda) por razões que se prendem com constrangimentos fiscais (pagamento do imposto). No fundo, evitar o cenário de um sujeito que não vende um ativo (ação ou quota) de que é titular – e todas as razões económicas o aconselham – apenas pelo facto de ir pagar nesse momento um elevado imposto (porque a tributação só é descarregada com a venda do ativo e não na cadência da sua valorização anual). É este motivo que justifica a infra tributação dos ativos tangíveis e financeiros (ações e quotas), corporizado num regime fiscal especial de tributação das mais valias.
E nada disso se verifica nas prestações suplementares. Elas são devolvidas, ao par, segundo as regras do direito comercial. Não existe, nem que se quer forçar a existência, de um mercado (secundário) de volumosas transações de prestações suplementares. E não é crível que os parcos detentores de prestações suplementares abaixo do par não queiram receber o seu valor nominal, com receio ou temor do pagamento de imposto associado; ou que isso seja um óbice económico tal que justifique criar ou inseri-los no regime especial das mais e menos valias.
Em suma: os encargos financeiros suportados pela Requerente com a realização de prestações suplementares acessórias sem juros são dedutíveis em termos fiscais, por não preenchimento do disposto no art. 32.º do EBF. Na aplicação da Circular 7/2004, a Requerente pode incluir prestações suplementares e acessórias (sem juros) como encargos (custos) não imputáveis a partes de capital, concorrendo assim para o lucro tributável.
4. Violação da confiança e da boa-fé
A Requerente invoca a violação dos artigos 55.º, 68.º-A e 77.º da LGT, artigos 266.º e 103.º da CRP e artigo 6.º-A, do CPA pelo facto de a AT ter alterado o seu entendimento sobre este assunto, passando a efetuar liquidações adicionais de imposto quando antes aceitava os comportamentos dos contribuintes.
O julgamento desta questão é desnecessário e está prejudicado, dada a procedência das pretensões do contribuinte na análise das outras duas questões supra. No entanto, sempre se dirá que os contribuintes não possuem, por regra, qualquer direito ou expetativa juridicamente tutelada, no sentido de impedirem a AT de alterar o seu entendimento sobre questões fiscais concretas, sobretudo se não possuem qualquer instrumento formal que os tutele (informação vinculativa, oficio ou despacho). A alteração de entendimento da AT não viola a boa-fé e, em geral, os contribuintes não possuem um direito a algo que, segundo a nova interpretação da AT, não está conforme com a lei.
5. Juros indemnizatórios
A liquidação contestada corrigiu, por diminuição, os prejuízos fiscais detidos pela Requerente, a qual solicita, para lá da anulação da liquidação (e possibilidade de efetuar o reporte desses prejuízos), que a AT seja condenada na obrigação de pagamento de juros indemnizatórios, pelo período de tempo entre o momento que os deduziria espontaneamente nos anos seguintes se acaso tivesse lucros (como se a liquidação impugnada nunca tivesse sido emitida) e o momento em que os vai agora deduzir (por efeito da Sentença).
Sem prejuízo deste ulterior cálculo concreto, reiteramos a correção do pedido da Requerente: a anulação da liquidação implica a sua retirada do mundo jurídico, como se nunca tivesse existido; e se a liquidação adicional não existisse (como assim agora o é, por efeito desta sentença), a Requerente poderia ter deduzido mais cedo esses prejuízos fiscais (se acaso tivesse lucros suficientes nos anos seguintes), e não o fez apenas por causa desta liquidação agora anulada. Ao ser reconhecido o aumento dos prejuízos fiscais em 2007, a requerente tem agora (mais tarde) direito a utilizar esses prejuízos fiscais nos anos seguintes se preenchidos os pressupostos do reporte de prejuízos. Mas vai exercer agora esse direito e não nas autoliquidações dos anos ulteriores a 2007 – e será reembolsada mais tarde das quantias associadas à utilização desse reporte.
Tem assim direito a receber juros indemnizatórios, à taxa legal, calculados sobre o montante de imposto que a requerente tenha suportado por desconsideração destes prejuízos fiscais, desde a data em que os poderia ter utilizado se acaso não houvesse a liquidação em causa, até integral reembolso.
V – DECISÃO
Em face do exposto, o presente Tribunal decide:
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Julgar procedente, por violação de lei, a impugnação parcial da liquidação de IRC de 2007 (2011 …), na parte respeitante à correção dos encargos financeiros de 185.887,30€.
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Julgar procedente o pedido de pagamento de juros indemnizatórios à taxa legal, calculados sobre o montante de imposto que a requerente tenha suportado por desconsideração destes prejuízos fiscais, desde a data em que os poderia ter utilizado até integral reembolso.
Fixa-se o valor do processo em 46.471,83€ (quarenta e seis mil, quatrocentos e setenta e um euro e oitenta e três cêntimos), nos termos do art. 97.º-A, n.º 1, do CPPT, aplicável ex vi art. 29.º, n.º 1, al. a) e b), do RJAT e art. 3.º, n.º 2, do Regulamento de custas dos processos de arbitragem tributária (RCPAT).
Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em 2.142,00€ (dois mil cento e quarenta e dois euros), nos termos da Tabela 1 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar integralmente pela Requerida, uma vez que a Requerente obteve deferimento integral do pedido, nos temos dos artigos 12.º, n.º 2 e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 2 do citado Regulamento.
Notifique-se.
Porto, 8 de Julho de 2013
O ÁRBITRO
Tomás Maria Cantista de Castro Tavares