DECISÃO ARBITRAL
1. RELATÓRIO
1. A…, S.A., contribuinte n.º…, com sede na…, n.º…, Lisboa, na qualidade de sociedade gestora do B…– FUNDO DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO FECHADO PARA ARRENDAMENTO HABITACIONAL» registado junto da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, com o número de identificação fiscal…, veio, aos 6 de Janeiro de 2017, requerer a constituição de tribunal arbitral, nos termos do artigo 2.º, n.º 1, alínea a) do Decreto-lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (adiante RJAT).
1.2. É Requerida nos autos a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
1.3 O Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) designou a ora signatária para formar o Tribunal Arbitral Singular, notificando as partes, e o Tribunal foi constituído a 21 de Março de 2017.
1.4 O pedido de pronúncia arbitral tem por objeto a liquidação de IMT número …, no valor de 687,15€, e a liquidação de IS número …, no valor de 549,72€, ambas relativas Prédio U-…-C sito na Rua …, …, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de … (actual União de Freguesias de … e …), …, liquidações e prédio que estão melhor identificados no pedido da Requerente e nos documentos a ele juntos, para os quais aqui se remete.
A Requerente pede ao Tribunal que afira se o número 2 do artigo 236.º (Norma Transitória no âmbito do Regime Especial Aplicável aos FIIAH e SIIAH) previsto pela Lei n.º 83 – C/2013, de 31 de Dezembro - na medida em que determina a aplicação do atual Regime Tributário dos FIIAH aos prédios que tenham sido adquiridos por FIIAH antes de 1 de Janeiro de 2014, contando-se, nesses casos, o prazo de três anos previsto no n.º 14 a partir de 1 de Janeiro de 2014 - consubstancia um novo regime de caducidade das isenções previstas no n.º 7, alínea a) e n.º 8 do artigo 8.º (Regime Tributário ) do Regime Tributário dos FIIAH e se, nessa medida, revela uma violação do princípio da não retroatividade da lei fiscal, plasmado no artigo 103.º, número 3, da Constituição da República Portuguesa, o que, no seu entender, conduz à sua inconstitucionalidade.
A Requerente invoca a ilegalidade das liquidações com base na sua inconstitucionalidade que, entende, conduz à respetiva nulidade, que pretende seja declarada pelo Tribunal, ou à sua anulabilidade, pelo que subsidiariamente pede sejam as liquidações anuladas.
Entende a Requerente que as liquidações em crise estão, em consequência, feridas de vício que tem como consequência a nulidade, ao abrigo da alínea d) do n. º. 2 do artigo 133.2 do Código do Procedimento Administrativo (CPA) porque ofendem o conteúdo essencial de um direito fundamental.
Sendo que, entende também, sempre serão as liquidações anuláveis, por ilegais, com o mesmo fundamento.
Mais peticiona a Requerente a condenação da Requerida ao reembolso das quantias pagas por força das liquidações em crise, acrescidas dos juros indemnizatórios sobre todas as quantias pagas vencidos contados até à data do reembolso.
1.5 A AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA respondeu a 4 de Maio de 2017, defendendo-se por impugnação, sustentando a consonância com a Constituição da norma em crise.
Alega que a lei em questão não é ferida de retroatividade, não tendo estabelecido nenhum novo requisito para aplicação da isenção prevista no regime fiscal dos FIAH, mas apenas tendo concedido um prazo para cumprimento de um requisito já subjacente ao próprio regime, prazo esse que apenas se inicia após a entrada em vigor da lei nova.
Não se trata, pois, de alterar os pressupostos, condições de atribuição ou de reconhecimento de um benefício fiscal, mas tão só e apenas, concretizar aquele regime, regulando o período de tempo para efeitos de comprovação do cumprimento de um requisito previamente estabelecido.
Acrescenta que, no caso em apreço, as liquidações de imposto em crise têm fundamento no facto de a Requerente ter alienado o imóvel, dando-lhe, dessa forma, destino diferente daquele em que assentara o benefício.
Acrescenta, quanto à suposta nulidade dos atos de liquidação, que no ordenamento jurídico-administrativo português o regime regra de invalidade dos atos é, por razões de segurança jurídica, a mera anulabilidade, incluindo para os praticados com fundamento em deliberações ilegais ou inconstitucionais, tendo o Supremo Tribunal Administrativo vindo a pronunciar-se nesse mesmo sentido.
Refere a Requerida que a declaração de nulidade aparece reservada aqueles atos que ofendem o conteúdo essencial de um direito fundamental, contendendo com os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, mas não aqueles que contendem com o princípio da legalidade, como é, diz, o caso nos autos.
Os atos em apreço, sendo, sem que em tal se conceda, violadores do princípio da legalidade tributária, seriam, assim, anuláveis, mas não nulos. Sendo certo que, continua, os actos em causa não são ilegais e, portanto, não padecem de qualquer vício que importasse sequer a respetiva anulabilidade, na medida em que, repete, as liquidações em apreço no facto de ter sido dado ao imóvel «um destino diferente daquele em que assentou o benefício» então, contrariamente ao que pretende a Requerente, não só não está em causa a retroatividade da norma legal por si melhor identificada no intróito do pedido arbitral, como também não se verifica qualquer lesão das suas expectativas.
Entende, finalmente, que, ainda que viessem a proceder os pedidos da Requerente, não seriam, em qualquer caso, devidos juros indemnizatórios, por não lhe poder, no seu entender, ser-lhe imputado qualquer erro de facto ou de direito, vinculada que está ao princípio da legalidade, não estando, pois, verificados os pressupostos do artigo 43.º da LGT.
Pelo que a Requerida conclui que devem ser julgados improcedentes os pedidos e termina requerendo que caso o Tribunal venha a acolher a pretensão da Requerente e, inerentemente, recuse a aplicação do artigo 236.º do Regime aplicável aos FIIAH, com fundamento em inconstitucionalidade, requer-se, por apelo ao disposto no artigo 280.º, n.º 3 da CRP e no artigo 72.º, n.º 3 da Lei do Tribunal Constitucional, seja determinado a notificação ao Ministério Público da douta decisão arbitral, a fim de que este dê cumprimento às suas prerrogativas legais.
1.6. Na mesma data, a Requerida veio requerer a dispensa de apresentação do processo administrativo, “atenta à matéria em causa e face ao teor dos documentos já juntos pela requerente”.
1.7 O Tribunal proferiu, aos 8 de Maio de 2017, despacho no sentido de dispensar a reunião do tribunal arbitral prevista no artigo 18.º do RJAT e bem assim, as alegações, e marcando data para a prolação da decisão arbitral.
1.8. As partes, notificadas. não se opuseram.
2. SANEAMENTO
O Tribunal foi regularmente constituído e é competente.
As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas e encontram-se regularmente representadas.
O processo não sofre de quaisquer vícios que o invalidem.
3. MATÉRIA DE FACTO
Com relevância para a decisão de mérito, o Tribunal considera provada a seguinte factualidade:
1) A Requerente era proprietária do Prédio U-…-C sito na Rua…, …, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de … (actual União de Freguesias de … e…), … .
2) O prédio foi adquirido beneficiando das isenções de IMT e de IS constantes, respetivamente, dos números 7, alínea a), e 8 do artigo 8.º do Regime Tributário dos FIIAH, que foram reconhecidas a requerimento, nos termos do artigo 10.º do Código do IMT.
3) A Requerente apresentou, em 10.08.2016, uma declaração para liquidação de IMT e de IS, solicitando o pagamento do IMT e do Imposto de Selo com fundamento no n.º 16.º do artigo 8.º do Regime dos FIIAH, aplicável ex vi do 236.º da Lei n.º 83 – C/2013, de 31 de Dezembro (Norma Transitória no âmbito do Regime Especial Aplicável aos FIIAH e SIIAH);
4) A Requerente indicou como preço da alineação o valor de 68.715,50€, que serviu de base às liquidações em crise;
5) Tais declarações deram origem à liquidação de IMT número…, no valor de 687,15€, e à liquidação de IS número…, no valor de 549,72€;
6) Estes valores foram pagos pela Requerente em 19 de Outubro de 2016;
Factos não provados
Não se constataram factos essenciais, com relevo para a apreciação do mérito da causa, os quais não se tenham provado.
Fundamentação da Decisão sobre a Matéria de Facto
A convicção sobre os factos dados como provados fundou-se na prova documental junta Requerente, cuja autenticidade e correspondência à realidade não foram questionadas pela Requerida.
4. QUESTÕES DECIDENDAS
A questão que está sob apreciação do Tribunal é a de aferir da legalidade das liquidações de IMT e IS sub judice e decidir acerca das consequências da sua eventual ilegalidade e, consequentemente, da legalidade das liquidações de IMT e de IS sub judice.
Vejamos:
O artigo 102.º (norma inserida no Capitulo X, sob a epígrafe “Benefícios Fiscais”) da Lei n.º 64-A/2008 de 31 Dezembro aprovou o regime especial aplicável aos fundos de investimento imobiliário para arrendamento habitacional (de ora adiante "FIIAH").
Segundo o n.º 7 do seu artigo 8° do FIIAH, ficam isentas de IMT:
"a) As aquisições de prédios urbanos ou de frações autónomas de prédios urbanos destinados exclusivamente a arrendamento para habitação permanente, pelos fundos de investimento referidos no n.º 1;
b) As aquisições de prédios urbanos ou de frações autónomas de prédios urbanos destinados a habitação própria e permanente, em resultado do exercício da opção de compra a que se refere o n.º 3 do artigo 5.º pelos arrendatários dos imóveis que integram o património dos fundos de investimento referidos no n.º 1."
O artigo 235.º da 83-C/2013, de 31 de Dezembro (Orçamento de Estado para 2014 veio introduzir mais 3 números no referido artigo 8.º:
"14 — Para efeitos do disposto nos n.ºs 6 a 8, considera-se que os prédios urbanos são destinados ao arrendamento para habitação permanente sempre que sejam objeto de contrato de arrendamento para habitação permanente no prazo de três anos contados do momento em que passaram a integrar o património do fundo, devendo o sujeito passivo comunicar e fazer prova junto da AT do respetivo arrendamento efetivo, nos 30 dias subsequentes ao termo do referido prazo. 15 — Quando os prédios não tenham sido objeto de contrato de arrendamento no prazo de três anos previsto no número anterior, as isenções previstas nos n.ºs 6 a 8 ficam sem efeito, devendo nesse caso o sujeito passivo solicitar à AT, nos 30 dias subsequentes ao termo do referido prazo, a liquidação do respetivo imposto. 16 — Caso os prédios sejam alienados, com exceção dos casos previstos no artigo 5.º, ou caso o FIIAH seja objeto de liquidação, antes de decorrido o prazo previsto no n.º 14, deve o sujeito passivo solicitar igualmente à AT, antes da alienação do prédio ou da liquidação do FIIAH, a liquidação do imposto devido nos termos do número anterior.".
No artigo 236.º consta a seguinte disposição transitória: “O disposto nos n.ºs 14 a 16 do artigo 8.º do regime especial aplicável aos FIIAH e SIIAH, aprovado pelos artigos 102.º a 104.º da Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro, é aplicável aos prédios que tenham sido adquiridos por FIIAH a partir de 1 de janeiro de 2014. 2 - Sem prejuízo do previsto no número anterior, o disposto nos n.ºs 14 a 16 do artigo 8.º do regime especial aplicável aos FIIAH e SIIAH, aprovado pelos artigos 102.º a 104.º da Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro, é igualmente aplicável aos prédios que tenham sido adquiridos por FIIAH antes de 1 de janeiro de 2014, contando-se, nesses casos, o prazo de três anos previsto no n.º 14 a partir de 1 de janeiro de 2014.”
É contra esta norma transitória que a Requerente se insurge, considerando-a inconstitucional, por violação do princípio da não retroatividade da lei fiscal, plasmado no artigo 103.º, número 3, da CRP, na medida em que, no seu entender, consubstancia um novo regime de caducidade das isenções.
Apreciando, resulta dos factos provados que o prédio em causa foi adquirido pela Requerente beneficiando de isenção de IMT ao abrigo da alínea a) do n.º 7 do artigo 8.º do regime jurídico dos FIIAH.
Tal norma obriga a que o imóvel seja destinado ao arrendamento para habitação permanente para que possa beneficiar de tal isenção.
Isto é, a obrigatoriedade de destinar o imóvel ao arrendamento habitacional não é requisito das alterações introduzidas pelos artigos artigo 235.º e 236.º da 83-C/2013, de 31 de Dezembro, antes um requisito do regime fiscal dos FIIAH.
É a natural decorrência das motivações que levaram à criação de um regime especial temporário aplicável a estes Fundos, ligadas à crise económica e à consequente dificuldade acrescida dos indivíduos e das famílias no pagamento das prestações dos contratos de mútuo celebrados para aquisição de habitação própria permanente, pretendendo, portanto, o regime acudir a situações de dificuldade e incentivar o arrendamento para habitação própria permanente.
O Orçamento de Estado para 2014 vem, é certo, estabelecer um novas regras para a isenção: caso a afetação a arrendamento para habitação permanente não ocorra no período de 3 anos após a entrada do imóvel no Fundo e, ainda caso o FIIAH seja objeto de liquidação, antes de decorrido aquele prazo, o adquirente tem que requerer a liquidação do IMT que não foi liquidado.
A Requerente alega que foi só por esta razão – e por aplicação destas regras, que considera inconstitucionais - que procedeu às declarações que deram origem às liquidações em crise.
Não escapa, pois, ao Tribunal que a Requerente pretende circunscrever o âmbito de apreciação da questão sub judice à constitucionalidade da norma e procurar que ao Tribunal fique, dessa forma, vedada a possibilidade de apreciar a legalidade da liquidação por aplicação do disposto, quanto à caducidade da isenção, no Estatuto dos Benefícios Fiscais, dessa forma forçando a via de recurso ao Tribunal Constitucional.
Pois bem, vejamos:
Note-se, desde já, que as liquidações de IMT e IS efetuadas no que à fração autónoma descrita se refere não tiveram por base a sua manutenção no fundo por um período igual ou superior a 3 anos sem que tivesse havido afetação a arrendamento para habitação permanente.
As liquidações em apreço, aliás conforme decorre das notas de liquidação juntas ao processo, basearam-se no disposto no número 16 daquele artigo 8.º. Isto - e apesar de a Requerente não o ter dito expressamente – tiveram por base o facto de a Requerente ter decidido alienar o prédio que, com benefício, havia adquirido para destinar a arrendamento.
O que, para efeitos do disposto no EBF, corresponde à intenção de lhe dar destino diferente daquele em que assentou o benefício, fazendo, portanto, caducar a isenção.
O facto de a alienação do imóvel fazer caducar a isenção não é, como ao diante se deixará explanado, um facto novo, resultante do aditamento efetuado pelo Orçamento de Estado para 2014.
Nova será, quando muito, a obrigatoriedade de o adquirente requerer a liquidação dos impostos que não foram liquidados antes da alienação.
Disposição que não só é meramente procedimental, como não está sequer em causa nestes autos, tendo em conta que foi precisamente isso que a Requerente fez e a consequência sempre seria, como veremos que resulta do Estatuto dos Benefícios Fiscais, que os impostos seriam liquidados oficiosamente pela Fazenda (acrescidos dos juros e sanções previstas na lei), uma vez constatada a alienação.
A alienação do prédio em questão pela Requerente determina a caducidade da isenção porque lhe foi por ela dado destino diferente daquele que havia determinado a concessão do benefício.
Na verdade, para cumprimento da alínea a) do n.º 7 do artigo 8.º não basta uma intenção declarada na aquisição do imóvel, mas uma efetiva afetação ao arrendamento para habitação permanente.
Não é, pois, verdade que não estivessem já legalmente previstos, no momento do reconhecimento da isenção, os factos ou circunstâncias de que dependia a respetiva caducidade, ao menos no que respeita às circunstâncias que efetivamente ocorreram: a alienação do imóvel.
Na verdade, a concessão de um benefício dependia já – e depende sempre – da efetiva verificação dos respetivos pressupostos, nos termos do artigo 12º do EBF (artigo 11.º, na redação do EBF que se encontrava em vigor previamente à republicação do mesmo pelo Decreto-Lei n.º 108/2008, de 26/06).
O facto de a Requerente ter procedido à declaração para liquidação nos termos do n.º 16 da norma, indicando preço, o que indica intenção de alienação da fracção, a qual, ao adquirir, declarou iria afetar a fim que lhe permitia fosse reconhecida – como foi – a isenção de IMT e IS, sempre determinaria, ainda que o aditado número 16 não o previsse expressamente, a caducidade de tais isenções, por efeito do disposto no artigo 12.º e no n.º 3 do artigo 14.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (antigo 12.º, n.º 3, na redação do EBF que se encontrava em vigor previamente à republicação do mesmo pelo Decreto-Lei n.º 108/2008, de 26/06), segundo o qual “Quando o benefício fiscal respeite a aquisição de bens destinados à direta realização dos fins dos adquirentes, fica sem efeito se aqueles forem alienados ou lhes for dado outro destino sem autorização do Ministro das Finanças, sem prejuízo das restantes sanções ou de regimes diferentes estabelecidos por lei.”.
A Requerente não alegou nem, por maioria de razão, demonstrou ter obtido a autorização lá prevista, ou qualquer outra circunstância que obstasse a que as concedidas isenções ficassem sem efeito em consequência da alienação.
Não é, por outro lado, verdade que o regime especial aplicável aos fundos de investimento imobiliário para arrendamento habitacional (FIIAH) e às sociedades de investimento imobiliário para arrendamento habitacional (SIIAH), que, no seu artigo 8.º, cria a isenção, afaste a aplicação do disposto nos citados artigos do EBF, tendo em conta que nada no regime dos Fundos – antes da entrada em vigor do número cuja aplicação retroactiva a requerida põe em causa – afastava a aplicação daquelas disposições, que são gerais.
Parece-nos, portanto, evidente que, na parte correspondente à alienação do imóvel, o n.º 16 do artigo 8.º do Regime Jurídico dos FIIAH se limita a reiterar o que já resultava do disposto no Estatuto dos Benefícios Fiscais.
Pelo que entendemos que a norma em questão, nessa parte, não estabelece qualquer regime novo, substancial, de caducidade do benefício, antes regras procedimentos relativas ao momento e à forma da liquidação dos impostos.
Não é, portanto, certo o que alega a Requerente: a concessão do benefício não constitui ato que fique definitivamente cristalizado na ordem jurídico-tributária.
Na verdade, a ratio para atribuição do benefício fiscal em sede de IMT e IS aos FIIAH é, claramente, a sua afetação a arrendamento para habitação permanente— "As aquisições de prédios urbanos ou de frações autónomas de prédios urbanos destinados exclusivamente a arrendamento para habitação permanente, pelos fundos de investimento...".
Pelo que a consequência de lhe ser dado diverso destino sempre seria a de que a caducidade da isenção, havendo que repor a legalidade, liquidando-se os impostos que, não fosse a declaração de intenção efetuada aquando da aquisição, haveriam de ter sido liquidados.
Nada releva, no caso, portanto, o que alega a Requerente no artigo 19.º do seu pedido de pronúncia arbitral, a saber, que “Caso o Regime Tributário dos FIIAH não tivesse sido alterado (cf. artigos 235.º (Alteração ao regime fiscal dos fundos e sociedades de investimento imobiliário para arrendamento habitacional), e artigo 236.º (Norma Transitória no âmbito do Regime Especial aplicável aos FIIAH e SIIAH), da Lei n.º 83 – C/2013, de 31 de Dezembro) o Requerente nunca teria solicitado as Liquidações.” Isto porque, se não o tivesse feito, seriam as liquidações efectuadas oficiosamente pela AT, mercê da caducidade do benefício.
Concluindo, não é verdade que não estivessem legalmente previstos, no momento do reconhecimento da isenção, quaisquer factos ou circunstâncias de que dependia a caducidade da isenção reconhecida, argumento no qual a Requerente alicerça, por completo, a sua tese da inconstitucionalidade da norma (cf. o artigo 41.º do pedido de pronúncia arbitral.
O douto Parecer que a requerente junta e do qual pretende fazer uso pronuncia-se, é verdade, pela inconstitucionalidade da norma, mas em situação diversa daquela aqui ocorrida, circunscrevendo-se àqueles casos em que a caducidade da isenção ocorre por não ter o imóvel adquirido com isenção sido destinado a arrendamento no prazo – esse sim, novo – fixado pela norma cuja inconstitucionalidade se invoca.
O caso em apreço é manifestamente outro. A liquidação de IMT e Selo não teve origem no decurso deste prazo sem que o Fundo tivesse afetado a fração a arrendamento. Outrossim, ocorreu pelo facto de se ter alienado a fração.
E, para esse caso, a norma em crise estabelece até um regime mais favorável: a isenção só caduca, agora, se o imóvel for alienado antes de decorrido o prazo de três anos. Sem esta norma, por mera aplicação do disposto no Estatuto dos Benefícios Fiscais, a isenção caducaria sempre que o imóvel fosse alineado, sem prejuízo, naturalmente, dos prazos de caducidade do direito à liquidação do imposto.
A norma em crise não é, pois, na parte que se aplica ao caso em apreço, uma norma que restrinja o âmbito da aplicação da isenção, antes uma norma que permite que, depois de decorridos três anos sobre a aquisição, o imóvel seja vendido sem que a isenção caduque.
De outro modo, a alienação da fração sempre determinaria a caducidade da isenção por aplicação do disposto no n.º 3 do artigo 14.º do EBF, não estando, portanto, em causa, na situação sub judice, qualquer aplicação retroativa de norma que venha a introduzir novo regime de caducidade das isenções, tampouco existe lesão de expectativas do Requerente ou agravamento da sua posição fiscal, pelo que entendemos assim que as liquidações de IMT e Imposto de Selo em crise são legais.
Entendemos, portanto, que a norma em crise não padece de inconstitucionalidade e, consequentemente, que são legais as liquidações impugnadas.
Nesse sentido, veja-se, entre outras, a decisão proferida no processo 398/2015-T que correu termos no CAAD: “No caso em concreto – alienação de imóveis que não chegaram a ser afetos a arrendamento para habitação permanente pelo fundo – este nº16, conjugado com o nº15, não altera a substância ou requisitos da isenção estabelecida pela alínea a) mas tem uma natureza mais processual/operativa – lendo-se que caso haja alienação de imóveis que não tenham sido objeto de contrato de arrendamento, as isenções cessam (nomeadamente a da alínea a) do nº7), devendo o sujeito passivo solicitar a liquidação do respetivo imposto. Concluindo, mantemos que não está em causa a retroatividade ou não da lei, nem tão pouco existe lesão de expectativas do Requerente ou agravamento da sua posição fiscal, pelo que entendemos assim que a liquidação de IMT em apreço é legal.”.
Bem assim, a decisão proferida no processo 684/2015-T, 688/2015-T, 690/2015-T, 691/2015-T, todos neste CAAD, entre muitos outros no mesmo sentido e com fundamentação idêntica.
No que respeita, agora, à invocada nulidade da liquidação: tendo em conta que supra se decidiu pela constitucionalidade da norma, fica prejudicada a análise da questão proposta pela Requerente, que é a de saber se uma liquidação que tem por base uma norma inconstitucional é inexistente, nula ou apenas anulável.
Tendo decidido pela legalidade das liquidações em crise, fica prejudicado, bem assim, o conhecimento das consequências de uma eventual ilegalidade, bem como o pedido de condenação em juros indemnizatórios.
6. DECISÃO
Em face do exposto, decide-se julgar totalmente improcedentes os pedidos da Requerente.
* * *
Fixa-se o valor do processo em 1.236,87€ (mil duzentos e trinta e seis euros e oitenta e sete cêntimos) de harmonia com o disposto nos artigos 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT), 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 297.º do CPC.
O montante das custas é fixado em 306,00€ (trezentos e seis euros) ao abrigo do artigo 22.º, n.º 4 do RJAT e da Tabela I anexa ao RCPAT, a cargo da Requerente, de acordo com o disposto nos artigos 12.º, n.º 2 do RJAT e 4.º, n.º 4 do RCPAT.
Notifique-se.
Porto, 22 de Maio de 2017,
O Árbitro
(Eva Dias Costa)
Texto elaborado em computador, nos termos do artigo 131.º, n.º 5 do Código de Processo Civil, aplicável por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.