Decisão Arbitral
I. - RELATÓRIO
A - PARTES
O A…, SA pessoa colectiva n.º…, com sede na Rua…, n.º…, …-… - Lisboa, doravante designada por “Requerente”, apresentou um pedido de constituição de tribunal arbitral, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante designado por “RJAT”), tendo em vista a apreciação da seguinte demanda que o opõe à Autoridade Tributária e Aduaneira (que sucedeu, entre outras, à Direcção-Geral dos Impostos) a seguir designada por “Requerida” ou “AT”.
B - PEDIDO
1 - O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD em 18 de Outubro de 2016 e, nessa mesma data, notificado à AT.
2 - A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 6.º do RJAT, o signatário, em 21-12-2016, foi designado pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa como árbitro de Tribunal Arbitral Singular, tendo aceitado nos termos legalmente previstos.
3 - As Partes foram, em 21-12-2016, devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados das alíneas a) e b) do nº 1, do artigo 11.º e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
4 - Nestas circunstâncias, em conformidade com o disposto na alínea c) do n.º 1 do art.º 11.º do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro, na redacção introduzida pelo art.º 228.º da Lei nº 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral foi regularmente constituído em 05-01-2017.
5 - No dia 05 de Abril de 2017, O Tribunal Arbitral, ao abrigo do art.º 16.º, alínea c) do RJAT (Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro), e tendo em conta o teor do despacho proferido em 27 de Março de 2017, considerou dispensada a realização da reunião prevista no artigo 18.º do referido diploma legal.
6 - A ora Requerente pretende que o presente Tribunal Arbitral:
a) - Declare a ilegalidade e consequente anulação dos 16 actos de liquidação relativos ao Imposto Único de Circulação (de ora em diante designado por IUC), referentes aos 16 veículos automóveis, tal como identificados nos autos, que aqui se dão por integralmente reproduzidos.
b) - Condene a Autoridade Tributária e Aduaneira ao reembolso do montante de € 3.229,27, referentes ao IUC e aos Juros Compensatórios (de ora em diante designado por JC), que pagou e indica como valor do pedido.
c) - Condene a Autoridade Tributária e Aduaneira ao pagamento de juros indemnizatórios pela privação da quantia de € 3.229,27.
C - CAUSA DE PEDIR
7 - A Requerente, na fundamentação do seu pedido de pronúncia arbitral, afirma, em resumo, o seguinte:
8 - Que é uma instituição financeira de crédito com forte presença no mercado nacional.
9 - Que, enquanto instituição financeira de crédito tem, no financiamento do sector automóvel, uma das suas áreas de actividade mais relevantes, celebrando, nesse quadro, entre outros, contratos de locação financeira.
10 - Que os dezasseis veículos identificados na listagem, que junta como Anexo A, foram dados em locação financeira aos seus clientes, tal como também estão identificados nesse Anexo.
11 - Que, um ponto-chave dos referidos contratos reside no facto dos locatários, durante a vigência dos contratos, deterem o seu exclusivo gozo, podendo, no seu termo, vir a adquirir o veículo, mediante o pagamento de um valor residual.
12 - Que, relativamente a cada um dos veículos em causa no processo, estava em vigor um contrato de locação financeira no momento em que se venceu a obrigação de pagar o correspondente IUC, não podendo a Requerente ser responsável pelo pagamento desse imposto.
13 - Que foi notificada para proceder ao pagamento do IUC respeitante aos actos de liquidação identificados no documento junto ao pedido de pronúncia arbitral, como Anexo A, relativamente aos dezasseis veículos, igualmente identificados no referido Anexo.
14 - Que a AT, mesmo sabendo que sobre os mencionados veículos incindiam contratos de locação financeira, e conhecendo perfeitamente a identidade dos locatários, entendeu exigir-lhe o pagamento do imposto em questão.
15 - Que, embora não podendo assumir a qualidade de sujeito passivo do imposto, procedeu ao seu pagamento, relativamente às dezasseis liquidações referenciadas nos autos, respeitantes aos dezasseis veículos, igualmente, identificados no processo, no valor global de € 3.229,27.
16- Que, no domínio do CIUC, o legislador optou por onerar o sujeito passivo, não de acordo com a sua riqueza, afastando o princípio da capacidade contributiva, mas sim na justa medida do custo para o ambiente e para as infra-estruturas viárias que o sujeito passivo, através da utilização de veículos automóveis, possa gerar.
17 - Que, na maioria dos casos, será o proprietário do veículo automóvel, como tal registado, o sujeito passivo do IUC, nos termos do n.º 1 do art.º 3.º do CIUC, na medida em que a regra é a de que, juntamente com a titularidade do veículo, o indivíduo detenha também o seu usufruto.
18 - Que, por estarem sujeitos a locação financeira, jamais os veículos automóveis identificados nos autos, foram, em momento algum, por si utilizados, mas sim pelos respectivos locatários, os quais tiveram o uso exclusivo de qualquer um dos dezasseis veículos em causa, a quem pertencia a sua sistemática utilização e todo o potencial causador dos custos ambientais e viários, que consubstanciam a ratio subjacente ao imposto.
19 - Que, nos contratos de locação financeira, o direito de utilizar o veículo é subtraído ao seu proprietário, enquanto locador, sendo atribuído ao locatário o direito de usar e fruir, em exclusivo, tal veículo.
20 - Que, nos termos do disposto no n.º 2 do art.º 3.º do CIUC, cabe aos locatários o gozo exclusivo do veículo automóvel, cabendo-lhes também a obrigação de pagar o respectivo imposto.
21 - Que, vigorando, relativamente aos dezasseis veículos identificados no processo, contratos de locação financeira, no momento em que se tornou exigível o IUC, é aos locatários, e não ao locador, que compete assegurar o pagamento desse imposto.
D - RESPOSTA DA REQUERIDA
22 - A Requerida, Autoridade Tributária e Aduaneira, (doravante designada por AT), apresentou, em 03-02-2017, a sua Resposta.
23 - Na referida Resposta, a AT entende que as alegações da Requerente não podem, de todo, proceder, porquanto fazem uma interpretação e aplicação das normas legais aplicáveis ao caso, notoriamente erradas, na medida em que:
24 - Revelam um entendimento que incorre, não só numa leitura enviesada da letra da lei, mas também numa interpretação que não atende ao elemento sistemático, violando a unidade do regime consagrado em todo o CIUC e, mais amplamente, em todo o sistema jurídico-fiscal, decorrendo ainda de uma interpretação que ignora a ratio do regime consagrado no CIUC. (cfr. art.º 19.º da Resposta)
25 - Refere que o legislador tributário ao estabelecer no art.º 3.º, n.º 1 do CIUC quem são os sujeitos passivos do IUC estabeleceu, expressa e intencionalmente, que estes são os proprietários (ou nas situações previstas no n.º 2, as pessoas aí enunciadas), considerando-se como tais as pessoas em nome das quais os mesmos se encontrem registados. (cfr. art.º 23.º da Resposta)
26 - Salienta que o legislador não usou a expressão “presume-se” como poderia ter feito, por exemplo, nos seguintes termos: “são sujeitos passivos do imposto os proprietários dos veículos, presumindo-se como tais as pessoas singulares ou colectivas, de direito público ou privado, em nome das quais os mesmos se encontrem registados”. (cfr. art.º 24.º da Resposta)
27 - Considera que a redacção do art.º 3.º do CIUC corresponde a uma opção clara de política legislativa acolhida pelo legislador e não comporta qualquer presunção legal, pelo que entender que aí se consagra uma presunção seria inequivocamente efectuar uma interpretação contra legem. (cfr. art.ºs 33.º, 34.º e 35.º da Resposta)
28 - Refere que o mencionado entendimento já foi adoptado pela Jurisprudência dos nossos tribunais, transcrevendo, para tanto, parte da sentença do tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, proferida no Processo nº 210/13.OBEPNF. (cfr. art.ºs 36.º e 37.º da Resposta)
29 - Sobre o elemento sistemático de interpretação, considera que a solução propugnada pela Requerente é intolerável, não encontrando o entendimento por esta sufragado qualquer apoio legal. (cfr. art.º 46.º da Resposta)
30 - Sobre a “ratio” do regime, entende que, à luz de uma interpretação teleológica do regime consagrada em todo o Código do IUC, a interpretação propugnada pela Requerente, no sentido de que o sujeito passivo do IUC é o proprietário efectivo independentemente de não figurar no registo automóvel o registo dessa qualidade, é manifestamente errada, na medida em que é a própria ratio do regime consagrado no CIUC que constitui prova clara de que aquilo que o legislador fiscal pretendeu foi criar um imposto assente na tributação do proprietário do veículo, tal como consta do registo automóvel. (cfr. art.ºs 69.º e 70.º da Resposta)
31 - Acrescenta que o CIUC procedeu a uma reforma do regime de tributação dos veículos em Portugal, alterando de forma substancial o regime de tributação automóvel, passando os sujeitos passivos do imposto a ser os proprietários constantes do registo de propriedade, independentemente da circulação dos veículos na via pública. (cfr. art.º 72.º da Resposta)
32 - Neste sentido, refere ser este o entendimento inscrito, nomeadamente, na recomendação n.º 6-B/2012 de 22-06-2012, do Senhor Provedor de Justiça dirigida ao Secretário de Estado das Obras Públicas, dos Transportes e das Comunicações.
33 - Entende que em matéria de locação financeira, e para efeitos do art.º 3.º do CIUC, é forçoso, que os locadores financeiros, como é o caso da Requerente, cumpram a obrigação estabelecida no art.º 19.º do referido Código, para que se possam exonerar da obrigação de pagamento do imposto, pelo que, não tendo sido cumprida tal obrigação, forçoso é concluir que a Requerente é sujeito passivo do imposto.
34 - Acrescenta que a interpretação veiculada pela Requerente mostra-se, também, desconforme com a Constituição na medida em que tal interpretação se traduz na violação do princípio da confiança, do princípio da segurança jurídica, do princípio da eficiência do sistema tributário e do princípio da proporcionalidade. (cfr. art.ºs 98.º, 99.º e 100.º da Resposta)
35 - Por fim, refere não ter sido a Requerida quem deu azo à dedução do pedido de pronúncia arbitral, mas sim a Requerente, devendo, consequentemente, ser a Requerente condenada nas custas arbitrais “nos termos do art.º 527.º/1 do Novo Código de Processo Civil ex vi do art.º 29.º/1-e) do RJAT”.
36 - Considera, a terminar, que, face a toda a argumentação exposta, o pedido de pronúncia arbitral deve ser julgado improcedente, mantendo-se na ordem jurídica os actos tributários de liquidação impugnados, que não foram revogados, absolvendo-se, em conformidade, a entidade Requerida do pedido.
E - QUESTÕES DECIDENDAS
37- Cumpre, pois, apreciar e decidir.
38 - Face ao exposto, relativamente às posições das Partes e aos argumentos apresentados, as questões a decidir são, particularmente, as de saber:
a) - Se a norma de incidência subjectiva constante do artigo 3.º, n.º 1, do CIUC, estabelece ou não uma presunção.
b) - Qual o valor jurídico do registo automóvel na economia do CIUC, particularmente para efeitos da incidência subjectiva deste imposto.
c) - Se, na data da exigibilidade do imposto, vigorar um contrato de locação financeira que tem por objecto um veículo automóvel, o sujeito passivo do IUC, para efeitos do disposto no artigo 3.º, n.ºs 1 e 2 do CIUC, é o locatário ou a entidade locadora, proprietária do veículo, em nome da qual o direito de propriedade se encontra registado.
d) - Se os documentos apresentados referentes à locação financeira, relativamente aos veículos identificados no processo, são aptos a fazer prova dos respectivos contratos.
F - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
39 - O Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído e é materialmente competente, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro.
40 - As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se legalmente representadas (cfr. art.º 4.º e n.º 2 do art.º 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011 e art.º 1.º da Portaria n.º 112/2011, de 22 de Março).
41 - O processo não enferma de vícios que o invalidem.
42 - Tendo em conta o processo administrativo tributário, cuja cópia foi junta aos autos pela AT, e a prova documental integrante do processo, cumpre agora apresentar a matéria factual relevante para a compreensão da decisão, tal como se fixa nos termos abaixo mencionados.
II - FUNDAMENTAÇÃO
G - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
43 - Em matéria de facto relevante, dá o presente tribunal por assente os seguintes factos:
44 - A Requerente é uma instituição financeira de crédito, tendo no financiamento do sector automóvel, uma das suas áreas de actividade mais relevantes, celebrando, nesse quadro, entre outros, contratos de locação financeira.
45 - Os dezasseis veículos identificados nos autos foram dados em locação financeira a clientes da Requerente, cuja identificação consta do processo.
46 - A Requerente foi notificada para proceder ao pagamento do IUC respeitante aos actos de liquidação identificados em documento junto ao pedido de pronúncia arbitral, relativamente a dezasseis veículos, igualmente identificados no processo.
47 - A AT teve conhecimento de que os mencionados veículos eram objecto de contratos de locação financeira, mas entendeu exigir à Requerente o pagamento do imposto em questão, tendo, relativamente a alguns dos actos de liquidação desse imposto, revelado a intenção de proceder à sua revogação.
48 - A Requerente, embora não assumindo a qualidade de sujeito passivo do imposto, procedeu ao seu pagamento, no valor global de € 3.229,27, relativamente às dezasseis liquidações referenciadas nos autos, respeitantes aos dezasseis veículos, igualmente, identificados no processo.
49 - Relativamente a qualquer dos veículos em causa no processo, estava em vigor um contrato de locação financeira no momento em que se tornou exigível o correspondente IUC.
50 - Nas datas relativas à exigibilidade do IUC, a que se reportam as liquidações identificadas nos autos, respeitantes ao ano de 2015 e 2016, os dezasseis veículos identificados nos autos, estavam sob vigência de contratos de locação financeira.
FUNDAMENTAÇÃO DOS FACTOS PROVADOS
51 - Os factos dados como provados estão baseados nos documentos mencionados, relativamente a cada um deles, na medida em que a sua adesão à realidade não foi questionada.
FACTOS NÃO PROVADOS
52 - Não existem factos dados como não provados, dado que todos os factos tidos como relevantes para a apreciação do pedido foram provados.
H - FUDAMENTAÇÃO DE DIREITO
53 - A matéria de facto está fixada, importando agora proceder à sua subsunção jurídica e determinar o Direito aplicável aos factos subjacentes, de acordo com as questões decidendas enunciadas no n.º 38.
54 - A primeira questão, relativamente à qual existem entendimentos absolutamente opostos entre a Requerente e a AT traduz-se em saber se a norma de incidência subjectiva constante do n.º 1 do art.º 3.º do CIUC estabelece ou não uma presunção ilidível.
55 - As posições das partes são conhecidas. Com efeito, para a Requerente, o disposto no n.º 1 do art.º 3.º do CIUC configura uma presunção legal ilidível, na medida em que o proprietário do veículo automóvel é tido como sendo o sujeito passivo do IUC, por se pressupor ser ele o indivíduo que o usa e detém o seu usufruto, considerando também que, nos termos do disposto no n.º 2 do referido artigo, cabe aos locatários o gozo exclusivo do veículo automóvel, cabendo-lhes também a obrigação de pagar o respectivo imposto.
56 - A Requerida, por seu lado, entende que o legislador tributário, ao estabelecer no art.º 3.º, n.º 1 do CIUC quem são os sujeitos passivos do IUC, determinou, expressa e intencionalmente, que estes são os proprietários (ou nas situações previstas no n.º 2, as pessoas aí enunciadas), considerando-se, como tais, as pessoas em nome das quais os mesmos se encontrem registados.
I - INTERPRETAÇÃO DA NORMA DE INCIDÊNCIA SUBJECTIVA CONSTANTE DO N.º 1 DO ARTIGO 3.º DO CIUC
57 - Sobre esta questão, ou seja, a de saber se a norma de incidência subjectiva constante do n.º 1, do art.º 3.º do CIUC, consagra uma presunção, deve notar-se que a jurisprudência firmada no CAAD aponta no sentido de que a dita norma consagra uma presunção legal ilidível. Com efeito, desde as primeiras Decisões, proferidas sobre esta matéria, no ano de 2013, entre as quais se podem, nomeadamente, referir as proferidas no quadro dos Processos n.ºs 14/2013-T, 26/2013-T e 27/2013-T, até às mais recentes de que se podem indicar as Decisões proferidas no âmbito dos Processos n.º 69/2015-T, n.º 191/2015-T e n.º 202/2015 - T, passando por inúmeras Decisões proferidas no ano de 2014, de que se mencionam, a título de mero exemplo, as Decisões proferidas nos Processos n.ºs 34/2014-T, 120/2014-T e 456/2014 - T, todas apontam para o entendimento de que o n.º 1, do art.º 3.º do CIUC consagra uma presunção legal ilidível.
A este propósito, deve também referir-se a recente Decisão do Tribunal Tributário de Lisboa, proferida, em 23-01-2017, no Proc. N.º 463/13.4BELRS, onde se considera que a “[…] impugnante logrou ilidir a presunção estabelecida no art.º 3.º, n.º 1 do CIUC.”
Deve ainda considerar-se o entendimento inscrito no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido em 19-03-2015, Processo 08300/14, disponível em: www.dgsi.pt, que secunda a referida jurisprudência, quando nele vem expressamente referido que o art.º 3.º, n.º 1 do CIUC “[…] consagra uma presunção legal de que o titular do registo automóvel é o seu proprietário, sendo que tal presunção é ilidível por força do art.º 73.º da LGT”.
Trata-se de um entendimento em que, de todo, nos louvamos e que se dá, sem mais, como válido e aplicável no presente caso, não se considerando, por conseguinte, necessário outros desenvolvimentos, face à abundante fundamentação vertida nas mencionadas Decisões e no referido Acórdão.
58 - Sendo este o entendimento que, no referente ao art.º 3.º, n.º 1 do CIUC, é, de todo, perfilhado por este tribunal, importa, todavia, ainda assinalar a falta de razão que assiste à Requerida, quando, nos artigos 98.º e 100.º da sua Resposta, alega que a interpretação que vai no sentido de entender estar consagrada uma presunção legal ilidível no n.º 1, do art.º 3.º do CIUC viola os princípios constitucionais da confiança e da segurança jurídica, da eficiência do sistema tributário e da proporcionalidade.
Apreciemos, então, essa questão.
Vejamos,
- Sobre o princípio da proporcionalidade cabe, antes de mais, salientar que o mesmo, na medida em que é materialmente inerente ao regime dos direitos liberdades e garantias, inscrevendo-se na sua defesa, visa, no essencial, disciplinar a actuação da Administração Pública em ordem a que a sua actividade, no relacionamento com os particulares, seja pautada pela escolha das medidas mais equilibradamente adequadas à prossecução do interesse público.
Como ensina o Prof. Freitas do Amaral, in Curso de Direito Administrativo, Vol II, Almedina, 2002, pp. 127/128 e segs, o “princípio da proporcionalidade constitui uma manifestação constitutiva do princípio do Estado de Direito”, estando “[…] fortemente ancorada a ideia de que, num Estado de Direito democrático, as medidas dos poderes públicos não devem exceder o estritamente necessário para a realização do interesse público”.
O princípio da proporcionalidade, acrescenta o referido Professor, ibidem, p.129, significa que “[…] a limitação de bens ou interesses privados por actos dos poderes públicos deve ser adequada e necessária aos fins concretos que tais actos prosseguem, bem como tolerável quando confrontada com aqueles fins”.
A propósito do princípio da proporcionalidade cabe, também, notar, o que nos dizem J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, in CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA, ANOTADA, VOLUME I, 4.ª Edição, 2007, Coimbra Editora, pp. 392/393, quando consideram que o referido princípio é desdobrável em três subprincípios, quais sejam: “[…] a) princípio da adequação (também designado por princípio da idoneidade); b) princípio da exigibilidade (também chamado princípio da necessidade ou da indispensabilidade); c) princípio da proporcionalidade em sentido restrito, que significa que os meios legais restritivos e os fins obtidos devem situar-se numa “justa medida”, impedindo-se a adopção de medidas legais restritas desproporcionadas, excessivas, em relação aos fins obtidos […]”.
Os referidos subprincípios têm, todos eles, um denominador comum, qual seja o do justo equilíbrio e permanente coerência entre as finalidades da lei e os meios adoptados para atingir tais finalidades, o que, na circunstância e tentando a transposição do dito princípio para o caso dos autos, implicará responder à questão de saber qual a interpretação adequada do n.º 1 do art.º 3.º, tendo em vista a prossecução dos fins legais previstos no art.º 1.º do CIUC, que se traduzem na oneração fiscal dos efectivos proprietários dos veículos automóveis (e não, necessariamente, dos constantes do registo) na medida do custo ambiental e viário que provoquem.
Como refere o Prof. J. J. Gomes Canotilho in Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Almedina - Coimbra, 1998, pp. 264 e segs, o campo de aplicação mais importante do princípio da proporcionalidade ou da proibição do excesso, que tem assento constitucional nos art.ºs 18.º, n.º 2 e 266.º, n.º 2 da CRP, “[…] é o da restrição dos direitos, liberdades e garantias por actos dos poderes públicos. No entanto, o domínio lógico de aplicação do princípio da proporcionalidade, estende-se aos conflitos de bens jurídicos de qualquer espécie.” A administração, acrescenta o referido autor, idem, “[…] deve observar sempre, em cada caso concreto, as exigências da proibição do excesso […]”.
Neste mesmo sentido aponta a jurisprudência, designadamente o acórdão do STA de 01-07-1997, Processo n.º 041177, disponível em: www.dgsi.pt, quando considera que o princípio da proporcionalidade em sentido amplo, compreende a congruência, a adequação ou a idoneidade do meio ou da medida para lograr o fim legalmente proposto e, em sentido estrito, engloba a proibição do excesso.
O princípio da proporcionalidade é um corolário do princípio da justiça, o qual significa e implica que na sua actuação a Administração Pública deve harmonizar o interesse público específico que lhe cabe prosseguir com os direitos e interesses legítimos dos particulares eventualmente afectados pelos seus actos, interesses e direitos estes que, no caso em apreço, se reconduzem à não tributação em IUC das pessoas que já não são proprietários dos veículos e que, consequentemente, em nada contribuem para a efectivação de qualquer custo viário e ambiental.
O que importa é balancear as finalidades legais e os meios para as prosseguir, e, no quadro de um juízo de ponderação, identificar os meios mais adequados para esse efeito, que, no caso, se traduzem na interpretação perfilhada pelo tribunal arbitral.
Dir-se-á, aliás, que o entendimento de que o referido n.º 1 do at.º 3.º do CIUC estabelece uma presunção legal ilidível corresponde à única interpretação que coerentemente se compagina com o dito princípio da equivalência, e que se mostra em linha com os princípios da justiça e da proporcionalidade.
A interpretação que entende estar consagrada uma presunção legal ilidível no n.º 1, do art.º 3.º do CIUC é, pois, a única que permite assegurar a prossecução dos fins visados pela lei - onerar os proprietários dos veículos automóveis na medida do custo ambiental e viário que provocam, - tal como estatuído no art.º 1.º do CIUC, o que significa que os sujeitos passivos do IUC são, presumivelmente, as pessoas em nome das quais os veículos se encontrem registados, ou seja, os referidos sujeitos passivos são, em princípio, e apenas em princípio, as pessoas em nome de quem tais veículos estejam registados, não havendo, pois, outra interpretação capaz de alcançar as referidas finalidades legais, só assim, reafirma-se, se mostram cumpridos os referidos princípios da proporcionalidade e da justiça.
O entendimento contrário, ou seja, o considerado pela AT, que interpreta o n.º 1, do art.º 3.º do CIUC como não consagrando uma presunção legal ilidível, entendendo que os sujeitos passivos do IUC são, em definitivo, as pessoas em nome das quais os veículos se encontrem registados, na justa medida em que conduz à imposição de um encargo fiscal a quem poderá já não ser o proprietário do veículo em causa e que, deste modo, não polui, afastando da sujeição fiscal quem, na realidade, é o efectivo causador dos danos ambientais e viários decorrentes da utilização dos veículos de que são os reais proprietários, evidencia que as finalidades legalmente prescritas não seriam, de todo, alcançadas, não se respeitando, assim, o princípio da equivalência que, no quadro do CIUC, tem uma função absolutamente estruturante. Tal entendimento, esse sim, não se mostra, nestas circunstâncias, em sintonia com o princípio da proporcionalidade.
A interpretação que aqui se perfilha tem, absolutamente, em conta o princípio da proporcionalidade, quando, ao arrepio do entendido pela Requerida, considera que o registo definitivo não surte eficácia constitutiva por se destinar a dar publicidade ao acto registado, funcionando apenas como mera presunção ilidível da existência do direito e quando, em homenagem àquele princípio, atende ao princípio da equivalência, enquanto elemento fundamental do CIUC.
- Quanto à eficiência do sistema tributário, dir-se-á que a eficiência da Administração em geral, ou da AT em particular, em sentido corrente, corresponderá à capacidade/metodologia de trabalho orientada para a optimização do trabalho executado ou dos serviços prestados, o que significa produzir o máximo, em quantidade e qualidade, com o mínimo de custos e meios, nada tendo a ver com a observância de princípios legalmente consagrados e com o respeito pelos direitos dos cidadãos, seja na qualidade de contribuintes ou não.
Em sentido técnico, dir-se-á que o princípio da eficiência do sistema tributário, é, comummente tido, no domínio do procedimento tributário, como corolário do princípio da proporcionalidade, o qual como é sabido, impõe uma adequada proporção entre as finalidades legais e os meios escolhidos para alcançar esses fins, ou, como referem Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, in Lei Geral Tributária, Anotada e Comentada, 4.ª Edição 2012, Encontro de Escrita, Lda, Lisboa, p. 488, nas anotações ao artigo 55.º da LGT, trata-se de um princípio que obriga “[…] a administração tributária a abster-se da imposição aos contribuintes de obrigações que sejam desnecessárias à satisfação dos fins que aquela visa prosseguir”.
Neste quadro, o referido princípio da eficiência do sistema tributário significará a capacidade de alcançar os objectivos legalmente fixados com o mínimo de meios, o que nada terá também a ver com o respeito pelos direitos dos cidadãos, nem com a necessidade de observância de outros princípios a que a administração tributária deve subordinar a sua actividade, designadamente o do inquisitório e o da descoberta da verdade material, não podendo, obviamente, a aplicação do mencionado princípio da eficiência ser feita, quer com prejuízo dos direitos dos cidadãos, quer pela ausência de observação das finalidades legais. [1]
- Quanto ao princípio da segurança jurídica e da confiança deve notar-se, antes de mais, que este último princípio, o da confiança, é uma concretização do princípio da boa-fé, o qual, tendo consagração no nosso ordenamento jurídico, desde 1996, veio a ter expressa inscrição constitucional, como consta do n.º 2 do art.º 266.º da CRP, onde se estabelece que “Os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei e devem actuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé”. (sublinhado nosso)
A propósito da boa-fé cabe notar o que refere o Prof. Freitas do Amaral, quando, in Curso de Direito Administrativo, Vol. II, Almedina, 2002, pp. 135/136, citando o Prof. V. Fausto de Quadros, nos diz que “[…] a Administração Pública está obrigada a obedecer à bona fide nas relações com os particulares. Mais: ela deve mesmo dar, também aí, o exemplo aos particulares da observância da boa fé, em todas as suas manifestações, como núcleo essencial do seu comportamento ético. Sem isso, nunca de poderá afirmar que o Estado (e com ele outras entidades públicas) é pessoa de bem”.
Por outro lado, o princípio da confiança é também tido como uma decorrência do princípio da segurança jurídica, indissociável do Estado de Direito, que tendo de garantir um mínimo de certeza nos direitos das pessoas e nas expectativas jurídicas que lhes forem criadas, é geradora de confiança dos cidadãos na tutela jurídica da Administração Pública.
Relativamente aos princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança, diz-nos o Prof. J. J. Gomes Canotilho in Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Almedina - Coimbra, 1998, p. 250 e segs, que os referidos princípios andam estreitamente associados, considerando-se que “[…] a segurança jurídica está conexionada com elementos objectivos da ordem jurídica - garantia de estabilidade jurídica, segurança de orientação e realização do direito - enquanto a protecção da confiança se prende mais com as componentes subjectivas da segurança, designadamente a calculabilidade e previsibilidade dos indivíduos em relação aos efeitos jurídicos dos actos dos poderes públicos”. Em qualquer caso, acrescenta o referido Professor, idem, que o “[…] princípio geral da segurança jurídica em sentido amplo (abrangendo, pois, a ideia de protecção da confiança) pode formular-se do seguinte modo: o indivíduo tem do direito poder confiar em que aos seus actos ou às decisões públicas incidentes sobre os seus direitos, posições ou relações jurídicas alicerçadas em normas jurídicas vigentes e válidas se ligam os efeitos jurídicos previstos e prescritos por essas mesmas normas”.
Decorre desta doutrina, que as pessoas ao alienarem os seus veículos hão-de estar seguras de que, caso procedam à venda dos veículos de que são proprietários, e não sendo os mesmos registados em nome dos adquirentes, os efeitos jurídicos daí resultantes serão os previstos e decorrentes das normas legais em vigor e da sua adequada interpretação face às finalidades legais dessas mesmas normas, o que, in casu, leva a que o tribunal arbitral considere a existência de uma presunção ilidível consagrada no n.º 1 do art.º 3.º do CIUC e que só as pessoas que provocam custos viários e ambientais devam ser tributadas.
A melhor forma de, no caso dos autos, se garantir a segurança jurídica, em sentido amplo, é, assim, a concretizada por via da interpretação feita pelo tribunal arbitral, quando considera estar consagrada no n.º 1 do art.º 3.º do CIUC, uma presunção legal ilidível, permitindo a qualquer cidadão, que proceda à venda, a uma terceira pessoa, de um veículo automóvel, a possibilidade de demonstrar que, aquando da exigibilidade do IUC, já não era seu proprietário nem responsável pelo pagamento desse imposto.
- Para além do que atrás fica referido, importará ainda saber se a interpretação perfilhada pelo tribunal arbitral, para além de não conflituar com qualquer dos referenciados princípios, se inscreve directa e substantivamente no contexto da ordem constitucional.
A propósito da interpretação da lei em face da Constituição, ou da interpretação conforme à Constituição, diz-nos o Prof. Jorge Miranda, in Manual de Direito Constitucional, TOMO II, Introdução À Teoria da Constituição, 2.ª edição, Coimbra Editora, 1987, p. 232 e segs, que do que se trata, antes de mais, é de “[…] levar em conta, dentro do elemento sistemático da interpretação, aquilo que se reporta à Constituição. Com efeito, cada disposição legal não tem somente de ser captada no conjunto das disposições da mesma lei e cada lei no conjunto da ordem legislativa; tem outrossim de se considerar no contexto da ordem constitucional [..]”. (sublinhado nosso)
O entendimento que considera estar consagrada no n.º 1 do art.º 3.º do CIUC uma presunção legal ilidível suporta-se em diversos elementos de interpretação, entre os quais cabe referir o elemento sistemático, na medida em que a interpretação conforme à Constituição implica que dentro do elemento sistemático da interpretação, se leve em conta aquilo que se reporta à Constituição.
Sobre o mencionado elemento sistemático cabe referir o seguinte:
a) No entendimento de BAPTISTA MACHADO, in Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, p. 183, o elemento sistemático “[…] compreende a consideração das outras disposições que formam o complexo normativo do instituto em que se integra a norma interpretanda, isto é, que regulam a mesma matéria (contexto da lei), assim como a consideração de disposições legais que regulam problemas normativos paralelos ou institutos afins (lugares paralelos). Compreende ainda o lugar sistemático que compete à norma interpretanda no ordenamento global, assim como a sua consonância com o espírito ou unidade intrínseca de todo o ordenamento jurídico”.
b) É sabido que um princípio jurídico, no caso o princípio da equivalência, não existe isoladamente, antes está ligado por um nexo íntimo com outros princípios que integram, ao nível mais global, o respectivo ordenamento jurídico, no caso, com os demais princípios corporizados no sistema inscrito no CIUC, e com outros princípios constitucionalmente consagrados. Nesse sentido, cada artigo de um dado diploma legal, no caso o CIUC, só será compreensível se o situarmos, quer perante os demais artigos que o seguem ou antecedem, quer perante a ordem constitucional.
c) No que à sistematização do CIUC diz respeito, as preocupações de ordem ambiental foram determinantes para que o mencionado princípio da equivalência fosse, desde logo, inscrito no primeiro artigo do referido Código, o que, necessariamente conduz a que os artigos subsequentes, na medida em que têm assentamento em tal princípio, sejam por ele influenciados. Foi o que ocorreu, designadamente, com a base tributável, que passou a ser constituída por diversos elementos, particularmente pelos respeitantes aos níveis de poluição, e com as taxas do imposto, estabelecidas nos artigos 9.º a 15.º, que foram influenciadas pela componente ambiental, e, naturalmente, também com a própria incidência subjectiva, prevista no artigo 3.º do CIUC, que não poderá furtar-se à influência referida.
d) O referido princípio da equivalência, como assinala Sérgio Vasques, in Os Impostos Especiais de Consumo, Almedina, 2001, p. 122 e segs, implica que “[…] o imposto deve corresponder ao benefício que o contribuinte retira da actividade pública; ou ao custo que o contribuinte imputa à colectividade pela sua própria actividade”. Acrescenta o referido autor, idem, que “Assim, um imposto sobre os automóveis assente numa regra de equivalência será igual apenas se aqueles que provoquem o mesmo desgaste viário e o mesmo custo ambiental paguem o mesmo imposto; e aqueles que provoquem desgaste e custo ambiental diverso, paguem imposto diverso também.” Por isso, como também refere o citado autor, idem, a concretização do princípio da equivalência dita especiais exigências “[…] no tocante à incidência subjectiva do imposto [..].”
O mencionado princípio que informa o actual Imposto Único de Circulação, inscreve-se nas preocupações ambientais estatuídas no n.º 2, alínea a) do art.º 66.º da CRP e na necessidade de, - tendo em vista assegurar o direito ao ambiente, no quadro de um desenvolvimento sustentável, - se “Prevenir e controlar a poluição e os seus efeitos e as formas prejudiciais de erosão”, preocupações estas, que são, manifestamente, consideradas na interpretação acolhida por este tribunal arbitral.
Por outro lado, o disposto na alínea h) do n.º 2 do art.º 66.º da Constituição, quando estatuí que, no quadro de um desenvolvimento sustentável, incumbe ao Estado “assegurar que a política fiscal compatibilize desenvolvimento com protecção do ambiente e qualidade de vida”, comporta, como corolário, o princípio do poluidor - pagador, que concretiza a ideia, nele inscrita, de que quem polui deve, por isso, pagar, estando, assim, a interpretação que aqui se defende em perfeita concordância com a ordem constitucional.
e) Cabe ainda deixar uma breve nota, apenas para suscitar a questão de saber por que razão as regras constantes do art.º 9.º do Código Civil obrigam o intérprete da legislação ordinária, quando é certo que o dito Código não ocupa qualquer lugar proeminente no sistema jurídico.
A esta questão responde o Prof. Jorge Miranda, ibidem, p. 230, quando considera que a “[…] conclusão para a qual se propende é que regras como estas são válidas e eficazes, não por constarem do Código Civil - pois este não ocupa nenhum lugar proeminente no sistema jurídico - mas, directamente, enquanto tais, por traduzirem uma vontade legislativa, não contrariada por nenhumas outras disposições, a respeito do problema da interpretação (que não são apenas técnico-jurídicos) de que curam.”
Acrescenta o referido autor, idem, que “regras sobre estas matérias podem considerar-se substancialmente constitucionais e não repugnaria mesmo vê-las alçadas à Constituição em sentido formal.”
A propósito da problemática da interpretação e das suas regras, como se retira do Prof. José de Oliveira Ascensão, in O Direito, Introdução e Teoria Geral, 2.ª edição, Fundação Calouste Gulbenkian, 1980, pp. 352/353, deve sublinhar-se o carácter imperativo dessas regras, e a sua natureza vinculativa para o intérprete.
A interpretação que este tribunal arbitral faz do n.º 1 do art.º 3.º do CIUC e os critérios que, para esse efeito, considerou, desde o elemento literal, até ao elemento sistemático, passando pelo elemento histórico e racional (ou teleológico), não colidem, assim, com quaisquer princípios constitucionais.
O n.º 1 do art.º 9.º do CC dispõe que a procura do pensamento legislativo deverá ter “[…] sobretudo em conta […] a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada”, circunstâncias e condições essas, que, hoje mais do que nunca, são de sensibilidade pelo ambiente e de respeito pelas questões com ele relacionadas, e que se mostram inscritas no ordenamento constitucional.
Assim, face ao que se deixa referido, não parece, salvo o devido respeito, assistir razão à AT, na medida em que a interpretação aqui considerada, como sendo a única capaz de respeitar as finalidades legais, não viola qualquer dos princípios em questão, ou seja, os princípios da confiança e da segurança jurídica, da eficiência do sistema tributário e da proporcionalidade, sendo que, por outro lado, tal interpretação está expressa e substantivamente conforme aos princípios inscritos na Constituição.
Nestas circunstâncias, não se vislumbra que a interpretação feita por este tribunal arbitral, sobre o n.º 1 do art.º 3.º do CIUC, contenda com quaisquer normas ou princípios constitucionais em vigor.
J - DO VALOR DO REGISTO
59 - Estabelece o n.º 1 do art.º 1.º do DL n.º 54/75, de 12 de Fevereiro, relativo ao registo de veículos automóveis, que “O registo de veículos tem essencialmente por fim dar publicidade à situação jurídica dos veículos a motor e respectivos reboques, tendo em vista a segurança do comércio jurídico”. (sublinhado nosso)
60 - Ficando claro, face à referida norma, qual a finalidade do registo, não há, porém, clareza, no âmbito do referido Decreto-lei, sobre o valor jurídico desse registo, importando considerar o artigo 29.º do mencionado diploma legal, relativo ao registo de propriedade automóvel, quando aí se dispõe que “São aplicáveis, com as necessárias adaptações, ao registo de automóveis as disposições relativas ao registo predial, […]”. (sublinhado nosso)
61 - Neste quadro, para que se possa alcançar o valor jurídico do registo de propriedade automóvel, importa ter em conta o que se estabelece no Código do Registo Predial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 224/84, de 06 de Julho, quando dispõe no seu artigo 7.º que “o registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito nos precisos termos em que o registo o define”. (sublinhado nosso)
62 - A conjugação do disposto nos artigos atrás mencionados, ou seja, no n.º 1 do art.º 1.º do DL n.º 54/75, de 12 de Fevereiro e no art.º 7.º do Código do Registo Predial, permite considerar, por um lado, que a função fundamental do registo é a de dar publicidade à situação jurídica dos veículos, permitindo, por outro lado, presumir que o direito existe e que tal direito pertence ao titular a favor de quem o mesmo está registado, nos precisos termos em que está definido no registo.
63 - Assim, o registo definitivo mais não constitui do que a presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos exactos termos do registo, mas presunção ilidível, admitindo-se, por isso, contraprova, como decorre da lei e a jurisprudência vem assinalando, podendo, a este propósito, verem-se, entre outros, os Acórdãos do STJ nºs 03B4369 e 07B4528, respectivamente, de 19/02/2004 e 29/01/2008, disponíveis em: www.dgsi.pt.
64 - A função legalmente reservada ao registo é, assim, por um lado, a de publicitar a situação jurídica dos bens, no caso, dos veículos e, por outro, permitir-nos presumir que existe o direito sobre esses veículos e que o mesmo pertence ao titular, como tal inscrito no registo, o que significa que o registo não tem uma natureza constitutiva do direito de propriedade, mas apenas declarativa, sendo que tais presunções são ilidíveis, seja por força do estabelecido no n.º 2 do art.º 350.º do CC, seja à luz do disposto no art.º 73.º da LGT. Daí que, a partir do momento em que se afastem as presunções em causa, mediante adequada prova, a AT não poderá persistir em considerar como sujeito passivo do IUC a pessoa em nome de quem o veículo continua registado.
L - DO SUJEITO PASSIVO DO IUC NA VIGÊNCIA DO CONTRATO DE LOCAÇÃO FINANCEIRA
65 - Importa, antes de mais, notar que o Regime Jurídico do Contrato de Locação Financeira, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 149/95, de 24 de Junho, com a última alteração introduzida pelo Decreto-Lei n.º 30/2008, de 25 de Janeiro, dispõe no seu art.º 9.º que são obrigações do locador, designadamente, as de conceder o gozo do bem para os fins a que se destina e o de vender o bem ao locatário, caso este queira, findo o contrato, conforme, respectivamente, as alíneas b) e c) do seu n.º 1.
66 - Por outro lado, face ao estabelecido no art.º 10 º do referido diploma legal, nomeadamente nas alíneas a) dos seus n.ºs 1 e 2, ficamos a saber que são obrigações do locatário pagar as rendas e usar e fruir o bem locado, o que significa que, na vigência de um contrato de locação financeira que tenha por objecto um veículo automóvel, só o locatário tem o seu gozo exclusivo.
67 - As obrigações do locatário, à luz das referidas normas, apontam, claramente, no sentido de que é esse sujeito contratual que tem o exclusivo gozo do veículo objecto do contrato de locação financeira, sendo ele que o usa como se fora o verdadeiro proprietário desse bem.
68 - A interpretação do n.º 1, do art.º 3.º do CIUC, face a tudo o que, a este propósito, atrás se deixou dito, tendo em conta, particularmente, a relevância legalmente conferida ao princípio da equivalência, não comporta a tributação, em IUC, do locador que, enquanto proprietário formal do veículo, não tem, consequentemente, qualquer potencial poluidor, o que significa que os danos advenientes para a comunidade, decorrentes da utilização dos veículos automóveis devem ser assumidos pelos seus reais utilizadores, como custos que só eles deverão suportar. O locatário, esse sim, tem o pleno uso e fruição do veículo, conforme legalmente estabelecido, sendo o seu verdadeiro utilizador e efectivo gerador dos danos ambientais, devendo, assim, responder pelo correspondente imposto, sendo este o entendimento que, face à ratio legis do CIUC, se deve colher do disposto no n.º 2 do art.º 3.º desse mesmo Código.
69 - Assim, a interpretação do n.º 2 do art.º 3.º do CIUC só permitirá perspectivar o locatário como o responsável pelo pagamento do IUC, importando, a este propósito notar o disposto no art.º 19.º do CIUC, quando, justamente, para efeitos do disposto no art.º 3.º do referido Código, ou seja, para efeitos da incidência subjectiva, vem impor às entidades que procedem à locação financeira a obrigação de fornecer à AT os dados relativos à identificação fiscal dos utilizadores dos veículos locados, o que revela, nomeadamente, que, para efeitos da referida incidência, se pretendeu conhecer quem eram, a final, os reais utilizadores dos veículos locados, para que fossem eles, e não outros, a suportar o imposto único de circulação, o que, aliás, se revela em total sintonia com o princípio da equivalência, enquanto princípio estruturante do CIUC.
70 - Face ao que vem de referir-se, é nosso entendimento que, se vigorar um contrato de locação financeira, na data da exigibilidade do imposto, que tenha como objecto um veículo automóvel, o sujeito passivo desse imposto não é, à luz do disposto no n.º 2 do art.º 3.º do CIUC, o locador mas sim locatário, dado ser este que tem o gozo do veículo e, como tal, o intrínseco potencial poluidor, independentemente do registo do direito de propriedade se manter em nome do locador.
71- Sobre os actos de liquidação em causa nos autos, deve notar-se a possibilidade legal cometida à Requerida de proceder à sua revogação, quando no n.º 1 do art.º 13.º do RJAT (redação introduzida pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro), se prevê que o dirigente máximo do serviço da administração tributária pode, no prazo de 30 dias, a contar do conhecimento do pedido de constituição do tribunal arbitral, (o que ocorreu em 04-11-2016), proceder à revogação do acto tributário cuja ilegalidade tenha sido suscitada.
72 - Como resulta da documentação junta ao processo, e conforme explicitamente exarado no art.º 5.º da Resposta, a Requerida expressa a intenção de que “vai proceder à revogação” de onze das liquidações em causa nos autos, referentes a onze veículos aí identificados, com as matrículas …-… -…; …-… -…; …-… -…; …-… -…; …-… -…; …-… -…; …-… -…; …-… -…; …-… -…; …-… -… e …-… -… .
73 - Por outro lado, na sequência do despacho proferido pelo tribunal, em 15-03-2017, veio a Requerida, em 22-03-2017, juntar aos autos a Informação n.º 382-APT/2016 da Divisão de Gestão e Assistência Tributária, da Unidade dos Grandes Contribuintes, referenciadora da intenção revogatória de alguns (nove) dos actos de liquidação identificados nos autos, na qual se alude à existência de contratos de locação financeira, relativamente a nove, dos dezasseis registos de liquidação em causa no processo, referentes a nove veículos, com as matrículas …-… -…; …-… -…; …-… -…; …-… -…; …-… -…; …-… -…; …-… -…; …-… -… e …-… -… .
74 - A revogação, nos termos legalmente previstos, de qualquer dos mencionados actos de liquidação não consta do Processo Administrativo que, em 10-03-2017, foi junto aos autos, nem, na sequência do despacho proferido pelo tribunal, em 15-03-2017, destinado a conhecer a referida revogação, foi feita qualquer demonstração de que a mesma tenha, realmente, acontecido.
75 - Não consta dos autos que a Administração Tributária tenha, efectivamente, usado a faculdade que lhe é conferida na mencionada disposição legal, devendo, assim, entender-se que a Requerida não concretizou a revogação dos actos de liquidação, cuja intenção consta dos autos, entendendo-se que os mesmos não foram revogados, mantendo-se na ordem jurídica.
76 - Neste quadro, e tendo em conta que qualquer dos dezasseis contratos de locação financeira, relativos a cada um dos dezasseis veículos identificados nos autos, estava em vigor à data da exigibilidade do IUC, o pagamento do referido imposto cabia aos respectivos locatários, e não ao locador, no caso a Requerente, não sendo, pois, esta o sujeito passivo do dito imposto.
M - DOS MEIOS DE PROVA APRESENTADOS
77 - Os meios de prova apresentados estão corporizados nos dezasseis contratos de locação financeira (cópias), relativos a igual número de veículos, contratos que se encontravam vigentes à data da exigibilidade do IUC, tal como se mostra provado no processo.
78 - Tais contratos são meios idóneos para fazer prova da qualidade dos locatários, para efeitos do disposto no n.º 2 do art.º 3.º do CIUC, ou seja, para efeitos da sua equiparação a proprietários dos veículos e da sua, consequente, vinculação ao pagamento do imposto em causa. Não existem, aliás, quaisquer elementos que permitam entender que os dados inscritos nesses contratos não correspondem à verdade contratual, não vendo este Tribunal razões para os pôr em causa, sendo também certo que a lei, no caso, o n.º 1 do art.º 75.º da LGT, atribui a esses documentos uma presunção de veracidade.
79 - Face ao que vem de referir-se, e tendo em conta, quer a presunção estabelecida no n.º 1 do art.º 3.º do CIUC, quer a interpretação do n.º 2 desse mesmo artigo e a responsabilidade dos locatários enquanto sujeitos passivos do imposto, quer o valor jurídico do registo automóvel na economia do CIUC, quer os contratos de locação financeira referentes aos dezasseis veículos identificados nos autos, que se encontravam em vigor nas datas da exigibilidade do correspondente IUC, os actos tributários referentes a estes veículos, não podem merecer o nosso acordo, seja porque não se teve em conta uma adequada interpretação e aplicação das normas legais de incidência subjectiva, o que consubstancia um erro sobre os pressupostos de direito, seja porque os referidos actos assentaram numa matéria de facto, claramente divergente da efectiva realidade, o que consubstancia um erro sobre os pressupostos de facto.
80 - Em suma, dir-se-á, em consonância com o que atrás se deixa exposto, que se consideram ilegais os actos de liquidação referentes aos dezasseis veículos identificados nos autos, na medida em que, na data da exigibilidade do IUC, estavam vigentes contratos de locação financeira, sendo sujeitos passivos do imposto os respectivos locatários, e não a Requerente, face ao disposto no n.º 2 do art.º 3.º do CIUC.
N - REEMBOLSO DO MONTANTE PAGO E JUROS INDEMNIZATÓRIOS
81 - Nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do art.º 24º do RJAT, e em conformidade com o que aí se estabelece, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta - nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários - “Restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito.” (sublinhado nosso)
82 - Trata-se de comandos legais que se encontram em total sintonia com o disposto no art.º 100.º da LGT, aplicável ao caso por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do art.º 29.º do RJAT, no qual se estabelece que “A administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei.” (sublinhado nosso)
83 - O caso constante nos presentes autos, suscita a manifesta aplicação das mencionadas normas, posto que na sequência da ilegalidade dos actos de liquidação, referenciados neste processo, terá, por força dessas normas, de haver lugar ao reembolso dos montantes pagos, quer a título de imposto, quer de juros compensatórios, como forma de se alcançar a reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, montantes esses que no caso dos autos totalizam a quantia de € 3.229,27.
84 - Quanto aos juros indemnizatórios, afigura-se manifesto, que, face ao estabelecido no artigo 61.º do CPPT e preenchidos que estão os requisitos do direito a juros indemnizatórios, ou seja, verificada a existência de erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido, tal como previsto no n.º 1 do art.º 43.º da LGT, a Requerente tem direito a juros indemnizatórios à taxa legal, calculados sobre a quantia de € 3.229,27.
CONCLUSÃO
85 - Conclui-se, assim, que se na data da exigibilidade do imposto vigorar um contrato de locação financeira que tem por objecto um automóvel, para efeitos do disposto no artigo 3.º, n.ºs.1 e 2, do CIUC, sujeito passivo do IUC é o locatário, mesmo que o registo do direito de propriedade do veículo constante da Conservatória do Registo Automóvel se encontre feito em nome da entidade locadora, desde que esta faça prova da existência do referido contrato.
86 - Tendo os actos de liquidação de IUC relativos aos dezasseis veículos, identificados no processo, sido suportados na ideia de que, no quadro de contratos locação financeira em vigor, aquando de exigibilidade do IUC, os sujeitos passivos do imposto são os locadores, face ao estabelecido no artigo 3.º, n.ºs 1 e 2, do CIUC, a AT faz errada interpretação e aplicação das referidas normas legais, cometendo um erro de direito sobre os pressupostos o que constitui violação de lei.
87 - Face a estes erros sobre os pressupostos de facto e de direito em que assentam os referidos actos de liquidação, tem o Pedido de Pronúncia Arbitral subjacente ao presente processo de ser julgado procedente, justificando-se a anulação desses actos de liquidação, com todas as consequências legais.
III - DECISÃO
88 - Destarte, atento a todo o exposto, este Tribunal Arbitral decide:
- Julgar procedente, por provado, com fundamento em vício de violação de lei, o pedido de pronúncia arbitral no que concerne à anulação dos actos de liquidação de IUC, respeitantes aos dezasseis veículos identificados no processo;
- Anular, consequentemente, os actos de liquidação de IUC, referentes ao ano de 2015 e 2016, respeitantes aos veículos, tal como atrás se deixam referenciados;
- Condenar a AT ao reembolso da quantia de € 3.229,27, referente ao IUC e aos juros compensatórios que foram pagos, respeitantes aos anos de 2015 e 2016, e ao pagamento de juros indemnizatórios à taxa legal, contados desde a data do pagamento da referida quantia, até ao integral reembolso da mesma;
- Condenar a AT a pagar as custas do presente processo.
VALOR DO PROCESSO
Em conformidade com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2 do CPC (ex-315.º, nº 2) e 97.º - A, n.º 1 do CPPT e no artigo 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 3.229,27.
CUSTAS
De harmonia com o disposto no artigo 12.º, n.º 2, in fine, no art.º 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e no art.º 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e da Tabela I, que a este está anexa, fixa-se o montante das custas totais em € 612,00.
Notifique-se.
Lisboa, 12 de Abril de 2017
O Árbitro
António Correia Valente
[1] Veja-se o estudo sobre a matéria, elaborado pelo Prof. Carlos Pestana Barros, in Ciência e Técnica Fiscal, 2005, n.º 416, pp. 105-126