Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 422/2016-T
Data da decisão: 2017-03-31  IRC  
Valor do pedido: € 1.311.172,58
Tema: IRC – Gastos. Amortizações. Tributações autónomas
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Decisão Arbitral

 

            Os árbitros Dr. Jorge Manuel Lopes de Sousa (árbitro-presidente, designado pelos outros Árbitros), Dr. José Alberto Pinheiro Pinto e Dr.ª Maria Manuela do Nascimento Roseiro, designados pela Requerente e pela Requerida, respectivamente, para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 31-10-2016, acordam no seguinte:

 

1. Relatório

           

A…, S.A., doravante designada por A… ou Requerente, contribuinte n.º…, com sede no … do …, veio, nos termos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, doravante “RJAT” - Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, requerer a constituição de tribunal arbitral colectivo, com vista à declaração de ilegalidade das liquidações de IRC n.º 2016 … e n.º 2016 …, das demonstrações de acerto de contas n.º 2016 … e n.º 2016 …, e das demonstrações de liquidação de juros n.º 2016 … e n.º 2016 …, relativas aos exercícios de 2012 e 2013.

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.

A Requerente designou como Árbitro o Dr. José Alberto Pinheiro Pinto, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 2, alínea b), do RJAT.

O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 18-08-2016.

Nos termos do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 6.º e do n.º 3 do RJAT, e dentro do prazo previsto no n.º 1 do artigo 13.º do RJAT, o dirigente máximo do serviço da Administração Tributária designou como Árbitro a Dr.ª Maria Manuela do Nascimento Roseiro.

Os Árbitros designados pelas Partes acordaram em designar o Conselheiro Jorge Lopes de Sousa como árbitro presidente, que aceitou a designação.

Nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 7 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do CAAD informou as Partes dessa designação em 24-10-2016.

Assim, em conformidade com o preceituado no n.º 7 artigo 11.º do RJAT, decorrido o prazo previsto no n.º 1 do artigo 13.º do RJAT sem que as Partes nada viessem dizer, o Tribunal Arbitral Colectivo ficou constituído em 31-10-2016.

A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta em que defendeu a improcedência do pedido de pronúncia arbitral.

Em 02-02-2017, realizou-se uma reunião em que foi produzida prova testemunhal e acordado que o processo prosseguisse com alegações escritas.

O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é competente.

            As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

            Não há nulidades ou qualquer obstáculo à apreciação do mérito da causa.

 

 

2. Matéria de facto

 

            2.1. Factos provados

 

            Consideram-se provados os seguintes factos:

 

a)      A Requerente é uma sociedade anónima enquadrada no CAE 51100 -Transportes aéreos de passageiros;

b)      A Requerente está enquadrada no regime geral do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (doravante, “IRC") com contabilidade organizada e no regime normal do Imposto sobre o Valor Acrescentado (doravante, “IVA"), com periodicidade mensal nos exercícios de 2012 e 2013;

c)      A Requerente foi adquirida na totalidade pelo Grupo B… em 30-06-2007;

d)     Na sequência desta aquisição da Requerente pelo Grupo B…, procedeu-se a uma reestruturação da actividade da Requerente, nos termos que constam dos documentos n.ºs 20 e 21 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);

e)      A generalidade das companhias de aviação tem a prática de disponibilizar facilidades de passagens aos seus trabalhadores e suas famílias (cônjuge e filhos), utilizando lugares disponíveis em voos (espaço comercialmente inútil), o que constitui uma regalia destes, que só é concretizada se no momento do check-in existirem lugares disponíveis; (depoimento da testemunha C…)

f)       Esta regalia é reconhecida também a trabalhadores de outras empresas relacionadas com as companhias de aviação e aos trabalhadores de cada uma destas em voos de outras empresas, na sequência de acordos entre estas; (depoimento da testemunha C…)

g)      OS trabalhadores da Requerente usufruíam dessa regalia nos seus voos, antes da integração da empresa no grupo B…; (depoimento da testemunha C…)

h)      Com a cessação dos voos em aviões próprios da Requerente e integração da empresa no grupo B…, ficou acordado entre a Requerente e a B… que os trabalhadores da Requerente mantinham essa regalia, podendo utilizar os voos da B…; (depoimento da testemunha C…)

i)        A manutenção dessa regalia foi decidida como opção de gestão que teve em vista obstar a que ocorressem perturbações do funcionamento da empresa provocadas por um previsível conflito laboral se ocorresse a cessação, relativamente apenas aos trabalhadores da Requerente;

j)        Já anteriormente tinha ocorrido um forte conflito laboral na B…, por a D… ter deixado de reconhecer aos trabalhadores da B… a fruição dessa regalia nos seus aviões; (depoimento da testemunha C…)

k)      Nos casos em que uma companhia de aviação disponibiliza os espaços disponíveis nos seus aviões a trabalhadores de outras empresas para uso dos trabalhadores destas, essa disponibilização é considerada um serviço que é valorado, sendo fixado um custo por essa utilização, que é suportado pela empresa cujos trabalhadores utilizam os voos da outra, independentemente da utilização efectiva dessa regalia por estes, com base numa estimativa de utilização, sendo isso que se passa com a Requerente, relativamente à possibilidade de os seus trabalhadores utilizarem os voos da B…; (depoimento da testemunha C…)

l)        Na empresa que fornece essas facilidades de passagens aos seus próprios trabalhadores não é contabilizado qualquer custo conexionado com essa regalia; (depoimento da testemunha C…)

m)    Não consta de contrato colectivo de trabalho dos trabalhadores da Requerente a obrigatoriedade de a Requerente proporcionar aos seus trabalhadores a regalia referida (depoimento da testemunha E…)

n)      Não foi pedida autorização à Autoridade Tributária e Aduaneira (Direcção-Geral de Impostos) nos termos do artigo 43.º, n.º 1, do CIRC, relativamente à regalia referida (depoimento da testemunha E…)

o)      A pontualidade é um elemento importante para a competitividade e imagem das empresas de aviação, pelo que as empresas procuram maximizar as possibilidades de os tripulantes dos aviões estarem a horas nos aeroportos; (depoimento da testemunha C…)

p)      Para concretizar a maximização das possibilidades de pontualidade, a B…, anteriormente, fornecia transporte da empresa aos tripulantes entre as suas residências e o aeroporto, mas depois, preferiu que sejam os tripulantes a utilizar os seus próprios meios de transporte, vindo já com o fardamento próprio, assegurando-lhes o estacionamento no aeroporto, cuja dificuldade é frequentemente um obstáculo à pontualidade; (depoimento da testemunha C…)

q)      Essa solução de fornecer estacionamento foi também utilizada pela Requerente, sendo restrita rigorosamente aos tripulantes com os seus próprios meios de transporte e para aceder aos voos que vão realizar; (depoimento da testemunha C…)

r)       Esta opção de assegurar o estacionamento é menos dispendiosa do que assegurar o transporte em veículos da empresa e é uma opção de gestão que as empresas têm de assumir; (depoimento da testemunha C…)

s)        A utilização indevida do estacionamento é infracção disciplinar e há um controle por amostragem dessa utilização; (depoimento da testemunha C…)

t)       Em Janeiro de 2012, quando estavam a preparar o encerramento das contas do exercício de 2011, os serviços de contabilidade da Requerente depararam com a factura n.º M…, relativa à reparação de um reactor, datada de Dezembro de 2011, que estava registada em 2012 (depoimentos das testemunhas F… e G…)

u)      Foi informado pelos serviços de manutenção de reactores da Requerente aos serviços de contabilidade que a reparação referida tinha sido efectuada em Janeiro de 2012, pelo que o registo foi efectuado neste ano; (depoimentos das testemunhas F… e G…)

v)      A reparação em causa foi efectuada e concluída no ano de 2011; (depoimentos das testemunhas F…, G… e E…)

w)    Os prejuízos dos anos de 2011 e 2012 já foram utilizados em exercícios posteriores; (depoimento da testemunha F…)

x)      A Autoridade Tributária e Aduaneira não fez qualquer correcção relativa ao exercício de 2011, respeitante à factura referida, por esse exercício estar fora do período de caducidade do direito de liquidação; (depoimentos das testemunhas F… e E…)

y)      A Requerente utiliza uma taxa para amortização de aviões considerando um período de vida útil de 16 anos, com um valor residual de 10% para todo o equipamento de voo (aviões, reactores, sobresselentes e respectivas ferramentas), na sequência de deferimento pela Autoridade Tributária e Aduaneira de pedido nesse sentido que lhe foi apresentado pela Requerente (documento n.º 13 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

z)      A Requerente, em 2012 e 2013, procedeu à análise dos gastos com grandes reparações e entendeu que só podia capitalizar as grandes reparações de reactores se houvesse expectativa de gerar benefícios económicos futuros e que não era esse o caso, porque a frota já era antiga e a empresa já tinha a expectativa de proceder a uma renovação da frota, a curto prazo; (depoimento da testemunha F…)

aa)   A Requerente, à semelhança do que sucede com a generalidade das empresas de aviação, regista no activo sempre 10% do valor de aquisição dos aviões como valor residual, que nunca é amortizado; (depoimentos das testemunhas F… e G…)

bb)  O valor residual é equivalente à expectativa de venda dos aviões ou motores, pelo que a Requerente entendeu que não podia capitalizar maior valor; (depoimento da testemunha F…)

cc)   Por não ter a expectativa de que as grandes reparações referidas gerassem benefícios económicos futuros que justificassem uma capitalização superior ao valor residual de 10%, a Requerente manteve o valor residual e contabilizou essas grandes reparações como custos dos respectivos exercícios de 2012 e 2013; (depoimento da testemunha F…)

dd) Nos exercícios de 2012 e 2013, não foi reconhecida qualquer imparidade relativamente aos aviões em que foram efectuadas as reparações de motores referidas, mas foi reconhecida posteriormente, em 2014; (depoimentos das testemunhas F… e E…)

ee)   A utilização dos aviões em que foram feitas as reparações referidas prolongou-se por vários exercícios, até 2016; (depoimentos das testemunhas G… e E…)

ff)    Não existia a expectativa de que os aviões em que foram feitas as reparações referidas fossem utilizados até 2022; (depoimento da testemunha F…)

gg)   O valor residual dos aviões é essencialmente o dos reactores; (depoimento da testemunha F…)

hh)  Desde 2016, que já não estão a ser utilizados os aviões detidos pela Requerente em 2012; (depoimentos das testemunhas F… e G…)

ii)      O documento com a designação “…–…” destina-se a prever quando serão efectuadas reparações se os aviões estiverem em funcionamento, mas não a prever a vida útil dos aviões; (depoimento da testemunha G…)

jj)      A Autoridade Tributária e Aduaneira, com fundamento nas ordens de serviço n.ºs OI2015… e OI2015…, realizou uma inspecção externa parcial à contabilidade da Requerente relativamente ao IRC dos exercícios de 2012 e 2013, em resultado da qual foram promovidas diversas correções;

kk)  À data da inspecção, a frota da Requerente era constituída por catorze aeronaves: oito … e seis …;

ll)      Nessa inspecção foi elaborado o relatório de inspecção de que foi junta cópia foi junta ao pedido de pronúncia arbitral como documento n.º 7, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais o seguinte:

III. - DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇOES MERAMENTE ARITMÉTICAS

III.1 - GASTOS COM REPARAÇÃO DE MOTORES

A frota da A… é constituída por 14 aeronaves, 8 … e 6 … . Cada avião tem dois motores incorporados. Para além, dos motores em uso nas aeronaves, a A… dispõe de 4 motores sobressalentes, dois por cada tipo de avião. A sociedade não faz depreciação por componentes, os aviões estão reconhecidos como um todo no imobilizado. Os motores sobressalentes estão reconhecidos de forma individualizada, (anexo 1, pg. 1 a 24).

As reparações dos motores são reconhecidas como gasto, no exercício em que ocorrem. Para o reconhecimento contabilístico dessas reparações a A…utiliza a subconta … -Conservação e Reparação - Motores e a subconta … - Conservação e Reparação -Reparações Não Programadas.

De acordo com informações recolhidas junto da empresa:

• Na subconta 6223210510 - Motores estão reconhecidos os gastos de manutenção dos motores realizados em função dos ciclos de voo;

• Na subconta 6223210530 - Reparações Não Programadas estão reconhecidos os gastos com reparações não programadas, decorrentes de acontecimentos fortuitos;

• São criadas estimativas de gastos para fazer face às reparações anualmente previstas, sendo movimentada a subconta 6223210510 ou a subconta 6223210530 (a débito), por contrapartida da subconta 2739222980 - Outros Fornecimentos e Serviços (a crédito);

• Com a aprovação da fatura emitida pelo fornecedor a estimativa é anulada, através da movimentação das contas identificadas no ponto anterior (conta 62 a crédito e conta 27 a débito);

• Também com a aprovação da fatura, é reconhecido o gasto, pelo valor correspondente à fatura, na subconta 6223210510 ou na subconta 6223210530, por contrapartida de fornecedores;

 

III.1.1 - EXERCÍCIO DE 2012

III.1.1.1 - SUBCONTA CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO - MOTORES

Neste exercício o saldo da subconta de conservação e reparação, 6223210510 - Motores, perfaz € 11.425.703,40, com o detalhe que se descrimina no quadro seguinte. Os documentos com a legenda FA, correspondem a faturas, os documentos com a legenda FB correspondem a notas de crédito, e os documentos SC, SA e SX6, correspondem à anulação, criação de estimativas, e reclassificação contabilística.

 

A) GASTOS TITULADOS POR FATURAS

Após análise aos documentos de suporte desta subconta, foram identificadas as faturas que se descriminam de seguida, correspondentes a reparações de motores (anexo 2. pg. 1 a 20). As faturas classificadas com "SC" correspondem a faturas que foram inicialmente reconhecidas na subconta 6223210530 - Reparações Não Frequentes e posteriormente reclassificadas para a subconta 6223210510 - Motores.

Verificamos o reconhecimento em 2012, de uma fatura datada de 2011, fatura n.º…, de 23-12-2011, do fornecedor … (anexo 2, pg.3). Esta fatura corresponde à reparação do motor CAE 310030. De acordo com o histórico de reparações disponibilizado pela A… (anexo 3, pg. 9), este motor foi removido para reparação do avião … a 16-10-2011, e instalado após reparação, no avião … a 21-12-2011.

Decorre do anteriormente exposto, que o serviço de reparação do motor CAE 310030 ocorreu em 2011, e não em 2012, informação que é coerente com a emissão da fatura pelo fornecedor, que também se reporta a 2011 e não a 2012.

De acordo com o n.º 1, do art. 18.º do CIRC, "os rendimentos e os gastos, assim como as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao período de tributação em que sejam obtidos ou suportados, independentemente do seu recebimento ou pagamento, de acordo com o regime de periodização económica."

Com o reconhecimento em 2012 de uma fatura emitida em 2011 e que corresponde a serviços efetivamente prestados em 2011, a A… violou o princípio da especialização dos exercícios previsto no n.º 1, do art. 18.º do CIRC. O gasto titulado pela fatura n.º…, de 23-12-2011, não é gasto de 2012, mas gasto de 2011, de onde resulta, uma correção ao lucro tributável de €914.999,65.

B) GASTOS ESTIMADOS

Na subconta de conservação e reparação, 6223210510 - Motores, para além do reconhecimento de gastos com base em faturas, temos o reconhecimento de gastos com base em estimativas (documentos SC, SA,SX). Identificamos como estimativas de gastos com reparações a ocorrer em 2013, os montantes que a seguir se identificam. Estes gastos são anulados em 2013, exercício em que ocorre a reparação dos motores, com a receção da fatura dos fornecedores, conforme explicitação no ponto III.1.2.

III.1.1.2 - SUBCONTA CONSERVAÇÃO E REPARAÇÃO - REPARAÇÕES NÃO PROGRAMADAS

Em 2012 são igualmente reconhecidos gastos com a reparação de motores na subconta de conservação e reparação 6223210530 — Reparações Não Programadas. O detalhe desta subconta é o evidenciado no quadro seguinte. O montante reconhecido com base em documentos SC, corresponde a faturas que foram reclassificadas para a subconta 6223210510 -Motores.

Após validação dos documentos de suporte reconhecidos nesta subconta identificamos as faturas correspondentes a reparação de motores que se identificam de seguida.

Decorre do anteriormente exposto, que em 2012, a A… reconheceu gastos efetivos com a reparação de motores no montante de € 8.568.406,48, distribuídos entre a subconta 6223210510-Motores e a subconta 6223210530- Reparações Não Programadas.

Do valor anteriormente referido, e conforme fundamentação do ponto III.1.1.1, desconsideramos € 914.999,65, por violação do princípio da especialização dos exercícios previsto no n.º 1, do art. 18.º do CIRC.

 

III.1.2 - EXERCÍCIO DE 2013

Em 2013 o saldo da subconta 6223210510 - Motores perfaz € 4.230.413,79. Procedendo à análise do detalhe dos movimentos reconhecidos nessa subconta (anexo 4, pg. 1 a 10), verificamos que o somatório das faturas excede o saldo da subconta, conforme se evidencia no quadro seguinte (apenas os documentos identificados como "FA" correspondem a faturas).

 

Em 2012 foram criadas estimativas na subconta 6223210510 - Motores, para a reparação de motores, que transitaram para o exercício de 2013, no montante de € 5.840.000,00. Essas estimativas foram anuladas em 2013, com a movimentação a débito da subconta 2739222980 -Outros Fornecimentos e Serviços, por contrapartida da subconta 6223210510 - Motores, conforme evidenciado no quadro infra.

Ao mesmo tempo que ocorreu a anulação das estimativas de 2012, toram reconhecidos os gastos com a reparação dos motores, para os quais foi criada a estimativa de € 5.840.000,00. A estimativa de € 5.840.000,00 em 2012, traduziu-se em gastos efetivos de € 3.629.293,53, em 2013, conforme faturas identificadas de seguida.

O facto de em 2012 terem sido criadas estimativas que transitaram para 2013 e que excederam os gastos efetivos desse exercício, com a correspondente anulação do excesso de estimativa, conduziu a que o valor de estimativas anuladas em 2013 fosse superior ao valor das estimativas criadas nesse exercício, o que se traduziu na diminuição do saldo da subconta 6223210510 -Motores. A anulação do excesso de estimativas absorveu parte do gasto reconhecido com base em faturas.

Apesar do saldo da subconta anteriormente identificada perfazer € 4.230.413,79, estão reconhecidos nesta subconta gastos com a reparação de motores no montante de e 5.409.258,75 (anexo 2, pg. 13 a 19).

  

De entre as faturas reconhecidas nesta subconta, identificamos uma fatura de 2012, fatura n.º…, de 07-12-2012, emitida pelo fornecedor L…, SA, NIPC:…, para reparação do motor CAE 310085 (anexo 2, pg.13). Pela consulta ao histórico de reparações deste motor (anexo 3, pg. 37), verificamos que o motor foi removido do avião … a 07-08-2012 e instalado após reparação, no motor …, a 30-11-2012.

De acordo com esclarecimentos prestados pelo sujeito passivo, email de 02-03-2016, foi efetuada a estimativa de € 1.062.000,00 para o motor CAE 310085 em 31/10/2012. A estimativa inclui o trabalho a efetuar pela L…, bem como a incorporação de material, que a A… tinha adquirido para essa intervenção. Em 2013 foi registada a fatura e anulada a estimativa, tendo o custo ficado em 2012 (ano em que ocorreu a intervenção).

 

Resulta do anteriormente exposto, que apesar da fatura respeitante à reparação do motor CAE 310085, ter sido reconhecida em 2013, o gasto efetivo com a reparação desse motor, na parte respeitante a serviços, no montante de € 256.929,85, foi reconhecido em 2012, por estimativa.

III.2 - CAPITALIZAÇÃO OU GASTO

Relativamente às reparações de motores identificadas no ponto anterior, importa verificar, se as mesmas devem ser capitalizadas, ou levadas a gastos do exercício. A decisão de capitalizar ou levar a gasto do exercício implica a análise dos gastos suportados, tendo em atenção os critérios de reconhecimento de ativos previstos na International Accounting Standard 16 (IAS 16). Prescreve o parágrafo 6 desta norma, que os ativos fixos tangíveis são itens tangíveis detidos para uso na produção ou fornecimento de bens ou serviços, e dos quais, se espera que sejam usados durante mais do que um período. Por sua vez, o parágrafo 7 prescreve que o custo de um item de ativo fixo tangível deve ser reconhecido como ativo se, e apenas se, for provável que benefícios económicos associados ao item fluam para a entidade e se o custo do item puder ser mensurado fiavelmente. Os parágrafos 12 a 14 determinam sobre o tratamento a conferir aos custos de assistência diária do bem, partes de itens do ativo que necessitem de substituições a intervalos regulares, e o custo de inspeções importantes. Decorre da leitura destes parágrafos, que apenas os custos correspondentes à assistência diária do bem deverão ser reconhecidos em resultados quando incorridos, devendo os restantes gastos ser capitalizados.

Analisando a frota da A…(anexo 1, pg.1 a 24), e respetivos motores sobressalentes, que descriminamos no quadro seguinte, verificamos que com exceção das aeronaves … e …, com período de vida útil até 2016, e do motor sobressalente CAE 310057, com período de vida útil até 2014, as reparações, ocorreram em motores totalmente amortizados ou em final de vida útil, ou a ser incorporados em aeronaves amortizadas, ou em aeronaves em final de vida útil, conforme identificamos no quadro seguinte. Em 2012 os aviões …, assim como os motores de substituição da mesma marca estão completamente amortizados.

Relativamente ao período de vida útil para o equipamento de voo, a A… foi autorizada, conforme despacho da Direção de Serviços do Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, datado de 12/01/2010, a considerar um período de vida útil de 16 anos com um valor residual de 10% para todo o equipamento de voo (avião, sobressalentes e respetivas ferramentas)

 

Para identificação das aeronaves onde os motores reparados foram incorporados, solicitamos à A… o histórico de cada motor (anexo 3, pg. 1 a 42). Com base na informação disponibilizada (Parts Tracking Report), foi possível fazer a correspondência entre os motores e as respetivas aeronaves, através da matrícula do avião. No quadro seguinte temos a identificação do avião onde o motor foi incorporado, com a indicação do exercício em que ocorreu o fim de vida útil (exercício em que a aeronave fica totalmente amortizada).

Resulta do quadro anterior, que em 2012 e 2013, foram reparados motores incorporados em aeronaves amortizadas ou em final de vida útil. Não se verifica essa situação, para os motores CAE 310086, CAE 310097 e CAE 310085, porque foram incorporados em aeronaves com fim de vida útil em 2016 (avião …- fim de vida útil a 01-03-2016, avião …- fim de vida útil a 01-02-2016).

No momento da incorporação dos motores nas aeronaves, a A… define a data previsível para a próxima reparação - …(anexo 3, pg. 39 a 42). Com base nessa informação, foi possível verificar, que a próxima reparação para o motor 310086 está estimada para 17-05-2018, para o motor 310097 a 16-12-2016 e para o motor 310085 a 08-10-2019, ou seja, a vida útil esperada dos motores sobrepõe-se à vida útil dos aviões onde estão incorporados.

Pela análise ao histórico de reparações dos motores é possível verificar que o tempo que decorre entre duas intervenções é superior a 365 dias (1 ano). Os benefícios decorrentes da reparação dos motores não se esgotam no exercício em que são realizados, mas durante os vários exercícios, em que o motor estiver em condições de voo, o que se materializa na superveniência de rendimentos para a A… em mais do que um exercício.

 

Tendo por base, as previsões de reparações futuras - …(anexo 3, pg. 39 a 42), procedemos à análise do tempo que medeia entre a data de incorporação dos motores e a data prevista para a próxima reparação. Verificamos que decorrem mais de 365 dias entre essas datas, pelo que, a utilização do motor, assim como os benefícios decorrentes da sua utilização não se esgotam num exercício.

Questionado o sujeito passivo, sobre a política contabilística adotada pela A…, para as despesas com a manutenção e reparação de reatores, foram prestados, por email de 28-01-2016 (anexo 5 pg. 1 a 4), os esclarecimentos que se resumem de seguida:

• Os dispêndios com reparações e manutenção são reconhecidos como gasto no exercício em que ocorrem;

• Cada aeronave é reconhecida como elemento individual no ativo da A…, englobando todas as suas componentes;

• Ao longo da vida útil as aeronaves são alvo de operações de manutenção e reparação constante, que fazem parte de um plano monitorizado pelas autoridades nacionais e internacionais;

• A regularidade das manutenções depende das horas de voo e condições da aeronave, sendo natural a ocorrência de várias manutenções durante a vida útil da aeronave;

• Consideram que são serviços de reparação expectáveis e dentro do plano de atividade que não aumentam o período de vida útil da aeronave que integram;

• O período de vida útil estabelecido para a aeronave já prevê este tipo de operações de manutenção e reparação.

Relativamente aos esclarecimentos prestados pelo sujeito passivo, o facto de as reparações fazerem parte de um plano monitorizado por autoridades nacionais e internacionais, e ocorrerem dentro do plano de atividade, não invalida a capitalização dos seus gastos. A decisão entre capitalizar e reconhecer como gasto, deve ser feita em função dos critérios previstos na IAS 16, não sendo determinante, o facto de as reparações serem monitorizadas por entidades externas e fazerem parte de um plano de reparações pré-definido.

Consideram que a reparação dos motores não aumenta o período de vida útil das aeronaves, contudo, pela informação recolhida junto da empresa, e a que fizemos referência anteriormente, concluímos que os motores que foram reparados foram incorporados em aeronaves completamente amortizadas, ou em que a utilidade esperada para os motores se sobrepõe à vida útil das aeronaves.

No caso presente, e atendendo aos requisitos para capitalização de custos com ativos, previsto na IAS 16 temos: o custo do item pode ser mensurado fiavelmente, uma vez que o mesmo, está titulado por faturas emitidas por entidades externas à A…, há lugar à obtenção de benefícios económicos futuros relacionados com os custos de reparação dos motores e o uso do ativo não se esgota num exercício.

Decorre do anteriormente exposto, que a A… não deveria ter reconhecido pela totalidade em 2012 e 2013, o custo com a reparação de motores de € 8.568.406,48 e € 5.409.258,75, deveria ter procedido à capitalização desse custo.

III.3 - GASTOS COM DEPRECIAÇÕES

III.3.1 - ENQUADRAMENTO FISCAL

Com a capitalização do custo de um ativo, o seu gasto dilui-se pelos exercícios, durante os quais, se prevê a obtenção de rendimentos, através do reconhecimento de um gasto por depreciação. O regime das depreciações está previsto nos parágrafos 43 a 62 da IAS 16. De acordo, com o parágrafo 55, a depreciação de um ativo começa quando o mesmo estiver disponível para uso, dispondo o parágrafo 57 que a vida útil de um ativo é definida em termos da utilidade esperada do ativo para a entidade.

O CIRC preconiza o modelo de dependência parcial entre a contabilidade e a fiscalidade. O parágrafo 10 do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 442-B/88 (diploma de aprovação do código do IRC), e o n.º 1, do art. 17.º do CIRC, fazem reportar, na origem, o lucro tributável ao contabilístico, ao qual introduzem as variações patrimoniais não refletidas no mesmo, e os ajustamentos extracontabilísticos positivos ou negativos previstos na lei, para salvaguardar os objetivos e os condicionalismos próprios da fiscalidade. O tratamento preconizado no normativo contabilístico é aplicável para efeitos fiscais sempre que o Código do IRC e a legislação complementar não estabeleçam regras próprias.

Relativamente ao reconhecimento de gastos, com ativos e regime das depreciações, para além das regras contabilísticas é necessário atender às regras preconizadas no CIRC, nos artigos 29.º a 34.º e às regras do Decreto Regulamentar 25/200 de 14/09.

Dispõe o n.º 1 do art. 29.º do CIRC e o n.º 1, do art. 1.º do Decreto Regulamentar 25/2009 de 14/09, que são aceites como gastos as depreciações e depreciações de elementos do ativo sujeitos a deperecimento, considerando-se, como sujeitos a deperecimento, os ativos tangíveis que com caráter sistemático sofram perdas de valor resultantes da sua utilização ou do decurso do tempo.

Os métodos para o cálculo das depreciações estão previstos nos artigos 3 e 31.º do CIRC e nos artigos 5.º e 6.º do Decreto Regulamentar. Como método regra para o cálculo das depreciações o n.º 1, do art. 30.º do CIRC e o n.º 1 do art. 4.º do Decreto Regulamentar prevêem o método das quotas constantes, que se materializa, nos termos do n.º 1, do art. 31.º do CIRC, pela aplicação das taxas de depreciação ao custo de aquisição, ou ao valor resultante de reavaliação ao abrigo de legislação de caráter fiscal ou ao valor de mercado, à data de abertura da escrita, para determinação da quota anual de depreciação, sendo esta quota igual durante todo o período de vida útil do bem.

O n.º 6, do art. 31.º do CIRC e o art. 7.º do Decreto Regulamentar prevêem a depreciação por duodécimos no ano de início de funcionamento ou utilização dos elementos, correspondente ao n.º de meses contados desde o mês da entrada em funcionamento ou utilização dos elementos.

O regime aplicável às grandes reparações e beneficiações está previsto no n.º 2 do art.º 5 do Decreto Regulamentar de 14/09, na alínea a), do n.º 5, do mesmo diploma e no n.º 5, do art. 31.º do CIRC. A alínea a), do n.º 5 do art. 5.º do Decreto Regulamentar define como grandes reparações as que aumentem o valor ou duração provável dos elementos a que respeitem e o n.º 2 do mesmo normativo preconiza a dedução da taxa de depreciação aplicável, em função do período de utilidade esperada.

Conforme foi demonstrado no ponto anterior, as reparações dos motores devem ser capitalizadas, porque preenchem os requisitos para o reconhecimento de ativos previstos na IAS 16, e correspondem a grandes reparações, uma vez que, permitiram prolongar o período de vida útil das aeronaves. Correspondendo essas reparações a grandes reparações, a vida útil, é deduzida conforme legislação anteriormente citada em função do período de utilidade esperada.

III.3.2 -APURAMENTO

A) Depreciação Por Data de Incorporação

O gasto a capitalizar, em cada um dos exercícios, corresponde ao gasto efetivo reconhecido na contabilidade com base nas faturas de fornecedores, corrigido pela imputação do gasto da reparação do motor 310085 (fatura emitida pela L… em 2012, mas contabilizada em 2013), a esse exercício, e desconsideração da fatura de 2011, reconhecida como gasto em 2012.

A definição do período de utilidade esperada para os motores que foram objeto de intervenção em 2012 e 2013, teve subjacente os dados disponibilizados pela A…, mais concretamente o histórico de reparações dos motores e a previsão de reparações futuras (anexo 3, pg. 1 a 42). Consideramos que o início da utilização ocorreu na data em que os motores foram incorporados nas aeronaves.

Perante os dados disponibilizados (histórico de reparações dos motores e data previsível para as próximas reparações), o período de utilidade esperada poderia ser estimado, recorrendo a valores históricos, ou seja, ao tempo real que mediou entre reparações, ou a dados previsionais, ou seja, ao período calculado em função da data estimada para a próxima intervenção. Optamos por recorrer aos dados históricos, por corresponderem a dados reais, a tempos efetivos, enquanto os tempos estimados poderão sofrer alterações.

Utilizámos esse critério, porque de acordo com as informações prestadas pelo sujeito passivo (anexo 5, pg. 3), a regularidade das manutenções depende das horas de voo e condições da própria aeronave.

Compilamos nos quadros seguintes, a informação disponibilizada pela A… (anexo 3, pg. 1 a 42). Com base nessa informação, procedemos ao cálculo da vida útil esperada (coluna 9) e ao cálculo do valor anual de gastos com depreciações (colunas 11 e 12). O apuramento foi feito para os motores integrados em cada exercício e a depreciação foi calculada por duodécimos, nos termos, do n.º 6, do art. 31.º do CIRC, por ser a política seguida pela A… .

B) Correção A Favor do Sujeito Passivo - 2013

No ponto anterior, procedemos ao apuramento do gasto anual com depreciações, para 2012 e 2013, tendo apenas em conta, os motores integrados em cada um desses exercícios.

No entanto, relativamente a 2013, o sujeito passivo tem direito a deduzir ao resultado fiscal, o gasto com depreciações dos motores que incorporou nesse exercício, bem como, o gasto com depreciações dos motores integrados em 2012. Assim, para além da dedução ao resultado fiscal de € 384.883,85, consideramos a dedução de € 2.119.481,74, conforme evidenciado de seguida.

 

Resulta dos cálculos anteriores, que em 2013, o sujeito passivo tem direito a deduzir ao resultado fiscal, € 2.504.385,59 (€ 384.883,85+ € 2.119.481,74).

 

C) Correção ao Lucro Tributável

Em resultado da capitalização do custo com a reparação de motores, o lucro tributável é corrigido em € 6.835.682,60 (2012) e em € 2.647.963,36 (2013). Em 2012 consideramos dedutível o gasto de € 1.074.654,08, correspondente à depreciação anual dos motores integrados nesse exercício, e em 2013, reconhecemos o gasto de € 2.504.365,59, correspondente à depreciação anual dos motores integrados em 2012 e 2013.

 

III-1.4- FACILIDADE PAX

A A… reconhece em 2012 e 2013, conforme evidenciado no quadro seguinte gastos denominados "facilidades de PAX", no montante de € 90.840,00 e € 112.600,00.

 

 

Estes gastos estão titulados por duas faturas (anexo 6, pg. 3 e 4).

A A… disponibilizou o Procedimento do Regime de Facilidades de Passagem (anexo e, pg. s a 14), resultando da leitura do mesmo, mais concretamente do ponto 7, que os colaboradores da A… podem usufruir da concessão de facilidades de passagem em lazer no primeiro dia do mês seguinte àquele em que totalizam 12 (doze) meses de prestação efetiva e contínua de trabalho na A…. As facilidades de passagem em lazer destinam-se a viagens nas rotas operadas por equipamento da A…, ou em Companhias terceiras. O custo dessas viagens é absorvido pela A… com exceção das taxas aeroportuárias.

Relativamente a este regime, a A… prestou os esclarecimentos que de forma resumida se transcrevem:

• Desde a integração da A… no grupo B…, a A… tem vindo a utilizar espaço de avião não comercializado/vendido pela B…;

• Pela utilização desse espaço a A… paga à B… uma importância, fixada por acordo, entre a B… e a A…;

• Consideram que a utilização desses espaços configura uma realização de utilidade social, na medida em que representa algo que a A… torna possível aos trabalhadores da empresa, com caráter geral e no âmbito de uma política de bem-estar social na empresa;

• Consideram o gasto incorrido dedutível para efeitos de IRC, porque se trata de uma realização de utilidade social no âmbito geral do pessoal, conforme estabelece o art. 43.ºdo CIRC;

Os gastos com pessoal serão dedutíveis, se enquadráveis na alínea d), do n.º 1, do art. 23.º ou no art. 43.º, ambos do CIRC. Para que sejam subsumíveis ao disposto no art. 23.º do CIRC, é necessário que sejam indispensáveis para a obtenção de rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora e que se traduzam em rendimentos na esfera dos beneficiários, o que não se verifica no caso em apreciação.

Os gastos com o regime de facilidades Pax são uma regalia social atribuída aos empregados e seus familiares, que se traduz na possibilidade de estes, realizarem viagens de avião, pagando apenas as taxas aeroportuárias, pelo que não constituem gastos indispensáveis para a manutenção da fonte produtora.

O custo suportado com esta regalia social, não corresponde a rendimentos tributados sem sede de IRS na esfera jurídica dos seus beneficiários, a A… não consegue fazer a correspondência entre o valor pago à B… e as facilidades de passagem efetivamente realizadas, não podendo em consequência, repercutir esse custo a cada um dos seus funcionários.

Afastada a possibilidade de dedução desses gastos nos termos do art. 23.º do CIRC, importa aferir se estão preenchidas as condições do art. 43.º do CIRC, normativo que o sujeito passivo invoca como pressuposto para a dedução dos gastos anteriormente identificados.

Dispõe o n.º 1, do art. 43.º do CIRC que:

 

São também dedutíveis os gastos do período de tributação, incluindo depreciações ou depreciações e rendas de imóveis, relativos à manutenção facultativa de creches, lactários, jardins-de-infância, cantinas, bibliotecas e escolas, bem como outras realizações de utilidade social como tal reconhecidas pela Direcção-Geral dos Impostos, feitas em benefício do pessoal ou dos reformados da empresa e respetivos familiares, desde que tenham carácter geral e não revistam a natureza de rendimentos do trabalho dependente ou, revestindo-o, sejam de difícil ou complexa individualização relativamente a cada um dos beneficiários.

 

O normativo anteriormente citado prevê a dedutibilidade de gastos com a atribuição de benefícios sociais ao pessoal da empresa, cuja individualização é complexa ou difícil. São dedutíveis os gastos taxativamente enumerados, ou os que, apesar de não enumerados, sejam objeto de reconhecimento pela Direção-Geral dos Impostos (atual Autoridade Tributária e Aduaneira - ATA).

O regime de facilidades de passagens não está taxativamente previsto no n.º 1, do art. 43.º do CIRC, pelo que, e atendendo à redação desse normativo, a sua dedutibilidade está condicionada à obtenção de reconhecimento junto da ATA.

A A… não dispõe do reconhecimento das facilidades de passagem como realizações de utilidade social, não podendo em consequência, o gasto com a aquisição desse serviço à B…, ser dedutível para efeitos fiscais.

O não cumprimento das condições previstas no n.º 1 do art. 43.º do CIRC, traduz-se numa correção ao lucro tributável de € 90.840,00, em 2012, e de € 112.600,00, em 2013.

 

III.5 - TRIBUTAÇÃO AUTÓNOMA

Em 2012 e 2013 a A… apurou € 14.336,67 e € 17.387,36 de tributação autónoma. Após validação desse apuramento (anexo 7, pg. 1 e 2), com as rubricas do balancete, verificamos que não estão a ser tributados autonomamente os encargos com viaturas respeitantes a estacionamento. A A… reconhece gastos com estacionamento na subconta 6222709900 de € 208.543,08 em 2012 e de € 246.677,48, em 2013. Esses gastos estão titulados por faturas emitidas pela M…, NIPC:…, que se relacionam de seguida para cada um dos exercícios (anexo 7, pg. 5 a 10)

O regime das tributações autónomas está previsto no art. 88.º do CIRC, de acordo com o disposto no n.º 3, desse normativo são tributados autonomamente à taxa de 10% os encargos efetuados ou suportados por sujeitos passivos não isentos subjetivamente e que exerçam, a título principal, atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, relacionados com viaturas ligeiras de passageiros ou mistas.

De acordo com o n.º 5 do mesmo normativo, consideram-se encargos com viaturas, os encargos relacionados com viaturas ligeiras de passageiros, motos e motociclos, nomeadamente, depreciações, rendas ou alugueres.

Conclui-se assim, pela sujeição a imposto dos montantes suportados com o pagamento de estacionamento e que estão titulados pelas faturas anteriormente identificadas, de onde decorre, a liquidação de imposto de € 20.854,31, em 2012 e €24.667,91 em 2013.

III. 6 -CONCLUSÃO

III.6.1 - LUCRO TRIBUTÁVEL

Como resultado deste procedimento inspetivo, foi apurada a correção ao lucro tributável de € 7.841.522,25 para 2012, e a correção de € 2.760.563,31, para 2013.

 

1.6.2 - PREJUÍZOS FISCAIS

A A… considerou, conforme preenchimento do quadro 09 da declaração de rendimentos modelo 22, de 2012 e 2013, que nesses exercícios, tem direito à dedução de prejuízos, de € 72.540.483,23 e € 5.248.774,36, respetivamente.

Tendo em atenção as sucessivas redações do art. 52.º do CIRC, os prejuízos apurados até 2009 são reportáveis num período de 6 anos e os prejuízos apurados de 2010 a 2011 (redação dada pela Lei n.º 3-B/2010, da 28/040), num período de 4 anos. Assim, em 2012, a A… pode deduzir ao lucro tributável os prejuízos apurados desde 2006, e em 2013, os prejuízos apurados desde 2007.

Tendo isso em conta, e tendo por base, os resultados constantes, nas declarações de rendimentos entregues pela A…, entre 2003 e 2011, procedemos ao apuramento dos prejuízos dedutíveis em 2012.

Procedemos igualmente ao apuramento dos valores utilizados até esse exercício.

Concluímos que o valor dos prejuízos reportáveis em 2012 é de € 72.540.483,23 (somatório dos prejuízos apurados entre 2006 e 2011). Em 2009 foram deduzidos prejuízos no montante de € 1.709.148,68, através da utilização de prejuízos apurados em 2003.

Assim, e atendendo à redação do n.º 2, do art. 52.º do CIRC8, de acordo com a qual, a dedução a efetuar em cada um dos períodos de tributação não pode exceder o montante correspondente a 75% do respetivo lucro tributável, em 2012 e 2013 a A… terá direito a deduzir prejuízos no montante de € 8.119.125,53 e € 5.819.062,81, conforme quadro infra.

III.6.3 -TRIBUTAÇÃO AUTÓNOMA

Foram também apurados, valores em falta de tributação autónoma conforme descriminado de seguida.

 

mm)        Na sequência da acção inspectiva foram emitidas as seguintes liquidações e demonstrações:

– relativamente ao exercício de 2012, a liquidação e IRC e juros compensatórios n.º 2016 … e as demonstração de acerto de contas n.º 2016 … e de liquidação de juros compensatórios n.º 2016 … (documentos n.ºs 1, 3 e 5, juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos;

– relativamente ao exercício de 2013, a liquidação de IRC e juros compensatórios n.º 2016…, a demonstração de acerto de contas n.º 2016…, e a demonstração de liquidação de juros n.º 2016 … (documentos n.ºs 2, 4 e 6 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);

nn)   Em 21-07-2016, a Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral que deu origem ao presente processo.

 

 

2.2. Factos não provados

 

Não se provou quais as viaturas que utilizaram os lugares de estacionamento que foi facturado pela M… à Requerente nem de que tipo e preço eram as viaturas.

Não se provou que a Requerente tivesse pago as quantias liquidadas nem que tivesse prestado qualquer garantia conexionada com as liquidações impugnadas.

 

 

2.3. Fundamentação da decisão da matéria de facto

 

Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos ao pedido de pronúncia arbitral e que constam do processo administrativo e, nos pontos indicados, com base na prova testemunhal.

As testemunhas aparentaram depor com intenção e com conhecimento dos factos que relataram, por estarem ligadas à actividade da B… e da Requerente, as três que indicou, e por a indicada pela Autoridade Tributária e Aduaneira ter sido quem efectuou a inspecção tributária que está na base das correcções contestadas.

 

 

3. Matéria de direito

 

 

3.1. Questão relativa à aplicação do princípio da especialização dos exercícios quanto à contabilização da factura n.º M…

 

 

Como resulta da prova produzida a factura n.º M… foi contabilizada pela Requerente no exercício de 2012, mas reporta-se a uma reparação de um reactor efectuada em Dezembro de 2011 e que ainda nesse ano foi utilizado.

A prova produzida permite concluir com segurança que foi por lapso, derivado de uma errada informação prestada aos serviços de contabilidade pelos serviços de manutenção de motores, que a inadequada contabilização da factura em causa foi efectuada e que a Requerente não obteve qualquer vantagem com a contabilização do gasto no exercício de 2012 em vez de 2011, designadamente por em ambos os exercícios ter tido prejuízos fiscais que já foram utilizados em exercícios subsequentes.

O artigo 18.º do CIRC estabelece o princípio da especialização dos exercícios, nos termos do qual, «os rendimentos e os gastos, assim como as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao período de tributação em que sejam obtidos ou suportados, independentemente do seu recebimento ou pagamento, de acordo com o regime de periodização económica».

À face deste princípio, a factura referida deveria ter sido contabilizada no ano de 2011 e o correspondente gasto deveria ser imputado a esse exercício e não ao de 2012, como foi.

No entanto, na sequência da correcção desfavorável à Requerente efectuada pela Autoridade Tributária e Aduaneira relativamente ao exercício de 2012, não foi efectuada correspondente correcção favorável relativamente ao exercício de 2011, por a Autoridade Tributária e Aduaneira ter entendido que não, a podia já efectuar, por estar esgotado o prazo de caducidade do direito de liquidação.

A Requerente reconhece que a contabilização deveria ser efectuada no exercício de 2011, mas invoca o princípio da justiça, por a aplicação rígida daquele princípio conduzir, no caso em apreço, a uma situação injusta que é a de o gasto em causa, cuja relevância fiscal a Autoridade Tributária e Aduaneira não questiona, não poder ser relevante em qualquer dos exercícios.

O princípio da justiça é imposto à globalidade da actividade da Administração Tributária pelos artigos 266.º, n.º 2, da CRP e 55.º da LGT.

Da observância concomitante dos princípios da legalidade e da justiça conclui-se que o dever de a Administração Tributária aplicar o princípio da legalidade não se traduz numa mera subordinação formal às normas que especificamente regulam determinadas situações, abrangendo também o dever de a administração ter em conta as consequências da sua actividade e abster-se da aplicação estrita de normas quando dela decorra um resultado manifestamente injusto

A aplicação do princípio da justiça sobrepondo-se ao princípio da especialização dos exercícios tem sido efectuada em situações deste tipo, conduzindo a que não seja efectuada qualquer correcção quando não é possível imputar os gastos ao exercício a que deveriam ser imputados, à face daquele princípio, e os sujeitos passivos não actuaram intencionalmente com o objectivo de obterem alguma vantagem.

O Supremo Tribunal Administrativo tem adoptado este entendimento, tendo decidido, relativamente ao princípio da especialização dos exercícios, que «esse princípio deve tendencialmente conformar-se e ser interpretado de acordo com o princípio da justiça, com conformação constitucional e legal (artigos 266.º, n.º 2 da CRP e 55.º da LGT), por forma a permitir a imputação a um exercício de custos referentes a exercícios anteriores, desde que não resulte de omissões voluntárias e intencionais, com vista a operar a transferência de resultados entre exercícios». ( [1] ) ( [2] )

É uma situação deste tipo que ocorre no caso em apreço, pelo que, em sintonia com esta jurisprudência, é de declarar a ilegalidade da referida correcção à matéria tributável da Requerente do exercício de 2012 no valor de € 914. 999, 65, de que decorre a ilegalidade do acto de liquidação, na parte em que teve como pressuposto esta correcção.

 

 

3.2. Questão do reconhecimento de gastos relativos a reparações dos motores de aviões

 

A Requerente utiliza uma taxa para amortização de aviões considerando um período de vida útil de 16 anos, com um valor residual de 10% para todo o equipamento de voo (aviões, reactores, sobresselentes e respectivas ferramentas), na sequência de deferimento pela Autoridade Tributária e Aduaneira de pedido nesse sentido que lhe foi apresentado pela Requerente, como se constata pelo documento n.º 13 junto com o pedido de pronúncia arbitral.

Relativamente aos exercícios de 2012 e 2013, a Requerente procedeu à análise dos gastos com reparações de motores e entendeu, interpretando a IAS 16, que só podia capitalizar as reparações de reactores se houvesse expectativa de gerar benefícios económicos futuros. A Requerente entendeu não existir esta expectativa, porque a frota já era antiga e a empresa já tinha a expectativa de proceder a uma renovação da frota, a curto prazo, como veio a suceder, pois os aviões apenas foram utilizados até 2016.

Embora esperasse que os aviões em que foram efectuadas as reparações de motores viessem a ser utilizados e a gerar benefícios para a Requerente, esta entendeu que não deveria capitalizar os valores dessas reparações, por existir o referido valor residual de 10% e os previsíveis benefícios económicos futuros não justificarem um aumento de capitalização em relação a esse valor.

Com base neste entendimento, a Requerente manteve o valor residual e contabilizou essas reparações de motores como custos dos respectivos exercícios de 2012 e 2013.

A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que as reparações dos motores deveriam ter sido capitalizadas, por preencherem os requisitos para o reconhecimento de activos previstos na IAS 16 (previsibilidade de benefícios económicos futuros e possibilidade de mensuração fiável), e corresponderem a grandes reparações, à face do preceituado na alínea a), do n.º 5 do artigo 5.º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de Setembro, por terem permitido prolongar o período de vida útil das aeronaves, já que doze das reparações foram efectuadas em motores de aviões já integralmente amortizados até 2013 e, relativamente aos outros três motores, estavam previstas próximas reparações para o motor 310086 em 17-05-2018, para o motor 310097 em 16-12-2016 e para o motor 310085 em 08-10-2019, datas estas posteriores à vida útil dos aviões em que os motores foram incorporados.

Na IAS 16, § 7, estabelece-se que «o custo de um item de activo fixo tangível deve ser reconhecido como activo se, e apenas se: (a) for provável que futuros benefícios económicos associados ao item fluirão para a entidade; e (b) o custo do item puder ser mensurado fiavelmente».

No caso em apreço, verificava-se esta segunda condição, pois existiam facturas relativas às reparações dos motores.

As situações das reparações dos motores de aeronaves já integralmente amortizadas e ainda não totalmente amortizadas afiguram-se ser diferentes pelo que se justifica uma abordagem separada.

 

3.2.1 Questão relativa às reparações dos motores CAE 310086, CAE 310097 e CAE 310085, de aviões que ainda não estavam integralmente amortizados em 2013

 

 Os motores CAE 310086, CAE 310097 e CAE 310085 foram incorporados em aeronaves com fim de vida útil em 2016 (avião …- fim de vida útil a 01-03-2016 e avião …- fim de vida útil a 01-02-2016).

Estas reparações dos motores estavam previstas nos planos de manutenção monitorizados por autoridades nacionais e internacionais, destinados a manter a segurança dos aviões, pelo que se destinaram a assegurar a reposição da sua aptidão para continuarem a proporcionar os benefícios económicos previsíveis durante o período de vida útil.

Quanto a estes aviões, não se pode considerar provado que fosse de esperar que as reparações proporcionassem aumentos de utilidade em relação aos períodos de vida útil inicialmente previstos, mas apenas que este fosse assegurado.

Na verdade, como resultou da prova testemunhal produzida, a previsão de reparações futuras que constava do não significava que a vida útil esperada dos aviões se estendesse até às datas neste previstas, o que se veio a comprovar que não aconteceu, pois nenhum dos aviões voou depois do ano de 2016. De qualquer modo, no mínimo, tem de se ficar numa situação de dúvida fundada sobre se era de esperar aumento da vida útil, e as dúvidas sobre esta matéria devem ser processualmente valoradas a favor da Requerente, por força do disposto no artigo 100.º, n.º 1, do CPPT aplicável aos processos arbitrais tributários por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT.

Nestas condições, as reparações relativas aos motores dos três aviões em que não era de esperar o aumento da vida útil, não podem ser consideradas «grandes reparações», à face do conceito definido na alínea a), do n.º 5 do art. 5.º do Decreto Regulamentar n. 25/2009, de 14 de Setembro, pois aí se esclarece são consideradas «grandes reparações e beneficiações» «as que aumentem o valor ou a duração provável dos elementos a que respeitem»;

Por isso, é aceitável a posição da Requerente ao considerar as despesas com as reparações como gastos.

Consequentemente, é ilegal, por vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, a correcção efectuada, quanto as estas despesas com motores de aviões ainda não amortizados.

 

3.2.2 Questão relativa às reparações dos motores de aeronaves já integralmente amortizadas até 2013

 

No que concerne às reparações de motores dos nove aviões já completamente amortizados é de entender que era de esperar que das reparações em causa adviessem benefícios futuros adicionais, derivados da utilização posterior desses aviões, o que é aceite pelas Partes.

Na verdade, relativamente aos aviões que já estavam totalmente amortizados, as reparações visavam prolongar a possibilidade de obtenção de benefícios económicos futuros adicionais em relação aos que normalmente estariam associados aos aviões em causa, que se esgotariam no período de vida útil previsto.

A razão que a Requerente invoca para não capitalizar os valores das reparações relativas a estes motores é existir o referido valor residual de 10%, que não seria ultrapassado mesmo com o valor das reparações.

O valor residual de um activo é a quantia estimada que uma entidade obteria correntemente pela alienação de um activo, após dedução dos custos estimados de alienação, se o activo já tivesse a idade e as condições esperadas no final da sua vida útil (IAS 16, § 6).

Se não existisse um valor residual, os benefícios advindos da possibilidade de utilização adicional dos aviões já completamente amortizados justificariam a capitalização, pois o valor do activo seria pelo menos o das reparações.

Mas, existindo um valor residual contabilizado, que pode ou não corresponder ao valor real do activo, as reparações de bens completamente amortizados só poderão justificar capitalização do seu valor, a acrescer ao valor residual, se o valor do activo passar a ser superior ao já contabilizado.

No caso em apreço, a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que devia ser feita a capitalização do valor das reparações em causa como se não existisse o valor residual, o que só se poderia justificar se demonstrasse que o valor residual contabilizado não era inferior ao valor real dos aviões em causa.

Mas, a Requerente defende que esse valor residual já era excessivo mesmo sem considerar valorização derivada das reparações de motores e esse excesso veio a ser reconhecido contabilisticamente em 2014, através do reconhecimento de imparidade em relação ao próprio valor residual, apesar de não terem sido capitalizados os valores das reparações. ( [3] )

Por outro lado, a testemunha F… disse que o elemento de maior relevância do valor residual dos aviões é o dos motores, pelo que, se os motores estiverem avariados, é provável que o valor residual de 10%, se tiver sido determinado no pressuposto de que os motores estão a funcionar, seja superior ao valor real dos aviões e, a ser assim, as reparações dos motores assegurarão que o valor residual, que será essencialmente o valor dos motores, corresponda à realidade.

Estes pontos não foram suficientemente esclarecidos pela prova apresentada e produzida, mas, nestas condições, é pelo menos duvidoso que a valorização derivada dos benefícios económicos futuros esperados justificasse a capitalização de um valor dos aviões superior ao que já constava da contabilidade como valor residual, pois o facto de ter sido reconhecida uma imparidade em 2014 em relação a esse valor residual, mesmo sem o acréscimo que poderia advir da capitalização do valor das reparações, sem que se tivesse provado outra causa para diminuição de valor, justifica, pelo menos, a dúvida sobre a correspondência à realidade da tese da Requerente de que já em 2012 e 2013, o valor dos aviões mesmo com as reparações não excederia o valor residual contabilizado.

Também aqui, por força do referido artigo 100.º, n.º 1, do CPPT, a dúvida deve ser valorada a favor da Requerente, o que se reconduz a que processualmente se tenha como pressuposto que os valores residuais já abrangiam os valores das reparações em causa.

Assim, também esta correcção enferma de vício de erro sobre os pressupostos de facto que justifica a sua anulação, nos termos do artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo.

3.2.3. Mensuração das amortizações

 

Mas, a entender-se que se justificava a capitalização do valor das reparações dos motores dos aviões já totalmente amortizados, afigura-se que terá sido errado o método de cálculo utilizado pela Autoridade Tributária e Aduaneira para calcular as amortizações, como defende a Requerente.

Na verdade, o período de utilidade esperada em 2012 e 2013 deveria ter sido calculado com base nas expectativas de utilização existentes nos momentos das reparações atendendo aos factores indicados no § 56 da IAS 16, que estabelece o seguinte:

56. Os futuros benefícios económicos incorporados num activo são consumidos por uma entidade principalmente através do seu uso. Porém, outros factores, tais como obsolescência técnica ou comercial e desgaste normal enquanto um activo permaneça ocioso, dão origem muitas vezes à diminuição dos benefícios económicos que poderiam ter sido obtidos do activo. Consequentemente, todos os factores que se seguem são considerados na determinação da vida útil e um activo:

(a) uso esperado do activo. O uso é avaliado por referência à capacidade ou produção física esperadas do activo.

(b) desgaste normal esperado, que depende de factores operacionais tais como o número de turnos durante os quais o activo será usado e o programa de reparação e manutenção, e o cuidado e manutenção do activo enquanto estiver ocioso.

(c) obsolescência técnica ou comercial proveniente de alterações ou melhoramentos na produção, ou de uma alteração na procura de mercado para o serviço ou produto derivado do activo.

e
(d) limites legais ou semelhantes no uso do activo, tais como as datas de extinção de locações com ele relacionadas.

 

 Como se vê pelo ponto III.3.2. do Relatório da Inspecção Tributária, a Autoridade Tributária e Aduaneira não atendeu às expectativas de utilização da Requerente nem fez aplicação de qualquer dos factores aqui indicados, tendo explicado a sua opção nestes termos:

 

Optamos por recorrer aos dados históricos, por corresponderem a dados reais, a tempos efetivos, enquanto os tempos estimados poderão sofrer alterações.

Utilizámos esse critério, porque de acordo com as informações prestadas pelo sujeito passivo (anexo 5, pg. 3), a regularidade das manutenções depende das horas de voo e condições da própria aeronave.

 

            Concretizando a opção por este critério, os quadros de cálculo das amortizações, mostram que a Autoridade Tributária e Aduaneira determinou o valor das depreciações apenas tendo em conta os dados históricos, isto é, entendeu que a vida útil esperada de cada avião em 2012 e 2013 era equivalente ao período que decorreu entre a reparação de cada motor efectuada em 2012 ou 2013 e a reparação anterior do mesmo motor.

            Para o comprovar, tome-se como exemplo o primeiro motor referido no quadro relativo ao exercício de 2012:

            A Autoridade Tributária e Aduaneira determinou dois valores de «vida útil» para cada motor:

– no campo 6, indicou como «vida útil» o valor em anos correspondente ao período que decorreu entre a anterior reparação do motor e a data da remoção: 2,64 (correspondente, com arredondamento, a 964 dias);

– no campo 9 a Autoridade Tributária e Aduaneira indicou um valor de «vida útil» correspondente aproximadamente ao número de anos entre a data da incorporação do motor em cada avião e a data prevista para nova intervenção: 7 anos.

 

A taxa de amortização indicada no campo 10, que foi a utilizada para determinar a «quota anual» relativa a este motor, é a de 37,86%, correspondente a 2,64 anos de vida útil e não a 7 anos de vida útil.

É este o critério de a taxa de amortização corresponder ao período que decorreu entre a anterior intervenção em cada motor e a sua remoção que foi aplicado ao cálculo de todas as outras quotas anuais indicadas nos quadros referidos.

Isto é, a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que a vida útil esperada de cada avião era equivalente ao período que decorreu entre a reparação de cada motor efectuada em 2012 ou 2013 e a reparação anterior do mesmo motor.

            Este critério de cálculo das amortizações não tem suporte legal.

Na verdade, este critério não está previsto na IAS 16 e não observa o seu § 56, ao preceituar que «todos os factores que se seguem são considerados na determinação da vida útil de um activo».

Por outro lado, de harmonia com o preceituado no artigo 31.º, n.º 5, do CIRC, na redacção vigente em 2012 e 2013, «tratando-se de bens adquiridos em estado de uso ou de grandes reparações e beneficiações de elementos do activo sujeitos a deperecimento, as correspondentes taxas de depreciação são calculadas com base no período de utilidade esperada de uns e outros».

Tratando-se de bens adquiridos em estado de uso ou de grandes reparações e beneficiações de elementos do activo sujeitos a deperecimento, as correspondentes taxas de depreciação são calculadas com base no período de utilidade esperada de uns e outros.

A mesma imposição do «período de utilidade esperada» para determinar as taxas de amortização e depreciação é feita no n.º 2 do artigo 5.º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de Setembro, relativamente às «grandes reparações e beneficiações», entendidas como as «que aumentem o valor ou a duração provável dos elementos a que respeitem» [n.ºs 2, alínea c) e 5, alínea a), do referido artigo 5.º].

            No caso em apreço, a Autoridade Tributária e Aduaneira não determinou o «período de utilidade esperada» com base nos factores impostos pela IAS 16, mas sim com base na utilidade efectiva que tiveram reparações anteriores dos mesmos motores, o que não permite qualquer juízo sobre o período de utilidade esperada, para os aviões, em 2012 e 2013, pois nem se apurou que as anteriores reparações de cada um dos motores fossem idênticas às efectuadas em cada um deles nos anos de 2012 e 2013.

            Assim, também por esta razão, a entender-se que deveria ter sido efectuada capitalização, as correcções relativas a motores de aviões já completamente amortizados enferma de vício de violação de lei que justifica a sua anulação.

 

           

3.3. Questão do gasto relativo a facilidades de passagem dos trabalhadores

 

No âmbito da integração da Requerente no grupo B…, foi celebrado um acordo através do qual a B… se obriga, além do mais, a proporcionar à Requerente os meios necessários para o cumprimento dos direitos e regalias dos trabalhadores da Requerente, entre os quais se contam as facilidades de passagem disponibilizadas à generalidade dos trabalhadores da Requerente (documento 21 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido).

A Requerente tem vindo a utilizar, para uso dos seus trabalhadores espaço de aviões não comercializado ou vendido pela B…, pagando a esta uma importância, fixada por acordo entre as empresas.

A Requerente considera que a utilização desses espaços configura uma realização de utilidade social, na medida em que representa algo que a A…torna possível aos trabalhadores da empresa, com carácter geral e no âmbito de uma política de bem-estar social na empresa e considerou o gasto incorrido dedutível para efeitos de IRC, porque se tratar de uma realização de utilidade social no âmbito geral do pessoal, nos termos do artigo 43.ºdo CIRC.

A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu no Relatório da Inspecção Tributária o seguinte:

«Os gastos com pessoal serão dedutíveis, se enquadráveis na alínea d), do n.º 1, do art. 23.º ou no art. 43.º, ambos do CIRC. Para que sejam subsumíveis ao disposto no art. 23.º do CIRC, é necessário que sejam indispensáveis para a obtenção de rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora e que se traduzam em rendimentos na esfera dos beneficiários, o que não se verifica no caso em apreciação.

Os gastos com o regime de facilidades Pax são uma regalia social atribuída aos empregados e seus familiares, que se traduz na possibilidade de estes, realizarem viagens de avião, pagando apenas as taxas aeroportuárias, pelo que não constituem gastos indispensáveis para a manutenção da fonte produtora.

O custo suportado com esta regalia social, não corresponde a rendimentos tributados sem sede de IRS na esfera jurídica dos seus beneficiários, a A… não consegue fazer a correspondência entre o valor pago à B…e as facilidades de passagem efetivamente realizadas, não podendo em consequência, repercutir esse custo a cada um dos seus funcionários.

Afastada a possibilidade de dedução desses gastos nos termos do art. 23.º do CIRC, importa aferir se estão preenchidas as condições do art. 43.º do CIRC, normativo que o sujeito passivo invoca como pressuposto para a dedução dos gastos anteriormente identificados».

(...)

O normativo anteriormente citado prevê a dedutibilidade de gastos com a atribuição de benefícios sociais ao pessoal da empresa, cuja individualização é complexa ou difícil. São dedutíveis os gastos taxativamente enumerados, ou os que, apesar de não enumerados, sejam objeto de reconhecimento pela Direção-Geral dos Impostos (atual Autoridade Tributária e Aduaneira - ATA).

O regime de facilidades de passagens não está taxativamente previsto no n.º 1, do art. 43.º do CIRC, pelo que, e atendendo à redação desse normativo, a sua dedutibilidade está condicionada à obtenção de reconhecimento junto da ATA.

A A… não dispõe do reconhecimento das facilidades de passagem como realizações de utilidade social, não podendo em consequência, o gasto com a aquisição desse serviço à B…, ser dedutível para efeitos fiscais».

 

A Requerente defende que a quantia que paga para serem asseguradas essas facilidades de passagem constitui um gasto da Requerente resultante de vinculação contratual protegida por lei, imperativo e obrigatório, e nessa medida, uma obrigação indeclinável, um gasto incorrido em cumprimento de um dever contratual legalmente protegido (artigo 23.º do CIRC).

Defende ainda a Requerente, em suma, o seguinte:

– não pode deixar de incorrer no gasto em causa, tendo ao seu serviço trabalhadores que são detentores de um vínculo jus-laboral que compreende a regalia em causa, na justa medida em que esse gasto, uma vez integrado no conjunto das regalias sócio-laborais do trabalhador, goza da protecção que resulta de lei e, nessa medida, constitui um encargo que se enquadra na al. d) do n.º 2 do artigo 23.º do CIRC;

– o gasto incorrido é um gasto da Requerente com o factor trabalho, em benefício das boas condições de trabalho, da satisfação dos trabalhadores, da paz social na empresa e da sua produtividade, claramente previsto no artigo 23.º do CIRC.

– esse gasto é indispensável para a realização dos proveitos e para a manutenção da fonte produtora.

 

Não se provou que exista uma vinculação escrita da Requerente a assegurar tais facilidades de passagem aos seus trabalhadores, mas resultou da prova produzida, designadamente do depoimento da testemunha C… que a regalia em causa tem vindo a ser reconhecida pela generalidade das companhias de aviação e que a sua eliminação seria seguramente fonte de graves conflitos laborais.

O artigo 23.º, n.º 1, do CIRC, na redacção vigente em 2012 e 2013, estabelece que «consideram-se gastos os que comprovadamente sejam indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora».

Como vem sendo entendido, o conceito de indispensabilidade constante do artigo 23.º do CIRC deve ser entendido numa perspectiva económico-empresarial, sendo de considerar indispensáveis todos os gastos que visam, directa ou indirectamente, concretizar o interesse da empresa, que é a obtenção de lucro, independentemente do êxito ou inêxito desses actos para ser atingido este objectivo.

Uma regalia dos trabalhadores cuja eliminação é fonte de conflitos laborais deve considerar-se indispensável para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto, já que é de presumir que, existindo conflitos desse tipo, não serão obtidos os rendimentos que se podem obter quando eles não existem.

De qualquer modo, é manifesto que, visando este objectivo de assegurar a paz laboral na empresa, tem de entender-se que as despesas em causa são praticadas no interesse da empresa, o que permite concluir pela sua indispensabilidade, à face do artigo 23.º, n.º 1, do CIRC e consequente dedutibilidade para a formação do lucro tributável.

Neste contexto, estando preenchidos os requisitos gerais para dedutibilidade dessas despesas, é irrelevante o não preenchimento das condições previstas no artigo 43.º, n.º 1, do CIRC, em que se prevê uma ampliação da dedutibilidade das despesas com realizações de utilidade social, independentemente da sua indispensabilidade para a formação do lucro tributável.

 Assim, tem razão a Requerente quanto a esta questão.

 

 

3.4. Questão da tributação autónoma relativa a despesas com viaturas

 

 A Requerente reconheceu gastos com estacionamento na subconta 6222709900 de € 208.543,08 em 2012 e de € 246.677,48, em 2013, titulados por facturas emitidas pela M… .

A não Autoridade Tributária e Aduaneira questionou a dedutibilidade destas despesas, mas entendeu que lhes é aplicável a tributação autónoma de 10% prevista no n.º 3 do artigo 88.º do CIRC, com referência ao seu n.º 5, pelo que liquidou a quantia de € 20.854,31, relativamente ao exercício 2012 e de €24.667,91, quanto ao exercício 2013.

Os n.ºs 3 a 5 do artigo 88.º do CIRC, na redacção que lhes foi dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, estabelecem o seguinte:

 

3 - São tributados autonomamente à taxa de 10 % os encargos efectuados ou suportados por sujeitos passivos não isentos subjectivamente e que exerçam, a título principal, actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, relacionados com viaturas ligeiras de passageiros ou mistas cujo custo de aquisição seja igual ou inferior ao montante fixado nos termos da alínea e) do n.º 1 do artigo 34.º, motos ou motociclos, excluindo os veículos movidos exclusivamente a energia eléctrica.

 

4 - São tributados autonomamente à taxa de 20 % os encargos efectuados ou suportados pelos sujeitos passivos mencionados no número anterior, relacionados com viaturas ligeiras de passageiros ou mistas cujo custo de aquisição seja superior ao montante fixado nos termos da alínea e) do n.º 1 do artigo 34.º

 

5 – Consideram-se encargos relacionados com viaturas ligeiras de passageiros, motos e motociclos, nomeadamente, depreciações, rendas ou alugueres, seguros, manutenção e conservação, combustíveis e impostos incidentes sobre a sua posse ou utilização.

 

Como se referiu, não está em causa a necessidade de tais despesas e sua dedutibilidade, que foi aceite pela Autoridade Tributária e Aduaneira.

A Requerente defende que o elemento literal da norma não permite a tributação autónoma de gastos com viaturas que não sejam da própria empresa e o elemento lógico da interpretação demonstra que isso não faria nenhum sentido pois, para além do mais, requereria o conhecimento, a posse e o tratamento de dados sobre a vida e o património pessoal dos seus colaboradores.

No caso em apreço, não estão identificadas as viaturas que ocuparam os lugares de estacionamento, não se tendo apurado, designadamente, o seu valor, nem se eram viaturas ligeiras de passageiros ou mistas, se eram ou não movidas exclusivamente a energia eléctrica, e resulta da prova testemunhal produzida que se tratava de estacionamento de viaturas de tripulantes dos aviões, pago pela Requerente para assegurar a pontualidade dos seus voos.

A Requerente tem razão quanto a estar subjacente às tributações autónomas previstas nos n.ºs 3 e 4 do artigo 88.º do CIRC que se trate de despesas com viaturas dos próprios sujeitos passivos, pois só nesse caso haverá a informação quanto ao seu custo de aquisição e características, que são elementos decisivos para definir se há lugar a tributação e a taxa aplicável.

Como bem refere a Requerente, o n.º 5 ao referir como sujeitos a tributação autónoma os impostos incidentes sobre a posse e utilização das viaturas confirma que esta tributação apenas é aplicável a despesas com viaturas dos próprios sujeitos passivos, pois, obviamente, não faria sentido pagar tributação autónoma relativamente a impostos incidentes sobre a posse e utilização de viaturas de outrem.

Assim, a aplicação da tributação autónoma referida enferma de vício de violação de lei, designadamente os n.ºs 3 e 5 do artigo 88.º do CIRC, o que justifica a sua anulação [artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT].

 

3.5. Liquidação de juros compensatórios e demonstrações de acerto de contas

 

As liquidações de juros compensatórios e demonstrações de acerto de contas têm por pressuposto as liquidações de IRC, pelo que a ilegalidade que afecta estas repercute-se naquelas liquidações e demonstrações.

Por isso, justifica-se também a anulação destas liquidações e demonstrações.

 

3.6. Questões de conhecimento prejudicado

 

Sendo de julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral pelas razões invocadas, fica prejudicado, por ser inútil (artigo 130.º do CPC), o conhecimento de outras questões colocadas. 

 

4. Juros, custos com a prestação de garantias e custas aplicáveis

 

A Requerente, para além de pedir a anulação dos actos de liquidação de IRC e juros compensatórios e das demonstrações de acerto de contas, pede também «juros, custos com a prestação de garantias e custas aplicáveis».

 

4.1. Juros indemnizatórios

Não é claro a que juros se refere a Requerente no pedido que formulou, pressupondo-se que se referirá a juros indemnizatórios.

O direito a juros indemnizatórios depende de «pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» (artigo 43.º, n.º 1, da LGT).

Não se provou que a Requerente tivesse pago as quantias liquidadas, pelo que não se pode considerar demonstrado que haja direito a juros indemnizatórios.

Assim, improcede esse pedido, sem prejuízo do direito que vier a ser reconhecido em execução do presente acórdão, nos termos do artigo 24.º, n.º 5, do RJAT

 

 

4.2. Indemnização por garantia

 

A Requerente faz referência no pedido que formula a «custos com a prestação de garantias», presumindo-se que estará a reportar-se a garantias que tenha prestado em conexão com as quantias liquidadas, designadamente para suspender execuções fiscais que eventualmente tenham sido instauradas para sua cobrança, pois é em situações desse tipo que há lugar a considerar custos desse tipo em processos arbitrais, nos termos dos artigos 53.º da LGT e 171.º do CPPT.

No caso em apreço, não se demonstrou que tivesse sido instaurada qualquer execução fiscal para cobrança das quantias liquidadas, nem que tivesse sido prestada qualquer garantia pelo que não há fundamento para atribuição de indemnização por garantia indevida ao abrigo do disposto no artigo 53.º da LGT.

Assim, improcede este pedido, sem prejuízos dos direitos que possam ser reconhecidos em execução do presente acórdão.

 

4.3. Responsabilidade por custas

 

No que concerne a responsabilidade por custas, nos processos arbitrais em que há designação de Árbitro pelo Sujeito Passivo, «a taxa de arbitragem é integralmente suportada pelo sujeito passivo e paga, na sua totalidade», nos termos do n.º 2 do artigo 5.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária. 

Estando-se perante um processo deste tipo, é à Requerente que cabe integralmente a responsabilidade pelas custas do processo, que já estão pagas.

Por isso, nada mais há a decidir sobre esta matéria.

 

 

5. Decisão

 

Nestes termos, acordam neste Tribunal Arbitral em:

 

a)      Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;

b)      Anular as liquidações de IRC n.º 2016 … e n.º 2016 …;

c)      Anular as liquidações de juros compensatórios n.º 2016 …e n.º 2016…;

d)     Anular as demonstrações de acerto de contas n.º 2016 … e n.º 2016 …;

e)      Julgar improcedentes os pedidos de juros indemnizatórios e de indemnização por garantia, sem prejuízo dos direitos que devam ser reconhecidos em execução de julgado.

 

 

6. Valor do processo

 

De harmonia com o disposto no art. 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 1.311.172,58.

 

Lisboa, 31-03-2017

 

Os Árbitros

 

 

 

 

 

(Jorge Manuel Lopes de Sousa)

 

 

 

 

(José Alberto Pinheiro Pinto)

 

 

 

 

 

(Maria Manuela do Nascimento Roseiro)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Declaração de voto

 

Discordo parcialmente da douta decisão (pontos 3.2 e 3.3) que fez vencimento com os fundamentos seguintes: 

I.                   Reparações dos motores de aviões (3.2.)

Quanto a esta questão, decidiu-se que, independentemente da relevância da contabilização de um valor residual, as correcções efectuadas pela Requerida sempre deveriam ser anuladas por se encontrarem indevidamente fundamentadas quanto à duração do período de vida útil esperado. Embora qualquer combinação de critérios considerados relevantes pela AT pudesse suscitar objecções, aceito que as referidas correcções devessem ter sido efectuadas e justificadas de forma mais fundamentada. Contudo, devo registar a minha discordância quanto à relação estabelecida pela Requerente entre capitalização dos encargos com reparações e valor residual dos bens em causa, quando argumenta que “a decisão sobre o registo contabilístico a efectuar associado às reparações, isto é ativo versus gasto, teria que ser ponderada (…) à luz da possibilidade da recuperabilidade futura do ativo nos termos das IAS/IFRS”. Se a Requerente julgava o valor residual desajustado deveria tê-lo revisto, considerando a existência de imparidades[4]. No exercício em causa ou num dos seguintes.[5] A questão decisiva nos autos, quanto a mim, é a referente ao efeito das reparações em bens que já se encontravam amortizados ou muito próximo dessa amortização. E, quanto a essa matéria, considero ter ficado provado que havia a expectativa de prolongamento de vida das aeronaves (aliás, estiveram ao serviço normal da A… até 2016 e, apesar da renovação da frota ainda continuam, de acordo com afirmações de testemunhas da Requerente, a poder ser utilizadas, vendidas ou alugadas com finalidade de voo). Ou seja, o efeito das reparações prolongou-se para além do exercício em que ocorreram. Nesse caso, e independentemente das opções contabilísticas da Requerente, entendo que a empresa, apesar de não estar obrigada a adoptar na contabilidade os critérios fiscais de qualificação de “grandes reparações” e as regras de depreciação aplicáveis, tinha, para efeito do cálculo do lucro tributável, de observar os critérios fiscaisin casu, os estabelecidos no artigo 31º, nº 5, do Código do IRC e no Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de Setembro, devendo proceder aos ajustamentos necessários.  

Assim, as reparações efectuadas nos motores – já após, ou muito perto do final, (d)o período de vida inicialmente previsto para as aeronaves - porque aumentam o respectivo período de utilidade provável, estavam abrangidas pelo conceito de «Grandes reparações e beneficiações» definido no nº 5 do artigo 5º do referido Decreto Regulamentar.

Em conclusão, considero, e aqui em discordância com o que me parece ser a posição reflectida, por maioria, na presente decisão, que o valor residual de um bem, correspondente à quantia que a empresa espera recuperar aquando da sua alienação ou abate, é realidade distinta da dos gastos realizados para prolongar a utilidade económica do mesmo bem, com efeitos que se prolongam por período superior a um ano. Nesta medida, afigura-se-me que ainda que uma empresa opte, de acordo com a interpretação feita das Normas contabilísticas (IAS 16/NCRF7), por registar como gastos do exercício as despesas com reparações, deve proceder, para o efeito do cálculo do lucro tributável, a imputação daqueles gastos aos exercícios abrangidos pelo período de utilidade esperada e não apenas àquele em que ocorreram.

 

II.                Facilidades de viagem (3.3.)

Concordo, tal como a decisão arbitral aprovada, que a prova testemunhal produzida aponta para que se trata de despesas realizadas no interesse da empresa dado o objectivo de manutenção de regalias adquiridas pelos trabalhadores da A… e de tratamento idêntico aos trabalhadores da empresa adquirente, assim assegurando a paz laboral. A natureza social dos gastos em causa torna-os subsumíveis no âmbito do artigo 23.º, n.º 1, do CIRC, especificamente na alínea d) deste número, dispositivo cujos conceitos são densificados noutros normativos do CIRC, pelo que a sua interpretação exige que sejam tidos em consideração no seu conjunto. Assim, tratando-se de encargos com a natureza de “realizações de utilidade social”, tem que se ter em atenção o disposto no n.º 1 do art.º 43º, especificamente, neste caso, a 2ª parte do nº 1, relativamente a benefícios concedidos pela entidade empregadora com carácter geral (pessoal, reformados e respectivos familiares), que não revestem natureza de rendimentos do trabalho dependente ou, revestindo-o, sejam de difícil ou complexa individualização. É o caso dos autos porque, ao que foi explicado por testemunha, a empresa paga à B… uma quantia não directamente relacionada com as viagens efectivamente realizadas para que os trabalhadores possam dispor de lugares, na medida das disponibilidades e não absolutamente garantidos. Com base nestes dados, concluo que se trata de uma situação que careceria de reconhecimento da AT, o que no caso não se verificou. Resultou ainda da inquirição de testemunhas que, apesar de se tratar de uma situação mantida ao longo dos anos, não se pode considerar que essa autorização tenha sido concedida implicitamente, já que não foi objecto de qualquer inspecção externa anterior e a situação não era detectável através de inspecção interna.

 

 

 

Manuela Roseiro

 

 

 

 

 

 

 

 



[1](  )Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 2-4-2008, processo n.º 0807/07.

Na mesma linha, podem ver-se os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 5-2-2003, processo n.º 01648/02, de 25-6-2008, processo n.º 0291/08 e de 21-11-2012, processo n.º 0809/12.

[2](  ) Aliás, há muito que a Administração Tributária reconheceu a necessidade de flexibilidade na aplicação do princípio da especialização dos exercícios, no Ofício-circular n.º C-1/84, de 8-6-84, publicado, com o respectivo parecer, em Ciência e Técnica Fiscal, n.ºs 307-309, páginas 781-791, em que se adoptou o seguinte entendimento, a propósito da questão paralela que se colocava no domínio da Contribuição Industrial:

                Sempre que em determinado exercício existam custos e proveitos de exercícios anteriores, o tratamento fiscal correspondente deverá obedecer às seguintes regras:

                a) Não aceitação dos custos e dos proveitos resultantes de omissões voluntárias ou intencionais no exercício em que são contabilizados, considerando-se, em princípio, como tais as que forem praticados com intenções fiscais, designadamente, quando:

               - está para expirar ou para se iniciar um prazo de isenção;

               - o contribuinte tem interesse em reduzir os prejuízos em determinado exercício para retirar maior benefício do reporte dos prejuízos previsto no artigo 43.º do Código;

               - o contribuinte pretende reduzir o montante dos lucros tributáveis para aliviar a sua carga fiscal.

                b) Nos restantes casos, não deverão corrigir-se os custos e proveitos de exercícios anteriores.

[3]                      Embora não tenha sido apresentado qualquer documento referindo o reconhecimento da imparidade, isso foi confirmado pelos depoimentos das testemunhas F… (indicada pela Requerente) e E… (indicada pela Autoridade Tributária e Aduaneira), como se pode ver pela parte final da gravação dos depoimentos, a partir do segundo 2:07:00).

[4] A NCRF 7 (IAS16) no parágrafo 51, refere que “o valor residual e a vida útil um activo devem ser revistos pelo menos no final de cada ano financeiro”, justamente porque, tratando-se de uma estimativa, uma  alteração das circunstâncias de utilização do bem podem determinar um ajustamento (para mais ou para menos) do valor residual.

[5] O que aliás a requerente informa ter feito em 2014 e 2016, não se sabendo contudo qual a causa da imparidade. Mas, como defendemos, esse facto não tem relevância para a solução do tratamento fiscal dos gastos com as reparações efectuadas em 2012 e 2013, que deve ser analisado face aos artigos citados.