DECISÃO ARBITRAL
REQUERENTE: A...
REQUERIDA: AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
I – RELATÓRIO
A. – PARTES
A A..., a seguir designada por Requerente, pessoa colectiva nº …, com sede no …, veio requerer em 15 de Julho de 2013 a constituição do tribunal arbitral singular em matéria tributária, ao abrigo do prescrito nos art. 2º, nº 1, alínea a) do Decreto – Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico de Arbitragem Tributária -RJAT) e nos arts. 1º, alínea a) e 2º da Portaria nº 112 – A/2011, de 22 de Março, com a finalidade de ser dirimido o litígio que a opõe à Autoridade Tributária e Aduaneira, que doravante será designada por Requerida.
B. – CONSTITUIÇÃO DO TRIBUNAL
1. O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Requerente e à Autoridade Tributária e Aduaneira em 17/07/2013, tendo o Presidente do respectivo Conselho Deontológico designado o signatário como árbitro do Tribunal Arbitral Singular, ao abrigo do disposto no art. 6º, nº 1, do RJAT, encargo este que foi aceite, nos termos legalmente estabelecidos.
2. Em 30/08/2013, as Partes foram notificadas dessa designação, nos termos das disposições combinadas do art. 11º, nº 1, alínea b) do RJAT, nos artigos 6º e 7º do Código Deontológico, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro.
3. Nestas circunstâncias, o Tribunal foi constituído em 17/09/2013, nos termos do preceituado na alínea c), do nº 1, do art. 11º do Decreto – Lei nº 10/2011, o que foi notificado às Partes nessa data.
C. – PRETENSÃO
A Requerente pretende que o Tribunal Arbitral declare a ilegalidade e a consequente anulação do Imposto Único de Circulação no valor de 6.134,40 euros, nos termos descritos no Pedido de Pronúncia Arbitral, e, em consequência.
Determine a restituição do imposto que foi pago pela Requerente, acrescido de juros indemnizatórios, contados desde a data de pagamento até integral reembolso.
Para além desta pretensão, requer, relativamente aos veículos cujas matrículas identifica no Doc. 459 junto ao Pedido de Pronúncia Arbitral, que o Tribunal declare a ilegalidade das liquidações de IUC por caducidade do direito à liquidação e a consequente anulação, por não terem sido notificadas dentro do prazo de quatro anos a contar dos respectivos aniversários.
D. – TRAMITAÇÃO DO PROCESSO
Após a comunicação da data da constituição do Tribunal Arbitral, em 17/09/2013, seguiram-se os posteriores termos processuais na forma seguinte:
- Em 23/09/2013 – Foi notificada a Requerida para, nos termos dos nºs 1 e 2 do art. 17º do RJAT, apresentar resposta no prazo de 30 dias e, querendo, solicitar produção de prova adicional.
- Em 28/10/2013 –A Requerida apresentou Resposta ao Pedido de Pronúncia Arbitral, remeteu despacho de designação dos juristas representantes da Requerida e inseriu na “Plataforma” on line do CAAD o processo administrativo, tendo sido, de tudo, notificada a Requerente.
- Em 06/11/2013 – O Tribunal designou o dia 26/11/2013 para a reunião prevista no art. 18º do RJAT, o que foi notificado às Partes.
- Em 26/11/2013 – Realizou-se a reunião prevista no art. 18º do RJAT, de que resultou, o seguinte:
-As Partes, ouvidas para o efeito, declararam não invocar qualquer excepção
susceptível de ser apreciada e decidida antes do conhecimento do pedido.
- Marcação de uma reunião a realizar em 18/12/2013 para inquirição da testemunha arrolada e a apresentar pela Requerente e produção de alegações orais, com apresentação de um resumo escrito das mesmas.
- Marcação da data da prolação da decisão em 14/02/2014.
- Em 18/12/2013 – Realização da reunião marcada para efeitos de produção de prova testemunhal e apresentação de alegações orais, de cujo conteúdo, cabe salientar o seguinte:
- Foi inquirida a testemunha arrolada pela Requerente no Pedido de Pronúncia
Arbitral - Sra. ….
- Foram produzidas alegações orais pelos representantes da Requerente e da Requerida, por esta ordem, aos quais apresentaram um resumo escrito das mesmas.
- Em 14/02/2013 – Prolação da decisão.
E. – PRETENSÃO DA REQUERENTE E SEUS FUNDAMENTOS
A fundamentar o Pedido de Pronúncia Arbitral, a Requerente, alegou, em síntese, o seguinte:
- A Requerente é uma sociedade que tem como objecto social a compra, venda e aluguer de bens, equipamentos e veículos automóveis com e sem condutor.
- No exercício da sua actividade, celebra contratos de aluguer operacional de veículos automóveis com uma duração média de 42 meses, procedendo à sua venda, quando finda o contrato.
- Em média, vende cerca de 200 veículos por mês, mediante venda directa a particulares, ou utilizando canais de venda, nomeadamente, leiloeiras e stands de automóveis, quando os compradores são empresas.
- Para além destas vendas, existem situações de perdas totais, decorrentes de furto ou sinistro, em que a Requerente é indemnizada pela Seguradora, prescindindo do direito ao veículo, no caso de furto (se o mesmo vier a ser encontrado), ou procedendo à venda do salvado, em caso de sinistro.
- Sempre que está ao seu alcance, a Requerente procede ao registo na Conservatória do Registo Automóvel dos veículos vendidos em nome dos novos proprietários, o que sucede, geralmente, nas situações de vendas directas a particulares, que são casos residuais.
- Tal não acontece quando a Requerente recorre a canais de venda, que é a situação mais frequente, em que, na maioria das vezes, os compradores dos veículos não registam a transferência de propriedade, apesar dos esforços da Requerente.
- Isto ocorre porque, quando utiliza os canais de venda, a Requerente só contacta com as referidas entidades intermediárias, as quais não registam os veículos em seu nome, na medida em que irão vendê-los a terceiros.
- Nestas situações, bem como nos casos de furto ou sinistro, a Requerente envia juntamente com a factura, o requerimento de registo subscrito pelos seus representantes legais, permitindo assim o registo em nome do novo proprietário ou o cancelamento da matrícula em caso de furto ou abate.
- No caso dos veículos, cujas matrículas se encontram identificadas nos Docs. 1 a 3 juntos ao Pedido de Pronúncia Arbitral, que respeitam às autoliquidações reclamadas, ou não foi registada a propriedade do comprador do veículo, ou não foi cancelada a matrícula.
- A Requerente alienou os veículos em questão em datas anteriores às datas-limite de pagamento do IUC de 2008, conforme facturas de venda juntas como Docs.
287 a 456 ao referido Pedido.
- A Requerente efectuou pedidos de apreensão administrativa dos referidos veículos, conforme resulta dos Docs. 184 a 286 anexos ao Pedido, com vista ao cancelamento das respectivas matrículas, encontrando-se já canceladas as que constam do quadro que junta ao mesmo como Doc. 458.
- A Requerente foi notificada pela Requerida para proceder à liquidação do IUC correspondente, por ser a entidade em nome da qual os referidos veículos se encontravam registados na Conservatória de Registo Predial.
- A Requerente teve acesso, em 18/09/2012, 19/09/2012 e 21/09/2012, através do Portal das Finanças, às notificações para exercer, querendo, o direito de audição prévia sobre a liquidação do IUC referente ao ano de 2008, relativamente às matrículas identificadas nas tabelas que anexou ao Pedido como Documentos nºs 1 a 3.
- Embora sem que aceitasse ser sujeito passivo do imposto em causa, a Requerente optou por proceder ao respectivo pagamento, no montante de 6.134,40 euros, conforme demonstram as guias de pagamento que juntou ao Pedido como Docs. nºs 4 a 183, para evitar a instauração de processos de execução fiscal e de contra-ordenação.
- Por não se conformar com as liquidações em apreço, a Requerente apresentou reclamação graciosa contra as mesmas no dia 16/01/2013.
- Na sequência da notificação do projecto de decisão de indeferimento, sem que a Requerente tivesse exercido o direito de audição prévia, a referida reclamação graciosa veio a ser definitivamente indeferida por despacho de 04/04/2013, notificado à Requerente em 15/04/2013.
- De acordo com o disposto no artigo 10º, nº 1, alínea a) do RJAT, conjugado com o nº 2 do artigo 102º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), o pedido de constituição de tribunal arbitral deve ser apresentado no prazo de 90 dias contados da notificação da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, pelo que terminando o prazo em 15/07/2013, o Pedido de Pronúncia Arbitral é tempestivo.
- A Requerente não é sujeito passivo do imposto sub-judice, face ao disposto no art. 3º, nº 1 do CIUC, porquanto não era proprietária dos veículos à data em que o imposto devia ser liquidado, ilidindo, assim a presunção legal juris tantum prevista neste normativo.
- De acordo com o estabelecido no art. 408º, nº 1, do Código Civil, a venda dos veículos automóveis em apreço implicou a transmissão da propriedade para os respectivos compradores.
- Não obstante, o direito de propriedade sobre veículos automóveis se encontrar sujeito a registo obrigatório (art.5º, nº1, alínea a) e nº 2 do Decreto-Lei nº 54/75, de 12 de Fevereiro), este registo, no ordenamento jurídico português, tem carácter meramente declarativo, visando a publicidade dos factos jurídicos, por razões de segurança no comércio jurídico.
- Em conformidade com o sistema do título, a validade da constituição, aquisição ou modificação de direitos (entre os quais o direito de propriedade) não depende do respectivo registo, daí que, mesmo não registados, possam ser invocados entre as partes (cfr. art. 4º, nº 1 do CRP).
- Muito embora os factos sujeitos a registo só produzam efeitos contra terceiros depois do respectivo registo (cfr. art. 5º, nº 1 do CRP), no entanto, para efeitos de registo, apenas são terceiros aqueles que tenham adquirido de um autor comum direitos incompatíveis entre si (cfr. art. 5º, nº 2 do CRP), não sendo este o caso da Autoridade Tributária.
- Não sendo a Autoridade Tributária um terceiro, a transmissão da propriedade dos veículos antes detidos pela Requerente, ainda que não registada, é-lhe oponível, nomeadamente para efeitos de contestação das autoliquidações de IUC.
- O facto gerador do imposto em apreço, de acordo com o que dispõe o art. 6º do CIUC é constituído pela propriedade do veículo, tal como atestada pela matrícula ou registo em território nacional.
- Quanto ao nº 1 do art. 3º do CIUC, que estatui que são sujeitos passivos de imposto os proprietários dos veículos, considerando-se como tais as pessoas singulares ou colectivas, de direito público ou privado, em nome das quais os mesmos se encontrem registados, esta norma legal pode ser dividida em duas partes: a primeira, constituída por previsão e estatuição, e a segunda, que configura uma presunção.
- Na primeira, a norma determina que os sujeitos passivos do IUC (previsão) são os proprietários dos veículos (estatuição), na segunda, considera como proprietários aqueles em nome dos quais os veículos se encontrem registados, estabelecendo, assim, uma presunção legal, que é, por natureza, uma presunção relativa, juris tantum.
- Consequentemente, a Requerente vem requerer a anulação dos actos de autoliquidação que constituem a primeira pretensão do presente Pedido de Pronúncia Arbitral, com o consequente reembolso do montante pago a título de imposto, que ascende a 6.134,40 euros, pois demonstra através da junção das facturas de venda não ser à data-limite proprietária dos veículos.
- No que concerne aos veículos com as matrículas identificadas no Doc. 459 junto ao Pedido de Pronúncia Arbitral, o prazo de caducidade do direito à liquidação de IUC respeitante a 2008 já havia decorrido aquando da notificação das liquidações, face ao disposto no nº 1 do art. 45º da Lei Geral Tributária (LGT).
- A Requerente alega que, terminando o prazo de caducidade do direito a liquidar o IUC quatro anos após o aniversário da matrícula, como as notificações das liquidações relativas aos veículos cujas matrículas estão identificadas no referido Doc. 459 não foram efectuadas dentro do prazo de quatro anos a contar dos respectivos aniversários, as mesmas são ilegais, requerendo, consequentemente a sua anulação.
- A Requerente, por ter procedido ao pagamento do IUC referente ao ano de 2008, requer que lhe seja reconhecido o direito a juros indemnizatórios até integral reembolso do montante peticionado, a taxa igual à taxa prevista para os juros compensatórios (cfr. art. 43º, nº 4 da LGT), que equivale por sua vez à taxa dos juros legais fixada nos termos do Código Civil (cfr. art. 35º, nº 10 da LGT), que corresponde actualmente a 4%, nos termos da Portaria nº 291/2003, de 8 de Abril.
F. – RESPOSTA DA REQUERIDA E SEUS FUNDAMENTOS
A Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou tempestivamente a sua Resposta, na qual, em síntese, alegou o seguinte:
- Confirma os actos tributários de liquidação do IUC, relativos ao ano de 2008, constantes dos Docs. 4 a 183 juntos ao Pedido de Pronúncia Arbitral, relativamente às matrículas identificadas nos Docs. 1 a 3 juntos ao mesmo, no valor total de 6.134,40 euros.
- Que a Requerente apresentou Reclamação Graciosa, por não se conformar com as liquidações em apreço, que foi indeferida por despacho de 04/04/2013 do Chefe do Serviço de Finanças de … e que esse indeferimento constitui o objecto mediato do presente Pedido de Pronúncia Arbitral.
- Impugna a alegada ilegitimidade da Requerente como sujeito passivo do IUC, nas situações em apreço, porquanto, no seu entender:
- A Requerente faz uma leitura enviesada da letra da lei, dado que o legislador estabeleceu expressa e intencionalmente que os sujeitos passivos do IUC são os proprietários (ou os que se encontram nas situações indicadas no nº 2 do art. 3º do CIUC) considerando-os como tal as pessoas em cujo nome se encontram os veículos registados, razão pela qual não foi utilizada neste dispositivo legal a expressão “presumem-se”, mas sim “considerando-se”.
- O normativo fiscal está repleto de previsões análogas à consagrada na parte final do nº 1 do artigo 3º, em que o legislador fiscal, dentro da sua liberdade de conformação legislativa, expressa e intencionalmente, consagra o que deve considerar-se legalmente, para efeitos de incidência, de rendimento, de isenção, de determinação e de periodização do lucro tributável, para efeitos de residência, de localização, entre muitos outros, como, por exemplo, nos artigos 2º do Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (CIMT), 2º, 3º e 4º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS) e 4º, 17º, 18º e 20º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC).
- Conclui, afirmando que a interpretação feita pela Requerente de que o legislador consagrou no art. 3º, nº 1 uma presunção é uma interpretação contra legem.
- Alega, ainda, a Requerida que aquela interpretação não atende ao elemento sistemático, violando a unidade do regime que impõe a obrigatoriedade do registo automóvel, de modo a evitar que a Autoridade Tributária caia em absoluta incerteza relativamente ao sujeito passivo do IUC, colocando até em risco o decurso do prazo de caducidade, razão pela qual se optou por estabelecer que são proprietários para os mencionados efeitos tributários as pessoas em nome das quais os veículos se encontram registados.
- Alega, também, a Requerida que a mencionada interpretação da Requerente ignora o elemento teleológico da interpretação da lei: a ratio do regime consagrado não só no dispositivo legal em apreço, mas também em todo o CIUC.
- Considera a Requerida que o CIUC procedeu a uma reforma do regime de tributação dos veículos em Portugal, alterando de forma substancial o regime de tributação automóvel, passando os sujeitos passivos do imposto a ser os proprietários constantes do registo de propriedade, independentemente da circulação dos veículos a via pública. Isto é, o Imposto Único de Circulação passou a ser devido pelas pessoas que figuram no registo como proprietárias dos veículos.
- Resulta tal conclusão do teor dos debates parlamentares em torno da aprovação do Decreto-Lei nº 20/2008, de 31 de Janeiro, da Recomendação nº 6-B/2012 do Provedor de Justiça e do espírito do CIUC que, tendo sido motivado, no essencial, por uma preocupação ambiental a sua “ratio” é a de tributar os utilizadores dos veículos, os quais, por força da respectiva utilização provocam um custo ambiental.
- Alega, ainda, a Requerida que apesar da apreensão administrativa de alguns dos veículos em causa, no ano de 2008, estes ainda se encontravam registados em nome da Requerente.
- A Requerida impugna, também, a invocada caducidade do direito de liquidar o IUC, alegando:
- O art. 45, nº 4 da LGT estabelece prazos de contagem diferentes consoante se está perante um imposto de obrigação única ou de um imposto periódico e que o IUC se subsume a um imposto periódico, face às normas ínsitas no CIUC - v.g. - art. 4º, art. 6º nº 1, que o qualificam como imposto periódico, atendendo ao carácter de permanência e estabilidade do facto tributário, independentemente da sua exigibilidade em função da matrícula do veículo, pelo que o prazo de caducidade inicia-se a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário.
- Assim sendo, uma vez que as liquidações do IUC foram notificadas à Requerente em 18/09/2012, 19/09/2012 e 21/09/2012, não se encontrava ultrapassado o prazo geral de caducidade de quatro anos, o qual apenas precludiria em 01/01/2013.
- Relativamente ao alegado direito ao pagamento de juros indemnizatórios invocado pela Requerente, alega a Requerida que não estão reunidos os pressupostos legais que conferem direito a serem peticionados, porquanto:
- À luz dos artigos 43º da LGT e 61º do CPPT, o direito a juros indemnizatórios depende da verificação dos seguintes pressupostos: Estar pago o imposto, ter a respectiva liquidação sido anulada, total ou parcialmente, em processo gracioso ou judicial, determinação, em processo gracioso ou judicial, que a anulação se funda em erro imputável aos serviços, o que não ocorreria no caso, uma vez que os actos tributários em crise são válidos e legais, porque conformes ao regime legal em vigor à data dos factos tributários, razão pela qual não ocorreu qualquer erro imputável aos serviços.
G. – QUESTÕES A DECIDIR
Face às posições assumidas pelas Partes conforme os argumentos apresentados, são as seguintes questões que cabe apreciar e decidir:
1 – Questão Principal – Interpretação do nº 1 do art. 3º CIUC, de forma a ser determinado se a norma de incidência subjectiva nela inscrita, consagra, ou não, uma presunção legal de incidência tributária, susceptível de ilição, isto é, admite, ou não, que o contribuinte, em nome do qual se encontre o veículo registado na Conservatória do Registo Automóvel, possa demonstrar, através de meios de prova em Direito permitidos, que não é, no período a que o imposto respeita, o seu proprietário, afastando, assim, a presunção de sujeito subjectivo do imposto que sobre ele recai.
2 – Caducidade do direito – Interpretação das normas do IUC no sentido de se determinar se se trata de um imposto periódico, ou de um imposto de obrigação única, e, sendo um imposto periódico, se o momento da contagem do prazo de caducidade deverá ser o termo do ano civil, ou o termo do período anual de tributação, de modo a aplicar-se a norma do nº 4, art. 45º da LGT relativamente à contagem do prazo de caducidade.
3 – Juros indemnizatórios – Existência, ou não, do direito a juros indemnizatórios, ao abrigo do art. 43º da LGT, no caso de serem anuladas as liquidações e determinado o reembolso da importância peticionada, que teria sido indevidamente paga.
H. – PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
1. O Tribunal Arbitral está regularmente constituído e é material competente, de acordo com o disposto na alínea a), do nº 1, do art. 2º do RJAT (Decreto – Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro).
2. As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se regularmente representadas, nos termos dos arts. 4º e 10º, nº 2 do RJAT e art. 1º da Portaria nº 112/2011, de 22 de Março.
3. Considerada a identidade do facto tributado, do tribunal competente para a decisão e dos fundamentos de facto e de direito invocados, o Tribunal admite a cumulação de pedidos de declaração de ilegalidade dos actos tributários que são objecto deste processo, uma vez que estão cumpridos os requisitos estabelecidos no art. 3º, nº 1 do RJAT.
4. O processo não enferma de vícios que afectem a sua validade.
I. – MATÉRIA DE FACTO
I. 1 – FACTOS PROVADOS
Com relevância para a apreciação das questões suscitadas, o Tribunal dá como provado os seguintes factos:
1 - A Requerente é uma sociedade que tem como objecto social a compra, venda e aluguer de bens, equipamentos e veículos automóveis com e sem condutor.
2 - No exercício da sua actividade, celebra contratos de aluguer operacional de veículos automóveis com uma duração média de 42 meses, procedendo à sua venda, quando finda o contrato.
3 - Em média, vende cerca de 200 veículos por mês, mediante venda directa a particulares, ou utilizando canais de venda, nomeadamente, leiloeiras e stands de automóveis, quando os compradores são empresas.
4 - Para além destas vendas, existem situações de perdas totais, decorrentes de furto ou sinistro, em que a Requerente é indemnizada pela Seguradora, prescindindo do direito ao veículo, no caso de furto (se o mesmo vier a ser encontrado), ou procedendo à venda do salvado, em caso de sinistro.
5 - Sempre que está ao seu alcance, a Requerente procede ao registo na Conservatória do Registo Automóvel dos veículos vendidos em nome dos novos proprietários, o que sucede, geralmente, nas situações de vendas directas a particulares, que são casos residuais.
6 -Tal não acontece quando a Requerente recorre a canais de venda, que é a situação mais frequente, em que, na maioria das vezes, os compradores dos veículos não registam a transferência de propriedade, apesar dos esforços da Requerente.
7 - Isto ocorre porque, quando utiliza os canais de venda, a Requerente só contacta com as referidas entidades intermediárias, as quais não registam os veículos em seu nome, na medida em que irão vendê-los a terceiros.
8 - Nestas situações, bem como nos casos de furto ou sinistro, a Requerente envia juntamente com a factura, o requerimento de registo subscrito pelos seus representantes legais, permitindo assim o registo em nome do novo proprietário ou o cancelamento da matrícula em caso de furto ou abate.
9 - No caso dos veículos, cujas matrículas se encontram identificadas nos Docs. 1 a 3 juntos ao Pedido de Pronúncia Arbitral, que respeitam às autoliquidações reclamadas, ou não foi registada a propriedade do comprador do veículo, ou não foi cancelada a matrícula.
10 - A Requerente alienou os veículos em questão em datas anteriores às datas- limite de pagamento do IUC de 2008, conforme facturas de venda juntas como Docs. 287 a 456 ao referido Pedido.
11 - A Requerente efectuou pedidos de apreensão administrativa dos referidos veículos, conforme resulta dos Docs. 184 a 286 anexos ao Pedido, com vista ao cancelamento das respectivas matrículas, encontrando-se já canceladas as que constam do quadro que junta ao mesmo como Doc. 458.
12 - A Requerente teve acesso, em 18/09/2012, 19/09/2012 e 21/09/2012, através do Portal das Finanças, às notificações para exercer, querendo, o direito de audição prévia sobre a liquidação do IUC referente ao ano de 2008, relativamente às matrículas identificadas nas já referidas tabelas que anexou ao Pedido como Docs nºs 1 a 3.
13 - Embora sem que aceitasse ser sujeito passivo do imposto em causa, a Requerente optou por proceder ao respectivo pagamento, no montante de 6.134,40 euros, conforme resulta das guias de pagamento que juntou ao Pedido como Docs. nºs 4 a 183, para evitar a instauração de processos de execução fiscal e de contra-ordenação.
14 - Por não se conformar com as liquidações em apreço, a Requerente apresentou reclamação graciosa contra as mesmas no dia 16/01/2013.
15 - Na sequência da notificação do projecto de decisão de indeferimento, sem que a Requerente tivesse exercido o direito de audição prévia, a referida reclamação graciosa veio a ser definitivamente indeferida por despacho de 04/04/2013, do Chefe de Serviço de Finanças de … e notificado à Requerente em 15/04/2013.
16 - No que concerne aos veículos com as matrículas identificadas no Doc. 459 junto ao Pedido de Pronúncia Arbitral, as notificações foram efectuadas para além do prazo de quatro anos a contar dos respectivos aniversários.
17 - Em 15 de Julho de 2013, a Requerente apresentou o Pedido de Pronúncia Arbitral que deu origem aos presentes autos.
I. 2 – FUNDAMENTAÇÃO DOS FACTOS PROVADOS
Os factos dados como provados estão baseados nos documentos indicados relativamente a cada um deles, e nos elementos factuais carreados para o processo pelas Partes, na medida em que a sua adesão à realidade não foi questionada, e, ainda, no depoimento da testemunha ….
I. 3 – FACTOS NÃO PROVADOS
Não existem factos dados como não provados, uma vez que todos os factos tidos como relevantes para a apreciação do pedido foram provados.
J. – MATÉRIA DE DIREITO
Fixada a matéria de facto, procede-se, de seguida, à sua subsunção jurídica e à determinação do Direito a aplicar, tendo em conta as questões a decidir que foram enunciadas.
No Pedido de Pronúncia Arbitral, a Requerente alega que não era proprietária dos veículos sub judice à data em que ocorreram os factos tributários que originaram as liquidações de IUC, e, consequentemente, não era sujeito passivo do imposto que lhe foi liquidado.
A Requerida Autoridade Tributária assume uma posição oposta relativamente a esta questão da incidência subjectiva do IUC, defendendo que, nos termos do art. 3º, nº 1 do CIUC, é sujeito passivo do IUC a pessoa em nome da qual o veículo se encontre registado na Conservatória do Registo Automóvel, facto este que ocorria com a Requerente, no período em causa.
O art. 3º, nº 1 do CIUC dispõe relativamente a esta matéria controvertida, o seguinte:
“Art. 3º - Incidência subjectiva
1. São sujeitos passivos do imposto os proprietários dos veículos, considerando-se como tais as pessoas singulares e colectivas, de direito público ou privado, em nome dos quais os mesmos se encontrem registados
------------------------------------------------------------------------------------------“
Sendo esta a questão principal a decidir nos presentes autos, pode o vício, que também foi invocado pela Requerente, de caducidade de direito à liquidação relativamente aos veículos identificados no ponto 16 dos “Factos Provados”, encontrar-se numa relação de prejudicialidade, no caso de proceder o pedido da Requerente relativamente a esta questão principal.
Das posições assumidas pelas Partes no presente processo, resulta claro que no fundo a questão se resume a saber se a norma de incidência subjectiva acima transcrita, constante do nº 1 do art. 3º do CIUC, estabelece uma presunção legal, susceptível de ilisão, como pretende a Requerente ou, expressa e intencionalmente, considera as pessoas em nome de quem os veículos estão registados como proprietários para efeito de incidência subjectiva do IUC, como entende a Requerida.
As orientações arrogadas pela Requerente e pela Requerida quanto a esta matéria e a sua fundamentação estão expostas em síntese, ou com parcial transcrição, em E. e F. do Relatório desta Decisão.
Cumpre, então, decidir:
Um ponto preliminar para se apreciar a questão do valor jurídico do registo automóvel.
O nº 1 do art. 1º do Decreto-Lei nº 54/75, de 12 de Fevereiro, que disciplina o registo de veículos automóveis, dispõe que o registo de veículos “tem essencialmente por fim dar publicidade à situação jurídica dos veículos… tendo em vista a segurança do comércio jurídico”.
Por seu lado, estabelece o art. 7º do Código do Registo Predial, aplicável ao registo automóvel por força do disposto no art. 29º do referido Decreto-Lei nº 54/75, que “O registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito nos precisos termos em que o registo define”.
Verifica-se, assim, que o registo definitivo é tão-só uma presunção da existência do direito, que admite prova em contrário, constituindo, portanto, presunção ilidível, conforme, aliás, tem sido reconhecido na jurisprudência.
Dado que não existe neste Código qualquer disposição que exija o registo como condição de validade dos contratos, conclui-se que, para se adquirir a qualidade de proprietário de um veículo, basta figurar como comprador num contrato de compra e venda.
Relativamente ao teor da norma em apreço – art. 3º, nº 1 do CIUC -, há que dizer que, conforme reconhecido unanimemente e se encontra consagrado no art. 11º da LGT, as leis fiscais devem ser interpretadas de acordo com os princípios gerais de interpretação, avultando, assim, para o efeito, o preceito fundamental de interpretação que é o art. 9º do Código Civil, o qual fornece as regras e os elementos para a interpretação das normas.
Significa isto que se devem utilizar os instrumentos tradicionais de hermenêutica jurídica, com vista a ser determinado o pensamento legislativo, de acordo com o disposto no art. 9º do Código Civil.
Nesta conformidade, comecemos a interpretação do art. 3º, nº 1 do CIUC, pelo elemento literal, aquele em que se visa detectar o pensamento legislativo que se encontra objectivado na norma, para se verificar se a mesma contempla uma presunção, ou se determina, em definitivo, que o sujeito passivo do imposto é o proprietário que figura no registo.
A questão que se coloca é saber se a expressão “considerando-se” utilizada pelo legislador no CIUC, em vez da expressão “presumindo-se”, que era a que constava nos diplomas que antecederam o CIUC, terá retirado a natureza de presunção ao dispositivo legal em apreço.
A nosso ver, a resposta tem necessariamente de ser negativa, uma vez que da análise do nosso ordenamento jurídico se retira de forma clara que as duas expressões têm sido utilizadas pelo legislador com sentido equivalente, seja ao nível de presunções ilidíveis, seja no quadro das presunções inilidíveis, pelo que nada habilita a extrair a conclusão pretendida pela Autoridade Tributária por uma mera razão semântica.
Na verdade, assim acontece em variadas normas legais que consagram presunções utilizando o verbo considerar, de que se indicam, meramente a título de exemplo, as seguintes:
No âmbito do direito civil - o nº 3 do art. 243º do Código Civil, quando estabelece que “considera-se sempre de má-fé o terceiro que adquiriu o direito posteriormente ao registo da acção de simulação, quando a este haja lugar”;
também no âmbito do direito da propriedade industrial o mesmo se passa, quando o art. 59º, nº 1 do Código da Propriedade Industrial dispõe que “As invenções cuja patente tenha sido pedida durante o ano seguinte à data em que o inventor deixar a empresa, consideram-se feitas durante a execução do contrato de trabalho”;
e, também, no âmbito do direito tributário, quando os nºs 3 e 4 do art. 89-A da LGT dispõem que incumbe ao contribuinte o ónus da prova que os rendimentos declarados correspondem à realidade e que, não sendo feita essa prova, presume-se (“considera-se” na letra da Lei) que os rendimentos são os que resultam da tabela que consta no nº 4 do referido artigo;
Esta conclusão de haver total equivalência de significados entre as duas expressões, que o legislador utiliza indiferentemente, satisfaz a condição estabelecida no art. 9º, nº 2 do Código Civil, uma vez que se encontra assegurado o mínimo de correspondência verbal para efeitos da determinação do pensamento legislativo.
Importa, de seguida, submeter a norma em apreço aos demais elementos de interpretação lógica, designadamente, o elemento histórico, o racional ou teleológico e o de ordem sistemática.
Através da análise do elemento histórico, extrai-se a conclusão que, desde a entrada em vigor do Decreto-Lei 59/72, de 30 de Dezembro, o primeiro a regular esta matéria, até ao Decreto-Lei nº 116/94, de 3 de Maio, o último a anteceder o CIUC, foi consagrada a presunção dos sujeitos passivos do IUC serem as pessoas em nome das quais os veículos se encontravam matriculados à data da sua liquidação.
Verifica-se, portanto, que a lei fiscal teve, desde sempre, o objectivo de tributar o verdadeiro e efectivo proprietário e utilizador do veículo, afigurando-se indiferente a utilização de uma ou outra expressão que, como vimos, têm na nossa ordem jurídica um sentido coincidente.
O mesmo se diga quando nos socorremos dos elementos de interpretação de natureza racional ou teleológica.
Com efeito, o actual e novo quadro da tributação automóvel consagra princípios que visam sujeitar os proprietários dos veículos a suportarem os prejuízos por danos viários e ambientais causados por estes, como se alcança do teor do art. 1º do CIUC.
Ora a consideração destes princípios, designadamente, o princípio da equivalência, que merecem tutela constitucional e consagração no direito comunitário, e são também reconhecidos em outros ramos do ordenamento jurídico, determina que os aludidos custos sejam suportados pelos reais proprietários, os causadores dos referidos danos, o que afasta, de todo, uma interpretação que visasse impedir os presumíveis proprietários de fazer prova de que já não o são por a propriedade estar na esfera jurídica de outrem.
Esta interpretação tem assento no disposto no nº 1, do art. 9º do Código Civil, que preceitua que a busca do pensamento legislativo deverá ter sobretudo em conta “a unidade do sistema jurídico e as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada”.
Assim, também, da interpretação efectuada à luz dos elementos de natureza racional e teleológica, atento aquilo que a racionalidade do sistema garante e os fins visados pelo novo CIUC, resulta claro que o nº 1 do art. 3º do CIUC consagra uma presunção legal ilidível.
Em face do exposto, importa concluir que a ratio legis do imposto aponta no sentido de serem tributados os efectivos proprietários-utilizadores dos veículos pelo que a expressão “considerando-se” está usada no normativo em apreço num sentido semelhante a “presumindo-se”, razão pela qual dúvidas não há que está consagrada uma presunção legal.
Ora, estabelece o art. 73º da LGT que “As presunções consagradas nas normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário, pelo que são ilidíveis”.
Assim sendo, consagrando o art. 3º, nº 1 do CIUC uma presunção juris tantum, portanto, ilidível, a pessoa que está inscrita no registo como proprietária do veículo e que, por essa razão foi considerada pela Autoridade Tributária como sujeito passivo do imposto, pode apresentar elementos de prova visando demonstrar que o titular da propriedade é outra pessoa, para quem a propriedade foi transferida.
Analisados os elementos carreados para o processo pela Requerente, extrai-se a conclusão que esta não era proprietária dos veículos a que respeitam as liquidações em apreço, por, entretanto, já ter transferido a propriedade dos mesmos, nos termos da lei civil.
Estes elementos, constituídos por cópias das respectivas facturas de venda, gozam da presunção de veracidade que lhes é conferida pelo art.º 75º, nº 1 da LGT, tendo, assim, idoneidade e força bastante para ilidir a presunção que suportou as liquidações efectuadas.
Esta transmissão de propriedade é oponível à Requerida Autoridade Tributária, porquanto, embora os factos sujeitos a registo só produzam efeitos contra terceiros quando registados, face ao disposto no art. 5º, nº 1 do Código do Registo Predial, a Autoridade Tributária não é terceiro para efeitos de registo, uma vez que não se encontra na situação prevista no nº 2 do referido art. 5º do CRP, isto é, não adquiriu de um autor comum direitos incompatíveis entre si.
Nestas circunstâncias, as mencionadas liquidações devem ser anuladas e, consequentemente restituído à Requerente pela Autoridade Tributária o imposto que indevidamente lhe foi cobrado.
Quanto aos juros indemnizatórios, esta matéria está regulada no art. 24º do RJAT, o qual expressamente determina no seu nº 1, alínea b) que a decisão arbitral obriga a administração tributária, nos casos aí consignados, a “Restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessárias, para o efeito”, e preceitua, ainda, no seu nº 5, que “É devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza nos termos previstos na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo
Tributário”.
Também o art. 100º da LGT, cuja aplicação é autorizada pelo disposto no art. 29º, nº 1, alínea a) do RJAT, preceitua de modo idêntico, no sentido da imediata reconstituição da legalidade, compreendendo a mesma o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso.
Por seu lado, o art. 43º, nº 1 da LGT condiciona o direito a juros indemnizatórios aos casos em que “houve erro imputável aos serviços de que resulta pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido”.
Nesta conformidade, coloca-se a questão de, face ao teor do disposto no art. 3º, nº 1 do CIUC, se poder considerar ter havido, ou não, um erro imputável aos serviços na situação vertente.
Analisada a situação, verifica-se que a Autoridade Tributária ao liquidar a IUC nos termos em que o fez, deu cumprimento ao ditame legal estabelecido na referida norma, uma vez que esta atribui a qualidade de proprietário, para os referidos efeitos, ao contribuinte em nome do qual se encontra registado o veículo na Conservatória do Registo Automóvel, sem necessidade de efectuar qualquer prova.
Só após o reconhecimento por este Tribunal que o dispositivo em apreço tem a natureza de presunção legal juris tantum, é que o Requerente está em condições de ilidir a referida presunção, o que veio a fazer e a provar nestes autos, deixando a partir de agora de ser sujeito passivo da obrigação tributária em análise e, em consequência, dever ser reembolsado do imposto pago.
Razão pela qual se conclui pela inexistência de erro imputável aos serviços, pois a Autoridade Tributária tem o direito de liquidar o imposto na forma em que o fez, apesar da norma em apreço estabelecer uma presunção legal, uma vez que lhe não cabe indagar e demonstrar quem é o proprietário, cabendo-lhe, por força do dispositivo legal em causa, liquidar e exigir o IUC a quem, ao tempo, conste no registo como proprietário.
L. – QUESTÃO PREJUDICADA
Em resultado desta decisão, de cuja procedência resulta uma mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos, fica prejudicado, por inútil, o conhecimento do vício invocado pela Requerente das liquidações de IUC relativos aos veículos que identifica terem sido notificadas para além do prazo do direito à liquidação, nos termos do disposto no art. 124 do CPT, aplicável ex vi do estabelecido no art. 29, nº 1 alínea a) do RJAT.
M. – DECISÃO
Atento o exposto, o presente Tribunal Arbitral decide:
a) Julgar procedente, com fundamento em vício de violação de lei, o pedido de declaração de ilegalidade da liquidação de IUC respeitante ao ano de 2008, relativamente a todos os veículos cujas matrículas estão identificadas nos autos, e, em consequência.
b) Anular os actos tributários de liquidação correspondentes.
c) Julgar improcedente o pedido do reconhecimento do direito a juros indemnizatórios a favor da Requerente.
d) Condenar a Autoridade Tributária a pagar as custas do presente processo.
Valor do processo: Em conformidade com o disposto nos artigos 306º, nº 2 do CPC (ex. 315º, nº 2) e 97º - A, nº 1 do CPPT e no artigo 3º, nº 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de 6.134,00 euros
Custas: De harmonia com o nº 4 do art. 22º do RJAT, fixa-se o montante das custas em 612,00 euros, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.
Notifique-se.
Lisboa, 14 de Fevereiro de 2014
O Árbitro
José Nunes Barata
(Redacção pela ortografia antiga)