Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 459/2016-T
Data da decisão: 2017-02-10  Selo  
Valor do pedido: € 63.414,00
Tema: IS - Verba 28.1 da TGIS; Terrenos para construção; Ano 2015
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DECISÃO ARBITRAL

 

Acordam os Árbitros José Pedro Carvalho (Árbitro Presidente), Maria Alexandra Mesquita e Rui Ferreira Rodrigues, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem Tribunal Arbitral, na seguinte

 

Decisão Arbitral

I ­RELATÓRIO

  1. A…, NIF…, doravante citada como Requerente, apresentou em 29 de Julho de 2016, através da sua representante a sociedade B…, SA, NIPC…, um pedido de constituição de Tribunal Arbitral Colectivo, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 2º e 10º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro qua aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária e Aduaneira (doravante designado por RJAT) em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante citada como AT ou Requerida).
  2. O Requerente vem pedir a pronúncia arbitral sobre a ilegalidade das liquidações de Imposto do Selo (doravante citado por IS) referente ao ano de 2015, no montante global de sessenta e três mil quatrocentos e catorze euros, 63 414,00€, alegando violação do artigo 1º do Código do Imposto de Selo (doravante CIS), da verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo (doravante TGIS) e do artigo 6.º da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro, sendo o valor do imposto liquidado e pago de 42 276,00 euros, e liquidado e a pagamento até 30 de Novembro de 2016, de 21 138.00 euros, o que perfaz o valor o montante global de 63 414,00 euros que corresponde ao valor da utilidade económica do pedido, cfr. alínea e) do n.º 2 do artigo 10 do RJAT.
  3.  Solicita assim a anulação das referidas liquidações pagas e a pagamento, assim como o pagamento de juros indemnizatórios sobre o montante global a contar das diferentes datas do pagamento do imposto, calculados à taxa legal.
  4.   O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Ex.mº Presidente do CAAD em 19 de Agosto de 2016 e notificado à AT a 20 de Agosto de 2016.
  5. Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11º do RJAT, com a redacção introduzida pelo artigo 228º da Lei 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou os árbitros do Tribunal Arbitral Colectivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável e notificou as partes dessa designação em 3 de Outubro de 2016.  
  6. O Tribunal Arbitral Colectivo ficou constituído em 19 de Outubro de 2016 e comunicado no mesmo dia às partes; foi-o regularmente e é materialmente competente face ao preceituado nos termos do n.º 1, alínea a) dos artigos 2º, 5º, do n.º 2, alínea a) do artigo 6º, e do n.º 1 do artigo 11º, todos, do RJAT, com a redação introduzida pelo artigo 228º da Lei nº 66-B/2012, de 31 de Dezembro.
  7. Nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 17º do RJAT, foi notificada a requerida AT, em 20 de Outubro de 2016, para apresentar Resposta.
  8. A AT apresentou a sua Resposta e juntando o Processo Administrativo (doravante designado PA), em 15 de Novembro de 2016.  
  9. Por Despacho Arbitral de 18 de Novembro de 2016, do Senhor Presidente deste Colectivo, foi determinada a dispensa tanto da reunião referida no artigo 18º do RJAT, bem como da apresentação de alegações pelas partes, fixando-se em 30 dias o prazo para a prolação da Decisão final do processo.

10.  O processo não enferma de nulidades e não foram suscitadas questões, prévias ou subsequentes, prejudiciais ou de excepção, que obstem à apreciação do mérito da causa, mostrando-se reunidas as condições para ser proferida Decisão final.  

11.  O Requerente juntou a devida procuração nos autos e a Requerida AT procedeu à designação dos seus representantes nos autos, encontrando-se assim as Partes devidamente representadas.  

12.  A Requerida AT tem personalidade e capacidade judiciária nos termos dos artigos 4º e 10.º n.º 2 do RJAT e artigo 1º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março e o Requerente beneficia de capacidade judiciária nos termos do artigo 26º do Código do Processo Civil aplicável aos presentes autos, ex vi da alínea e) do artigo 29º do RJAT e dos artigos citados anteriormente com excepção do artigo 1º da Portaria 112-A/2011, de 22 de Março, pelo que ambas têm legitimidade processual.

 

 II – Fundamentação: A matéria de facto

II.A. Factos que se consideram provados

a)      O Requerente recebeu os documentos n.ºs 2016…, 2016… e 2016… emitidos pela Requerida AT, do qual constam as liquidações de IS relativas ao prédio urbano com o artigo matricial…, da União das Freguesias de … e …, concelho e distrito do Porto, correspondente ao prédio sito na Rua de …, n.º…, Lote …, na cidade do Porto.

b)      Essas liquidações no montante global de 63 414,00 euros foram emitidas ao abrigo da verba 28.1 da TGIS, com referência ao ano de 2015, com a nova redação conferida à verba pelo Orçamento de Estado para 2014 - Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro.

c)      A requerente é dona e legitima proprietária do prédio objecto das liquidações de IS ora em apreço.

d)      O referido prédio, no período a que se referem aquelas liquidações encontrava-se inscrito na matriz predial respectiva como “terreno para construção”, constando ainda como “Tipo de Coeficiente de Localização” a menção “Habitação”.

e)      De acordo com o Alvará de Loteamento n.º ALV/…/…/DMU, com referência ao Processo n.º …/…/CMP, que titula a operação de loteamento e respectivas obras de urbanização sobre o prédio sito na Rua…, n.º…, o Lote … é descrito como tendo a área de 4.883,00 m2, destinado à construção de um edifício, cuja área de construção é de 27.722,00 m2 e a área de implantação de 4.270,00 m2, sendo que a área bruta destinada a habitação é de 19.345,00 m2, a que correspondem 116 fogos, e a área bruta de construção destinada a estacionamento é de 8.377,00 m2.

f)       O montante do imposto foi liquidado e pago pela Requerente s as duas primeiras prestações, respectivamente, em Abril e Julho de 2016, devendo a terceira prestação ser paga até 30 de Novembro do mesmo ano.

II.B. Factos que ainda não se consideram provados

Não está feita prova do pagamento da terceira prestação do imposto que, como temos referido, deveria ter sido efetuado até 30 de Novembro de 2016.

 

III – Fundamentação: A matéria de Direito

            A única questão a dirimir nos presentes autos de processo arbitral tributário, prende-se com a aplicação da verba 28.1 da tabela anexa ao CIS, a um terreno destinado a construção.

No presente processo está, assim, em causa a definição do âmbito de incidência da verba nº 28.l. da TGIS, na redacção dada pela Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro, mais concretamente determinar se o terreno para construção em questão no presente processo pode subsumir-se no conceito de “terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI” a que alude a referida verba, tendo em conta que o respectivo valor patrimonial é igual ou superior a € 1.000.000,00.

A questão coloca-se em virtude da tributação em sede de imposto do selo da propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, seja igual ou superior a € 1.000.000, caso em que é devido imposto, à taxa de 1% sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI, por prédio com afectação habitacional.

Esta questão não é nova, tendo sido objecto de apreciação quer na jurisdição arbitral, quer na jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, sendo que, no âmbito da redacção do CIS dada pela Lei n° 55-A/2012, de 29 de Outubro, as decisões proferidas foram-no sempre em sentido contrário ao pretendido pela Administração Tributária[1].

            A situação sub iudice, todavia, dá-se num quadro jurídico diferenciado, na medida em que os factos deverão ser apreciados à luz da redacção do CIS dada pelo Orçamento de Estado para 2014, Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro (artigo 194º, sob a epígrafe - Alteração à Tabela Geral do Imposto do Selo), segundo o qual a verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo, anexa ao Código do Imposto do Selo, aprovado pela Lei n.º 150/99, de 11 de Setembro, passou a ter a seguinte redacção:

«28.1 — Por prédio habitacional ou por terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI — 1 %».

            Neste novo quadro legal, foram já proferidas decisões em sede arbitral, igualmente em sentido desfavorável ao sustentado pela AT[2].

            A referida jurisprudência, não obstante ter concluído pela procedência do pedido arbitral, assenta no entendimento de que se deverá ter como preenchendo os pressupostos da nova verba 28.1 da TGIS:

 “no que se refere a terrenos para construção, quer estejam, ou não, localizados dentro de um aglomerado urbano, tal como vem definido no art. 3.º/4 do presente diploma [CIMI], devem, como tal, ser considerados os terrenos relativamente aos quais tenha sido concedida: - licença para operação de loteamento; - licença de construção; - autorização para operação de loteamento; - autorização de construção; - admitida comunicação prévia favorável de operação de loteamento ou de construção; emitida informação prévia favorável de operação de loteamento ou de construção, bem assim como; - aqueles que assim tenham sido declarados no título aquisitivo, devendo ter-se em atenção que, também para esse efeito, apenas deve relevar o título aquisitivo com a forma preceituada pela lei civil, ou seja, a escritura pública ou o documento particular autenticado referidos no art. 875.º CC.” [vd. ANTÓNIO SANTOS ROCHA / EDUARDO JOSÉ MARTINS BRÁS – Tributação do Património. IMI-IMT e Imposto do Selo (Anotados e Comentados). Coimbra, Almedina, 2015, p. 44].”[3]

            Também no acórdão proferido no processo arbitral 142/2016T, já citado, que concluiu, igualmente, pela procedência do pedido, se pode ler o seguinte:

“Não há nestas normas da TGIS e do CIMI indicação do que deve entender-se por «edificação prevista», mas, tendo em conta os documentos exigidos para ser efectuada a avaliação de terrenos para construção, indicados no artigo 37.º, n.º 3, do CIMI, conclui-se que apenas se pode falar de construção autorizada ou prevista quando o «edifício a construir», a que se refere o n.º 1 do artigo 45.º, esteja definido em alvará de loteamento ou alvará de licença de construção, ou projecto aprovado, ou comunicação prévia, ou informação prévia favorável ou documento comprovativo de viabilidade construtiva".

            Subscreve-se integralmente aqui, o entendimento dos referidos acórdãos, quanto ao que, face à nova redacção do CIS, se deve entender por “terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI”.

            Com efeito, de acordo com o CIMI, os terrenos para construção, que, de acordo com o artigo 6.º/1/c) de tal Código, constituem um tipo de prédio urbano, poderão ter como afectação a habitação, conforme decorre do artigo 41.º, também do CIMI, afectação essa que, conforme resulta, para além do mais, expressamente do artigo 45.º/5 do CIMI, será determinada com base nos elementos a que alude o artigo 37.º do mesmo Código, sendo que o n.º 3 deste artigo se refere que:

“Em relação aos terrenos para construção, deve ser apresentada fotocópia do alvará de loteamento, que deve ser substituída, caso não exista loteamento, por fotocópia do alvará de licença de construção, projecto aprovado, comunicação prévia, informação prévia favorável ou documento comprovativo de viabilidade construtiva”.

            Conclui-se, assim, aqui, como na jurisprudência atrás citada, que se deverá considerar como “terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI”, aqueles terrenos em que o «edifício a construir», esteja definido como destinado a habitação em alvará de loteamento ou alvará de licença de construção, ou projecto aprovado, ou comunicação prévia, ou informação prévia favorável ou documento comprovativo de viabilidade construtiva.

            Ora, no caso, apura-se que o terreno a que se reporta a liquidação de Imposto do Selo, objecto da presente acção arbitral, é abrangido pelo Alvará de Loteamento n.º ALV/…/…/DMU, com referência ao Processo n.º …/…/CMP, que titula a operação de loteamento e respectivas obras de urbanização sobre o prédio sito na Rua …, n.º…, o Lote …, como tendo a área de 4.883,00 m2, destinado à construção de um edifício, cuja área de construção é de 27.722,00 m2 e a área de implantação de 4.270,00 m2, sendo que a área bruta destinada a habitação é de 19.345,00 m2, a que correspondem 116 fogos, e a área bruta de construção destinada a estacionamento é de 8.377,00 m2.

            Assim, dúvidas não persistem que o «edifício a construir» no terreno em questão está definido em alvará de loteamento, como tendo por finalidade a habitação.

            Face ao exposto, haverá que considerar tal terreno como “terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI”, preenchendo-se, como tal, a previsão da verba 28.1 da Tabela anexa ao CIS, na redacção aplicável, nada havendo a censurar ao acto tributário impugnado e devendo, como tal, improceder integralmente o pedido arbitral.

 

IV – Decisão

Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral julgar improcedente o pedido arbitral formulado e, em consequência,

a)      Absolver a Requerida do pedido; e

b)      Condenar a Requerente nas custas do processo, abaixo fixadas.

 

V. Valor do processo

Fixa-se o valor do processo em € 63 414,00, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

VI. Custas

Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 2 448,00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pela Requerente, uma vez que o pedido foi totalmente improcedente, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.

 

Notifique-se.

 

Lisboa 10 de Fevereiro de 2017

 

 

O Árbitro Presidente

 

(José Pedro Carvalho)

 

O Árbitro Vogal

 

(Maria Alexandra Mesquita)

 

O Árbitro Vogal

 

(Rui Ferreira Rodrigues)

 



[1] Cfr., p. ex., Acórdãos 49/2013-T de 18 de Setembro de 2013, 53/2013-T de 2 de Outubro, 231/2013-T de 3/2/2014, Processo nº 7/2014-T, de 3 de Julho, 56/2014-T de 31 de Julho, 210/2014-T de 30 de Julho, Processo nº 125/2015-T, de 12 de Outubro, todos do CAAD (disponíveis em www.caad.org.pt) e o Acórdão do STA de 9 de abril de 2014, P1870/2013, a que se seguiram vários outros de teor semelhante, disponíveis em http://www.dgsi.pt/jsta.

[2] Cfr., p. ex., as decisões dos processos arbitrais 156/2016T, 142/2016T, 524/2015T, 578/2015T, 467/2015T, 260/2016T e 290/2015T, todas disponíveis em www.caad.org.pt.

[3] Cfr. neste sentido, o acórdão proferido no processo 156/2016T, já citado.