Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 254/2016-T
Data da decisão: 2017-02-15  Selo  
Valor do pedido: € 11.537,70
Tema: IS – verba 28.1 da TGIS; terreno para construção; Pedido de revisão oficiosa; incompetência do Tribunal em razão da matéria
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Decisão Arbitral

 

 

Autor / Requerente: A…, S.A.

Requerida: Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante A.T.A.)

 

1. Relatório

Em 05-05-2016, a sociedade anónima A…, S.A., pessoa coletiva n.º …, com sede na Rua …, n.º…, …-… …, matriculada na Conservatória do Registo Comercial do … sob o n.º …, doravante designada por Requerente, submeteu ao Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) o pedido de constituição de tribunal arbitral com vista, de forma imediata, à anulação do indeferimento de requerimento de revisão de ato tributário proferido no processo administrativo n.º …2015…, e de forma mediata, à anulação do ato tributário de liquidação de Imposto de Selo relativo ao ano de 2013 e relativo ao prédio urbano inscrito na matriz predial urbana sob o artigo … da freguesia de …, concelho de ..., com o valor patrimonial tributário de 1.153.770,00 € e descrito como terreno para construção.

A Requerente alega que a verba 28 da Tabela Geral do Imposto de Selo (TGIS) aditada pelo artigo 4º da Lei n.º 55-A/2012, não abrange os lotes de terreno para construção com valor patrimonial igual ou superior a um milhão de euros, uma vez que os imóveis inscritos na matriz como terrenos para construção não são subsumíveis no conceito de prédios com afetação habitacional. Entende, por isso, a Requerente que a liquidação de Imposto de Selo em causa se encontra desprovida de fundamento legal.

A Requerente refere que apresentou um pedido de revisão do ato tributário de liquidação de Imposto de Selo em causa nestes autos, ao abrigo do artigo 78º da Lei Geral Tributária (LGT) e do artigo 115º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI), aplicável por força do artigo 49º n.º 3 do Código do Imposto de Selo. A Requerente refere ainda que este pedido de revisão do ato tributário foi objeto de decisão de indeferimento.

A Requerente expõe que o artigo 67º n.º 2 do Código do Imposto de Selo determina a aplicação subsidiária das regras do Código do IMI à tributação prevista na verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto de Selo (TGIS). E o artigo 6º n.º 2 do Código do IMI refere que os prédios habitacionais, comerciais, industriais e para serviços são os “edifícios ou construções para tal licenciados, ou, na falta de licença, que tenham como destino normal cada um destes fins”. Assim, entende a Requerente que a expressão habitacional tem necessariamente implícita uma utilização habitacional, referindo-se a prédios urbanos que tenham, ou possam ter, uma efetiva utilização para fins habitacionais, seja porque para tal estão licenciados, seja porque têm esse destino normal.

Expõe a Requerente que a verba 28.1 da TGIS deve abranger unicamente prédios que estejam efetivamente afetos a fins habitacionais.

A Requerente considera que os terrenos para construção não podem ser objeto da tributação especial consagrada na verba 28.1 da TGIS. Desde logo porque o artigo 6º do Código do IMI refere que o conceito de terrenos para construção inclui os prédios urbanos “situados dentro ou fora de um aglomerado urbano, para os quais tenha sido concedida licença ou autorização, admitida comunicação prévia ou emitida informação prévia favorável de operação de loteamento ou de construção”.

Para a Requerente, um prédio classificado como terreno para construção não tem uma efetiva e real afetação habitacional. Existe apenas e tão só uma expectativa de os mesmos serem objeto de obras de construção para habitação ou outros fins.

Assim, conclui a Requerente o âmbito de incidência da verba 28.1 da TGIS não poderá incluir os prédios inscritos como terreno para construção, sendo ilegal a liquidação em causa, por erro nos pressupostos de facto e de direito.

Por fim, a Requerente alega, a título subsidiário, que a tributação consagrada na verba 28 da TGIS é contrária ao princípio da igualdade previsto no artigo 13º da Constituição da República Portuguesa (CRP), e contrária ao princípio da igualdade fiscal e da capacidade contributiva constantes do artigo 104º n.º 3 da CRP.

A Requerente faz ainda referência às decisões do CAAD dos processos n.º 43/2013-T, 240/2013-T, 12/2014-T, 231/2014-T, 370/2014-T, 499/2014-T, 529/2014-T, 569/2014-T, 135/2015-T, 367/2015-T e 619/2015-T. 

A Requerente procedeu ao pagamento da liquidação de Imposto de Selo em causa nos autos, e pede a condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira (A.T.A.) a proceder ao reembolso do imposto indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios nos termos do artigo 43º da LGT.

Foi designada como árbitro único, em 29-06-2016, Suzana Fernandes da Costa.

Em conformidade com o previsto no artigo 11º n.º 1, alínea c) do RJAT, o tribunal arbitral singular foi constituído em 15-07-2016.

A A.T.A. apresentou resposta, em 27-07-2016 (dentro do prazo legal para o efeito).

A A.T.A. começa por apresentar defesa por exceção, alegando a existência de incompetência absoluta do Tribunal Arbitral.

A A.T.A. refere que o artigo 97º do Código do Procedimento e do Processo Tributário (CPPT) impõe que a impugnação de atos administrativos em matéria tributária só possa ser feito, no processo judicial tributário, através da impugnação judicial ou da ação administrativa especial, conforme esses atos comportem, ou não, a apreciação da legalidade de atos administrativos de liquidação.

E, no caso tendo havido indeferimento liminar do pedido de revisão por intempestividade, o meio processual a utilizar seria a ação administrativa especial e não o pedido arbitral.

Apresentando defesa por impugnação, a A.T.A. defende que o pedido de declaração de ilegalidade e consequente anulação da liquidação controvertida deveria ser julgado improcedente, uma vez que a liquidação em crise consubstancia uma correta interpretação da verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto de Selo, já que o referido prédio tem natureza jurídica de prédio com afetação habitacional.

Conclui ainda a A.T.A. que não se verifica qualquer violação de princípios constitucionalmente consagrados, nomeadamente os princípios da igualdade fiscal e capacidade contributiva.

A A.T.A. requereu ainda, na mesma data, a dispensa da realização da reunião prevista no artigo 18º do Regime de Arbitragem Tributária, bem como a dispensa da apresentação de alegações.

Em 28-07-2016 foi proferido despacho a ordenar a notificação da Requerente para, em 10 dias, se pronunciar sobre o pedido da A.T.A. de dispensa de realização da reunião prevista no artigo 18º do RJAT, e de dispensa da apresentação de alegações. No mesmo despacho referiu-se também que caso a Requerente concorde com a dispensa da reunião, ficava notificada para se pronunciar sobre a matéria de exceção contida na resposta da A.T.A., no prazo de 20 dias. Constou ainda do despacho que se a Requerente não estivesse de acordo com a dispensa da reunião, seria a mesma agendada para discussão da matéria de exceção.

Uma vez que a Requerente não se pronunciou, em 14-10-2016 foi proferido despacho a agendar a reunião do tribunal arbitral para o dia 22-11-2016, pelas 14:30 horas.

Em 31-10-2016, veio a Requerente juntar aos autos procuração a favor de novos mandatários.

No dia 22-11-2016, compareceram à reunião o mandatário da Requerente, Dr. B…, e as juristas em representação da Requerida, Dra C… e Dra D… .

Nesta reunião, o tribunal notificou a Requerida para juntar, em 10 dias, aos autos o projeto de decisão notificado para efeito de audição prévia.

O tribunal notificou ainda ambas as partes para apresentarem alegações escritas no prazo de dez dias, a contar de forma sucessiva.

Foi decidido também proceder-se à prorrogação por dois meses do prazo referido no artigo 21º n.º 1 do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), e foi designado o dia 15-02-2017 para o efeito da prolação da decisão arbitral.

Por último, foi advertida a Requerente para, até à data da prolação da decisão, proceder ao pagamento da taxa arbitral subsequente.

Em 07-12-2016, a Requerente juntou aos autos o projeto de decisão do procedimento de revisão oficiosa do ato tributário, contendo a fundamentação do pedido de revisão.

A Requerente juntou as suas alegações em 12-12-2016. E a AT apresentou alegações em 19-12-2016.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (artigos 4º e 10º n.º 1 e 2 do RJAT e artigo 1º da Portaria n.º 112-A/2011 de 22 de março).

O presente pedido de pronúncia arbitral foi apresentado tempestivamente, nos termos do artigo 10º n.º 1 alínea a) do Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de janeiro.

O processo não enferma de nulidades e não foram suscitadas questões prévias.

 

2. Da exceção de incompetência do Tribunal Arbitral

Na sua resposta, a Requerida apresenta defesa por exceção, alegando a incompetência material absoluta do Tribunal Arbitral para apreciar os atos de indeferimento dos pedidos de revisão oficiosa que não comportem a apreciação da legalidade dos atos de liquidação.

A A.T.A. refere que o artigo 97º do CPPT impõe que a impugnação de atos administrativos em matéria tributária só pode ser feito, no processo judicial tributário, através da impugnação judicial ou da ação administrativa especial, conforme esses atos comportem, ou não, a apreciação da legalidade de atos administrativos de liquidação.

Assim, para a A.T.A., o indeferimento de pedido de revisão de atos tributários apenas poderão ser impugnados através de impugnação judicial ou pedido arbitral quando comportem a apreciação da legalidade do ato de liquidação. E consequentemente, o ato de indeferimento liminar de uma revisão oficiosa de ato de liquidação por intempestividade, porque não comporta a apreciação da legalidade desta, só pode ser objeto de ação administrativa especial, que não integra as competências do CAAD. 

A questão que se coloca é a de saber se o Tribunal Arbitral é competente para apreciar o pedido de pronúncia arbitral interposto na sequência de despacho de indeferimento liminar de pedido de revisão da liquidação por intempestividade.

Analisando o projeto de decisão de indeferimento do pedido de revisão que foi junto aos autos pela Requerente em 07-12-2016, e do qual consta a fundamentação da decisão de indeferimento liminar do referido pedido, verificámos que a A.T.A. considerou que o pedido de revisão era intempestivo. A A.T.A. entendeu que o pedido de revisão teria que ser feito no prazo de 120 dias a contar da data limite de pagamento do imposto, nos termos dos artigos 70º e 102º do CPPT. Tendo em conta que o prazo limite de pagamento terminou em 30-11-2014 e o pedido de revisão deu entrada em 12-11-2015, a A.T.A. concluiu pela intempestividade do pedido. Não entraremos aqui no conhecimento do mérito ou demérito dessa decisão, mas sempre diremos que a A.T.A. não chegou a apreciar nesse procedimento a liquidação de imposto de selo em causa.

Analisemos a competência atribuída aos tribunais arbitrais que funcionam junto do CAAD.

O artigo 2º do RJAT dispõe que:

“1 — A competência dos tribunais arbitrais compreende a apreciação das seguintes pretensões:
a) A declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta;

b) A declaração de ilegalidade de actos de fixação da matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, de actos de determinação da matéria colectável e de actos de fixação de valores patrimoniais.”.

Em face desta disposição legal, deve entender-se como Lopes de Sousa, que a competência dos tribunais arbitrais se restringe “à atividade conexionada com atos de liquidação de tributos, ficando fora da sua competência a apreciação da legalidade de atos administrativos de indeferimento total ou parcial ou de revogação de isenções ou outros benefícios fiscais, quando dependentes de reconhecimento da Administração Tributária, bem como de outros administrativos relativos a questões tributárias que não comportem apreciação do ato de liquidação, a que se refere a alínea p) do n.º 1 do art. 97.º do CPPT”[1].

Tal como se refere na decisão do CAAD do processo n.º 237/2014-T, a apreciação da competência do tribunal arbitral envolve um juízo sobre a adequação ao caso em concreto do meio processual da ação administrativa especial ou do processo de impugnação judicial, em atenção ao disposto no artigo 97º do CPPT, que procede à definição dos respetivos campos de aplicação distinguindo a impugnação dos atos administrativos em matéria tributária que comportem a legalidade do ato de liquidação e o recurso contencioso do indeferimento total ou parcial ou da revogação de isenções ou outros benefícios fiscais, quando dependentes de reconhecimento da administração tributária, bem como de outros atos administrativos relativos a questões tributárias que não comportem a apreciação da legalidade do ato de liquidação, sendo que, nos termos do n.º 2 do art.º 97º, o recurso contencioso dos atos administrativos em matéria tributária, que não comportem a apreciação da legalidade do ato de liquidação, da autoria da administração tributária, compreendendo o governo central, os governos regionais e os seus membros, mesmo quando praticados por delegação, é regulado pelas normas sobre processo nos tribunais administrativos.

A Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, aprovada ao abrigo do artigo 4.º n.º 1 do RJAT, estabelece os termos de vinculação da Administração Tributária à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam junto do CAAD, tendo determinado a vinculação da A.T.A. à apreciação de pretensões relativas a impostos, com as exceções previstas nas alíneas a) a d) do artigo 2.º daquela portaria. No entanto, neste caso, não está em causa a aplicação de qualquer uma daquelas exceções.

Assim, entende-se que a competência dos tribunais arbitrais compreende a apreciação da legalidade de atos de liquidação de tributos, ou seja, atos através dos quais se apura o valor do imposto a pagar. Todavia, o sujeito passivo pode optar por proceder à impugnação direta do ato tributário ou, em alternativa, optar pela via administrativa e, posteriormente, intentar a respetiva impugnação judicial ou pedido de pronúncia arbitral, em caso de indeferimento, expresso ou tácito.

Nos presentes autos, a Requerente apresentou pedido de revisão oficiosa da liquidação de Imposto de Selo, referente ao ano de 2013, devida pela aplicação da verba n.º 28.1 da TGIS, ao prédio de que é proprietária.

O pedido de revisão foi indeferido, por despacho do Chefe do Serviços de Finanças de ...…, de 28-01-2016, proferido nos seguintes termos: “Concordo, pelo que rejeito liminarmente o pedido nos termos e com os fundamentos constantes do projeto de decisão oportunamente notificado. Notifique-se, informando o requerente que deste despacho poderá, querendo, recorrer hierarquicamente, no prazo de 30 dias a contar da notificação, nos termos do n.º 1 do artigo 66º do Código do Procedimento e de Processo Tributário (CPPT)”.

Por sua vez, o projeto de decisão, proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças de ... …, de 25-11-2015, refere o seguinte: “Nos termos da informação e proposta infra, com as quais concordo, projeto a rejeição liminar do pedido por extemporâneo. Notifique-se o requerente para, querendo, exercer o direito de audição prévia, por escrito, no prazo de 15 (quinze) dias, nos termos do artigo 60º da Lei Geral Tributária”.

Do exposto resulta, tal como entendeu a decisão do CAAD do processo n.º 112/2015-T, a conclusão de que a A.T.A. não apreciou a legalidade da liquidação.

E tal como no caso do processo do CAAD n.º 112/2015-T, o ato que se encontra em causa, que constitui o objeto imediato dos presentes autos, é a decisão de indeferimento, por extemporaneidade, do pedido de revisão do ato tributário e não a liquidação de Imposto de Selo.

Sobre este assunto, também já se pronunciaram as decisões do CAAD dos processos n.º 73/2012-T, 210/2013-T e 237/2014-T, que consideraram que está excluída da jurisdição arbitral a apreciação de atos de indeferimento de pedidos de revisão oficiosa que não comportem a apreciação da legalidade de atos de liquidação.

Estamos, assim, perante um ato administrativo em matéria tributária que, por não apreciar ou discutir a legalidade do ato de liquidação, não pode ser sindicável através da impugnação judicial, nos termos previstos na alínea a) do n.º 1 do artigo 97º do CPPT e do artigo 2º do RJAT (veja-se acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 28-04-2010 do processo n.º 0120/09), o que vale a dizer, que não cabe no âmbito da competência material dos Tribunais Arbitrais.

Serena Cabrita Neto e Carla Castelo Trindade, in Contencioso Tributário, Volume I, Almedina, 2017, referem que “o ato de indeferimento do pedido de revisão oficiosa será sempre passível de recurso hierárquico, nos termos do artigo 76º, n.º 1 do CPPT e 80º da LGT. Poderá ser ainda objeto de impugnação judicial e de pedido de constituição do tribunal arbitral ou de ação administrativa, consoante o ato comporte ou não, respetivamente, a apreciação da legalidade os atos de liquidação”.

O acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 12-05-2016, do processo n.º 01886/09.9, decidiu que o meio processual adequado “para reagir contra despacho de indeferimento de pedido de revisão oficiosa com fundamento em extemporaneidade do pedido é a ação administrativa especial, uma vez que não comporta a apreciação da legalidade do ato de liquidação”.

Com efeito, este Tribunal Arbitral é materialmente incompetente para apreciar e decidir o pedido objeto do litígio em causa, nos termos do artigo 2º n.º 1 alínea a) e artigo 4º n.º 1 do RJAT e dos artigos 1º e 2º alínea a) da Portaria n.º 112-A/2011 de 22-03-2011, o que consubstancia uma exceção dilatória impeditiva do conhecimento do mérito da causa, nos termos do disposto no artigo 576º n.º 1 e 2 do CPC, aplicável por força do artigo 2º alínea e) do CPPT e artigo 29º n.º 1 alíneas a e e) do RJAT, que obsta ao conhecimento do pedido e à absolvição da instância da AT, nos termos dos artigos 576º n.º 2 e 577º alínea a) do CPC, aplicável por força do artigo 29º n.º 1 alíneas a) e e) do RJAT.

Tem assim que proceder a exceção de incompetência do Tribunal Arbitral suscitada pela Requerida.

Fica, nestes termos, prejudicado o conhecimento da questão de mérito.

 

3. Do pedido da Requerente de reconhecimento do direito a apresentar a competente ação administrativa

Em sede de alegações, a Requerente “admite que a presente ação arbitral poderá não ser o meio próprio para contestar tal decisão, ainda que no pedido de revisão oficiosa que precede esta ação arbitral a Requerente tenha efetivamente pretendido contestar a legalidade dos respetivos atos tributários de liquidação de IS”. E alega que o evidenciado erro na forma de processo não poderá considerar-se como imputável à Requerente, uma vez que a notificação da A.T.A. era omissa quanto ao meio judicial suscetível de ser utilizado para contestar a legalidade da respetiva decisão administrativa.

A Requerente faz referência ao artigo 24º n.º 3 do RJAT, afirmando que o mesmo visa acautelar os efeitos da inaplicabilidade do regime da convolação no domínio da jurisdição arbitral, permitindo que o sujeito passivo, na sequência da prolação de uma decisão arbitral de absolvição da instância, possa ainda apresentar o meio de reação adequado para obter uma decisão de mérito.

Conclui a Requerente solicitando, na sequência da absolvição da Requerida da instância, o reconhecimento do direito daquela apresentar a competente ação administrativa.

Ainda que a Requerente se encontrasse em tempo de requerer o reconhecimento do direito de apresentar a ação administrativa, sempre seria de não atender a pretensão da Requerente.

A possibilidade de apresentação de uma nova ação está prevista no n.º 3 do artigo 24.º do RJAT, para os casos em que a decisão arbitral ponha termo ao processo sem conhecer do mérito da pretensão por facto não imputável ao sujeito passivo.

A Requerente sustenta o seu pedido na decisão do CAAD do processo n.º 270/2015-T. No entanto, nos presentes autos não estamos perante factos semelhantes aos que constam do processo n.º 270/2015-T. Nesse processo a notificação da A.T.A. induziu de facto em erro, ao informar o sujeito passivo que do despacho poderia deduzir impugnação judicial, bem como requerer ao CAAD – Centro de Arbitragem Administrativa a constituição de tribunal arbitral, nos termos da alínea a) do n.º 10 do Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de janeiro e da Portaria n.º 112-A/2011 de 22 de março.

Já nos presentes autos, a notificação da decisão de indeferimento do pedido de revisão refere que “deste despacho poderá, querendo, recorrer hierarquicamente, no prazo de 30 dias a contar da notificação, nos termos do n.º 1 do artigo 66º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT)”, não fazendo qualquer referência ao pedido arbitral junto do CAAD. E a Requerente optou, naturalmente de forma voluntária, por não seguir as indicações constantes da decisão de indeferimento que lhe foi notificada, não interpondo recurso hierárquico, mas sim interpondo um pedido de constituição do tribunal arbitral junto do CAAD.

Por outro lado, a Requerente, considerando que a notificação era insuficiente por falta de indicação de todos os meios de defesa, tinha a faculdade de requerer a notificação dos elementos omitidos (meios de defesa), nos termos do artigo 37º n.º 1 do CPPT, tal como de decidiu no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 08-07-2015 do processo n.º 0389/15.

Pelo que, sempre se diria que o erro na forma de processo é imputável à Requerente e, consequentemente, não seria de lhe reconhecer o direito a interpor a competente ação administrativa.

 

4. Decisão

Em face do exposto, determina-se:

a) julgar procedente a exceção dilatória de incompetência em razão da matéria deduzida pela Requerida;

b) absolver a Requerida da instância (artigos 96º e 278º do Código de Processo Civil);

c) julgar em consequência, prejudicado o conhecimento da questão de mérito.

 

 

5. Valor do processo:

De acordo com o disposto no artigo 315º, n.º 2, do CPC e 97º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 3º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se o valor da ação em 11.537,70 €.

 

6. Custas:

Nos termos do artigo 22º, n.º 4, do RJAT, e da Tabela I anexa ao Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em 918,00 € devidas pela Requerente.

 

Notifique.

 

Lisboa, 15 de fevereiro de 2017.

 

Texto elaborado por computador, nos termos do artigo 138º, n.º 5 do Código do Processo Civil (CPC), aplicável por remissão do artigo 29º, n.º 1, alínea e) do Regime de Arbitragem Tributária, por mim revisto.

O árbitro singular

 

 

Suzana Fernandes da Costa

 

 



[1] Jorge Lopes de Sousa, Comentário ao Regime Jurídico da Arbitragem Tributária in Guia da Arbitragem Tributária, Almedina, 2013, p. 105.