DECISÃO ARBITRAL
1. Relatório
A - Geral
1.1. A…, S.A., com o número único de matrícula e de pessoa colectiva…, com sede na …, Apartado…, …-… … (de ora em diante designada “Requerente”), apresentou, no dia 30.03.2016, um pedido de constituição do tribunal arbitral em matéria tributária, que foi aceite, visando, por um lado, a anulação da decisão de indeferimento da reclamação graciosa n.º …2015…, apresentada pela Requerente como reacção ao acto de autoliquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (de ora em diante “IRC”), respeitante ao exercício de 2013, que lhe foi comunicada pelo Ofício … de 30.12.2015 da Direcção de Finanças de…, com o consequente reembolso do montante de imposto indevidamente pago e, por outro, o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios pelo pagamento indevido de prestação tributária.
1.2. Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do art.º 6.º e da alínea b) do n.º 1 do art.º 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, na redacção que lhe foi dada pelo art.º 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) designou o signatário como árbitro, não tendo as Partes, depois de devidamente notificadas, manifestado oposição a essa designação.
1.3. Por despacho de 14.04.2016, a Administração Tributária e Aduaneira (de ora em diante designada “Requerida”) procedeu à designação das Senhoras Dra. B… e Dra. C… para intervirem no presente processo arbitral, em nome e representação da Requerida.
1.4. Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do art.º 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, na redacção que lhe foi dada pelo art.º 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral foi constituído a 13.06.2016.
1.5. No dia 14.06.2016 foi notificado o dirigente máximo do serviço da Requerida para, querendo, no prazo de 30 dias, apresentar resposta e solicitar produção de prova adicional e bem assim para juntar aos autos cópia do respectivo processo administrativo.
1.6. No dia 02.09.2016 a Requerida apresentou a sua resposta.
B – Posição da Requerente
1.7. A Requerente, relativamente ao período de tributação de 2013, na declaração de rendimentos Modelo 22, apurou o montante total de € 41.780,00 (quarenta e um mil setecentos e oitenta euros) relativo a tributações autónomas, dos quais € 37.188,00 correspondentes a gastos com viaturas ligeiras de passageiros e € 4.592,00 correspondentes a gastos com despesas de representação.
1.8. Os gastos subjacentes às tributações autónomas ora em questão foram incorridos com um claro e evidente propósito empresarial: a promoção dos produtos comercializados pela Requerente.
1.9. A Requerente apresentou Reclamação Graciosa (a que coube o n.º …2015…) por erro na autoliquidação, por entender que as referidas tributações autónomas haviam sido indevidamente liquidadas, dado o carácter integralmente empresarial dos gastos que lhe estão associados, tendo a mesma sido indeferida.
1.10. A tributação autónoma, no entendimento do Tribunal Constitucional, funciona como um mecanismo de tributação instantânea sobre determinadas despesas.
1.11. O legislador elencou as despesas que deverão ser sujeitas a tributação autónoma, tendo para o efeito adoptado uma presunção de não empresarialidade.
1.12. Para se determinar se um acto de despesa é ou não sujeito a tributação autónoma terá de verificar-se, primeiro, se o tipo de despesa em causa consta do elenco do art.º 88.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (adiante, “CIRC”) e, depois, em caso de resposta afirmativa, haverá que avaliar a “empresarialidade integral” desse acto de despesa, caso em que se afasta a presunção legal e, consequentemente, a susceptibilidade de tributação autónoma desses gastos.
1.13. Sendo a sujeição de determinados gastos a tributação autónoma baseada na presunção da sua não empresarialidade, não pode deixar de concluir-se pela susceptibilidade de ilisão dessa mesma presunção, nos termos do disposto no art.º 73.º da Lei Geral Tributária (adiante, “LGT”).
1.14. Entende ainda a Requerente que as normas em que assentam as tributações autónomas possuem carácter anti-abuso pelo que tem de ser admitida a ilisão das presunções sob pena de violação do Direito da União Europeia.
1.15. Os encargos com viaturas ligeiras de passageiros incorridos pela Requerente constituem gastos inerentes à prossecução do respectivo objecto social e, consequentemente, gastos com causa estritamente empresarial, já que as viaturas são utilizadas pelos colaboradores a quem estão confiadas as funções de comercialização, publicitação e apresentação dos produtos comercializados pela Requerente (comerciais e directores), sendo preciosos instrumentos de trabalho daqueles que, pelas suas funções têm de realizar, pelo país todo, constantes deslocações.
1.16. As despesas de representação em crise (arrendamento de espaços para eventos, publicidade, catering) inserem-se na estratégia comunicacional e de marketing previamente definido e calendarizado pelo grupo económico a que a Requerente pertence, nos termos de normativos internos, visando, através de eventos como o “...”, a angariação de clientes e a realização de vendas.
1.17. Foram ainda realizados diversos seminários e cursos para profissionais da construção civil.
1.18. Não existe qualquer cariz privado nas despesas de representação ora em crise, sendo objectiva e integralmente empresariais.
1.19. Peticiona ainda a Requerente, nos termos dos art.ºs 43.º e 100.º da LGT, a percepção de juros indemnizatórios uma vez que pagou imposto superior ao devido, pagamento que resultou de erro imputável aos serviços.
C – Posição da Requerida
1.20. A Requerida, na sua resposta, deixa claro o entendimento segundo o qual as normas que estabelecem tributações autónomas são indubitavelmente normas de incidência tributária, não consagrando nenhuma presunção cuja prova em contrário possa ser admitida.
1.21. Na origem das tributações autónomas sobre as viaturas e as despesas de representação não está a presunção de não empresarialidade integral dos gastos, já que se eles não se inscrevessem no interesse geral da empresa não seria sequer aceite a sua dedutibilidade, por falta de preenchimento do requisito da indispensabilidade a que se refere o n.º 1 do art.º 23.º do CIRC.
1.22. As normas que estabelecem a tributação autónoma de determinadas realidades resultam de uma ponderação legislativa de vários factores, como sejam a virtual impossibilidade de aferição da natureza de cada despesa em concreto e a dificuldade de se aquilatar com segurança da verdadeira finalidade do gasto e da exclusividade dessa finalidade.
1.23. As tributações autónomas são impostos que penalizam determinados encargos incorridos pelas empresas, não devendo ser minimizada a pretensão desincentivadora e de modelação de comportamentos que assiste também ao Direito Fiscal.
1.24. Admitir à Requerente a prova da alegada empresarialidade integral dos gastos que autorizam as tributações autónomas constitui uma violação do princípio da legalidade tributária, na vertente da generalidade e abstracção, e do princípio da igualdade na vertente fiscal, que decorrem do disposto nos artigos 13.º e 103.º da Lei Fundamental.
1.25. Acresce que não poderá ter-se por suficiente a mera prova testemunhal, quando a possibilidade que a lei prevê para o contribuinte se eximir à imposição fiscal em causa é de natureza documental.
1.26. Por último, entende a Requerida não serem devidos juros indemnizatórios por não haver qualquer erro imputável aos serviços.
D – Conclusão do Relatório e Saneamento
1.27. No dia 28.11.2016, pelas 14h, teve lugar a reunião a que se refere o art.º 18.º do RJAT, tendo sido inquirida a testemunha arrolada, marcados os prazos para a apresentação das alegações e fixada a data para a prolação da decisão, que se previu pudesse ter lugar até ao dia 17.01.2017.
1.28. No dia 07.12.2016 a Requerente apresentou as suas alegações, que corroboram o sustentado no pedido de pronúncia arbitral, estranhando que a Requerida, na sua resposta, tenha invocado a ausência de prova documental idónea para ser ilidida a presunção, quando nunca esse argumento havia sido expendido na fase administrativa nem solicitada qualquer informação ou documento adicional nos termos do princípio da colaboração a que faz apelo o art.º 75.º da LGT, sendo certo que o que está em apreciação nos autos é a legalidade do acto de indeferimento tal como ele foi praticado, à data a que se reportam os factos, pela Requerida.
1.29. No dia 13.12.2016, por seu turno, apresentou a Requerida as suas contra-alegações, que sufragam o anteriormente expendido na resposta.
1.30. O tribunal arbitral é materialmente competente, nos termos do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, al. a) do RJAT.
1.31. As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade nos termos do art.º 4.º e do n.º 2 do art.º 10.º do RJAT, e art.º 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.
1.32. A cumulação de pedidos efectuada no presente pedido de pronúncia arbitral, em homenagem ao princípio da economia processual, justifica-se uma vez que o art.º 3.º do RJAT, ao admitir expressamente a possibilidade de “cumulação de pedidos ainda que relativos a diferentes actos”, acomoda, sem abuso hermenêutico, a apreciação de um pedido que decorre, em termos necessários, do juízo que o tribunal arbitral sufrague quanto à validade da liquidação mediatamente posta em crise.
1.33. O processo não padece de qualquer nulidade nem foi invocada qualquer excepção, pelo que pode passar-se de imediato ao conhecimento do mérito da causa.
2. Matéria de facto
2.1. Factos provados
Dão-se por provados os seguintes factos:
2.1.1. A Requerente, relativamente ao período de tributação de 2013, na declaração de rendimentos Modelo 22, apurou o montante total de € 41.780,00 (quarenta e um mil setecentos e oitenta euros) relativo a tributações autónomas, dos quais € 37.188,00 correspondentes a gastos com viaturas ligeiras de passageiros e € 4.592,00 correspondentes a gastos com despesas de representação (docs. 2 e 3, juntos com o pedido de pronúncia arbitral).
2.1.2. A Requerente apresentou Reclamação Graciosa (a que coube o n.º …2015…) por erro na autoliquidação, por entender que as referidas tributações autónomas haviam sido indevidamente liquidadas (doc. 4, junto com o pedido de pronúncia arbitral).
2.1.3. A Reclamação Graciosa referida em 2.1.2. foi indeferida, não tendo sido acolhidos os argumentos apresentados pela Requerente (doc. 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral).
2.1.4. A Requerente prossegue, entre outras, a actividade de comercialização de produtos químicos para a construção (art.º 1 do pedido de pronúncia arbitral).
2.1.5. Os colaboradores da Requerente afectos à função comercial e de assistência técnica costumam realizar deslocações a clientes e a potenciais clientes (pedido de pronúncia arbitral e depoimento da testemunha inquirida).
2.1.6. A Requerente, à data dos factos, tinha 20 (vinte) viaturas ligeiras de passageiros ao seu serviço, das quais 14 (catorze) atribuídas aos colaboradores com funções ditas comerciais, 1 (uma) a um técnico de assistência técnica e 5 (cinco) a directores (doc. 6, junto com o pedido de pronúncia arbitral).
2.1.7. São sujeitas a tributação autónoma os seguintes encargos com viaturas ligeiras de passageiros ao serviço da Requerente: renda dos respectivos alugueres operacionais; seguros; combustíveis e portagens (depoimento da testemunha e art.º 35.º das alegações apresentadas pela Requerente).
2.1.8. A Requerente controla os quilómetros, combustíveis e portagens das viaturas ao seu serviço e todos os encaros que a Requerente detecte não terem uma causa empresarial não são por ela suportados, sendo debitados aos colaboradores em causa (depoimento da testemunha e Conclusão XII das alegações apresentadas pela Requerente).
2.1.9. As condições de utilização das viaturas foram comunicadas aos colaboradores e são deles conhecidas (depoimento da testemunha e art.º 44.º das alegações apresentadas pela Requerente).
2.1.10. Os colaboradores a quem são entregues as viaturas que a Requerente tem ao seu serviço podem (no sentido em que pode dar-se o caso de que o façam) usá-las para fins não empresariais, nas férias, feriados e fins-de-semana e, por maioria de razão, em dias úteis em que tenham estado a trabalhar, sem prejuízo de, sempre que isso seja detectado lhes serem imputadas as despesas de combustíveis e portagens tidas por não empresariais (depoimento da testemunha e art.º 43.º das alegações apresentadas pela Requerente).
2.1.11. A Requerente organiza eventos promocionais relativamente à apresentação de produtos que comercializa, que visam promover a marca da Requerente, nomeadamente o “…” (docs. 7 a 9, juntos com o pedido de pronúncia arbitral).
2.1.12. As despesas de representação a que aludem os presentes autos referem-se a arrendamento de espaços para eventos, publicidade, catering (art.º 136.º do pedido de pronúncia arbitral).
2.2. Factos não provados
Não há factos relevantes para a apreciação do mérito da causa que hajam sido dados como não provados.
2.3. Fundamentação da fixação da matéria de facto
Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos aos autos pelas Partes, nas posições por elas assumidas nos articulados apresentados e no depoimento da testemunha inquirida.
3. Matéria de direito
3.1. Questões a decidir
Resulta do que acima se deixou dito que as questões a apreciar são, no fundo, as seguintes:
a) Saber se as normas que estabelecem as tributações autónomas que nos ocupam constituem presunções, se, em caso afirmativo, poderão elas ser susceptíveis de ilisão e, se for a resposta afirmativa, se, no caso dos autos, a Requerente logrou ilidi-las; e
b) A de esclarecer se, caso se julgue procedente o pedido de declaração de ilegalidade do indeferimento da reclamação graciosa apresentada pela Requerente com a consequente anulação da autoliquidação de IRC mediatamente contestada, a Requerente, no âmbito do presente processo arbitral poderá obter a condenação da Requerida no pagamento de juros indemnizatórios relativamente à quantia por si entregue para satisfação da prestação tributária indevida.
3.2. As tributações autónomas
a) Geral
O regime das tributações autónomas é o resultado de numerosas alterações legislativas. A sujeição de determinadas despesas a tributação autónoma surgiu com o Decreto-Lei n.º 192/90, de 2 de Junho, num contexto de penalização da tributação das despesas confidenciais ou não documentadas incorridas pelas empresas.
Foi só com a reforma fiscal de 2001 que se estendeu a tributação autónoma às despesas de representação e às despesas com viaturas e, depois, a um conjunto muito diverso de realidades nos termos que hoje se encontram previstos no CIRC no Capítulo IV relativo às taxas, juntamente com a Derrama Estadual[1].
Sob a epígrafe “Taxas de tributação autónoma”, dispunha o art.º 88.º do CIRC, na redacção vigente à data dos factos e para o que aqui nos interessa o seguinte:
3 - São tributados autonomamente à taxa de 10 % os encargos efectuados ou suportados por sujeitos passivos não isentos subjectivamente e que exerçam, a título principal, actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, relacionados com viaturas ligeiras de passageiros ou mistas cujo custo de aquisição seja igual ou inferior ao montante fixado nos termos da alínea e) do n.º 1 do artigo 34.º, motos ou motociclos, excluindo os veículos movidos exclusivamente a energia eléctrica.
4 - São tributados autonomamente à taxa de 20 % os encargos efectuados ou suportados pelos sujeitos passivos mencionados no número anterior, relacionados com viaturas ligeiras de passageiros ou mistas cujo custo de aquisição seja superior ao montante fixado nos termos da alínea e) do n.º 1 do artigo 34.º.
5 - Consideram-se encargos relacionados com viaturas ligeiras de passageiros, motos e motociclos, nomeadamente, depreciações, rendas ou alugueres, seguros, manutenção e conservação, combustíveis e impostos incidentes sobre a sua posse ou utilização.
6 — Excluem-se do disposto no n.º 3 os encargos relacionados com viaturas ligeiras de passageiros, motos e motociclos, afectos à exploração de serviço público de transportes, destinados a serem alugados no exercício da actividade normal do sujeito passivo, bem como as depreciações relacionadas com viaturas relativamente às quais tenha sido celebrado o acordo previsto no n.º 9) da alínea b) do n.º 3 do artigo 2.º do Código do IRS.
7 - São tributados autonomamente à taxa de 10 % os encargos dedutíveis relativos a despesas de representação, considerando-se como tal, nomeadamente, as despesas suportadas com recepções, refeições, viagens, passeios e espectáculos oferecidos no País ou no estrangeiro a clientes ou fornecedores ou ainda a quaisquer outras pessoas ou entidades.
A redacção hoje vigente é esta:
3 — São tributados autonomamente os encargos efectuados ou suportados por sujeitos passivos que não beneficiem de isenções subjectivas e que exerçam, a título principal, actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, relacionados com viaturas ligeiras de passageiros, viaturas ligeiras de mercadorias referidas na alínea b) do n.º 1 do artigo 7.º do Código do Imposto sobre Veículos, motos ou motociclos, excluindo os veículos movidos exclusivamente a energia eléctrica, às seguintes taxas:
a) 10 % no caso de viaturas com um custo de aquisição inferior a (euro) 25.000;
b) 27,5 % no caso de viaturas com um custo de aquisição igual ou superior a (euro) 25.000 e inferior a (euro) 35.000;
c) 35 % no caso de viaturas com um custo de aquisição igual ou superior a (euro) 35.000.
4 — (Revogado)
5 — Consideram-se encargos relacionados com viaturas ligeiras de passageiros, motos e motociclos, nomeadamente, depreciações, rendas ou alugueres, seguros, manutenção e conservação, combustíveis e impostos incidentes sobre a sua posse ou utilização.
6 — Excluem-se do disposto no n.º 3 os encargos relacionados com:
a) Viaturas ligeiras de passageiros, motos e motociclos, afectos à exploração de serviço público de transportes, destinados a serem alugados no exercício da actividade normal do sujeito passivo; e
b) Viaturas automóveis relativamente às quais tenha sido celebrado o acordo previsto no n.º 9) da alínea b) do n.º 3 do artigo 2.º do Código do IRS.
7 - São tributados autonomamente à taxa de 10 % os encargos dedutíveis relativos a despesas de representação, considerando-se como tal, nomeadamente, as despesas suportadas com recepções, refeições, viagens, passeios e espectáculos oferecidos no País ou no estrangeiro a clientes ou fornecedores ou ainda a quaisquer outras pessoas ou entidades.
17 - No caso de viaturas ligeiras de passageiros híbridas plug-in, as taxas referidas nas alíneas a), b) e c) do n.º 3 são, respectivamente, de 5 %, 10 % e 17,5 %.
18 - No caso de viaturas ligeiras de passageiros movidas a GPL ou GNV, as taxas referidas nas alíneas a), b) e c) do n.º 3 são, respectivamente, de 7,5 %, 15 % e 27,5 %.
b) A natureza jurídica das tributações autónomas
Quando se fala em tributações autónomas é conveniente desde logo ter presente que está em causa um conjunto de situações díspares, que abrangerão, pelo menos, três tipos distintos, a saber:
-
Tributação autónoma de determinados rendimentos (ex.: n.ºs 3, 5 e 6 do CIRS);
-
Tributação autónoma de determinados encargos dedutíveis (ex.: n.ºs 3 e 4 do artigo 88.º do CIRC);
-
Tributação autónoma de outros encargos independentemente da respectiva dedutibilidade (ex.: artigos 1 e 2 do artigo 88.º do CIRC).
Este esforço analítico, atenta a disparidade e heterogeneidade das situações abrangidas, mostra não ser recomendável a tentativa de as reconduzir a uma natureza jurídica própria e unitária[2]. Numa leitura simplificada, dir-se-ia que estas regras gravitam em torno de duas preocupações principais: a de evitar a evasão fiscal (despesas não documentadas, pagamentos a não residentes sujeitos a um regime fiscal claramente mais favorável, ajudas de custo e gastos com viaturas) e a de notar a insusceptibilidade de aferir, com segurança, da indispensabilidade do gasto face ao disposto no art.º 23.º do CIRC (despesas de representação)[3].
A existência de tributações autónomas explica-se pela “necessidade de prevenir e evitar que, através dessas despesas, as empresas procedam à distribuição camuflada de lucros, enquanto lucros da sociedade, bem como combater a fraude e evasão fiscais que tais despesas equacionem”[4]. Com elas “o legislador procura responder à questão reconhecidamente difícil do regime fiscal de despesas que se encontram numa zona de intersecção da esfera pessoal e da esfera empresarial, de modo a evitar remunerações em espécie mais atraentes por razões exclusivamente fiscais ou a distribuição oculta de lucros (…) Cria-se aqui uma espécie de presunção de que estes custos não têm uma causa empresarial (…) Em resumo, o custo é dedutível, mas a tributação autónoma reduz a sua vantagem fiscal, uma vez que aqui a base de incidência não é um rendimento líquido, mas, sim, um custo transformado – excepcionalmente – em objecto de tributação”[5].
O objectivo parece ser o de tentar evitar (atenuando ou anulando a “vantagem” delas resultantes em IRC) que, através dessas despesas, o sujeito passivo utilize para fins não-empresariais bens que geraram custos fiscalmente dedutíveis; ou que sejam pagas remunerações a terceiros com evasão aos impostos que seriam devidos por estes. A realização de tais despesas implica um encargo fiscal adicional para quem nelas incorre porque a lei supõe que, assim, outra pessoa deixa de pagar imposto[6].
Há quem veja nas regras que impõem as tributações autónomas, pelos menos as que respeitam às despesas confidenciais e às referentes a viaturas, presunções. Outros, porém, vêem nelas normas de incidência, recortando o âmbito de sujeição de um verdadeiro tributo, directamente incidente sobre a despesa.
c) As tributações autónomas como expressão da consagração de presunções legais?
Como se viu, parece detectar-se aqui a presença de uma espécie de presunção de que os custos associados às tributações autónomas, ou a algumas delas, pelo menos, não têm uma causa empresarial ou, diríamos nós, uma causa empresarial exclusiva[7].
Também no CAAD a questão tem sido apreciada e não são poucas as decisões que têm concluído no sentido da natureza presuntiva das tributações autónomas.
Vale a pena atentar no que é dito com lapidar clareza na Decisão Arbitral do Processo n.º 628/2014-T:
“Sob o prisma que vem de se expor, as tributações autónomas em análise terão então materialmente subjacente uma presunção de empresarialidade “parcial” das despesas sobre que incidem, em função da supra-apontada circunstância de tais despesas se situarem numa linha cinzenta que separa aquilo que é despesa empresarial, produtiva, daquilo que é despesa privada, de consumo, sendo que, notoriamente, em muitos casos, a despesa terá efetivamente na realidade uma dupla natureza (parte empresarial, parte particular).
Confrontado com tal dificuldade, o legislador, em lugar de simplesmente afastar a sua dedutibilidade, ou inverter o ónus da prova da empresarialidade das despesas em questão (impondo, por exemplo, a demonstração de que “não têm um carácter anormal ou um montante exagerado”, como faz nos artigos 65.º/1 e 88.º/8 do CIRC), optou por consagrar o regime actualmente vigente, que, não obstante, tem precisamente o mesmo fundamento, a mesma finalidade, e o mesmo tipo de resultado, que outras formas utilizadas noutras situações típicas do regime (no caso) do IRC.
Assim, do facto conhecido que é a realização de determinado tipo de gastos, o legislador tira o facto desconhecido, que é a aferição do grau de afectação empresarial do produto de tais gastos.
E será este facto desconhecido, presumido pelo legislador, que desencadeia e justifica a tributação autónoma em questão no presente processo. Com efeito, foi por presumir que as despesas sobre que incide aquela tributação autónoma têm, por norma, uma afectação mista, havendo, por isso, um benefício injustificado na sua dedução integral, que o legislador começou, numa primeira fase, por limitar a percentagem daquelas que admitia como dedutível. Ulteriormente, por razões que pouco importarão ao caso, mas que passarão por constrangimentos de ordem orçamental, por um lado, e pela necessidade de assegurar a tributação de eventuais benefícios que particulares pudessem retirar daquelas despesas, o legislador adoptou o actual modelo de tributação autónoma das despesas que ora nos ocupam. Mas tal, não excluiu, antes complementou, aquela primitiva motivação de tributar, adequadamente, o rendimento das pessoas colectivas, distorcido pela dedução de despesas, que o legislador presume de afectação não totalmente empresarial. Ou seja: as finalidades orçamentais e, eventualmente, de tributação de fringe benefits, que possam assistir ao regime actual da tributação autónoma que nos ocupa, não excluem, antes assentam, na referida presunção de “empresarialidade parcial” das despesas sobre que recaem (e, complementarmente, na distorção da tributação do rendimento das pessoas colectivas daí decorrente).”
Ora, estando-se na presença de uma presunção, conclui-se, não poderá ser afastada a possibilidade de ela ser ilidida, nos termos do que dispõe no n.º 2 do art.º 350.º do Código Civil e no art.º 73.º da LGT.
Há quem sustente que as tributações autónomas, ou pelo menos algumas delas, como as que são confiadas à nossa atenção, integram o elenco de normas anti-abuso específicas[8]. Consubstanciam uma forma de obstar a determinadas actuações abusivas, que o “normal” funcionamento do sistema de tributação era incapaz de impedir, sendo que outras formas de combater tais actuações, incluindo formas mais gravosas para o contribuinte, eram possíveis[9]. Visam algumas delas, pura e simplesmente, penalizar comportamentos presuntivamente evasivos ou fraudulentos dos sujeitos passivos, consubstanciando um mecanismo, como se disse, anti-abusivo[10].
As tributações autónomas são, em certa medida, uma “forma de realização da tributação das pessoas colectivas que nasce da constatação da crescente incapacidade de se tributar o respectivo rendimento apenas com base no eixo tradicional do IRC”[11], não consagrando qualquer presunção ilidível para os efeitos do disposto no art.º 73.º da LGT. Embora se possa reconhecer que um dos propósitos das normas que as impõem seja o de associar a determinadas despesas uma presumível empresarialidade parcial, a intenção do legislador não se esgota nessa ratio.
Nesta linha de raciocínio as tributações autónomas surgem talhadas como genuínos “impostos indirectos e instantâneos que tributam a despesa e não o rendimento e que se distinguem claramente do IRC (…) não se relacionando sequer com a obtenção de um resultado positivo. (…) as despesas sobre as quais incide a tributação autónoma constituem factos tributários instantâneos ou de obrigação única[12].
A opção legislativa pela tributação autónoma não consagra uma presunção ilidível por aplicação do art.º 73.º da LGT. Tendo embora subjacente um juízo presuntivo da dificuldade de controlo rigoroso de certos casos, opta o legislador por tipificar situações, traduzidas, na prática, na redução do montante dos custos dedutíveis na determinação da matéria colectável[13]. O artigo 88.º do CIRC não consagra uma presunção de “empresarialidade” parcial[14].
Atente-se no que se pode ler na Decisão Arbitral do Processo n.º 52/2016-T:
“No que respeita à possibilidade de elisão da presunção, analisada a argumentação que está subjacente à decisão do tribunal arbitral proferida no processo no 628/2014-T citada pela Requerente, afastamo-nos do entendimento lá expresso nesta medida: na verdade, o artigo 88.º do CIRC não consagra uma presunção de “empresarialidade” parcial. Se consagrasse, seria indubitavelmente ilidível ao abrigo do artigo 73.º da LGT.
O que sucede é que as tributações autónomas do artigo 88.º do CIRC, sem a consagrar, assentam, i.e., buscam a sua ratio (ou parte dela) numa presunção de “empresarialidade” parcial.
Mas não é esta a sua única ratio, designadamente, no que interessa ao caso em apreço. Subjacente à tributação autónoma está também a opção do legislador de tributar em IRC ao invés de tributar em IRS na esfera dos beneficiários das despesas nas quais a empresa incorreu.
O que não é despiciendo.
Caso se entendesse que a empresa podia e lograra ilidir a dita presunção, necessário era encontrar uma forma de tributar o acréscimo patrimonial que tinha resultado da realização e tais despesas para os respetivos beneficiários. Por hipótese, que o Código do IRS contivesse uma norma que, nesse caso, permitisse considerar e forçar a englobamento, na esfera dos beneficiários, os custos incorridos pelas empresas como rendimento coletável.
Isto, pelo que supra já deixamos exposto acerca das várias razões pelas quais – concorde-se ou não - o legislador introduziu as tributações autónomas: elas são, na verdade, medidas específicas anti-abuso, introduzidas num contexto de ampla discricionariedade legislativa: o legislador pode decidir o que considera encargo dedutível (em IRC como em IVA) e o que não considera, bem como aquilo que, pelas razões já expostas, aceita como encargo por um lado, mas tributa pelo outro.
E. note-se, o abuso que o sistema de tributações autónomas pretende evitar não é apenas aquele que pode ocorrer em sede de IRC na empresa que incorre na despesa, como aquele que pode ocorrer em sede de imposto sobre o rendimento para o beneficiário da despesa.
Consideramos, portanto, que a norma do artigo 88.º do CIRC, assentando, em parte, numa presunção, na verdade não consagra qualquer presunção que, portanto, seja ilidível nos termos do artigo 73.º da LGT.”
Aqui chegados, importa tomar posição.
d) Posição adoptada
Parece-nos decisiva a já citada lição de Saldanha Sanches a este propósito. Não cremos ser razoável ignorar que estamos perante uma “espécie de presunção” de que estes custos não têm uma causa empresarial exclusiva. Contudo, dizer “espécie de presunção” e “presunção” não há-de querer significar a mesma realidade. Não hão-de ser conceitos totalmente estranhos, alheios entre si, mas não beneficiarão da mesma identidade conceptual nem serão exactamente sinónimos.
Na verdade, não subscrevemos na sua inteireza a afirmação de que “do facto conhecido que é a realização de determinado tipo de gastos, o legislador tira o facto desconhecido, que é a aferição do grau de afectação empresarial do produto de tais gastos”[15]. Ainda que aceitemos que as normas que estabelecem as tributações autónomas se baseiam numa presunção, ou que assentam numa presunção, como se lê na Decisão Arbitral do Processo n.º 52/2016-T, não vemos nelas os traços distintivos das presunções a que se referem os artigos 349.º e seg. do Código Civil.
Portanto, as tributações autónomas, a nosso ver, não consagram presunções em sentido próprio, mas não deixam de convocar o respectivo conceito na sua formulação. Cremos que era esta dimensão de certo modo híbrida que justificou a sugestiva mas fluida e pouco rigorosa expressão de Saldanha Sanches: “espécie de presunção”.
Sem prejuízo do excurso ontológico que podem merecer as tributações autónomas, e da vantagem que do esforço tendente a surpreender-lhes a essência, importa não perder de vista o caso concreto dos autos.
Ora, o que temos em mãos é saber se podem eximir-se às imposições das tributações autónomas os gastos suportados pela Requerente com as viaturas ligeiras de passageiros que tem ao seu serviço e com as despesas de representação que apurou na sua declaração de rendimentos (Modelo 22). Vejamos, então.
i) Dos gastos relativos a encargos com viaturas ligeiras de passageiros
A Requerente entende que os encargos incorridos com viaturas ligeiras de passageiros têm como objectivo a promoção dos seus produtos, sendo um instrumento de trabalho dos seus colaboradores. Considera, pois, estar demonstrada a empresarialidade desses mesmos encargos, devendo concluir-se pela sua não sujeição a tributação autónoma.
Salvo o devido respeito, nunca a empresarialidade dessas despesas esteve em causa. É aliás essa empresarialidade que justifica a dedutibilidade desses encargos nos termos do disposto no art.º 23.º do CIRC, tendo esses gastos sido deduzidos sem que tivesse havido qualquer objecção a essa dedução.
O problema, portanto, parece ser outro. A própria Requerente parece identificá-lo com acerto. Para se determinar se um acto de despesa é – ou não – sujeito a tributação autónoma, ter-se-ão de realizar duas operações:
Ø verificar se o acto de despesa em causa consta do elenco do art.º 88.º do CIRC;
Ø e, se a resposta for afirmativa, determinar a “empresarialidade integral” desse acto de despesa, afastando-se a sujeição a tributação autónoma caso se demostre que a despesa em causa é integralmente empresarial[16].
Não há dúvida de que os encargos havidos com viaturas ligeiras de passageiros constam do rol do artigo 88.º CIRC. Portanto, terá de ser determinada, agora, a “empresarialidade integral” desses mesmos gastos. Note-se que nesta afirmação o conceito de empresarialidade surge qualificado e o adjectivo usado é este: “integral”.
Aliás, a Requerente, respigando a Decisão Arbitral do Processo n.º 628/2014-T, concorda que “haverá que concluir que a presunção de «empresarialidade parcial» deverá considerar-se como abrangida pela possibilidade de ilisão genericamente consagrada no art.º 350.º/2 do Código Civil e 73.º da LGT”[17].
Portanto, a haver uma presunção – em sentido técnico-jurídico ou num sentido apenas aproximado – a ilisão passará necessariamente pela demonstração de que os gastos com viaturas ligeiras de passageiros servem apenas o interesse da empresa, estão afectos exclusivamente à prossecução das actividades da entidade empresarial. Repare-se que não basta dizer que as viaturas estão ao serviço da empresa (se não estivessem, como é evidente, nem sequer se poderia considerar a possibilidade dos respectivos encargos serem deduzidos, erodindo a matéria tributável por falta da verificação da necessária indispensabilidade). Forçoso é demonstrar que estão apenas ao serviço da empresa, não podendo os colaboradores em causa usá-las para outros fins, desde logo fins pessoais.
Ora, o que ficou demonstrado foi exactamente o contrário. As viaturas, sendo instrumentos de trabalho dos colaboradores da Requerente a quem são confiadas, podem ser usadas por eles para fins pessoais, nomeadamente, em férias, feriados e fins de semana. Contudo, quando a Requerente detecta o uso das viaturas para fins não empresariais, as respectivas despesas não são suportadas pela Requerente, sendo antes imputadas ao colaborador em causa. Mas importa perguntar se será este o controlo exigível para se poder eximir o contribuinte à sujeição da tributação autónoma. Entendemos que não. Desde logo porque o escrutínio sobre a natureza da utilização das viaturas só pode ser feito na base do confronto com as despesas que elas suscitam, nomeadamente as de combustível e portagens. Ou seja, é forçoso reconhecer que por muito rigoroso que se pretenda ser, não podem ser detectadas e imputadas os respectivos colaboradores todas as utilizações que escapem ao escopo empresarial que estão na base da sua atribuição, pela simples razão de que não podem todas ser detectadas.
Mais, o combustível e as portagens – que admitamos possam ser debitados aos colaboradores quando se refiram a deslocações de índole pessoal (àquelas que sejam detectadas, insiste-se) – não são os únicos gastos com viaturas sujeitos a tributação autónoma. Temos ainda que considerar outras, como as rendas dos alugueres operacionais e os seguros. Como é bom de ver, a partição destes custos, distinguindo neles a fracção que deve considerar-se empresarial da que reveste natureza extra-empresarial é, no mínimo, impraticável, se não mesmo praticamente impossível.
Ora, a tributação autónoma de que nos ocupamos é, pois, a resposta a esta dificuldade ou impossibilidade prática. Uma resposta pragmática e legítima em termos de política legislativa, em face da mais óbvia alternativa que se pretendeu afastar: a indedutibilidade dos respectivos encargos.
Não podemos esquecer que o propósito do legislador foi o de consentir a dedução das despesas com viaturas ligeiras de passageiros, sujeitando-as, em jeito de compensação, a uma tributação autónoma quando a empresarialidade integral dos respectivos gastos não pudesse ser demonstrada.
Concluindo, não tem arrimo legal a pretensão da Requerente de querer ver subtraídos à sujeição da tributação autónoma os gastos por si suportados com as viaturas ligeiras de passageiros que tem ao seu serviço.
ii) Dos gastos relativos a despesas de representação
O que se disse relativamente aos gastos havidos com viaturas ligeiras de passageiros aproveita à análise que tem de ser feita sobre as despesas de representação, que são as despesas suportadas para representação da empresa junto de terceiros (clientes, fornecedores e outros).
A tributação autónoma relativa às despesas de representação tem na sua base a dificuldade de se aquilatar com segurança da verdadeira finalidade do gasto e da exclusividade dessa finalidade, como afirma a Requerida. Na verdade, é difícil proceder a uma rigorosa separação do âmbito empresarial ou de lazer, pelo que a despesa será um custo da empresa, mas será objecto de tributação autónoma tentando atingir o que do evento excede os objectivos empresariais[18].
Não se deve enjeitar, em tese, a possibilidade de ser demonstrada a integral empresarialidade da despesa suportada com um determinado evento. Contudo, esta afirmação de princípio não pode descurar as indispensáveis cautelas com essa demonstração, sobretudo quando ela não se refere a um evento em particular mas à totalidade das despesas de representação apuradas.
A nosso ver não basta sustentar que uma empresa desenvolve a sua actividade num determinado sector e que organiza eventos promocionais da marca que comercializa para que os custos havidos com esses encontros escapem à tributação autónoma. Essa demonstração será suficiente para se apurar o carácter empresarial da iniciativa em causa. Contudo para que uma determinada despesa de representação possa apartar-se do âmbito de sujeição da respectiva tributação autónoma, forçoso é demonstrar que o evento em causa teve não apenas uma exclusiva finalidade empresarial como ainda que todos os que nele tomaram parte, originando a despesa, cabem no critério que objectivamente deve ser eleito como o razoavelmente determinante para essa exclusiva empresarialidade.
Como é bom de ver, essa demonstração é de muito difícil realização. Uma vez mais se insiste: a tributação autónoma surge justamente para buscar um equilíbrio que possa compensar a dedutibilidade dessas mesmas despesas de representação.
No juízo deste tribunal, não logrou a Requerente fazer a referida demonstração, pelo que, também aqui, não pode acolher-se o pedido da Requerente.
3.3. Dos juros indemnizatórios
O acto impugnado, como se procurou demonstrar, não padece de qualquer ilegalidade. Assim, não se verificam os pressupostos para que haja lugar ao pagamento de juros indemnizatórios.
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Decisão
Nos termos e com os fundamentos expostos, o tribunal arbitral decide:
a) Julgar improcedente o pedido de declaração de ilegalidade do indeferimento da reclamação graciosa apresentada, mantendo-se, portanto, o acto de autoliquidação de IRC que lhe deu origem;
b) Julgar improcedente o pedido de condenação da Requerida no pagamento de juros indemnizatórios.
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Valor do processo
De harmonia com o disposto no n.º 2 do art.º 306.º do CPC, no art.º 97.º-A do CPPT e ainda do n.º 2 do art.º 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 41.780,00 (quarenta e um mil setecentos e oitenta euros).
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Custas
Para os efeitos do disposto no n.º 2 do art.º 12 e no n.º 4 do art.º 22.º do RJAT e do n.º 4 do art.º 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em € 2.142,00 (dois mil cento e quarenta e dois euros), nos termos da Tabela I anexa ao dito Regulamento, a suportar integralmente pela Requerente.
[assinatura na página seguinte]
Lisboa, 16 de Janeiro de 2017
O Árbitro
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(Nuno Pombo)
Texto elaborado em computador, nos termos do n.º 5 do art.º 131.º do CPC, aplicável por remissão da al. e) do n.º 1 do art.º 29.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro e com a grafia anterior ao dito Acordo Ortográfico de 1990.
[1] Vide Decisão Arbitral n.º 52/2016-T.
[2] Vide Decisão Arbitral n.º 628/2014-T.
[3] Cfr. CLOTILDE CELORICO PALMA, As Tributações Autónomas vistas pelo Tribunal Constitucional: Comentário ao Acórdão do Tribunal Constitucional nº 310/2012, de 20 de junho de 2012, in Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal, Coimbra, a.5 n.2(Verão2012), p.245.
[4] Vide CASALTA NABAIS, Direito Fiscal, 6ª ed., Almedina, Outubro de 2010, p. 614.
[5] Vide SALDANHA SANCHES, Manual de Direito Fiscal, 3ª edição, 2007, p. 407.
[6] Vide RUI DUARTE MORAIS, Apontamentos ao IRC, Almedina, 2009, p. 203.
[7] Cfr. SALDANHA SANCHES, Manual de Direito Fiscal, 3ª edição, 2007, p. 407.
[8] Cfr. Decisão Arbitral n.º 628/2014-T e ALEXANDRE FERREIRA, Tributações Autónomas – Caracterização e Dedutibilidade de Gastos, in Arbitragem Tributária n.º 2, Jan. 2015, CAAD, p. 40.
[9] Cfr. Decisão Arbitral n.º 628/2014-T.
[10] Vide GUILHERME W. D’OLIVEIRA MARTINS, Da Dedutibilidade das Tributações Autónomas para Efeitos de Apuramento do Lucro Tributável, in Arbitragem Tributária n.º 2, Jan. 2015, CAAD, pp. 33 e seg..
[11] Idem, ibidem, p. 34.
[12] Cfr. CLOTILDE CELORICO PALMA, ibidem, p.247.
[13] Cfr. Voto de vencido na Decisão Arbitral do Processo n.º 628/2014-T.
[14] Vide Decisão Arbitral do Processo n.º 52/2016-T.
[15] Decisão Arbitral do Processo n.º 628/2014-T.
[16] Cfr. Art.º 39.º do pedido de pronúncia arbitral.
[17] Cfr. Art.º 63.º do pedido de pronúncia arbitral.
[18] Cfr. Acórdão do STA de 06.04.2016 (Proc. 01613/15).