Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 288/2016-T
Data da decisão: 2016-12-21  IMT IMI  
Valor do pedido: € 13.647,63
Tema: IMI e IMT – Fundos de Investimento Imobiliário
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Decisão Arbitral

 

 

Autora / Requerente: A… SOCIEDADE GESTORA DE FUNDOS DE INVESTIMENTO, S.A.

Requerida: Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante A.T.A.)

 

1. Relatório

Em 23-05-2016, A…– Sociedade Gestora de Fundos de Investimento, S.A., pessoa coletiva n.º …, com sede na …, n.º…, …, …-… Lisboa, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa sob o n.º…, na qualidade de sociedade gestora do fundo de investimento imobiliário B…– Fundo de Investimento Imobiliário Fechado para Arrendamento Habitacional, registado na Comissão de Valores Mobiliários e com o número de identificação fiscal …, doravante designada por Requerente, submeteu ao Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) o pedido de constituição de tribunal arbitral com vista à declaração de ilegalidade dos atos de liquidação de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) e de liquidação de Imposto de Selo, no valor total de 13.647,63 €.

A Requerente começa por referir que o pedido de pronúncia arbitral tem como objetivo aferir se o artigo 236º - norma transitória no âmbito do Regime Especial Aplicável aos Fundos de Investimento Imobiliário para Arrendamento Habitacional (FIIAH) e Sociedades de Investimento Imobiliário para Arrendamento Habitacional (SIIAH) - previsto pela Lei n.º 83-C/2013 de 31 de dezembro, na medida em que determina a aplicação do atual Regime Transitório dos FIIAH “aos prédios que tenham sido adquiridos por FIIAH antes de 1 de janeiro de 2014, contando-se, nesses casos, o prazo de três anos previsto no n.º 14 a partir de 1 de janeiro de 2014”, consubstancia um novo regime de caducidade das isenções previstas no n.º 7 alínea a) e n.º 8 do artigo 8º do Regime Tributário dos FIIAH, revelando uma violação flagrante e inequívoca do princípio da não retroatividade da lei fiscal, plasmado no artigo 103º n.º 3 da Constituição da República Portuguesa (CRP).

A Requerente menciona que, tendo em conta as alterações consagradas pela Lei do Orçamento de Estado para 2014 no Regime Tributário do FIIAH, solicitou à Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) a liquidação de IMT e de Imposto de Selo dos atos tributários de alienação pelo Fundo B… do prédio urbano sito na …, n.º…, …/… e Rua …, n.º…, …/…, …, …, inscrito na matriz predial urbana n.º…, fração …, da freguesia de …, Lisboa.

O requerimento, apresentado de forma oral pela Requerente, teve por fundamento o disposto no artigo 236º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro (norma transitória no âmbito do regime especial aplicável aos FIIAH e SIIAH), que manda aplicar aos prédios que tenham sido adquiridos antes de 2014, o disposto nos números 14 a 16º do artigo 8º do Regime Tributário dos FIIAH, ou seja, caso a Requerente pretendesse alienar o imóvel deveria solicitar à AT a liquidação do respetivo imposto.

Por conseguinte, a Requerente refere que não mencionou a emissão da liquidação de imposto por pretender dar ao imóvel em causa um destino diferente daquele em que assentou o benefício, caducando a isenção, como alegadamente teria sido colocado pela AT nos documentos de liquidação em causa nestes autos.

A Requerente alega que o único requisito da isenção à data em que adquiriu o imóvel em causa e em que tal isenção se consomou, era o de que os prédios adquiridos pelos FIIAH se destinassem a ser arrendados para habitação permanente, conforme artigo 8º números 7 e 8 do Regime Tributário dos FIIAH. E que a alteração do referido regime veio dispor que a alienação de prédios propriedade dos FIIAH ou a liquidação do próprio FIIAH, antes de decorrido o prazo de três anos, contado a partir da data da entrada dos prédios relevantes no património dos FIIAH, nos termos do n.º 16 do artigo 8º, conduz à caducidade da isenção. Entende assim a Requerente que estas alterações visaram estabelecer um regime de caducidade das isenções inexistente à data em que os fatos tributários se verificaram e que vieram afetar uma isenção já cristalizada na ordem jurídica da Requerente, em violação do consagrado no artigo 103º n.º 3 da CRP.

Em suma, alega a Requerente que: “não estando (…) legalmente previstos, no momento do reconhecimento da isenção, quaisquer factos ou circunstâncias de que dependia a caducidade da isenção reconhecida, é manifesto que a imposição superveniente desses factos ou circunstâncias a isenções cristalizadas na ordem jurídico-tributária da Requerente enferma de inconstitucionalidade, por violação do princípio da não retroatividade da lei fiscal, consagrado no artigo 103º (Sistema Fiscal), número 3, da Constituição da República Portuguesa”.

Por outro lado, a Requerente refere ainda que o artigo 236º (norma transitória no âmbito do regime especial aplicável aos FIIAH e SIIAH) da Lei n.º 83-C/2013 de 31 de dezembro (Lei do Orçamento de Estado para 2014), ao estender a aplicação do atual Regime Tributário dos FIIAH aos prédios que tenham sido adquiridos antes de 01-01-2014, contando-se, nesses casos, o prazo de três anos previsto no n.º 14 a partir de 01-01-2014, “está a violar de forma direta e inequívoca o princípio da não retroatividade da lei fiscal constitucionalmente consagrado”.

A Requerente invoca ainda a inconstitucionalidade do artigo 236º n.º2 da referida Lei n.º 83-C/2013 de 31 de dezembro, e junta um parecer assinado pelos Senhores Professores Dr. C… e Doutor D…, que corrobora a tese de inconstitucionalidade defendida pela Requerente.

Por fim, a Requerente pede que seja declarada a nulidade das liquidações de IMT e Imposto de Selo objeto do pedido arbitral com base na sua inconstitucionalidade, ou, subsidiariamente, serem anuladas as liquidações, e que seja condenada a A.T.A. a reembolsar a Requerente pela totalidade do montante do imposto pago, acrescido de juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43º da Lei Geral Tributária.

Foi designada como árbitro único, em 20-07-2016, Suzana Fernandes da Costa.

Em conformidade com o previsto no artigo 11º n.º 1, alínea c) do RJAT, o tribunal arbitral singular foi constituído em 23-08-2016.

A A.T.A. apresentou resposta, em 30-09-2016 (dentro do prazo legal para o efeito).

A A.T.A. defende que o pedido de declaração de ilegalidade e consequente anulação das liquidações de IMT e Imposto de Selo controvertidas deveria ser julgado improcedente, uma vez que com a alienação do imóvel é necessariamente dado um destino diferente ao imóvel, ocorrendo a caducidade da isenção nos termos do artigo 14º n.º 2 do Estatuto dos Benefícios Fiscais, pois deixa de ser possível à Requerente destiná-lo ao fim perseguido pelo benefício fiscal em causa, ou seja, a sua afetação ao arrendamento habitacional. E refere os acórdãos do CAAD que decidiram nesse sentido: processos n.º 727/2015-T, 61/2016-T e 93/2016-T.

Indica ainda as seguintes decisões arbitrais favoráveis à A.T.A.: 320/2015-T, 689/2015-T, 694/2016-T, 705/2015-T, 706/2015-T, 707/2015-T, 708/2015-T, 709/2015-T, 710/2015-T, 717/2015-T, 729/2015-T, 735/2015-T, 6/2016-T, 62/2016-T, 63/2016-T, 85/2016-T, 93/2016-T, 121/2016-T e 165/2016-T.

A A.T.A. requereu ainda, na mesma data, a dispensa da realização da reunião prevista no artigo 18º do Regime de Arbitragem Tributária, bem como a dispensa da apresentação de alegações.

Em 04-10-2016, foi proferido despacho a ordenar a notificação da Requerente para se pronunciar em 10 dias, sobre o pedido de dispensa da reunião.

Na mesma data, a Requerente veio informar os autos que nada tem a opor à dispensa da realização da reunião.

Em 11-10-2016, foi proferido despacho a dispensar a realização da reunião, atendendo ao facto de não existirem exceções a apreciar e à posição das partes. No mesmo despacho, foi ordenada a notificação de ambas as partes para, querendo, apresentaram alegações escritas no prazo de 15 dias. Também se designou o dia 21-12-2016 para a prolação da decisão arbitral e advertiu-se a Requerente para até essa data, proceder ao pagamento da taxa arbitral subsequente.

Nenhuma das partes apresentou alegações.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (artigos 4º e 10º n.º 1 e 2 do RJAT e artigo 1º da Portaria n.º 112-A/2011 de 22 de março).

O presente pedido de pronúncia arbitral foi apresentado tempestivamente, nos termos do artigo 10º n.º 1 alínea a) do Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de janeiro.

O processo não enferma de nulidades e não foram suscitadas questões prévias.

Embora a Requerente não tenha requerido expressamente a cumulação de pedidos, o pedido arbitral tem por objeto dois impostos e verifica-se identidade dos factos tributários, do tribunal competente para a decisão e dos fundamentos de facto e de direito.

Neste caso a cumulação de pedidos é admissível, nos termos dos artigos 104º do CPPT e 3º do RJAT, pelo que se admite.

 

2. Matéria de facto

2. 1. Factos provados:

Analisada a prova documental produzida, consideram-se provados e com interesse para a decisão da causa os seguintes factos:

  1. Em 29-11-2013, a Requerente adquiriu a fração … do prédio urbano inscrito na matriz predial urbana da freguesia de …, concelho de Lisboa, sob o artigo … .
  2. A referida fração foi adquirida beneficiando da isenção de IMT ao abrigo da alínea a) do n.º 7 do artigo 8º do regime jurídico dos FIIAH.
  3. Em 19-02-2016, a supra mencionada fração foi alienada.
  4. Na mesma data, 19-02-2016, a A.T.A. emitiu a liquidação de IMT n.º … no valor de 11.410,63 €, e liquidação de Imposto de Selo n.º … no valor de 2.237,00€, juntas ao pedido arbitral como documento 1, na sequência de declaração verbal da Requerente para o efeito.
  5. Nas liquidações acima identificadas encontra-se expressa que as mesmas decorrem do facto de “na escritura de venda irá ser dado destino diferente daquele em que assentou o benefício, caducando a isenção”.

 

Não se provaram outros factos com relevância para a decisão da causa.

 

2.2. Fundamentação da matéria de facto provada:

No tocante aos factos provados, a convicção do árbitro fundou-se na prova documental junta aos autos e nos factos admitidos por acordo.

 

3. Matéria de direito:

3.1.Objeto e âmbito do presente processo

Constitui questão decidenda nos presentes autos a de saber se são ou não legais as liquidações de IMT e Imposto de Selo em crise, emitidas pela AT na sequência de declaração da Requerente, ao abrigo do artigo 236º da Lei n.º 83-C/2013 de 31 de Dezembro (Lei do Orçamento de Estado para 2014).

Sobre esta mesma questão já se pronunciaram, entre outros, os acórdãos do CAAD proferidos nos processos número 710/2015-T, 133/2016-T, 163/2016-T, 164/2016-T, 165/2016-T, 231/2016-T.

 

3.2. Questão do enquadramento da isenção de IMT e da caducidade da isenção

Analisemos a matéria de direito sobre a qual o presente caso versa.

A Lei do Orçamento de Estado para 2009, Lei n.º 64-A/2008 de 31 de dezembro, aprovou o Regime Especial aplicável aos Fundos de Investimento Imobiliário para Arrendamento Habitacional, que dispõe no seu artigo 8 n.º 7 que:

“7 - Ficam isentos de IMT:

a) as aquisições de prédios urbanos ou de frações autónomas de prédios urbanos destinados exclusivamente a arrendamento para habitação permanente, pelos fundos de inv4estimento referidos no n.º 1;

b) a aquisição de prédios urbanos ou de frações autónomas de prédios urbanos destinados a habitação própria e permanente, em resultado do exercício da opção de compra a que se refere o n.º 3 do artigo 5º pelos arrendatários dos imóveis que integram o património dos fundos de investimentos referidos no n.º 1”.

A Lei do Orçamento de Estado para 2014, Lei n.º 83-C/2013 de 31 de dezembro, aditou ao supra referido artigo 8º os seguintes números:

“14 – Para efeitos do disposto nos n.º 6 a 8, considera-se que os prédios urbanos são destinados a arrendamento para habitação permanente sempre que sejam objeto de contrato de arrendamento para habitação permanente no prazo de três anos contados do momento em que passaram a integrar o património do fundo, devendo o sujeito passivo comunicar e fazer prova junto da AT do respetivo arrendamento efetivo, nos 30 dias subsequentes ao termo do referido prazo.

15 – Quando os prédios não tenham sido objeto de contrato de arrendamento no prazo de três anos previsto no número anterior, as isenções previstas nos n.º s 6 a 8 ficam sem efeito, devendo nesse caso o sujeito passivo solicitar à AT, nos 30 dias subsequentes ao termo do referido prazo, a liquidação do respetivo imposto.

16 – Caso os prédios sejam alienados, com exceção dos casos previstos no artigo 5º, ou caso o FIIAH seja objeto0 de liquidação, antes de decorrido o prazo previsto no n.º 14, deve o sujeito passivo solicitar igualmente à AT, antes da alienação do prédio ou da liquidação do FIIAH, a liquidação do imposto devido nos termos do número anterior.”

Por outro lado, o artigo 236º (norma transitória no âmbito do regime especial aplicável aos FIIAH e SIIAH) da referida Lei n.º 83-C/2013 de 31 de dezembro, dispõe que:

“1 – O disposto nos n.os 14 a 16 do artigo 8.º do regime especial aplicável aos FIIAH e SIIAH, aprovado pelos artigos 102.º a 104.º da Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro, é aplicável aos prédios que tenham sido adquiridos por FIIAH a partir de 1 de janeiro de 2014.

2 – Sem prejuízo do previsto no número anterior, o disposto nos n.os 14 a 16 do artigo 8.º do regime especial aplicável aos FIIAH e SIIAH, aprovado pelos artigos 102.º a 104.º da Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro, é igualmente aplicável aos prédios que tenham sido adquiridos por FIIAH antes de 1 de janeiro de 2014, contando-se, nesses casos, o prazo de três anos previsto no n.º 14 a partir de 1 de janeiro de 2014.”

No caso dos presentes autos, a fração cuja transmissão motivou as liquidações em crise de IMT e Imposto de Selo, foi adquirida em 29-11-2013, beneficiando nessa operação e nessa data de isenção e pagamento de IMT ao abrigo da alínea a) do n.º 7 do artigo 8º do regime especial supra referido.

Importa desde já referir que aderimos à fundamentação constante da decisão do CAAD do processo n.º 710/2015-T, quando esta refere que a referida norma já pressupunha que o imóvel fosse destinado ao arrendamento para habitação permanente para poder beneficiar de tal isenção. Assim, entendemos que a obrigatoriedade de destinar o imóvel para arrendamento habitacional não é requisito das alterações introduzidas pela Lei n.º 83-C/2013 de 31 de dezembro, mas sim um requisito do próprio regime fiscal dos FIIAH.

Com efeito, dificilmente se mostra comprovado existir uma violação de expectativas jurídicas da parte da Requerente, nem sequer na vertente da proibição da norma fiscal retroativa. Efetivamente, foi apenas a alienação da fração pela Requerente, posterior à entrada em vigor da Lei n.º 83-C/2013 de 31 de dezembro, que provocou a tributação ao abrigo da norma já em vigor no momento da alienação. Este aspeto invoca a posição do Tribunal Constitucional de prevalência, como facto gerador de imposto, do momento da alienação dos bens e não do momento da respetiva aquisição. Neste sentido, veja-se o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 85/2010 de 03-03-2010.

Seguindo de perto a decisão do CAAD proferida no processo n.º 710/2015-T, não está sequer em questão a retroatividade da lei aplicada, mas sim o facto da fração em apreço ter sido alienada sem que tenha cumprido o seu destino – afetação ao arrendamento habitacional permanente – e que alienada que seja a fração, esse destino já não possa ser cumprido, pelo que não se cumpriu o requisito estabelecido para que a isenção de IMT seja aplicável.

Tal como refere a decisão do CAAD do processo n.º 710/2015-T, “em suma, a Requerente adquiriu e alienou uma fração. E fê-lo sem que a tenha arrendado entre a data da aquisição e da alienação. Todavia, beneficiou, na data da respetiva aquisição, do benefício fiscal de não pagamento de IMT e IS aplicável à aquisição de frações destinadas exclusivamente a arrendamento para habitação permanente. Benefício cujo regime foi regulamentado pela Lei do Orçamento de Estado para 2014, tendo a alienação acima referida ocorrido precisamente em momento posterior à entrada em vigor da referida lei. Nessa medida, entendemos que a liquidação de IMT em crise, bem como a de IS que tem como fundamento a mesma factualidade, são legais ao abrigo das normas do Regime Especial acima citadas”.

 

3.3. Da inconstitucionalidade do artigo 236º n.º 2 da Lei n.º 83-C/2013 de 31 de dezembro

A Requerente refere ainda que o artigo 236º (norma transitória no âmbito do regime especial aplicável aos FIIAH e SIIAH) da Lei n.º 83-C/2013 de 31 de dezembro (Lei do Orçamento de Estado para 2014), ao estender a aplicação do atual Regime Tributário dos FIIAH aos prédios que tenham sido adquiridos antes de 01-01-2014, contando-se, nesses casos, o prazo de três anos previsto no n.º 14 a partir de 01-01-2014, “está a violar de forma direta e inequívoca o princípio da não retroatividade da lei fiscal constitucionalmente consagrado”.

A Requerente invoca ainda a inconstitucionalidade do artigo em que assentam as liquidações em crise, artigo 236º n.º 2 da referida Lei n.º 83-C/2013 de 31 de dezembro. E junta um parecer assinado pelos Senhores Professores Doutores C… e D…, que corrobora a tese de inconstitucionalidade defendida pela Requerente.

O n.º 2 do artigo 236º (norma transitória no âmbito do regime especial aplicável aos FIIAH e SIIAH) da referida Lei n.º 83-C/2013 de 31 de dezembro, dispõe que: “2 – Sem prejuízo do previsto no número anterior, o disposto nos n.os 14 a 16 do artigo 8.º do regime especial aplicável aos FIIAH e SIIAH, aprovado pelos artigos 102.º a 104.º da Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro, é igualmente aplicável aos prédios que tenham sido adquiridos por FIIAH antes de 1 de janeiro de 2014, contando-se, nesses casos, o prazo de três anos previsto no n.º 14 a partir de 1 de janeiro de 2014.”

Os autores do parecer junto concluem que “a norma do artigo 236º, n.º 2, da Lei do OE de 2014 é uma norma autenticamente retroativa, pois ordena a aplicação dos novos pressupostos das isenções – arrendamento e não alienação num prazo de 3 anos, sob pena de estas ficarem “sem efeito” – a aquisição e a atos (isto é, a factos tributários) anteriores à sua entrada em vigor e que completaram antes desta”.

No entanto, não podemos aderir à douta posição aí defendida, e aderindo à posição de anteriores decisões do CAAD, no sentido em que os pressupostos para a isenção de IMT constam do artigo 8º n.º 7 alínea a) do regime jurídico dos FIIAH aprovado pela Lei n.º 64-A/2008 de 31 de dezembro, que refere que ficam isentos de IMT “as aquisições de prédios urbanos ou de frações autónomas de prédios urbanos destinados exclusivamente a arrendamento para habitação permanente, pelos fundos de investimento referidos no n.º 1”.

E não foi a Lei do Orçamento de Estado de 2014, ao aditar o artigo 236º n.º 2 ao referido regime jurídico que veio criar novos pressupostos. Este n.º 2 apenas veio mencionar que o disposto nos números 14 a 16 do artigo 8ª (caducidade das isenções), é igualmente aplicável aos prédios que tenham sido adquiridos por FIIAH antes de 1 de janeiro de 2014, contando-se nesses casos o prazo de três anos previsto no n.º 14 a partir de 1 de janeiro de 2014.

Com efeito, este artigo apenas veio concretizar que caducidade das isenções constante dos números 14 a 16 do artigo 8º também se aplica a prédios adquiridos antes de 1 de janeiro de 2014.

Mas o pressuposto para a isenção de IMT - prédios urbanos destinados exclusivamente a arrendamento para habitação permanente - estava já consagrado na lei aquando da aquisição do imóvel.

Veja-se que no presente caso, o imóvel não foi destinado a arrendamento para habitação permanente no prazo de três anos, mas sim foi alienado. E por essa razão, é que a Requerente apresentou declaração verbal à AT para efeitos de emissão da liquidação de IMT e Imposto de Selo, dado que o destino dado ao imóvel não foi o arrendamento habitacional, tendo-se verificado a caducidade da isenção de que tinha beneficiado aquando da aquisição do referido imóvel.

Com efeito, entendemos como na decisão do CAAD proferida no processo n.º 164/2016-T, que “não é possível concluir que a obrigatoriedade de destinar o prédio a arrendamento para habitação permanente constitui um requisito introduzido pela Lei n.º 83-C/2013 de 31 de Dezembro. Tal obrigação já constava expressa e concretamente no art. 8º, n.º 7 e 8 do regime jurídico dos FIIAH ma sua versão inicial”.

Assim, concluímos como na decisão do CAAD acima referida, que não existe qualquer violação do princípio da não retroatividade da lei fiscal ou agravamento da posição fiscal da Requerente, e não se coloca em causa a inconstitucionalidade da referida norma.

 

3.4. Aplicação do regime à situação da Requerente

A Lei do Orçamento de Estado para 2014 veio estabelecer um novo requisito para a isenção: caso a afetação a arrendamento para habitação permanente não ocorra no período de três anos após a entrada do imóvel no fundo, o fundo deverá requerer a liquidação de IMT que não foi liquidado.

Contudo, não foi isso que se verificou neste caso. As liquidações de IMT e Imposto de Selo em causa não tiveram por base a sua manutenção no fundo por um período igual ou superior a três anos sem que tivesse havido afetação a arrendamento para habitação permanente. De facto, as liquidações basearam-se no facto de ter sido dado aos imóveis destino diferente daquele em que assentou o benefício, tal como consta das referidas liquidações.

Alienada que seja a fração, esse destino já não pode ser cumprido, pelo que não se cumpriu o requisito estabelecido para que a isenção de IMT seja aplicável.

Com efeito, entendemos que não tem carater inovador os efeitos resultantes da alienação do prédio que constam do artigo 8º n.º 15 e 16 do regime jurídico dos FIIAH, pois já resultavam do artigo 8º n.º 7 e 8 do referido regime. Assim, não se coloca em causa a inconstitucionalidade de tal norma (artigo 8º n.º 15 e 16 do regime jurídico dos FIIAH, aditada pela Lei n.º 83-C/2013 de 31 de dezembro).

Mais, o prédio supra referido foi adquirido em 29-11-2013, beneficiando da isenção de IMT prevista no artigo 8º n.º 7 alínea a) do regime jurídico dos FIIAH, uma vez que a Requerente declarou que o imóvel em causa seria destinado a arrendamento para habitação permanente.

Por outro lado, na declaração efetuada pela Requerente com vista às liquidações em crise há menção expressa que têm por base o facto de se ter dado um destino diferente daquele em que assentou o benefício.

E neste ponto, aderimos totalmente à fundamentação constante da decisão do CAAD proferida no processo n.º 164/2016-T, que refere que: “e a conclusão diversa não chegamos pelo facto da Requerente ter junto um documento no qual solicita a liquidação e IMT e Imposto de Selo, apesar de neste constar expressamente que a norma que conduz ao sobredito pedido ser ilegal e inconstitucional. Com efeito, tal requerimento não diz respeito ao prédio objeto destes autos e se a declaração que justificou a liquidação de IMT e de Imposto de Selo (…) teve por génese qualquer outro fundamento distinto da afetação do prédio a fim diverso do arrendamento, só a si competia fazer prova da afetação a arrendamento para habitação permanente. Não existindo nos autos prova distinta, impõe-se concluir que o fundamento das liquidações em crise consistiu no facto do Fundo B… pretender dar ao prédio um destino diferente do arrendamento para habitação”.

E continua a mesma decisão afirmando que “(…) o que está em causa nestes autos consiste no facto de não ter sido dada a utilização que alicerçou a isenção, a afetação ao arrendamento para habitação permanente e não uma questão de prazo. O que afasta a questão da violação do princípio da não retroatividade da lei fiscal”.

Afirma ainda que “em resumo, a atribuição do benefício fiscal não exige uma mera intenção declarada, no momento da celebração da escritura pública de compra e venda, de afetação do prédio a arrendamento habitacional permanente, mas a efetiva afetação. Ora, se a Requerente manifestou essa intenção, mas não chegou a proceder a tal afetação ou pelo menos, não a prova nestes autos, tem de improceder o pedido”.

Terá, pois, que improceder o pedido da Requerente e será de concluir que as liquidações de IMT e Imposto de Selo em apreço são legais ao abrigo da alínea a) do n.º 7 do artigo 8º do regime especial aplicável aos fundos de investimento imobiliário para arrendamento habitacional.

 

4. Decisão

Em face do exposto, determina-se julgar improcedente o pedido formulado pela Requerente no presente processo arbitral tributário, quanto à ilegalidade das liquidações de IMT no valor de 11.410,63 € e de Imposto de Selo no valor de 2.237,00 €.

 

5. Valor do processo:

De acordo com o disposto no artigo 315º, n.º 2, do CPC e 97º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 3º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se o valor da ação em 13.647,63 €.

 

6. Custas:

Nos termos do artigo 22º, n.º 4, do RJAT, e da Tabela I anexa ao Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em 918,00 € devidas pela Requerente.

 

Notifique.

 

Lisboa, 21 de dezembro de 2016.

 

Texto elaborado por computador, nos termos do artigo 138º, n.º 5 do Código do Processo Civil (CPC), aplicável por remissão do artigo 29º, n.º 1, alínea e) do Regime de Arbitragem Tributária, por mim revisto.

 

O árbitro singular

 

 

Suzana Fernandes da Costa