Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 389/2015-T
Data da decisão: 2016-02-19  IRS  
Valor do pedido: € 30.850,87
Tema: IRS – Crédito por dupla tributação internacional
Versão em PDF


 

 

 

 

DECISÃO ARBITRAL

 

 

I - RELATÓRIO

 

1.      A…, NIF…, residente na Rua … n.º…, …, …-… Lisboa, requereu, em 22 de Junho de 2015, ao abrigo do disposto no artigo 10.º/1, al. a) do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante, RJAT), artigos 1.º e 2.º da Portaria 112-A/2011, de 22 de Março, artigo 102.º/1, al. e) do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), a constituição do Tribunal Arbitral, para apreciação da ilegalidade dos actos de liquidação de IRS a que foram atribuídos os números 2014 … e  2014…, referentes aos exercícios de 2010 e 2011, e juros compensatórios, tudo no montante global de € 30.850,87, bem como ao reembolso do valor indevidamente pago e respectivos juros indemnizatórios.

2.      No pedido de pronúncia arbitral o Requerente optou por não designar árbitro.

3.      Nos termos do art. 6.º/2, al. a) e do art. 11.º/1, al. b) do RJAT, o Conselho Deontológico designou como árbitro singular a ora signatária, que aceitou o encargo no prazo legalmente estipulado.

4.      O Tribunal Arbitral ficou constituído em 24 de Agosto de 2015.

5.      A Requerida apresentou a sua resposta no dia 5 de Outubro de 2015.

6.      A reunião arbitral teve lugar no dia 4 de Dezembro de 2015, tendo o Requerente sido notificado para, no prazo de 30 dias obter, junto da Administração Tributária espanhola, o comprovativo do imposto pago/retido em Espanha.

7.      Em 5 de Janeiro de 2016, o Requerente fez consignar nos autos que não foi possível obter, junto das autoridades tributarias espanholas, qualquer documentação que ateste a retenção na fonte efectuada ao Requerente em 2010.

8.      Em 14 de Janeiro de 2016, o Requerente juntou aos autos declarações fiscais apresentadas pelas autoridades tributárias brasileiras, referentes aos exercícios de 2010 e 2011, certificados e autenticados pelo Consulado Geral de Portugal em São Paulo.

9.      Requerente e Requerida apresentaram alegações escritas, em 1/02/2016 e 9/02/2016, respectivamente.

 

**  **  **  **

 

C – Factos provados

10.  Com base nos factos alegados pelas partes, e não contestados pela Requerida, assim como na documentação junta aos autos, fixa-se a seguinte factualidade relevante para a boa decisão da causa:

A)    Em 25/10/2011, o Requerente entregou a sua Declaração de Rendimentos – IRS, Modelo n.º 3, referente ao ano de 2010.

B)    Na mencionada declaração, o Requerente inscreveu, no Anexo J, os rendimentos obtidos no estrangeiro, aí tendo declarado, entre outros, os rendimentos obtidos no Brasil e em Espanha, bem como o imposto pago no estrangeiro, com os seguintes montantes:

Identificação do país

Montante dos rendimentos

Imposto pago no estrangeiro

Brasil (linha 601)

€ 72.394,82

€ 14.508,59

Espanha (linha 602)

€ 12.000,00

€ 2.880,00

 

C)    Em 16/04/2012, o Requerente entregou a sua Declaração de Rendimento – IRS, Modelo n.º 3, ano 2011.

D)    Na mencionada declaração, o Requerente inscreveu, no Anexo J, os rendimentos obtidos no estrangeiro, aí tendo declarado, entre outros, os rendimentos obtidos no Brasil, bem como o imposto pago, com os seguintes montantes:

Identificação do país

Montante dos rendimentos

Imposto pago no estrangeiro

Brasil (linha 602)

€ 66.455,56

€ 9.329,62

E)     O Requerente, no âmbito de acção inspectiva conduzida pela Direcção de Finanças de Lisboa, foi notificado que visava aferir o correcto apuramento do crédito de imposto por dupla tributação internacional, deduzido à colecta pelo Requerente nas declarações de rendimento Modelo n.º 3 de IRS referentes aos exercícios de 2010, 2011 e 2012.

F)     No âmbito daquela acção, foi o Requerente notificado, nos termos do n.º 1 do art. 128.º do CIRS para remeter “documento original válido, emitido ou autenticado pela respectiva autoridade fiscal do estado da fonte dos rendimentos”.

G)    O Requerente entregou declaração do B…e cópia simples do comprovativo de rendimentos pagos e do imposto sobre a renda retido na fonte, relativamente ao exercício de 2011, emitido pelo Ministério da Fazenda – Secretaria da Receita Federal do Brasil.

H)    Os documentos entregues pelo Requerente foram remetidos à Divisão de Administração da Direcção de Serviços e Relações Internacionais que se pronunciou por oficio de …/2014, com data de 2014/10/13, nos seguintes termos:

- ”Ficando a faltar documentos comprovativos dos montantes de rendimentos auferido/imposto suportado, para Espanha e Brasil, assim sendo as correcções a efectuar, anexo J, de 2010, são as seguintes:

Rubrica

Valor declarado

Valor a considerar

Rendimento auferido no Brasil

€ 72.394,82

€ 72.394,82

Imposto pago no Brasil

€ 14.508,59

0

Rendimento auferido em Espanha

€ 12.000,00

€ 12.000,00

Imposto pago em Espanha

€ 2.880,00

0

-          “Ficando a faltar documentos comprovativos dos montantes de rendimento auferido/imposto suportado, para o Brasil, assim sendo as correcções a efectuar, no anexo J, de 2011, são as seguintes:

Rubrica

Valor declarado

Valor a considerar

Rendimento auferido no Brasil

€ 66.455,56

€ 66.455,56

Imposto pago no Brasil

€ 9.329,62

0

 

I)       Em 25/11/2014, o Requerente foi notificado para exercer o direito de audição prévia, “relativamente ao projecto de alterações à sua declaração Mod. 3 de IRS dos anos de 2010, 2011 e 2012 que serão efectuadas em conformidade com os fundamentos constantes da informação n.º …/2014 de 13/10/2014, enviado pela Direcção de Serviços das Relações Internacionais, de que se junta cópia”.

J)      Após exercício do direito de audição prévia, foi o Requerente notificado (oficio n.º …-…) de que se iria proceder à liquidação adicional de Imposto, cuja nota de cobrança iria ser remetida ao Requerente.

K)    Em 19/12/2014 foi emitida liquidação adicional de IRS, referente ao ano de 2010, liquidação n.º 2014…,  de que resultou o imposto a pagar no montante de € 88.793,71, o que após acerto de contas e liquidação de juros compensatórios, deu origem ao pagamento de € 11.622,20.

L)     Na liquidação não foi considerada qualquer parcela de imposto suportado pelo Requerente no Brasil e em Espanha, no ano de 2010, tendo sido considerados somente os rendimentos auferidos.

M)  Em 19/12/2014 foi emitida liquidação adicional de IRS, referente ao ano de 2011, liquidação n.º 2014…,  de que resultou o imposto a pagar no montante de € 79.789,18, o que após acerto de contas e liquidação de juros compensatórios, deu origem ao pagamento de € 19.692,91.

N)    Na liquidação não foi considerada qualquer parcela de imposto suportado pelo sujeito passivo no Brasil, no ano de 2011, tendo sido considerado somente os rendimentos auferidos.

O)    O Requerente apresentou reclamação gracioso tendo por objecto aquelas liquidações adicionais de IRS, dos anos de 2010 e 2011.

P)     A reclamação graciosa foi acompanhada por cópias simples do documento emitido pelo B…, com data de 31 de Janeiro de 2011, bem como cópia simples do comprovativo de rendimentos pagos e do imposto sobre a renda retido na fonte, relativamente ao exercício de 2011, emitido pelo Ministério da Fazenda – Secretaria da Receita Federal do Brasil. 

Q)    A reclamação graciosa foi indeferida por despacho de 22/04/2015.

R)    Dos autos consta documento emitido pela entidade designada por “B…”, com data de 31 de Janeiro de 2011, intitulado “Información Fiscal del Ejercicio 2010”, com o seguinte teor: “Que al Sr .A…, con domicilio en la…, … Lisboa (Portugal) y número de identificación X-…-M, y a efectos fiscales en concepto de retribuciones del Consejo de Administración y del impuesto sobre la renta de no residentes correspondientes el ejercicio 2010, se le han efectuado las retenciones sigientes:

Retribuiciones Consejo de Administración 12.000,00

Retención 24% (Art. 13.1. e) LIRNR) 2.880,00”.

S)     Pelo Requerente foi junto documento emitido pelo Ministério da Fazenda – Secretaria da Receita Federal do Brasil, que certifica que no ano de 2010, o Requerente auferiu no Brasil € 72.394,82 e pagou imposto no valor de € 14.508,50 (fls. ... dos autos, junto pelo Requerente em 14/01/2016).

T)     Pelo Requerente foi junto documento emitido pelo Ministério da Fazenda – Secretaria da Receita Federal do Brasil, que certifica que no ano de 2011, o Requerente auferiu no Brasil € 66.455,56 e pagou imposto no valor de € 13.095,24 (fls. ... dos autos, junto pelo Requerente em 14/01/2016).

 

 

II – SANEAMENTO

 

11. O Tribunal é competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º/1, al. a), 5.º/2, e 6.º/ 1, todos do RJAT.

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º/2, do RJAT e do artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.

O processo não enferma de vícios que o invalidem, pelo que se mostram reunidas as condições para prolação da decisão final.

 

 

III. FUNDAMENTAÇÃO

 

As questões em causa nos presentes autos são as seguintes:

a)      saber se as liquidações adicionais de IRS, dos anos de 2010 e 2011, que desconsideraram o crédito de imposto por dupla tributação internacional, previsto no art. 81.º/2 do CIRS, são ilegais, mais concretamente, saber se os documentos apresentados para comprovar o imposto pago no estrangeiro (Brasil e Espanha), são suficientes para fazer operar a dedução do crédito por dupla tributação internacional;

b)      Saber se incumbia à administração tributária, no quadro dos poderes de investigação, acionar os mecanismos de troca de informações previstos nas Convenções para evitar a dupla-tributação.

 

** ** ** **

 

O art. 81.º/1 e 2 do Código do IRS contém regras destinadas à eliminação da dupla tributação internacional. Confere-se ao sujeito passivo, residente em Portugal, o direito a deduzir à colecta o montante do imposto pago no estrangeiro. Nesse sentido, dispõe o art. 81.º/1 e 2 do CIRS, com a epígrafe “Eliminação da dupla tributação internacional” vigente à data dos factos, que:

“1. Os titulares de rendimentos das diferentes categorias obtidos no estrangeiro têm direito a um crédito de imposto por dupla tributação internacional, dedutível até à concorrência da parte da colecta proporcional a esses rendimentos líquidos, considerados nos termos da alínea a) do n.º 6 do art. 22.º, que corresponderá à menor das seguintes importâncias:

a)      Imposto sobre o rendimento pago no estrangeiro;

b)      Fracção da colecta do IRS, calculado antes da dedução, correspondente aos rendimentos que no país em causa possam ser tributados, líquidos das deduções específicas previstas neste Código.

2. Quando existir convenção para eliminar a dupla tributação celebrada por Portugal, a dedução a efectuar nos termos do número anterior não pode ultrapassar o imposto pago no estrangeiro nos termos previstos pela convenção.”.

 

Tendo, no caso dos autos, o Requerente auferido rendimentos do trabalho dependente no Brasil e em Espanha, não restam dúvidas de que assiste ao Requerente, residente em Portugal, e nas condições previstas no art. 81.º/ 2 do Código de IRS, deduzir o imposto sobre o rendimento pago no estrangeiro.

 

Ainda sobre a dedução do imposto pago fora de Portugal, estabelece o art. 23.º/1 da Convenção celebrada entre a República Portuguesa e a República Federativa do Brasil destinada a evitar a Dupla Tributação, aprovada, para ratificação, por resolução da Assembleia da República n.º 33/2001, de 1 de Março de 2001 e ratificada por decreto do Presidente da República n.º 27/2001, de 27/04 (de ora em diante, CDT Portugal/Brasil), que compete ao Estado da residência deduzir do imposto sobre os rendimentos uma importância igual ao imposto sobre o rendimento pago no Estado da fonte.

 

No que respeita aos rendimentos obtidos pelo Requerente no Brasil está em causa saber se os documentos apresentados para comprovar o imposto pago no Brasil são suficientes para fazer operar a dedução por crédito de imposto sobre o rendimento pago no Brasil, relativamente aos anos de 2010 e 2011, de acordo com o disposto no art. 81.º/2 do CIRS e art. 23.º/1 da Convenção.

 

No âmbito do presente processo judicial, o Requerente apresentou (relativamente aos anos de 2010 e 2011) documento, devidamente certificado, emitido pelo “Ministério da Fazenda – Secretaria da Receita Federal do Brasil – Impostos sobre a Renda de Pessoa Física” como o  “Comprovante de Rendimentos Pagos e de Imposto sobre a Renda retido na Fonte”.

 

Do documento referente ao exercício de 2010 resulta que o Requerente auferiu no Brasil rendimentos no valor de € 72.394,82 e pagou imposto no valor de € 14.508,50 (ponto S dos factos provados).

 

Do documento referente ao exercício de 2011 resulta que o Requerente auferiu no Brasil rendimento no valor de € 66.455,56 e pagou imposto no valor de € 13.095,24 (ponto T dos factos provados).

 

A prova documental carreada para os autos revela o montante dos rendimentos obtidos, bem como o montante do imposto retido e do imposto pago a final. Assim, não restam dúvidas quanto aos valores auferidos pelo Requerente, nem quanto ao imposto retido, o qual se mostra evidenciado na declaração “Comprovante de Rendimentos Pagos e de Imposto sobre a Renda Retido na Fonte”, emitida pelas autoridades fiscais da República Federativa do Brasil, mais concretamente, pelo “Ministério da Fazenda – Secretaria da Receita Federal do Brasil – Impostos sobre a Renda de Pessoa Física”.

 

Face aos documentos apresentados pelo Requerente e tendo em conta o disposto no art. 23.º/ 1 da CDT Portugal/Brasil, conjugado com os art. 81/2 do Códigodigo﷽﷽﷽﷽﷽﷽mposto sobre a Renda RBrasil.CIRSbem como ao reembolso do imposto pago referente ao ano de 2011. mentos auferidos. as ódigo  IRS, o imposto pago no Brasil pode e deve ser deduzido no imposto sobre o rendimento, com os limites fixados na parte final daquele preceito.

 

Não tendo a Requerida considerado tal dedução, a AT violou o disposto no art. 23.º/1 da CDT Portugal/Brasil e o disposto no art. 81.º/2 do CIRS, pelo que a liquidação adicional de IRS referente ao ano de 2010, na parte em que desconsidera o crédito de imposto por dupla tributação internacional deve ser anulada, com as legais consequências.

 

O mesmo sucedendo com a liquidação adicional de IRS referente ao ano de 2011 uma vez que a mesma também desconsidera o crédito de imposto por dupla tributação internacional de que o Requerente é titular.

 

No que respeita aos rendimentos obtidos pelo Requerente em Espanha, a Convenção celebrada entre a República Portuguesa e o Reino de Espanha destinada a evitar a Dupla Tributação, aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 6/95, de 29 de Junho de 1994, ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º 14/95, de 28 de Janeiro (de ora em diante CDT Portugal/Espanha), estabelece na al. a) do n.º 2 do art. 23.º que “Quando um residente de Portugal obtiver rendimentos que, de acordo com o disposto nesta Convenção, possam ser tributados em Espanha, Portugal deduzirá do imposto sobre o rendimento desse rendimento uma importância igual ao imposto pago em Espanha”. E, acrescenta “A importância deduzida não poderá, contudo, exceder a fracção do imposto sobre o rendimento, calculado antes da dedução, correspondente aos rendimentos que possam ser tributados em Espanha;”.

 

Para provar o imposto pago em Espanha, o Requerente juntou declaração do B…(cf. ponto R) dos factos provados). A Administração Fiscal não aceitou aquele documento como prova do imposto pago no estrangeiro, em Espanha. Advoga a Requerente que, por um lado, a Administração Fiscal deveria ter aceite aquele documento e, por outro, que face ao documento apresentado, se a Administração Fiscal tivesse dúvidas quanto ao valor do imposto pago em Espanha, deveria ter recorrido aos mecanismos de troca de informação previsto no art. 26.º da CDT Portugal/Espanha.

 

Como é sabido, em matéria de prova do imposto pago no estrangeiro, a lei não exige um determinado tipo de prova. A lei não estipula um regime de prova vinculada. Vale, neste caso, o princípio da livre apreciação das provas, as quais devem ser apreciadas pelo julgador e, necessariamente, fundamentada (sem prejuízo, necessariamente, da força probatória atribuída a determinado tipo de documentos). 

 

O art. 128.º do Código do IRS dispõe que incumbe às pessoas sujeitas a IRS o dever de apresentar os documentos comprovativos dos rendimentos auferidos, das deduções e de outros factos ou situações mencionadas na respectiva declaração, quando a Autoridade Tributária e Aduaneira os exija. Por seu turno, em matéria sobre o ónus da prova, o art. 342.º do Código Civil, bem como o art. 74.º da LGT, dispõem ambos que incumbe a quem invocar um direito fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado, cabendo à outra parte a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos.

 

O dever de investigação oficiosa acontecerá, entre outras, em situações em que existe um princípio de prova capaz de gerar um dúvida razoável sobre a realidade dos factos relevante e/ou quando o sujeito passivo alegue a existência de compreensivas dificuldades na produção de prova. Nestes casos caberia à Administração Fiscal portuguesa proceder à troca de informações com a autoridade fiscal estrangeira, por forma a evitar a dupla tributação internacional.

 

Ao analisar a aptidão probatória das declarações emitidas pelas entidades patronais como meio de prova do imposto pago no estrangeiro, a jurisprudência tem entendido que os documentos (particulares) emitidos pelas entidades patronais, quando acompanhados de outros documentos provenientes das autoridades fiscais estrangeiras são suficientes para prova do imposto pago no estrangeiro. Nesse sentido, veja-se o acórdão do TCA Norte de 14/04/2015, o Tribunal considerou para prova do pagamento do imposto na Suiça por rendimentos de trabalho aí auferidos, ser suficiente a declaração da entidade patronal, juntamente com a declaração certificada pela autoridade tributária Suiça que atestava o montante dos rendimentos aí auferidos e o montante do imposto aí pago por retenção na fonte. Neste arresto, o documento emitido pela entidade patronal (“certificado de retenção na fonte na Suiça para pessoas com residência no estrangeiro”) tinha aposto o carimbo da respectiva autoridade tributária. E, conclui, caso subsistissem dúvidas, designadamente, quanto à coincidência entre o valor retido na fonte e o imposto liquidado, competida à Administração Fiscal proceder à troca de informações com aquelas autoridades, ao abrigo da respectiva Convenção. No acórdão do TCA Norte de 20/04/2005, o Tribunal considerou que, “estando o contribuinte impossibilitado de apresentar documento emitido pela Autoridade Ttibutária alemã, comprovativo desse pagamento, é bastante para a dedução a apresentação de declaração da entidade patronal, onde constam as retenções efectuadas, bem como as guias de pagamento” do respectivo imposto.

 

Sucede que, o documento emitido pelo B… não está carimbado pelas autoridades tributárias espanholas. Não consta dos autos qualquer documento, emitido pela Autoridade Tributária espanhola, que ateste o pagamento do montante do imposto retido alegadamente ao Requerente, nem da comunicação desses rendimentos às autoridades fiscais espanholas, nem do imposto retido. Acresce que, o Requerente também não logrou demonstrar que diligenciou no sentido de obter documento emitido pelas autoridades fiscais espanholas que atestasse o montante do imposto retido/pago naquele país. Inexiste nos autos qualquer suporte documental que evidencie que o Requerente solicitou junto das autoridades tributarias espanholas, comprovativo do imposto pago neste país. Esta ausência de prova leva-nos a concluir que o mero documento emitido pela entidade patronal do Requerente não é suficiente para prova do imposto retido/pago em Espanha. Assim, à mingua de qualquer outro documento, designadamente, um documento emitido pela autoridade tributária espanhola, não podemos aceitar aquele documento como prova do imposto retido/ pago em Espanha.

 

Quanto ao dever imposto à administração tributária de averiguar a verdade material e dos deveres de investigação (princípio do inquisitório), o art. 58.º da LGT dispõe que a administração tributária deve realizar as diligências de prova necessárias à descoberta da verdade material. Este princípio tem de ser temperado com outros princípios, como seja o princípio da proporcionalidade e da praticabilidade. Tal princípio não dispensa, porém, o sujeito passivo da obrigação de colaborar com a produção de provas (art. 50.º da LGT). É pois à luz destes princípios que se imporá aferir se, no presente caso, estava a Autoridade Tributária obrigada, ou não, a recorrer ao mecanismo de troca de informações, previsto no art. 26.º da CDT Portugal/ Espanha. Cremos que não. Com efeito, apenas nos casos em que existe prova (suportada por um documento emitido pela autoridade tributária de certo país que evidencie o montante do imposto retido/pago ou, nos casos, em seja alegada e provada a existência de sérias dificuldades na obtenção de prova) é que se imporia à administração tributária portuguesa recorrer ao mecanismo de troca de informações, previsto nas CDT ou na legislação interna. De outro modo, ficaria o Requerente desonerado da obrigação de fazer prova de factos que são do seu interesse, e da inerente obrigação do contribuinte de colaborar na produção de prova (art. 59.º da LGT).

 

Improcede, neste ponto, a impugnação do Requerente.

 

 

c) Dos juros indemnizatórios

 

Peticiona o Requerente a condenação da ATA ao reembolso do imposto pago indevidamente, bem como aos respectivos juros indemnizatórios.

 

O art. 43.º, n.º 1 da Lei Geral Tributária prescreve que são “devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.”. Por seu turno, o artigo 24.º, n.º 1, al. b) do RJAT dispõe que a “decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado.

 

No caso sub iudice, verifica-se a ilegalidade (parcial) das liquidações impugnadas, por erro imputável aos serviços, que ao desconsiderar os documentos entregues pelo Requerente comprovativos do crédito por dupla tributação internacional quanto aos rendimentos auferidos no Brasil nos anos de 2010 e 2011, liquidou imposto superior ao devido.

 

Assim, afigura-se que o Requerente tem direito ao reembolso (parcial) do imposto pago referente ao ano de 2010, bem como ao reembolso do imposto pago referente ao ano de 2011, acrescido de juros indemnizatórios desde a data do pagamento até reembolso integral do montante indevidamente pago, à taxa legal.

 

 

 

Decisão:

 

Pelos fundamentos expostos, o tribunal arbitral decide:

 

a)      Julgar, parcialmente, procedente o pedido de pronúncia arbitral e, em consequência, declarar, parcialmente, ilegais as liquidações de IRS referentes aos anos de 2010 e 2011 na parte em que desconsideram o crédito por dupla tributação internacional decorrente do imposto pago no Brasil, com as legais consequências.

b)      Julgar, parcialmente, procedente o pedido de condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira a reembolsar o Requerente do valor do imposto indevidamente pago, acrescidos de juros indemnizatórios até ao reembolso integral do montante pago em excesso.

c)      Julgar, parcialmente, improcedente o pedido de pronúncia arbitral na parte que respeita ao imposto retido/pago em Espanha, referente ao ano de 2010.

d)      Condenar o Requerente e a Requerida nas custas do processo, na proporção do decaimento.

 

 

 

Valor do processo:

Nos termos do disposto no n.º 2 do art.º 315.º do CPC, conjugado com a al. a) do n.º 1 do art. 97.º-A do CPPT e n.º 2 do art.º 3.º do Regulamento de Custas nos Processo de Arbitragem Tributária, fixa-se à causa o valor de € 30.850,87.

 

 

 

Custas:

Para os efeitos do disposto no n.º 2 do art.º 12.º e no n.º 4 do art.º 22.º do RGAT e do n.º 4 do art.º 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em € 1.836,00, nos termos da Tabela I anexa ao regulamento, a suportar pelo Requerente e pela Requerida, na proporção de 10% para o Requerente e 90% para a Requerida.

 

Lisboa, 19 de Fevereiro de 2016

 

O Árbitro,

 

(Alexandra Gonçalves Marques)