Decisão Arbitral [1]
Os árbitros, Conselheiro José Baeta de Queiroz (Presidente), Dr. Henrique Nogueira Nunes (Vogal) e Dra. Sílvia Oliveira (Vogal), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formar o Tribunal Arbitral Colectivo, constituído em 9 de Junho de 2016, com respeito ao processo acima identificado, decidem o seguinte:
1. RELATÓRIO
1.1. A…, contribuinte nº…, residente na Rua…, nº…, …, na ... (doravante designado por “Requerente”), apresentou um pedido de pronúncia arbitral e de constituição de Tribunal Arbitral Colectivo, no dia 11 de Março de 2016, ao abrigo do disposto no artigo 4º e nº 2 do artigo 10º do Decreto-lei nº 10/2011, de 20 Janeiro [Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT)], em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada por “Requerida”).
1.2. O Requerente tendo sido notificado “da decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra a liquidação adicional de IRS n.º 2015… referente ao ano de 2013 (…)”, “(…) veio deduzir pedido de pronúncia arbitral contra a referida liquidação adicional de IRS (…) e contra o despacho de indeferimento da reclamação graciosa (…)”, no sentido de obter “(…) a revogação da decisão da reclamação graciosa proferida pela Direção de Finanças de Lisboa, por vício de ilegalidade, ordenando, em consequência, a anulação da liquidação de IRS n.º 2015… e (…) proceder-se ao pagamento dos juros indemnizatórios devidos”.
1.3. O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD em 14 de Março de 2016 e notificado à Requerida na mesma data.
1.4. O Requerente não procedeu à nomeação de árbitro pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 6º, nº 2, alínea a) do RJAT, os signatários foram designados como árbitros pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, em 4 de Maio de 2016, tendo a nomeação sido aceite, no prazo e termos legalmente previstos.
1.5. Na mesma data foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos do disposto no artigo 11º, nº 1, alíneas a) e b) do RJAT, conjugado com os artigos 6º e 7º do Código Deontológico.
1.6. Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c), do nº 1, do artigo 11º do RJAT, o Tribunal Arbitral foi constituído em 19 de Maio de 2016, tendo sido proferido despacho arbitral, na mesma data, no sentido de notificar a Requerida para, “(…) em 30 dias, responder, juntar cópia do processo administrativo e solicitar, querendo, a produção de prova adicional”
1.7. Em 15 de Junho de 2016 a Requerida juntou aos autos cópia do processo administrativo e em 20 de Junho de 2016 apresentou a sua Resposta, tendo-se defendido por impugnação e concluído que “(…) devem ser julgados totalmente improcedentes os pedidos e, consequentemente, absolvida da AT”.
1.8. Por despacho arbitral de 20 de Junho de 2016, tendo em consideração o facto de não ocorrerem no processo circunstâncias que justificassem a realização da reunião a que se refere o artigo 18º do RJAT, foi essa reunião dispensada, tendo-se convidado as partes a, querendo, “produzir alegações escritas no prazo, sucessivo, de 10 dias, contando-se o da Requerida a partir da notificação das alegações do Requerente”.
1.9. Tendo em consideração que nenhuma das partes apresentou alegações escritas, foi produzido despacho arbitral, em 13 de Setembro de 2016, no sentido de referir que a decisão arbitral seria proferida até ao dia 18 de Novembro de 2016 e advertindo o Requerente quanto á necessidade de pagamento da taxa arbitral subsequente, nos termos do disposto no nº 3 do artigo 4º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
2. CAUSA DE PEDIR
O Requerente sustenta o seu pedido, em síntese, da seguinte forma:
2.1. Começa por esclarecer que “em 01.01.1993 (…) foi contratado pelo B… SA para o exercício de funções de Diretor-Geral” e “em 16.03.2000, (….) celebrou contrato de trabalho com outra entidade do mesmo grupo societário, a C… SGPS, S.A. (…), com antiguidade reconhecida a 01.01.1993, também para o exercício das funções de Diretor-Geral (…)”, sendo que “em 20.05.2004, por deliberação da Assembleia Geral de Acionistas da C… SGPS, (…) foi nomeado para o Conselho de Administração daquela entidade para o triénio 2004/2006 (…), tendo ficado suspenso o contrato de trabalho (…)”.
2.2. Neste âmbito, esclarece ainda que “em 24.05.2007, por deliberação da Assembleia Geral de Acionistas da C… SGPS, (…) foi reeleito para o Conselho de Administração daquela entidade para o triénio 2007/2009 (…)” e “em 27.05.2010, por deliberação da Assembleia Geral de Acionistas da C… SGPS, (…) foi mais uma vez reeleito para o Conselho de Administração daquela entidade, agora para o triénio 2010/2012 (…)”, sendo que “no final de 2012, (…) cessou as suas funções no Conselho de Administração, não tendo sido reeleito para o referido órgão para o triénio seguinte, de 2013/2015”.
2.3. Desta forma, segundo o Requerente, “deixou de vigorar a suspensão do contrato de trabalho acima referido em 01.01.2013, tendo (…) voltado a ocupar o seu anterior cargo de Diretor-Geral”.
2.4. “Em 01.07.2013, (…) foi notificado da decisão da sua entidade empregadora, a C… SGPS, de extinguir o seu posto de trabalho (…)” e, “em consequência, o contrato de trabalho celebrado entre o Peticionante e a C… SGPS cessou com efeitos reportados à referida data de 01.07.2013”.
2.5. Nestes termos, esclarece o Requerente que “em virtude da cessação do contrato de trabalho por extinção do posto de trabalho, a C… SGPS pagou ao Peticionante, também em 01.07.2013, o valor de EUR 611.289,00 (…)”, “valor que (…) não incluiu na sua declaração de rendimentos por considerar (…) que o mesmo estava excluído de tributação em sede de IRS”.
2.6. Contudo, continua o Requerente, “em cumprimento da ordem de serviço n.º OI2015…, foi objecto de ação inspetiva interna de âmbito parcial em sede de IRS ao ano de 2013”, tendo servido de fundamento à mesma “o facto de se ter verificado na consulta às declarações mensais de remunerações que o Peticionante tinha auferido rendimentos da categoria A, sem que tivesse procedido à entrega da respetiva modelo 3 de IRS ou houvesse declarado a totalidade dos rendimentos auferidos”, porquanto entenderam “os serviços de inspeção tributária (…) que parte da compensação paga (…) deveria estar sujeita a IRS”.[2] [3]
2.7. Apesar de “não concordar minimamente com esta liquidação”, o Requerente em 07.07.2015 “procedeu ao seu pagamento, para evitar a execução fiscal (…)” e “em 16.09.2015, (…) apresentou reclamação graciosa (…) contra o ato de liquidação adicional (…) supra referido”, tendo sido notificado “em 28.01.2016, (…) da decisão de indeferimento da reclamação graciosa (…)”, “não concordando com a mesma (…)”.
2.8. Em consequência, apresentou o Requerente o presente pedido de pronúncia arbitral, porquanto entende que “(…) a compensação paga ao Peticionante surgiu como consequência da cessação do contrato de trabalho por extinção do posto de trabalho – não estando de modo algum relacionada com as funções de administrador – em pleno e exclusivo cumprimento da legislação laboral em vigor à data dos factos” e, nestes termos, defende que “(…) apenas nos casos em que está em causa a compensação pela cessação de funções de gestor, administrador ou gerente de pessoa coletiva é que se aplicaria a alínea a) do n.º 4 do artigo 2.º do Código do IRS, sendo a prestação paga integralmente sujeita a imposto”.
2.9. Assim, segundo o Requerente, “à data dos factos (…) a subsunção destes às normas em vigor era bastante simples e isenta de qualquer dúvida”, defendendo que a alteração introduzida pela Lei nº 82-E/2014 “(…) veio permitir que, no caso de terem exercido funções de trabalhador, pudessem beneficiar de uma exclusão de tributação relativamente aos valores recebidos destinados a compensar a cessação de um contrato de trabalho (…)”.
2.10. Ou seja, segundo o Requerente, “quando o legislador conferiu natureza interpretativa à alteração efetuada, pretendeu desagravar fiscalmente (com efeitos retroativos) a situação de administradores que cessavam funções e haviam sido trabalhadores no passado”, pelo que entende que “a AT (…) inverteu totalmente o sentido desta norma, transformando este desagravamento numa nova incidência de imposto, pretendendo agravar o IRS de trabalhadores que cessaram o contrato de trabalho e haviam sido, no passado, administradores ou gerentes”.
2.11. Nestes termos, para o Requerente “não pode senão concluir-se que a compensação pela cessação do contrato de trabalho paga (…) se deveu exclusivamente à extinção do seu posto de trabalho, sendo aplicável à referida prestação, por tudo quanto se disse a propósito do enquadramento fiscal das prestações desta natureza, a alínea b) do n.º 4 do artigo 2.º do Código do IRS”.
2.12. E, reitera o Requerente que “mesmo que não se concorde com o acima exposto (…) ainda assim a liquidação aqui impugnada seria ilegal, por manifesta inconstitucionalidade do artigo 14.º da Lei 82-E/2014”, porquanto entende que “a interpretação que a AT efetua deste artigo 14.º viola frontalmente a CRP (…)”, uma vez que “a AT considera que esta norma aplica-se retroactivamente porque o legislador lhe conferiu carácter interpretativo”.[4]
Do direito aos juros indemnizatórios
2.13. Neste âmbito, tendo o Requerente pago a liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) em crise, peticiona para além do reembolso do valor do imposto indevidamente pago, que lhe seja reconhecido o direito a receber juros indemnizatórios [porquanto entende que lhe são aplicáveis os requisitos enunciados no artigo 43º da Lei Geral Tributária (LGT)], calculados nos termos legais.
2.14. Em resumo, conclui o Requerente que deverá ser revogada “a decisão da reclamação graciosa proferida pela Direção de Finanças de Lisboa, por vício de ilegalidade”, ordenando-se, “em consequência, a anulação da liquidação de IRS n.º 2015…” e procedendo-se “ao pagamento dos juros indemnizatórios devidos”.
3. RESPOSTA DA REQUERIDA
3.1. A Requerida respondeu, defendendo-se por impugnação e sustentando que “devem ser julgados totalmente improcedentes os pedidos (…)” e, em consequência, “ser absolvida a Requerida”.
3.2. Neste âmbito, a Requerida reitera a posição anteriormente assumida, defendendo que “(…)a indemnização atribuída, o foi atendendo ao tempo em que o A. exerceu funções como administrador” e que, por isso, “(…) se impunha (…) proceder à determinação do quantum da mesma correspondia ao exercício de funções de administrador”, “(…) no exato cumprimento do texto introduzido pela Lei 82-E/2014, de 31/12/2014, à alínea a) do nº 4 do art. 2º do CIRS”.
3.3. Segundo a Requerida, “não fora esta nova redação, com natureza interpretativa e mais favorável ao contribuinte, e a tributação teria ocorrido pela totalidade, como determinava a redação da alínea a) do nº 4 do art. 2º do CIRS, na versão anterior à Lei 82-E/2014, de 31/12/2014”.
3.4. Assim, defende a Requerida que com as alterações introduzidas na Lei “o que efectivamente se pretendeu foi clarificar aquilo que já vinha sendo o entendimento e a prática, determinando-se expressamente que a indemnização haveria de ser tributada, ou isenta de tributação, precisamente em função do quantum correspondente ao exercício das funções de administrador, e o correspondente ao exercício de funções como trabalhador”, reiterando em matéria de interpretação, citando para o efeito Batista Machado (in “Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador”, Almedina, 1987, pág. 189) que “a letra da lei é o ponto de partida de toda a interpretação e é também o seu limite (…)”, sendo que “(…) é de presumir que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (…)” (sublinhado nosso).
3.5. Nestes termos, não concorda a Requerida com a posição assumida pelo Requerente, pelo que entende que “deve (…) improceder todo o argumentário do A” e, não resultando dos factos “(…) qualquer erro imputável aos serviços, nem pagamento de imposto indevido”, “nenhum vício podendo ser imputado à liquidação em crise e ao acto que recaiu sobre a respectiva reclamação graciosa (…)”, defende a Requerida que “não existe fundamento legal para o pagamento de juros indemnizatórios, devendo o respectivo pedido improceder”.
4. SANEADOR
4.1. O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo uma vez que foi apresentado no prazo previsto na alínea a) do nº 1 do artigo 10º do RJAT.[5]
4.2. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária, são legítimas quanto ao pedido de pronúncia arbitral e estão devidamente representadas, nos termos do disposto nos artigos 4º e 10º do RJAT e do artigo 1º da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de Março.
4.3. O Tribunal é competente quanto à apreciação do pedido de pronúncia arbitral formulado pelo Requerente.
4.4. Não foram suscitadas excepções de que cumpra conhecer.
4.5. Não se verificam nulidades pelo que se impõe, agora, conhecer do mérito do pedido.
5. MATÉRIA DE FACTO
5.1. Dos factos provados
5.2. Consideram-se como provados os seguintes factos (com base nos documentos a seguir identificados, anexados pelo Requerente, bem como nos documentos que fazem parte do processo administrativo anexado pela Requerida):
5.2.1. O Requerente foi contratado, em 01 de Janeiro de 1993, pelo B… S.A., para o exercício de funções de Director-Geral (facto apresentado pelo Requerente, não contestado pela Requerida e cuja antiguidade é referida e salvaguardada no contrato de trabalho identificado no ponto seguinte).
5.2.2. O Requerente, em 16 de Março de 2000, celebrou contrato de trabalho, com outra entidade do mesmo grupo societário, a C… SGPS, S.A. (C…SGPS), relativo às funções de Director-Geral, tendo sido garantida a sua antiguidade com efeitos a 1 de Janeiro de 1993, (conforme cópia do contrato de trabalho anexado aos autos com o pedido – doc. nº 3).
5.2.3. Por deliberação da Assembleia Geral de Acionistas da C… SGPS, de 20 de Maio de 2004, o Requerente foi nomeado para o Conselho de Administração daquela entidade, para o triénio 2004/2006 (conforme cópia da acta nº 40, anexada aos autos com o pedido – doc. nº 4).
5.2.4. Por deliberação da Assembleia Geral de Acionistas da C… SGPS, de 24 de Maio de 2007, o Requerente foi reeleito para o Conselho de Administração daquela entidade, para o triénio 2007/2009 (conforme cópia da acta nº 43, anexada aos autos com o pedido – doc. nº 5).
5.2.5. Por deliberação da Assembleia Geral de Acionistas da C… SGPS, de 27 de Maio de 2010, o Requerente foi reeleito para o Conselho de Administração daquela entidade, para o triénio 2010/2012 (conforme cópia da acta nº 48, anexada aos autos com o pedido – doc. nº 6).
5.2.6. Em consequência das nomeações anteriores, ficou suspenso o contrato de trabalho à data em vigor.
5.2.7. No final do mandato relativo ao triénio 2010/2012, o Requerente cessou as suas funções no Conselho de Administração, não tendo sido reeleito para o referido órgão para o triénio seguinte, de 2013/2015.
5.2.8. Em consequência da não reeleição referida no ponto anterior, deixou de vigorar a suspensão do contrato de trabalho acima referida no ponto 5.2.6., tendo o Requerente voltado a ocupar o seu anterior cargo de Director-Geral na C… SGPS.
5.2.9. Em 01.07.2013, o Requerente foi notificado (PMP) da decisão da C… SGPS de extinguir o seu posto de trabalho (conforme cópia da comunicação da decisão de cessação do contrato de trabalho por extinção do posto de trabalho, anexada aos autos com o pedido – doc. nº 7).
5.2.10. Em consequência da decisão referida no ponto anterior, o contrato de trabalho celebrado entre o Requerente e a C… SGPS (vide ponto 5.2.2., supra) cessou com efeitos reportados 1 de Julho de 2013.
5.2.11. A C… SGPS pagou ao Requerente, em 01 de Julho de 2013, o montante de EUR 611.289,00 sob a designação de “Indemnização isento” (conforme cópia do recibo de vencimento relativo ao mês de Julho de 2013, anexada com o pedido - doc. nº 8).
5.2.12. O Requerente apresentou a declaração modelo 3 de IRS relativa ao ano 2013 em 6 de Maio de 2014 (nº …-…-…-…), tendo declarado no
Anexo A da mesma rendimentos do trabalho dependente no montante total de EUR 252.717,61, não tendo incluído o montante de EUR 611.289,00 (identificado no ponto anterior) respeitante a compensação por cessação do contrato de trabalho (conforme referido no doc. nº 2, anexado com o pedido).
5.2.13. A declaração modelo 3 de IRS identificada no ponto anterior deu origem à liquidação nº 2014…, com imposto a pagar, até 31 de Agosto de 2014, no montante de EUR 3.988,95 (conforme referido no doc. nº 2, anexado com o pedido).
5.2.14. No cumprimento da ordem de serviço n.º OI2015…, datada de 23 de Fevereiro de 2015, foi o Requerente objeto de acção inspectiva interna, de âmbito parcial, em sede de IRS e relativa ao ano de 2013, tendo a mesma tido por fundamento o facto de a Requerida ter verificado, na consulta às declarações mensais de remunerações, “existir uma discrepância entre os rendimentos de trabalho dependente declarados (€ 252.717,61) e os rendimentos (….) auferidos (€ 864.006,61)”, sendo que “a diferença de € 611.289,00 resulta do facto de ter auferido de uma compensação por cessação do contrato de trabalho (…)” (conforme referido no doc. nº 2, anexado com o pedido).
5.2.15. Como resultado da referida acções inspectiva, foram propostas correcções, sem recurso a métodos indirectos, no montante de EUR 494.573,84, tendo o Requerente sido notificado do Ofício nº…, de 27 de Fevereiro de 2015, relativo ao projecto de correcções e para exercer, querendo, o direito de audição por escrito ou oralmente no prazo de 15 dias (conforme referido no doc. nº 9, anexado com o pedido).
5.2.16. Em consequência do ponto anterior, e tendo em consideração o facto de o Requerente não ter exercido o referido direito de audição, foi elaborado documento de correcção à declaração modelo 3 de IRS (nº …-2013-… -…), que deu origem à liquidação nº 2015…, no montante de imposto a pagar de EUR 152.048,34 (conforme referido no doc. nº 2, anexado com o pedido).
5.2.17. Tendo em consideração o IRS anteriormente já liquidado de EUR 3.988,95 (vide ponto 5.2.13., supra), o imposto a pagar constante da nota de cobrança nº 2015… ascendeu a EUR 148.059,39, com data limite para pagamento de 27 de Julho de 2016 (conforme referido no doc. nº 2, anexado com o pedido).
5.2.18. O Requerente, apesar de não concordar com a referida nota de liquidação, procedeu ao seu pagamento, em 7 de Julho de 2015 (conforme doc. nº 10, anexado com o pedido).
5.2.19. O Requerente apresentou, em 16 de Setembro de 2015, a reclamação graciosa nº …2015… contra o acto de liquidação adicional referido no ponto 5.2.16., supra (conforme doc. nº 2, anexado com o pedido).
5.2.20. O Requerente foi notificado, através do Ofício nº… de 7 de Dezembro de 2015, para exercer o direito de audição prévia no prazo de 15 dias (conforme referido no doc. nº 2, anexado com o pedido).
5.2.21. O Requerente não veio, dentro do prazo referido no ponto anterior, exercer qualquer direito de audição prévia relativo ao projecto de indeferimento da reclamação graciosa identificada (conforme referido no doc. nº 2, anexado com o pedido).
5.2.22. O Requerente foi notificado, em 28 de Janeiro de 2016, do Ofício nº … de 26 de Janeiro de 2016, relativo à decisão de indeferimento da reclamação graciosa identificada (conforme referido no doc. nº 2, anexado com o pedido).
5.3. Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito do pedido.
5.4. Dos factos não provados
5.5. Não se verificaram quaisquer factos como não provados com relevância para a decisão arbitral.
6. FUNDAMENTOS DE DIREITO
6.1. Nos autos, para efeitos de dar ou não provimento aos pedidos formulados pelo Requerente:
6.1.1. De revogação da decisão da reclamação graciosa interposta relativamente ao acto de liquidação de IRS do ano de 2013 objecto do pedido;
6.1.2. De anulação da referida liquidação de IRS e,
6.1.3. De reembolso do imposto pago acrescido de juros indemnizatórios,
Importará decidir se a compensação paga ao Requerente na sequência da cessação do contrato de trabalho, em 1 de Julho de 2013, é enquadrável na alínea b), do nº 4 do artigo 2º do Código do IRS (em vigor à data a que respeita o facto gerador do imposto) e, nessa medida, totalmente isenta de tributação [6]por dizer respeito a compensação derivada de cessação de contrato de trabalho por extinção do posto de trabalho (como defende o Requerente) ou se, pelo contrário (como defende a Requerida), é enquadrável na alínea a), do nº 4, do artigo 2º do Código do IRS, porquanto “a (…) compensação atribuída (…) visa compensar (…) o período em que exerceu funções de trabalho dependente e o período em que exerceu funções de administração”, “pelo que, se impunha, (…) proceder à determinação do quantum da mesma [que] correspondia ao exercício de funções de administrador”, “(...) no exacto cumprimento do texto introduzido pela Lei 82-E/2014, de 31 de dezembro de 2014, à alínea a) do nº 4 do artigo 2º do CIRS”, ou seja, sujeitando a referida compensação a tributação na parte proporcional ao exercício das funções de administrador (sublinhado nosso).
6.2. Neste âmbito, é oportuno desde já referir que, em sede de interpretação de normas de incidência tributária, a segurança jurídica (valor subjacente ao princípio da legalidade), não consente outra interpretação que não a literal e, citando-se neste âmbito, J. Baptista Machado (in “Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador”, Almedina, 1987, pág. 189), quando defende que “a letra da lei é o ponto de partida de toda a interpretação e é também o seu limite (…)” (citação que, curiosamente, também é usada pela Requerida, na Resposta apresentada, mas no sentido de demonstrar o oposto do pretendido pelo Requerente).
6.3. Na verdade, e sem prejuízo do acima exposto, é “hoje pacífico que as leis fiscais se interpretam como quaisquer outras, havendo que determinar o seu verdadeiro sentido de acordo com as técnicas e elementos interpretativos geralmente aceites pela doutrina (…)” (cfr. ac. TCAS, 21/9/2010, proc. 3748/10 e Rui Duarte Morais, Sobre o I.R.S., 2ª. edição, Almedina, 2010, pág.56)”.[7]
6.4. Por outro lado, recorde-se que, no Direito Fiscal, por força do princípio da legalidade previsto no artigo 106º, nº 2, da Constituição da República Portuguesa (CRP), bem como como consequência dos princípios da tipicidade e determinação em que aquele se desdobra, as normas de incidência têm de ser pré-determinadas no seu conteúdo, devendo os elementos integrantes da mesma estar formulados de modo preciso e determinado.
6.5. Assim, e no que diz respeito ao nascimento da obrigação tributária, aqui importante para aferir das condições aplicáveis e, em consequência, determinar a legislação aplicável, esclarece o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA) nº 0827/06, de 29 de Novembro de 2006 que, conforme se lê “no acórdão de 26 de Junho de 2002 proferido por este Tribunal no processo nº 26811 (…) os impostos assentam, essencialmente, na capacidade contributiva revelada através do rendimento ou da sua utilização e do património. Logo, o que conta é o momento em que se obtém o rendimento ou a utilização do rendimento, pois só aí é que existe capacidade contributiva”, pelo que se conclui que o facto tributário nasce no momento em que o rendimento (no caso, derivado do pagamento de compensação por cessação de contrato de trabalho) é pago ou colocado à disposição.
6.6. Citando o Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul (TCAS), proferido no âmbito do processo nº 04771/11, de 22 de Janeiro de 2013, “o acto tributário tem sempre na sua base uma situação de facto concreta, a qual se encontra prevista abstracta e tipicamente na lei fiscal como geradora do direito ao imposto”, sendo que “essa situação factual e concreta define-se como facto tributário, o qual só existe desde que se verifiquem todos os pressupostos legalmente previstos para tal” (sublinhado nosso).[8]
6.7. Nestes termos, o facto tributário (“situação factual e concreta, que só existe desde que se verifiquem todos os pressupostos legalmente previstos para tal”), nasce no momento em que o rendimento é pago (ou colocado à disposição), sendo que é nesse momento em que se obtém o rendimento (ou a utilização desse rendimento) que determina a existência da capacidade contributiva do sujeito passivo, devendo ser aplicado a esse facto tributário a legislação que, nesse mesmo momento, está em vigor, no mais estrito cumprimento do princípio da legalidade.
6.8. Em termos gerais, à data a que se reportam os factos subjacente ao caso em análise (1 de Julho de 2013), dispunha o artigo 2º do Código do IRS, nos seus nº 1 e nº 2 que se consideravam “rendimentos do trabalho dependente todas as remunerações pagas ou postas à disposição do seu titular, provenientes de trabalho por conta de outrem prestado ao abrigo de contrato individual de trabalho ou de outro a ele legalmente equiparado (…)”, compreendendo “(…) designadamente, ordenados, salários, vencimentos, gratificações, percentagens, comissões, participações, subsídios ou prémios, senhas de presença, emolumentos, participações em multas e outras remunerações acessórias, ainda que periódicas, fixas ou variáveis, de natureza contratual ou não” (sublinhado nosso).
6.9. De acordo com o disposto no nº 4 do referido artigo 2º do Código do IRS (na redacção em vigor no ano 2013, ou seja, à data dos factos descritos no pedido), “quando, por qualquer forma, cessem os contratos subjacentes às situações referidas nas alíneas a), b) e c) do n.º 1, mas sem prejuízo do disposto na alínea d) do mesmo número, quanto às prestações que continuem a ser devidas mesmo que o contrato de trabalho não subsista, ou se verifique a cessação das funções de gestor público, administrador ou gerente de pessoa colectiva (…), as importâncias auferidas, a qualquer título, ficam sempre sujeitas a tributação:
a) Pela sua totalidade, tratando-se de gestor público, administrador ou gerente de pessoa colectiva (…);
b) Na parte que exceda o valor correspondente ao valor médio das remunerações regulares com carácter de retribuição sujeitas a imposto, auferidas nos últimos 12 meses, multiplicado pelo número de anos ou fracção de antiguidade ou de exercício de funções na entidade devedora, nos demais casos, salvo quando nos 24 meses seguintes seja criado novo vínculo profissional ou empresarial, independentemente da sua natureza, com a mesma entidade, caso em que as importâncias serão tributadas pela totalidade” (sublinhado nosso).
6.10. Ou seja, nos termos do disposto no Código do IRS, “o legislador considera rendimentos do trabalho dependente quaisquer indemnizações resultantes, além do mais, da extinção da relação jurídica que origine os mesmos rendimentos do trabalho dependente”, sendo que “tais indemnizações pela cessação do contrato de trabalho não se enquadram no conceito de remuneração, embora recebam enquadramento expresso enquanto rendimentos do trabalho passíveis de tributação, nos termos consagrados no nº 4, do mesmo preceito”. [9]
6.11. Ora, tendo em consideração os factos dados como provados no Capítulo 5 desta Decisão, nomeadamente, que:
6.11.1. O Requerente foi contratado, em 01 de Janeiro de 1993, pelo B… S.A. para o exercício de funções de Director-Geral (vide ponto 5.2.1. do capítulo anterior) e que, em 16 de Março de 2000, celebrou contrato de trabalho relativo às funções de Director-Geral, com outra entidade do mesmo grupo societário (C… SGPS), tendo-lhe sido garantida a sua antiguidade anterior, ou seja, com efeitos a 1 de Janeiro de 1993 (vide ponto 5.2.2. do capítulo anterior);
6.11.2. Por sucessivas deliberações da Assembleia Geral de Acionistas da C… SGPS, o Requerente foi sendo nomeado para o Conselho de Administração daquela entidade, para os triénios 2004/2006, 2007/2009 e 2010/2012 (vide ponto 5.2.3. a 5.2.5. do capítulo anterior) e, em consequência das nomeações referidas no ponto anterior, ficou suspenso o contrato de trabalho anteriormente em vigor (vide ponto 5.2.6. desta Decisão);
6.11.3. No final do mandato relativo ao triénio 2010/2012, o Requerente cessou as suas funções no Conselho de Administração (vide ponto 5.2.7. do capítulo anterior) tendo, em consequência, reassumido o seu anterior cargo de Director-Geral na C… SGPS (vide ponto 5.2.8. do capítulo anterior), ou seja, voltando às suas funções de trabalhador dependente que desempenhou até 1 de Julho de 2013, data da cessação do referido contrato de trabalho por extinção do posto de trabalho (vide ponto 5.2.10. do capítulo anterior);
Verifica-se que, em 1 de Julho de 2013, quando o Requerente cessou as suas funções na C… SGPS, as mesmas diziam respeito às funções de Director-Geral (inerentes ao seu contrato de trabalho), enquanto trabalhador dependente e a Requerida, em momento algum do seu itinerário cognoscitivo, logra demonstrar e provar o contrário.
6.12. Nessa medida, de acordo com o texto legal, à data aplicável [alínea b), do nº 4 do artigo 2º do Código do IRS], “(…) as importâncias auferidas, a qualquer título (…)”, pela cessação do referido contrato, só ficariam sujeitas a tributação na parte que excedessem “(…) o valor correspondente ao valor médio das remunerações regulares com carácter de retribuição sujeitas a imposto, auferidas nos últimos 12 meses, multiplicado pelo número de anos ou fracção de antiguidade (…)” (sublinhado nosso).
6.13. Ou seja, a compensação paga pela cessação do contrato de trabalho, a 1 de Julho de 2013, por extinção do posto de trabalho, estava abrangida pelo disposto no artigo 2º, nº 4, alínea b) do Código do IRS (na redacção em vigor no ano 2013), conforme defende o Requerente porquanto, a aplicabilidade da alínea a), do nº 4, do artigo 2º do Código do IRS (como defende a Requerida) só seria possível se, naquela data, o Requerente ainda fosse membro do Conselho de Administração da C… SGPS e fosse nessa qualidade que tivesse cessado as suas funções o que, como vimos, já não sucedia, dado que o Requerente não foi reeleito, como tal, na respectiva Assembleia Geral, para o triénio 2013/2015 (vide ponto 5.2.7. desta Decisão).
6.14. Em consequência, a compensação paga pela cessação do contrato de trabalho do Requerente estará totalmente isenta de tributação em sede de IRS, assumindo que cumpre com os requisitos previstos no artigo 2º, nº 4, alínea b) do Código do IRS, nomeadamente, porque não excede “o valor correspondente ao valor médio das remunerações regulares com carácter de retribuição sujeitas a imposto, auferidas nos últimos 12 meses, multiplicado pelo número de anos ou fracção de antiguidade (…)”, facto que em momento algum é contestado pela Requerida.
6.15. Nestes termos, face ao acima exposto, entende o Tribunal Arbitral não ser aplicável à situação em análise o disposto na alínea a), do nº 4, do artigo 2º do Código do IRS, nem na redação à data em vigor, nem na redacção subsequente (introduzida pela Lei nº82-E/2014, de 31 de Dezembro), independentemente do seu carácter interpretativo, porquanto, repita-se, a compensação paga ao Requerente é devida pela cessação de um contrato de trabalho e, nessa medida, não é aquela a disposição legal que lhe era aplicável, em 1 de Julho de 2013, tendo em conta as condicionantes subjacentes ao facto tributável a que se fez referência na presente Decisão, não tendo, reitera-se, a Requerida feito prova de que tal não foi assim.
6.16. Assim, entende o Tribunal Arbitral que assiste razão ao Requerente quanto aos pedidos formulados em sede de pronúncia arbitral, e acima identificados nos pontos 6.1.1. e 6.1.2. da presente Decisão, pelo que será de revogar a decisão que recaiu sobre a reclamação graciosa apresentada contra a liquidação de IRS em crise e, em consequência, será também de anular a referida liquidação de IRS relativa ao ano de 2013, porquanto enferma de vício de ilegalidade.
6.17. Em consequência, face ao acima exposto, e tendo em consideração que “o julgador não tem que analisar e a apreciar todos os argumentos, todos os raciocínios, todas as razões jurídicas invocadas pelas partes em abono das suas posições”, entende este Tribunal Arbitral que, com a conclusão expressa no ponto 6.15., fica prejudicada a análise dos restantes argumentos apresentados por ambas as Partes.[10]
Do reembolso do imposto pago, com juros indemnizatórios
6.18. Tendo em consideração a conclusão referida nos pontos 6.6. e 6.7., supra, bem como o facto de o valor associado com a liquidação de IRS ter sido atempadamente pago (vide acima o ponto 5.2.18.), o Requerente tem direito ao reembolso das quantias indevidamente pagas.
6.19. Ora, no que diz respeito ao pagamento de juros indemnizatórios, de acordo com o disposto no nº 5, do artigo 24.º do RJAT “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário”, daqui resultando que uma decisão arbitral não se limita à apreciação da legalidade do acto tributário.
6.20. De igual modo, de acordo com o disposto no artigo 24º, nº 1, alínea b) do RJAT, deverá ser entendido que o pedido de juros indemnizatórios é uma pretensão relativa a actos tributários (v.g. de liquidação), que visa explicitar/concretizar o conteúdo do dever de “restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito”.
6.21. Como refere Jorge Lopes de Sousa “insere-se nas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD a fixação dos efeitos da decisão arbitral que podem ser definidos em processo de impugnação judicial, designadamente, a anulação dos actos cuja declaração de ilegalidade é pedida, a condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira no pagamento de juros indemnizatórios (…)” (sublinhado nosso).[11] [12]
6.22. Assim, nos processos arbitrais tributários pode haver lugar ao pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do disposto nos artigos 43º, nºs 1 e 2, e 100º da LGT, quando se determine que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.
6.23. Nestes termos, o direito a juros indemnizatórios dependerá sempre da verificação de um erro imputável aos serviços da Requerida, do qual tenha resultado um pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.
6.24. Na sequência da ilegalidade do acto de liquidação acima já identificado (vide ponto 6.16.) e, nos termos do disposto na alínea b), do nº 1, do artigo 24º do RJAT (em conformidade com o que aí se estabelece), “a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito”, pelo que terá de haver lugar ao reembolso do montante pago pelo Requerente, como forma de se alcançar a reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade.
6.25. Assim, face ao estabelecido no artigo 61º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), preenchidos que estão os requisitos do direito a juros indemnizatórios (ou seja, verificada a existência de erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido, tal como previsto no nº 1, do artigo 43º da LGT), o Requerente tem direito a juros indemnizatórios, à taxa legal, calculados sobre a quantia paga, no âmbito da liquidação de IRS objecto do pedido de pronúncia arbitral, os quais serão contados de acordo com o disposto no nº 3 do artigo 61º do CPPT, ou seja, desde a data do pagamento do imposto indevido até à data da emissão da respectiva nota de crédito.
Da responsabilidade pelo pagamento das custas arbitrais
6.26. De harmonia com o disposto no artigo 22º, nº 4, do RJAT, “da decisão arbitral proferida pelo tribunal arbitral consta a fixação do montante e a repartição pelas partes das custas directamente resultantes do processo arbitral”.
6.27. Assim, nos termos do disposto no artigo 527º, nº 1 do Código de Processo Civil (CPC) (ex vi 29º, nº 1, alínea e) do RJAT), deve ser estabelecido que será condenada em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito.
6.28. Neste âmbito, o nº 2 do referido artigo concretiza a expressão “houver dado causa”, segundo o princípio do decaimento, entendendo que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.
6.29. No caso em análise, tendo em consideração o acima exposto, o princípio da proporcionalidade impõe que seja atribuída a responsabilidade integral por custas à Requerida, de acordo com o disposto no artigo 12º, nº 2 do RJAT e artigo 4º, nº 4 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
7. DECISÃO
7.1. Assim, face a todo o supra exposto, decide este Tribunal Arbitral:
7.1.1. Julgar integralmente procedente o pedido de pronúncia arbitral apresentado pelo Requerente, revogando a decisão da reclamação graciosa que recaiu sobre a liquidação de IRS objecto do pedido e, em consequência, anulando a referida liquidação de IRS, por enfermar de vício de ilegalidade, condenando-se a Requerida no reembolso do IRS indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios à taxa legal, contados nos termos legais;
7.1.2. Condenar a Requerida no pagamento das custas do presente processo.
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Valor do processo: Tendo em consideração o disposto nos artigos 306º, nº 2 do CPC, artigo 97º-A, nº 1 do CPPT e no artigo 3º, nº 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor do processo em EUR 148.059,39.
Custas do processo: Nos termos do disposto na Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor das custas do Processo Arbitral em EUR 3.060,00, a cargo Requerida, de acordo com o artigo 22º, nº 4 do RJAT.
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Notifique-se.
Lisboa, 31 de Outubro de 2016.
O Árbitro-Presidente
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O Árbitro Vogal
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O Árbitro Vogal
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José Baeta de Queiroz
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Henrique Nogueira Nunes
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Sílvia Oliveira
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[1] Texto elaborado em computador, nos termos do artigo 138.º, n.º 5, do Código de Processo Civil, aplicável por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, com versos em branco e por nós revisto, e respeitando a ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990, excepto no que diz respeito às transcrições efectuadas, em que se manteve a ortografia do original.
[2] Neste âmbito, e relativamente ao ano de 2013, “os serviços de inspeção tributária consideraram existir uma discrepância entre os rendimentos do trabalho dependente declarados (…) (no valor de € 252.717,61) e os que terá efetivamente auferido a esse título (no valor de € 864.006,61), o que originou a liquidação adicional de IRS n.º 2015…. (…)”. Com efeito, segundo refere o Requerente, “no entender da AT, o mero facto de o Peticionante ter desempenhado funções de administrador em parte do período em que esteve ao serviço da C… SGPS é, por si só, suficiente para sujeitar a IRS parte da compensação auferida”, concluindo que “(…) uma vez que o Peticionante exerceu funções de administrador em parte do período em que esteve ao serviço da C… SGPS SA, a compensação recebida não terá sido paga devido exclusivamente ao exercício das funções de trabalhador, mas também e em parte pelas funções de administrador (…)”, sendo que “para determinar que parte da compensação deveria ser afeta à cessação do contrato de trabalho e que parte deveria ser afeta à cessação das funções de administração, a AT fez um cálculo com base na proporção entre o número de dias em que foram exercidas cada uma das funções, tendo aferido que o Peticionante exerceu funções como trabalhador durante 4196 dias e como administrador 3290 (…)”, tendo concluído “(…) que a compensação pela cessação do contrato de trabalho foi de € 342.635,41 e a compensação pela cessação das funções de administrador foi de € 268.653,59, estando este último valor integralmente sujeito a IRS” (sublinhado nosso).
[3] Segundo o Requerente, “de modo a fundamentar o seu entendimento, a AT invocou a nova redação da alínea a) do n.º 4.º do artigo 2.º do Código do IRS, que foi introduzida pela Lei n.º 82-E/2014, de 31 de Dezembro, que procedeu à reforma do Código do IRS (…)”, nos termos da qual “(…) nos casos de cessação do contrato de trabalho de administradores, o valor de indemnização auferida, na parte correspondente ao exercício dessas funções, fica totalmente sujeito a tributação”.
[4] Para sustentar a sua posição, cita o Requerente o Acórdão do STA de 16 de Maio de 2012 (processo nº 0675/11), bem como a posição defendida por J. Baptista Machado (in “Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador”, 19ª Reimpressão, Almedina, páginas 245 e 246) e a posição defendida por Saldanha Sanches (in “Fiscalidade 1 - Lei interpretativa e retroactividade em matéria fiscal”, 2000, página 86).
[5] Neste âmbito, tendo em conta que no pedido de pronúncia arbitral está incluído o pedido de sindicância da decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada, em 16 de Setembro de 2015, contra o acto tributários de liquidação de IRS do ano de 2013 (como forma de poder declarar, em última instância, a ilegalidade da liquidação de IRS objecto do pedido), a qual foi notificada ao Requerente em 28 de Janeiro de 2016, a decisão de indeferimento de reclamação graciosa que comporte a apreciação da legalidade de acto de liquidação está abrangida na previsão da alínea e) do nº 1 do artigo 102º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT). Assim, tendo em consideração o disposto no n° l do artigo 102° do CPPT (na redacção em vigor desde 1 de Janeiro de 2013), o prazo de dedução da impugnação judicial é de três meses contados dos factos enumerados naquele artigo, nomeadamente, “da notificação dos restantes actos que possam ser objecto de impugnação autónoma nos termos deste Código”, bem como o previsto no artigo 10º, nº 1, alínea a) do RJAT que estabelece que o pedido de constituição de tribunal arbitral deve ser apresentado “no prazo de 90 dias, contado a partir dos factos previstos nos nºs 1 e 2 do artigo 102º do CPPT, quanto aos actos susceptíveis de impugnação autónoma (...)”, pelo que, tendo em conta a data da interposição do pedido de pronúncia arbitral (11 de Março de 2016), o pedido é tempestivo.
[6] Porque dentro dos limites previstos na lei.
[7] Neste âmbito, cita também o referido Acórdão o artigo 9º do Código Civil, o artigo 11º da LGT, bem como José de Oliveira Ascensão, in “O Direito, Introdução e Teoria Geral”, Editorial Verbo, 4ª. Edição, 1987, página 335 e segts., J. Baptista Machado, in “Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador”, Almedina, 1989, página 181 e segts. e Nuno Sá Gomes, in “Manual de Direito Fiscal, II, Cadernos de C.T. Fiscal, nº.174”, 1996, página 363 e segts.
[8] Neste sentido, vide Alberto Xavier, in “Conceito e Natureza do Acto Tributário”, página 324, Nuno de Sá Gomes, in “Manual de Direito Fiscal, II, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal”, 1996, página 57, A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, in “Código de Processo Tributário Anotado e Comentado”, 3ª. Edição, 1997, página 269, todos citados no referido Acórdão.
[9] Conforme se refere no Acórdão do TCAS nº 05971/12, de 12 de Março de 2013, no qual se citam José Guilherme Xavier Basto, in “IRS: Incidência Real e Determinação dos Rendimentos Líquidos”, Coimbra Editora, 2007, página 131 e Rui Duarte Morais, in “Sobre o I.R.S.”, 2ª. Edição, Almedina, 2010, página 55 e segts.
[10] Neste sentido, vide Acórdão do STJ nº 05S2137, de 29 de Novembro de 2005, nos termos do qual se cita Alberto dos Reis [in “Código de Processo Civil Anotado, Volume V”, Coimbra Editora, 1981 (reimpressão), página 143], autor que defendia que “há que não confundir questões suscitadas pelas partes com motivos ou argumentos por elas invocados para fazerem valer as suas pretensões. São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão” (sublinhado nosso).
[11] Vide Leite de Campos, Diogo, Silva Rodrigues, Benjamim, Sousa, Jorge Lopes, in “Lei Geral Tributária - Anotada e Comentada”, 4.ª Ed., 2012, página 116).
[12] Sobre a temática dos juros indemnizatórios pode ver-se do mesmo autor (Sousa, Jorge Lopes), Juros nas relações tributárias, in “Problemas fundamentais do Direito Tributário”, Lisboa, 1999, página 155 e sgts).