Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 79/2016-T
Data da decisão: 2016-10-25  Selo  
Valor do pedido: € 22.279,37
Tema: IS - Verba 28.1 da TGIS Propriedade vertical
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Decisão Arbitral

Requerente:A…, Lda.

Requerida: Autoridade Tributária e Aduaneira

I. Relatório

1.      A…, Lda. pessoa coletiva n.º…, com sede na Avenida…, …, …, …-… …, doravante designada por “Requerente” ou “A…”, vem, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º e no artigo 10.º, ambos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”), requerer a constituição de tribunal arbitral e submeter o pedido de pronúncia arbitral após a formação da presunção de indeferimento tácito do Pedido de Revisão Oficiosa das liquidações de Imposto do Selo de 2012 e 2013, emitidas ao abrigo da verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo (“TGIS”), anexa ao Código do Imposto do Selo (“CIS”), respeitantes a um prédio urbano descrito na matriz predial sob o artigo … da freguesia de … e …(anterior artigo…, da freguesia do…), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (adiante designada como “Requerida” ou “AT”).

2.      O pedido de constituição de tribunal arbitral, correspondente ao registo n.º … foi validado e aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD, tendo sido notificado à Requerida em 26/02/2016

3.      A Requerente optou por não designar árbitro, tendo, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico designado como árbitro do tribunal arbitral singular a ora signatária, que aceitou o encargo no prazo legalmente estipulado.

4.      As partes foram devidamente notificadas da nomeação em 12/04/2016, não tendo manifestado vontade de recusar a mesma.

5.      Em conformidade com o disposto na alínea c) do n.º 1 artigo 11.º do RJAT, o tribunal arbitral singular ficou constituído em 29/04/2016.

6.      A Requerida foi notificada em 02/05/2016 para apresentar resposta, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 17.º do RJAT.

7.      A Requerida apresentou a sua resposta em 06/06/2016 alegando, por exceção, a intempestividade do pedido de pronúncia arbitral e a consequente a absolvição da instância, e, por impugnação, a legalidade dos atos tributários em crise, concluindo pela improcedência total do pedido e consequente absolvição do mesmo.

8.      Nessa mesma resposta, atendendo à natureza estritamente jurídica da exceção de intempestividade do pedido de pronuncia arbitral, e a questão controvertida nos autos ser exclusivamente de direito, a Requerida veio, em consonância com os princípios da cooperação, da boa fé processual e da livre condução do processo consignados, respetivamente, na alínea f) do artigo 16.º e no artigo 19.º do RJAT, e ainda com o princípio da limitação de atos inúteis do artigo 130.º do Código do Processo Civil (“CPC”), requerer a dispensa da apresentação do Processo Administrativo, bem como a dispensa de realização da reunião prevista no artigo 18º do RJAT.

9.      Considerando a autonomia do tribunal arbitral na condução do processo, prevista nomeadamente na alínea c) do artigo 16.º do RJAT, tendo em conta a simplicidade das questões em apreço e que o processo já reunia todas as provas necessárias para a decisão de mérito, por razões de economia processual, foi, por despacho de 06/06/2016, dispensada a realização da primeira reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, concedendo-se, ao abrigo do princípio do contraditório, um prazo de 10 dias (prazo sucessivo) para alegações finais escritas.

10.  A prolação da decisão arbitral foi agendada para dia 9 de Setembro de 2016, tendo a Requerente sido advertida que deveria proceder ao pagamento da taxa arbitral subsequente nos termos do n.º 3 do artigo 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem, e comunicar o seu pagamento ao CAAD.

11.  A Mandatária da Requerente apresentou requerimento em 21/06/2016, sustentando que a exceção da tempestividade do pedido de pronúncia arbitral não poderia proceder e, admitindo por cautela e dever de patrocínio que o Pedido não foi adequadamente formulado, requerendo a possibilidade de retificação da imprecisão do pedido, ao abrigo dos princípios de boa fé das partes, concretização da justiça material e de gestão processual, e nos termos dos artigos 614.º do CPC, aplicado por analogia, ex vi alínea e) do artigo 29.º do RJAT e artigo 249.º do Código Civil.

12.  Em obediência ao princípio do contraditório, a signatária emitiu despacho dando à representante da Requerida um prazo de 10 dias para se pronunciar sobre o requerimento apresentado pela Requerente.

13.  A representante da Requerida não se pronunciou sobre o requerimento no prazo concedido.

14.  Assim, em 04/07/2016, foi emitido despacho arbitral indeferindo o requerimento de retificação do pedido de pronúncia arbitral apresentado pela Mandatária da Requerente, considerando que esta faculdade somente se aplica para correção de meros erros materiais ou erros de escrita, ou para correção de inexatidões devidas a omissões ou lapsos manifestos.

15.  Mais considerou o Tribunal que o requerimento supra suspendeu o prazo para alegações escritas, tendo sido concedido novo prazo de 10 dias (prazo sucessivo) para as partes apresentarem as suas alegações finais por escrito, adiando-se a prolação da decisão arbitral até ao dia 29 de Outubro de 2016.

16.  A ilustre Mandatária da Requerente apresentou alegações por escrito em 22/09/2016, pugnando pela anulação do ato de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa e consequentemente anulação dos atos de liquidação de IS de 2012 e de 2013.

17.  A ilustre representante da Requerida não apresentou alegações por escrito.

II. Resumo das pretensões da Requerente e da Requerida

A. Pretensão da Requerente

18.  A Requerente sustenta que o presente pedido de pronúncia arbitral deverá ser julgado totalmente procedente por provado, com base em erro nos pressupostos de direito, por, no caso concreto dos prédios constituídos em “propriedade vertical”, e para efeito de incidência da verba 28.1 da TGIS, dever relevar o valor patrimonial tributário (“VPT”) individual e efetivo de cada uma das divisões/andares e não a soma dos VPT’s de todas as divisões/andares do prédio, com afetação habitacional.

19.  Sustenta, ainda, o seu pedido no princípio da igualdade, decorrente de a Requerente ter obtido uma decisão arbitral[1] favorável relativamente às liquidações de IS do ano 2014, processo com a mesma matéria de facto e de direito.

20.  Consequentemente, a Requerente peticiona a anulação do indeferimento tácito do Pedido de Revisão Oficiosa e, consequentemente, das liquidações de Imposto do Selo de 2012 e 2013, emitidas ao abrigo da verba 28.1 da TGIS, anexa ao CIS, com a restituição do imposto pago, acrescido de juros indemnizatórios à taxa legal, desde a data do pagamento do imposto, até à sua efetiva restituição, para todos os devidos efeitos legais.

21.  Em resposta à exceção de intempestividade alegada pela Requerida, veio a Requerente pugnar pela improcedência da mesma por considerar que a apresentação do Pedido de Pronúncia Arbitral se seguiu à não resposta – pela Autoridade Tributária - em tempo útil/ legal do Pedido de Revisão Oficiosa apresentado e à consequente formação do indeferimento tácito de tal pedido.

22.  Pelo que, segundo a Requerente, o presente Pedido de Pronúncia Arbitral deveria ser julgado procedente por provado, anulando-se, em consequência, as liquidações de Imposto do Selo de 2012 e 2013, dado ser de considerar, no caso de os prédios constituídos em “propriedade vertical”, para efeitos de incidência da verba 28.1 da TGIS, o VPT individual e efetivo de cada uma das divisões/andares com afetação habitacional do prédio.

B. Pretensão da Requerida

23.  A Requerida, por seu turno, alega, por exceção, a intempestividade do pedido de pronúncia arbitral, por considerar que o pedido de pronúncia arbitral da Requerente recai sobre a declaração da ilegalidade dos atos de liquidação de IS de 2012 e 2013, e que, tendo sido apresentado em 11.02.2016, seria intempestivo, devendo a Requerida ser absolvida da instância.

24.  Sem conceder, por impugnação, a Requerida sustenta que, para efeitos da verba 28.1 da TGIS, o valor patrimonial relevante para efeitos da incidência do imposto é o valor patrimonial total do prédio urbano e não o valor patrimonial de cada uma das partes que o componham, ainda quando suscetíveis de utilização independente. Concluindo, assim, pela legalidade das liquidações impugnadas, devendo ser considerada como improcedente a pretensão da Requerente e absolvida a Requerida.

25.  A Requerida não apresentou alegações por escrito.

III. Saneamento

26.  O Tribunal arbitral encontra-se regularmente constituído.

27.  O Tribunal é materialmente competente, nos termos da alínea a) do n.º 1 artigo 2.º do RJAT para julgar sobre o pedido de anulação do ato tácito de indeferimento do pedido de revisão oficiosa[2] dos atos de liquidação de IS ao abrigo da verba 28.1 da TGIS anexa ao CIS e sobre os juros indemnizatórios.

28.  A Requerente cumula pedidos, relativamente às liquidações de Imposto do Selo de 2012 e de 2013, o que, nos termos do artigo 104.º do Código do Procedimento e do Processo Tributário e do n.º 1 do artigo 3.º do RJAT, é admissível dada a identidade das circunstâncias de facto e a aplicação dos mesmos princípios e regras de direito,

29.  As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas (artigos 3.º, 6.º e 15.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, ex vi alínea a) do n.º 1 do artigo 29.ºdo RJAT.

30.  Foi alegada pela Requerida uma questão prévia – a intempestividade do pedido de pronúncia arbitral – que será analisada na parte decisória, após a fixação da matéria de facto dada como provada.

31.  Não se verificam quaisquer nulidades, nem foram alegadas pelas partes outras exceções ou questões prévias que devam ser analisadas de imediato.

IV. Matéria de facto

A. Factos dados como provados

32.  Com interesse para a decisão da causa, dão-se como provados os seguintes factos.

33.  A Requerente é a proprietária do prédio urbano que corresponde ao artigo matricial…, da freguesia de … e …(anterior artigo…, da freguesia do…).

34.  De acordo com a respetiva caderneta predial, o prédio encontra-se constituído em “propriedade total com andares ou divisões suscetíveis de utilização independente”.

35.  O prédio está descrito na matriz como sendo constituído por duas vivendas individuais, ambas para a habitação e de utilização independente:

a)       Vivenda com 3 pisos e 12 divisões, composta também por uma casa de caseiro, duas piscinas, casa das máquinas e casa de cães;

b)       Vivenda constituída por 2 pisos.

36.  À data das liquidações, as vivendas tinham os seguintes VPT’s:

 

Valor patrimonial tributário

Identificação do Prédio

2012

2013

Moradia A

    894.054,42 €

    967.940,00 €

Moradia B

    159.652,58 €

    206.290,00 €

Total

 1.053.707,00 €

 1.174.230,00 €

 

37.  Atendendo à afetação habitacional do prédio e aos VPT’s totais, em 2012 e 2013, a AT notificou a Requerente das liquidações de Imposto do Selo por referência ao ano de 2012 e 2013 nos termos da verba 28.1 da TGIS, conforme descrito infra:

Ano do Imposto

Identificação do documento

Identificação do prédio

Prestação

Data de Pagamento

Valor a pagar

2012

2013…

Moradia A

02-04-2013

2.980,18 €

2013…

Moradia A

22-07-2013

2.980,18 €

2013…

Moradia A

04-11-2013

2.980,18 €

2013…

Moradia B

02-04-2013

532,19 €

2013…

Moradia B

22-07-2013

532,17 €

2013…

Moradia B

04-11-2013

532,17 €

 

 

 

 

 

10.537,07 €

2013

2014…

Moradia A

31-03-2014

3.226,48 €

2014…

Moradia A

01-07-2014

3.226,46 €

2014…

Moradia A

19-11-2014

3.226,46 €

2014…

Moradia B

31-03-2014

687,64 €

2014…

Moradia B

01-07-2014

687,63 €

2014…

Moradia B

19-11-2014

687,63 €

         

11.742,30 €

Total

22.279,37 €

 

 

38.  No entanto, por não concordar com as liquidações de Imposto do Selo notificadas, a Requerente apresentou em junto do Serviço de Finanças de … -…, em 23/07/2015, Pedido de Revisão Oficiosa dos atos tributários.

39.  Em 16/11/2015, foi emitida a decisão arbitral no processo n.º 463/2015-T[3], referente às liquidações de IS relativas ao ano de 2014.

40.  Contudo, o Pedido de Revisão Oficiosa das liquidações dos anos de 2012 e 2013 não obteve decisão expressa até ao dia 23/11/2015, nem em data posterior.

41.  Em 11 de Fevereiro de 2016, a Requerente apresentou o presente Pedido de constituição do tribunal arbitral / Pronúncia Arbitral.

B. Fundamentação da matéria de facto provada e não provada

42.  A decisão da matéria de facto efetuou-se com base na informação carreada para o processo e que não foi impugnada pelas Partes.

43.  Não existem factos com relevo para a decisão que não tenham sido dado como provados.

V. Questões a decidir

44.  A questão prévia que cumpre analisar é a intempestividade do Pedido de Pronúncia Arbitral, alegada pela Requerida, a qual é uma exceção dilatória que obsta ao conhecimento do mérito da causa e implica a absolvição da instância.

45.  Caso não seja de proceder a exceção, haverá que conhecer do mérito da causa, ou seja, decidir se, no caso de prédios urbanos em propriedade total, para efeito da verba 28.1 da TGIS, deverá relevar o valor patrimonial tributário total do prédio urbano ou se, pelo contrário, se deverá relevar o VPT atribuído a cada andar ou divisão com utilização independente que o compõem.

VI. Do Direito

A. Questão prévia – Intempestividade do pedido de pronúncia arbitral

46.  A Requerida alega a exceção da intempestividade do Pedido de Pronúncia Arbitral, o que constituiria uma exceção dilatória, nos termos da alínea h) do número 1 do artigo 89.º do CPTA (atual alínea k), com a redação do Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de Outubro), e da alínea e) do número 1 do artigo 287º do CPC (atual artigo 278.º, com a redação dada pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho), aplicável ex vi artigo 2.º do RJAT, e obstaria ao conhecimento do mérito e acarretaria a absolvição da AT da instância.

47.  Segundo a Requerida, o objeto do presente Pedido de Pronuncia Arbitral é a ilegalidade dos atos de liquidação de imposto do Selo dos anos de 2012 e 2013, face ao articulado na petição e os pedidos formulados pelo Requerente.

48.  Pelo que, sendo o prazo para a apresentação do pedido de pronúncia arbitral de 90 dias, contados a partir do termo do prazo para pagamento voluntário, o qual terminou em 30 de Novembro de 2012 e em 30 de Novembro de 2013, respetivamente, para os atos de liquidação de 2012 e 2013, por força do disposto no artigo 10º do RJAT e alínea d) do n.º 1 do artigo 102.º do CPPT, e tendo o Pedido de Pronúncia Arbitral sido apresentado em 11/02/2016, o mesmo seria manifestamente intempestivo.

49.  Por seu turno, a Requerente sustenta que não poderá proceder a exceção de intempestividade do Pedido de Pronúncia Arbitral, alegada pela Requerida, atendendo a que, tal como contextualizou nos artigos 1.º a 8.º, a apresentação do Pedido de Pronúncia Arbitral se seguiu à não resposta pela Autoridade Tributária relativamente ao Pedido de Revisão Oficiosa apresentado e à consequente formação do indeferimento tácito.

50.  Assim, a tempestividade do pedido de pronúncia arbitral deverá ser aferida sobre o “facto/ficção tributário/a” da formação do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa, nos termos conjugados da alínea a) do artigo 10.º do RJAT, e da alínea d) do n.º 1 do artigo 102.º do CPPT.

51.  Cumpre, assim, ao Tribunal arbitral decidir com base no enquadramento legal em vigor.

52.  No que concerne ao prazo para apresentação do Pedido de Pronúncia Arbitral, haverá que atender ao disposto nas seguintes normas do RJAT, CPPT e LGT:

Artigo 10.º do RJAT

“1 - O pedido de constituição de tribunal arbitral é apresentado:

a) No prazo de 90 dias, contado a partir dos factos previstos nos nºs 1 e 2 do artigo 102.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, quanto aos atos suscetíveis de impugnação autónoma e, bem assim, da notificação da decisão ou do termo do prazo legal de decisão do recurso hierárquico;

b) No prazo de 30 dias, contado a partir da notificação dos atos previstos nas alíneas b) e c) do artigo 2.º, nos restantes casos.” (negrito nosso).

Artigo 102.º do CPPT

 “1 - A impugnação será apresentada no prazo de três meses contados a partir dos factos seguintes: (Redação da lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro)

a) Termo do prazo para pagamento voluntário das prestações tributárias legalmente notificadas ao contribuinte;

b) Notificação dos restantes actos tributários, mesmo quando não dêem origem a qualquer liquidação;

c) Citação dos responsáveis subsidiários em processo de execução fiscal;

d) Formação da presunção de indeferimento tácito;

e) Notificação dos restantes actos que possam ser objecto de impugnação autónoma nos termos deste Código;

f) Conhecimento dos actos lesivos dos interesses legalmente protegidos não abrangidos nas alíneas anteriores. (…)” (negrito nosso).

Artigo 57.º da Lei Geral Tributária

“1 - O procedimento tributário deve ser concluído no prazo de quatro meses, devendo a administração tributária e os contribuintes abster-se da prática de actos inúteis ou dilatórios. (…)

5 - Sem prejuízo do princípio da celeridade e diligência, o incumprimento do prazo referido no n.º 1, contado a partir da entrada da petição do contribuinte no serviço competente da administração tributária, faz presumir o seu indeferimento para efeitos de recurso hierárquico, recurso contencioso ou impugnação judicial.” (negrito nosso).

53.  Analisado o Pedido de Pronúncia Arbitral, cedo se conclui sobre qual o seu objeto, senão vejamos.

54.  Desde logo, no introito é referido que o Pedido é apresentado “(…) após a formação da presunção do indeferimento tácito do Pedido de Revisão Oficiosa de anulação das referidas liquidações de Imposto do Selo (…)”

55.  Segue-se, no capítulo denominado “Questões Prévias” uma secção denominada “Da formação do Indeferimento tácito”, nos artigos 1º a 8º, em que se detalha a sucessão de atos que levaram à formação do ato tácito de indeferimento acima referido

56.  Sendo que, apenas, no capítulo do Direito, se entra em considerações sobre a legalidade das liquidações de IS.

57.  Nem podia ser de outra forma, dado que, estando em causa a impugnação do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa de atos de liquidação, o objeto imediato da impugnação é o ato de indeferimento tácito, e, mediatamente, o(s) ato(s) de liquidação, que seriam os únicos atos suscetíveis de apreciação de ilegalidade.

58.  A este propósito refira-se, o Acórdão do STA[4], cujo Relator foi o Conselheiro Lopes de Sousa: “Por outro lado, tendo aquela reclamação graciosa como objecto um acto de liquidação, o objecto do processo de impugnação judicial de indeferimento tácito de reclamação graciosa embora seja, formalmente, o indeferimento tácito, é mediatamente o acto de liquidação que foi objecto da reclamação, e é mesmo este acto de liquidação, nos casos de indeferimento tácito, o único cuja legalidade pode ser apreciada no processo de impugnação judicial, pois a ficção jurídica que é o indeferimento tácito não pode conter vícios próprios e as eventuais ilegalidades procedimentais do processo de reclamação graciosa, visando assegurar o rigor da decisão, serão irrelevantes se não vier a ser proferida uma decisão expressa. (…) De resto, não há razões de segurança e certeza jurídicas, que são as que estão subjacentes à caducidade do direito de impugnação contenciosa, que possam explicar que esse direito se extinga antes do momento em que essas razões valem, que é o do termo do prazo de impugnação.” (negrito nosso).

59.  Nestes casos, o pedido recai, assim, imediatamente, sobre a ilegalidade do ato tácito de indeferimento do pedido de revisão oficiosa e, mediatamente, sobre a ilegalidade dos referidos atos de liquidação de IS de 2012 e de 2013.

60.  Com efeito, conforme referido no Acórdão do STA no processo n.º 0862/2013, “O indeferimento tácito é uma ficção jurídica destinada a permitir aos interessados reacção contenciosa contra o incumprimento dos prazos legais de decisão pela administração tributária (art.57° n°s 1 e 5 LGT). O acto de indeferimento tácito comporta, ainda que implicitamente, uma apreciação da legalidade do acto de liquidação, pelo que o meio processual adequado de reacção contenciosa é a impugnação judicial, a deduzir no prazo de 90 dias, após a formação da presunção de indeferimento tácito (art. 102° n°1 al. d) CPPT; cf. acórdãos STA SCT 2.02.2005 processo n° 1171/04; 4.05.2005 processo n° 1276/04; 6.10.2005 processo n° 1166/04; 6.10.2005 processo n° 653/05). Neste contexto é tempestiva a impugnação judicial apresentada em 2 maio 2011, na sequência de pedido de revisão oficiosa formulado em 14 outubro 2010, tendo por objecto liquidação de IRC notificada em 23 novembro 2009 (facto afirmado na decisão judicial e não impugnado pelas partes)”.[5]

61.  Pelo que, tendo o presente Pedido de Pronúncia Arbitral sido apresentado no seguimento da formação do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa, nos termos conjugados da al. a) do artigo 10.º do RJAT, e da al. d) do n.º 1 do artigo 102.º do CPPT, é sobre este facto tributário que deverá ser aferida a tempestividade do presente Pedido de Pronúncia Arbitral.

62.  No mesmo sentido, refira-se, a Decisão Arbitral no processo n.º 531/2015-T[6], citada pela Requerente: “No entender deste tribunal, não assiste razão à Requerida. Isto porque a Requerente declara inicialmente que apresenta “(…) Pedido de pronúncia arbitral imediatamente, sobre o indeferimento da reclamação graciosa (…) e, mediatamente, sobre a legalidade do acto de liquidação referente ao IRC do período de tributação de 2012”, reiterando este pedido no art. 21.º da petição inicial. Ao longo da petição inicial, a Requerente pronuncia-se sobre o conteúdo da decisão de indeferimento da reclamação graciosa (ver artigos 43.º e seguintes da petição inicial). Nessa medida, não restam dúvidas quanto ao objecto do presente pedido de pronúncia arbitral que abrange o despacho de indeferimento da reclamação graciosa bem como a autoliquidação do IRC de 2012. Tendo o pedido de pronúncia arbitral sido deduzido no prazo de 90 dias após a notificação da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, é o mesmo tempestivo à luz da alínea a) do n.º 1 do art. 10.º do RJAT. Improcede, assim, a exceção invocada pela Requerida.” 

63.  Concluindo, o Pedido de Pronúncia Arbitral, recai imediatamente sobre o indeferimento (tácito) do pedido de revisão oficiosa das liquidações de IS do ano de 2012 e de 2013, sendo que, contrariamente ao alegado pela Requerida, este objeto está claramente expresso no Pedido.

64.  O facto de ser discutida a legalidade das liquidações de IS em crise no Pedido de Pronúncia Arbitral, resulta da própria natureza do ato controvertido, que é um ato tácito e não expresso de indeferimento, relativamente ao qual não é possível fazer mais do que comprovar o decurso do prazo, sem que tenha havido qualquer ação por parte da Requerida.

65.  Considerando a data da apresentação do pedido de revisão oficiosa das liquidações de IS (23/07/2015) e a falta de decisão expressa sobre esse pedido no prazo legal de 4 meses, formou-se ato tácito de indeferimento em 23/11/2015, contando-se, a partir desta data o prazo de 90 dias para apresentação do Pedido de constituição de Tribunal Arbitral.

66.  Tendo o Pedido sido apresentado em 11/02/2016, não se mostra ultrapassado o prazo de 90 dias, acima referido, pelo que o pedido é tempestivo nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do RJAT.

67.  Improcede, assim, a exceção de intempestividade alegada pela Requerida.

B. Aplicação da verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo a prédios verticais

68.  Em sede de IS, estabelece o artigo 1.º do Código que “O imposto do selo incide sobre todos os atos, contratos, documentos, títulos, papéis e outros factos ou situações jurídicas previstos na Tabela Geral, incluindo as transmissões gratuitas de bens”. (negrito nosso)

69.  Assim, para efeitos de norma de incidência, haverá que analisar o conjunto de atos, contratos, documentos, etc, elencados na TGIS, anexa ao CIS.

70.  A referida TGIS foi alterada em 2012 pela Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro, que aditou uma nova verba com a seguinte redação:

“28 – Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1.000.000 - sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:

28.1 – Por prédio com afetação habitacional - 1 %” (negrito nosso)

71.  A redação supra esteve em vigor até ao final de 2013, tendo sido alterada pela Lei do Orçamento do Estado para 2014[7]:

“28 – Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1.000.000 - sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:

28.1. Por prédio habitacional ou por terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI – 1%.” (negrito nosso).

72.  No que respeita à verba 28, existe uma remissão genérica para o CIMI (no n.º 2 do artigo 67.º), e uma remissão específica relativamente à liquidação do imposto (no n.º 7 do artigo 23.º).

73.  Não existe, assim, uma definição no CIS de “prédio com afetação habitacional”, na redação em vigor até ao final de 2013, ou de “prédio habitacional”, na redação em vigor a partir de 1 de Janeiro de 2014.

74.  Assim, para efeito de interpretação da verba 28.1 da TGIS, haverá que recorrer às regras do CIMI, cujas disposições mais relevantes se elencam em seguida.

75.  O artigo 2.º do CIMI contem a definição de prédio como sendo “1 – (…) toda a fração de território, abrangendo (…) edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com carácter de permanência, desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou coletiva e, em circunstâncias normais, tenha valor económico, bem como (…) edifícios ou construções, nas circunstâncias anteriores, dotados de autonomia económica em relação ao terreno onde se encontrem implantados(…) 4 - Para efeitos deste imposto, cada fracção autónoma, no regime de propriedade horizontal, é havida como constituindo um prédio.” (negrito nosso).

76.  Por seu turno, a definição de prédios urbanos resulta do artigo 4.º que indica que serão “(…) todos aqueles que não devam ser classificados como rústicos (…)” e do n.º 1 do artigo 6.º do CIMI que estabelece que “(…) os prédios urbanos dividem-se em: a) Habitacionais; b) Comerciais, industriais ou para serviços; c) Terrenos para construção; d) Outros.”. (negrito nosso).

77.  Ainda a propósito desta classificação, o n.º 2 do mesmo artigo 6.º esclarece que Habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços são os edifícios ou construções para tal licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal cada um destes fins.”. (negrito nosso).

78.  Com utilidade para a decisão do pleito, refiram-se, ainda, as seguintes disposições relativas à inscrição matricial dos prédios e à liquidação de cobrança do IMI.

79.  Assim, o n.º 3 do artigo 12.º do CIMI, que estabelece que “Cada andar ou parte de prédio suscetível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina também o respetivo valor patrimonial tributário” (negrito nosso).

80.  O n.º 2 do artigo 80.º do CIMI estipula que “(…) a cada prédio corresponde um único artigo na matriz”, com as exceções previstas nos artigos 84.º (prédios mistos) e 92.º (prédio em regime de propriedade horizontal) do mesmo código, em que se prevê que um mesmo prédio possa ter mais do que uma inscrição matricial (prédios mistos) ou que um edifício tenha uma só inscrição na matriz, sendo cada uma das frações autónomas descritas e individualizadas pela letra maiúscula que lhe corresponder (prédio em regime de propriedade horizontal).

81.  Relativamente ao documento de cobrança, o n.º 1 do artigo 119.º do CIMI, esclarece que “Os serviços da Direcção-Geral dos Impostos enviam a cada sujeito passivo, até ao fim do mês anterior ao do pagamento, o competente documento de cobrança, com discriminação dos prédios, suas partes suscetíveis de utilização independente, respetivo valor patrimonial tributário e da coleta imputada a cada município da localização dos prédios.” (negrito nosso)

82.  Face ao supra exposto, cumpre decidir sobre qual a interpretação que deverá ser dada à verba 28.1 da TGIS, se a da Requerente que defende a sua não aplicação ao prédio em apreço, dado que o mesmo apesar de constituído em propriedade total, é composto por apartamentos autónomos, destinados a habitação, ou se, pelo contrário, se deverá seguir a interpretação seguida pela Requerida que sustenta que, no caso de prédios em propriedade total, para efeitos de IS releva o prédio na sua totalidade, dado que as referidas divisões suscetíveis de utilização independente não são havidas como prédios nos termos do CIMI, facto que somente releva para os prédios em propriedade horizontal.

83.  Para o efeito, recorde-se que a verba 28.1 da TGIS dispõe que incidirá IS sobre:

  1. Propriedade, usufruto ou direito de superfície;
  2. De prédio (com afetação) habitacional;
  3. Com valor patrimonial tributário igual ou superior a € 1.000.000,00.

 

84.  Sobre o conceito de prédio habitacional relevante para efeitos da verba 28.1 da TGIS, o Acórdão do STA n.º 01870/13[8] sintetiza desta forma as dúvidas resultantes da redação inicial da verba 28.1 em apreço e a clarificação posterior dada pela Lei do Orçamento para 2014[9]: “O conceito de “prédio (urbano) com afectação habitacional” não foi definido pelo legislador. (…). E é um conceito que, provavelmente mercê da sua imprecisão – facto tanto mais grave quanto é em função dele que se recorta o âmbito de incidência objectiva da nova tributação – teve vida curta, porquanto foi abandonado aquando da entrada em vigor da Lei do Orçamento do Estado para 2014 (Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro), que deu nova redacção àquela verba n.º 28 da Tabela Geral, e que recorta agora o seu âmbito de incidência objectiva através da utilização de conceitos que se encontram legalmente definidos no artigo 6.º do Código do IMI.”.

85.  Assim, para efeitos de incidência da verba 28.1 da TGIS, deverá existir um prédio habitacional, ou seja, um prédio licenciado para habitação ou, na falta de licença, um prédio cujo destino normal seja a habitação.

86.  No caso em apreço, estamos perante um prédio em regime de propriedade total, ainda que com divisões ou andares suscetíveis de utilização independente, que se destinam a habitação, conforme resulta da respetiva certidão matricial.

87.  Resta saber qual o VPT que relevará para efeito da norma de incidência, se o valor patrimonial total do prédio, que é superior a €1.000.000, ou o valor patrimonial de cada andar, suscetível de utilização independente.

88.  A este respeito, veja-se por todos a decisão arbitral proferida no âmbito do Processo n.º 724/2014-T, citada pelo Acórdão do STA 047/2015 de 9 de Setembro de 2015, que acompanhamos: “Consultado o CIMI verifica-se que o seu artigo 6º apenas indica as diferentes espécies de prédios urbanos, entre os quais menciona os habitacionais (…) Daqui podemos concluir que, na óptica do legislador, não importa o rigor jurídico-formal da situação concreta do prédio mas sim a sua utilização normal, o fim a que se destina o prédio. Concluímos ainda que para o legislador a situação do prédio em propriedade vertical ou em propriedade horizontal não relevou, pois que nenhuma referência ou distinção é efectuada entre uns e outros. O que releva é a verdade material subjacente à sua existência enquanto prédio urbano e à sua utilização.”[10][11]

89.  Não colhe assim a argumentação da Requerida de que, para efeitos da verba 28.1 da TGIS, contrariamente às regras do CIMI, aplicáveis ao IS e mais concretamente a esta verba por remissão do artigo 67.º do CIMI, relevaria o prédio na sua totalidade, independentemente da existência de divisões ou partes suscetíveis de utilização independente, dada a existência de um prédio em propriedade total e não um prédio em propriedade horizontal.

90.  Conforme referido supra, esta distinção não releva para efeitos de IMI e não deverá relevar para efeitos de IS, sob pena de violação do princípio da legalidade tributária estabelecido constitucionalmente.

91.  Com efeito, nos termos do n.º 3 do artigo 12.º do CIMI, cada andar ou parte suscetível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, que discrimina o respetivo valor patrimonial tributário, e, nos termos do no n.º 1 do artigo 119.º do CIMI, o documento de cobrança é enviado com discriminação dos prédios, suas partes suscetíveis de utilização independente e respetivo valor patrimonial tributário.

92.  Assim sendo, não pode a Requerida dar relevância às divisões ou partes suscetíveis de utilização independente no caso de um prédio em propriedade total para efeitos de emissão da nota de cobrança do IS, mas considerar que se trata de um único prédio para verificação dos restantes requisitos da norma de incidência, nomeadamente o VPT relevante.

93.  Voltando à decisão supra citada para concluir: “(…)Ora, o artigo 12.º, n.º 3 do Código do IMI estabelece que “cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina também o respectivo valor patrimonial tributário”. (…) Refira-se que a própria ATA parece concordar com o critério exposto, razão pela qual as liquidações que a própria emite são muito claras nos seus elementos essenciais, donde resulta o valor de incidência ser o correspondente ao VPT de cada um dos andares e as liquidações individualizadas. Logo, se o critério legal impõe a emissão de liquidações individualizadas para as partes autónomas dos prédios em propriedade vertical, nos mesmos moldes em que o estabelece para os prédios em propriedade horizontal, claramente estabeleceu o critério, que tem de ser único e inequívoco, para a definição da regra de incidência do novo imposto. Assim, só haveria lugar a incidência de IS (no âmbito da Verba n.º 28 da TGIS) se alguma das partes, andares ou divisões com utilização independente apresentasse um VPT superior a € 1.000.000,00. Não podendo a ATA considerar como valor de referência para a incidência do novo imposto o valor total do prédio, quando o próprio legislador estabeleceu regra diferente em sede de IMI (e, tal como anteriormente mencionado, este é o código aplicável às matérias não reguladas no que toca à Verba n.º 28 da TGIS). Em conclusão, o regime jurídico actual não impõe a obrigação de constituição de propriedade horizontal, pelo que a actuação da ATA traduz-se numa discriminação arbitrária e ilegal. De facto, não pode a ATA distinguir onde o próprio legislador entendeu não o fazer, sob pena de violar a coerência do sistema fiscal, bem assim como o princípio da legalidade fiscal previsto no artigo 103.º da Constituição da República Portuguesa, e ainda os princípios da justiça, igualdade e proporcionalidade fiscal.” (negrito nosso)..

94.  Assim, no caso dos autos, o prédio em apreço encontrava-se, à data relevante dos factos, constituído em propriedade total, mas tinha partes, andares ou divisões com utilização independente destinados a habitação.

95.  Nenhuma dessas partes, andar ou divisão com utilização independente e afeto a habitação possuía um valor patrimonial igual ou superior a €1.000.000,00, nos anos de 2012 ou 2013, conforme se comprovou supra.

96.  Com efeito, a moradia A tinha como VPT € 894.054,42 (em 2012) e € 967.940,00 (em 2013), sendo que a morada B tinha como VPT € 159.652,58 (em 2012) e € 206.290,00 (em 2013).

97.  Não se verifica, assim, um dos pressupostos da norma de incidência prevista na verba 28.1 da TGIS, pelo que as liquidações de IS de 2012 e 2013 deverão ser declaradas ilegais.

98.  Acompanhamos, assim, a decisão arbitral tomada no processo n.° 463/2015–T relativamente às liquidações de IS de 2014 relativas ao prédio sub judice:

“6.33. Em consequência, a discriminação operada pela Requerida traduz-se numa discriminação arbitrária e ilegal, porquanto a lei não impõe a obrigação de constituição de propriedade horizontal.

6.34. E, tendo em conta toda a realidade social e económica (por vezes presente em muitos dos prédios existentes em propriedade vertical), o próprio legislador fiscal no Código do IMI tratou as duas situações (propriedade horizontal e vertical) de forma equitativa, aplicando os mesmos critérios.

6.35. Com efeito, reitere-se que não pode a Requerida distinguir onde o próprio legislador entendeu não o fazer, sob pena de violar a coerência do sistema fiscal e os princípios da legalidade fiscal (artigo 103º, nº 2 da CRP), da justiça, da igualdade e da proporcionalidade fiscal, naquele incluídos.

6.36. Analisando a situação sub judice, constata-se que o VPT das duas unidades autónomas com afectação habitacional varia entre EUR 208.290,00 e EUR 987.940,00 pelo que, em qualquer uma delas, individualmente considerada, o referido VPT é inferior a EUR 1.000.000,00 (conforme já referido no ponto 6.30., supra).

6.37. Assim, face ao acima exposto, e em resposta à questão colocada no ponto 6.1.1., supra, conclui-se que sobre as duas unidades autónomas com afectação habitacional (do prédio urbano identificado nos autos) não pode incidir o Imposto do Selo a que se refere a verba nº 28 da TGIS sendo, portanto, ilegais os actos de liquidação objecto do Pedido de Pronúncia Arbitral apresentado pela Requerente.

6.38. Adicionalmente, tendo também em consideração tudo o que anteriormente foi dito, podemos concluir que a interpretação feita pela Requerida não é conforme à Lei e à Constituição, porquanto viola o princípio da igualdade (artigo 13º da CRP) e não contribui para a igualdade entre os cidadãos (artigo 104º, nº 3, da CRP).”

99.  Nessa medida, não se verificando os requisitos da norma de incidência constante na verba 28.1 da TGIS, as liquidações controvertidas padecem de vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de direito quanto ao disposto na verba 28.1 da TGIS, o que implica a declaração da sua ilegalidade e consequente anulação.

C. Do direito aos juros indemnizatórios

100.No que concerne ao pedido formulado pela Requerente de juros indemnizatórios, atente-se no disposto no artigo 43.º da Lei Geral Tributária (“LGT”):

“1 – São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

2 – Considera-se também haver erro imputável aos serviços nos casos em que, apesar de a liquidação ser efetuada com base na declaração do contribuinte, este ter seguido, no seu preenchimento, as orientações genéricas da administração tributária, devidamente publicadas.

3 - São também devidos juros indemnizatórios nas seguintes circunstâncias:

a) Quando não seja cumprido o prazo legal de restituição oficiosa dos tributos;

b) Em caso de anulação do acto tributário por iniciativa da administração tributária, a partir do 30.º dia posterior à decisão, sem que tenha sido processada a nota de crédito;

c) Quando a revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte se efectuar mais de um ano após o pedido deste, salvo se o atraso não for imputável à administração tributária.”

101.Com efeito, nos termos do artigo 100.º da LGT: “A administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei”.

102.Acrescenta o artigo 61.º do CPPT:

“(…) 1 - O direito aos juros indemnizatórios é reconhecido pelas seguintes entidades:

a) Pela entidade competente para a decisão de reclamação graciosa, quando o fundamento for erro imputável aos serviços de que tenha resultado pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido; (…)

d) Pela entidade competente para a decisão sobre o pedido de revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte, quando não seja cumprido o prazo legal de revisão do acto tributário.

2 - Em caso de anulação judicial do acto tributário, cabe à entidade que execute a decisão judicial da qual resulte esse direito determinar o pagamento dos juros indemnizatórios a que houver lugar.

3 - Os juros indemnizatórios serão liquidados e pagos no prazo de 90 dias contados a partir da decisão que reconheceu o respectivo direito ou do dia seguinte ao termo do prazo legal de restituição oficiosa do tributo.

4 - Se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea.

5 - Os juros são contados desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respectiva nota de crédito, em que são incluídos (…)”.

103.Coloca-se, assim, a questão de saber se no caso em apreço, perante a procedência do pedido de pronúncia arbitral, serão devidos juros indemnizatórios e qual o seu termo inicial e final.

104.No que concerne à problemática dos juros indemnizatórios no caso de pedido de revisão oficiosa de atos tributários, veja-se por todos o Acórdão do STA no processo 0722/2014[12], cuja fundamentação acompanhamos: “A situação dos autos é enquadrável no nº 3, al. c) do artº 43º da Lei Geral Tributária porque o contribuinte, podendo ter obtido anteriormente a anulação do acto de liquidação praticado em 27/08/2004, nada fez, desinteressando-se temporariamente da recuperação do seu dinheiro, até que em 23/11/2007, apresentou um pedido de revisão oficiosa dos acto tributário. Entre 2004 e 2007 decorre um extenso período em que a reposição da legalidade poderia ter sido provocada por iniciativa do contribuinte que a não desenvolveu, o que justifica que o direito a juros indemnizatórios haja de ter uma extensão mais reduzida por contraposição à situação em que o contribuinte, suscita a questão da ilegalidade do acto de liquidação imediatamente após o desembolso da quantia em questão. O legislador considera que o prazo de um ano é o prazo razoável para a Administração decidir o pedido de revisão e executar a respectiva decisão, quando favorável ao contribuinte, afastando-se da indemnização total dos danos a partir do momento em que surgiram na esfera patrimonial do contribuinte. (…) A decisão recorrida atribuiu a indemnização a partir da ocorrência do evento danoso, sendo que face às normas de direito tributário vigente tal indemnização não tem assento legal, pelo menos sob a égide do processo de impugnação da decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa do acto de liquidação. Tal tem vindo a ser a posição reiteradamente afirmada pela jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, em situações similares, de que a título meramente exemplificativo se enuncia o Ac. 01041/06 de 15-02-2007, disponível em www.dgsi.pt, aqui reiterada. Pelo exposto, se declara que os juros indemnizatórios a que as impugnantes têm direito neste processo são apenas devidos a partir de um ano após o pedido de revisão por elas formulado, ou seja, a partir de 24/11/2008.” (negrito nosso).

105.No caso em apreço, sendo o pedido de revisão ato tributário datado de 23 de Julho de 2015, somente serão devidos juros indemnizatórios no período contado a partir de 1 ano decorrido da apresentação do referido pedido de revisão.

106.Assim sendo, para além do reembolso do montante total das liquidações de Imposto do Selo, a AT é condenada a liquidar juros indemnizatórios, contados desde o ano seguinte à entrega do pedido de revisão até à data da emissão da respetiva nota de crédito.

VII. Decisão

107.Termos em que este Tribunal Arbitral singular decide:

a.       Julgar improcedente a exceção de intempestividade do pedido de pronúncia arbitral

b.      Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral, declarando ilegal o indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa deduzido com referência às liquidações de Imposto de Selo de 2012 e de 2013;

c.       Anular as liquidações de IS de 2012 e de 2013, por vício de violação de lei quanto à norma constante na verba 28.1. da TGIS, por erro sobre os pressupostos de direito, e consequente reembolso pela Requerida à Requerente do imposto do selo pago relativamente aos atos tributários objeto destes autos;

d.      Julgar procedente, por provado, o pedido de pagamento de juros indemnizatórios pela Requerida à Requerente, em conformidade com o estatuído na alínea c) do n.º 1 do artigo 43° da LGT e no artigo 61° do CPPT.

VIII. Valor do processo

108.Fixa-se o valor do processo em € 22.279,37. (vinte e dois mil, duzentos e setenta e nove euros e trinta e sete cêntimos), nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 97.°-A do CPPT, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPTA).

IX. Custas

109.Custas nos termos da Tabela I, do RCPTA, calculadas em função do valor do pedido, a cargo da Requerida, nos termos do n.º 2 dos artigos 12.º e do n.º 4 do artigo 22.º, ambos do RJAT, e do artigo 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.

Notifique-se.

Lisboa, CAAD, 25 de outubro de 2016

O Árbitro Singular,

 

_________________________________

(Vera Figueiredo)

Texto elaborado em computador, nos termos do n.º 5 do artigo 131º, do Código de Processo Civil, aplicável por remissão da alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT, redigido segundo a grafia do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, aprovado pela Resolução da Assembleia da República n.º 26/91 e ratificado pelo Decreto do Presidente da República n.º 43/91, ambos de 23 de Agosto.

 



[1] Decisão Arbitral no processo n.º 463/2015-T, de 16 de Novembro de 2015, publicada em https://caad.org.pt/tributario/decisoes/

 

[2] Confr. Decisão Arbitral no processo n.º 531/2015-T, de 4 de Abril de 2016, e Decisão Arbitral no processo n.º 617/2015-T, de 22 de Fevereiro de 2016, publicadas em https://caad.org.pt/tributario/decisoes

[3] Ver nota 1 supra.

 

[4] Acórdão do STA no processo n.º 0734/08 de17 de Dezembro de 2008, publicado em www.dgsi.pt.

[5] Acórdão do STA no processo n.º 0862/2013, de 18 de Junho de 2014, publicado em publicado em www.dgsi.pt.

[6] Decisão Arbitral no processo n.º 531/2015-T de 4 de Abril de 2016 publicada em https://caad.org.pt/tributario/decisoes/

[7] Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, que entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2014.

 

[8] Acórdão do STA n.º 01870/13, 9 de Abril de 2014

[9] Vide nota 7) supra.

[10] Acórdão do STA no processo n.º 047/2015, de 9 de Setembro de 2015, publicado em www.dgsi.pt.

[11] Decisão do CAAD no processo n.º 724/2014, de 29 de Abril de 2015, publicada em https://caad.org.pt/tributario/decisoes/

[12] Acórdão do STA 0722/2014 de 28 de Janeiro de 2015, publicado em www.dgsi.pt.