DECISÃO ARBITRAL
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Relatório
A - Geral
1.1. A…, LDA., com sede na …, lote…, …, … – … …, com o capital social de €5.100,00 (cinco mil e cem euros), matriculada na Conservatória do Registo Comercial de … sob o número único de matrícula e de pessoa colectiva …, apresentou, no dia 19.01.2016, um pedido de constituição de tribunal arbitral singular em matéria tributária, que foi aceite, visando a declaração de ilegalidade do acto de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (“IRC”) n.º 2015 … (doc. apresentado com o requerimento de 25.07.2016, substituindo o doc. n.º 7 junto aos autos com o pedido de pronúncia arbitral) com a consequente devolução do imposto e juros compensatórios indevidamente liquidados.
1.2. Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do art.º 6.º e da alínea b) do n.º 1 do art.º 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, na redacção que lhe foi dada pelo art.º 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) designou como árbitro Nuno Pombo, não tendo as partes, depois de devidamente notificadas, manifestado oposição a essa designação.
1.3. Por despacho de 05.02.2016, a Administração Tributária e Aduaneira (de ora em diante designada “Requerida”) procedeu à designação dos Senhores Dra. B… e Dr. C… para intervirem no presente processo arbitral, em nome e representação da Requerida.
1.4. Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do art.º 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, na redacção que lhe foi dada pelo art.º 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral foi constituído a 01.04.2016.
1.5. No mesmo dia 01.04.2016 foi notificado o dirigente máximo do serviço da Requerida para, querendo, no prazo de 30 dias, apresentar resposta e solicitar produção de prova adicional.
1.6. No dia 29.04.2016 a Requerida apresentou a sua resposta.
B – Posição da Requerente
1.7. A Requerente desenvolve a sua actividade principal, essencialmente, na zona geográfica …, concelho de Viseu.
1.8. A Requerente no dia 27.05.2013 entregou a sua declaração de rendimentos modelo 22 referente ao exercício de 2012, por meio da qual se aplicou à matéria colectável a taxa reduzida prevista na alínea b), do n.º 1 do art.º 43.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (“EBF”).
1.9. Pelo ofício da Requerida n.º … de 22.06.2015 foi a Requerente notificada de que a Direcção de Finanças de … havia iniciado um procedimento inspectivo interno de âmbito parcial ao IRC de 2012 e 2013.
1.10. A Requerente, embora não concordando com o entendimento dos Serviços de Finanças de …, no dia 05.08.2015 procedeu voluntariamente à substituição da declaração de rendimentos modelo 22 referente ao exercício de 2012, corrigindo o imposto que havia calculado, fazendo aplicar a taxa de 25% e não já a taxa de 10% correspondente ao benefício que entende dever ser-lhe aplicado.
1.11. No dia 06.08.2015 foi a Requerente notificada do resultado da acção inspectiva que conclui no sentido de o sujeito passivo não cumprir os requisitos necessários para poder beneficiar da redução de taxa de IRC.
1.12. A conclusão da Requerida de que a Requerente não cumpre os requisitos necessários para poder usufruir do benefício da redução da taxa de IRC funda-se na circunstância de não ter a Requerente, pela sua actividade, criado directamente qualquer posto de trabalho, quando, no entender desta, o art.º 43.º do EBF não condiciona a concessão desse benefício à criação de qualquer posto de trabalho.
1.13. Entende a Requerente que a norma do n.º 2 do art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 55/2008, quando interpretada no sentido de estabelecer que a exigência de manutenção de mais de 75% da massa salarial na área beneficiária é condição obrigatória de acesso ao benefício fiscal em causa viola o princípio da legalidade e a reserva de lei da Assembleia da República.
C – Posição da Requerida
1.14. A Requerida, na sua resposta, começa por sustentar a incompetência material do Tribunal Arbitral para apreciar o pedido de declaração de ilegalidade do acto de autoliquidação de IRC, uma vez que se impunha a precedência obrigatória de reclamação graciosa nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 131.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), aplicável por força do n.º 1 do art.º 2.º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT) e da alínea a) da Portaria 112-A/2011, de 22 de Março.
1.15. Também por excepção, defende a Requerida a intempestividade do pedido de pronúncia arbitral, por entender que ele foi apresentado depois de terminado o prazo de 90 dias previsto na alínea a) do n.º 1 do art.º 10.º do RJAT.
1.16. O regime de redução de taxa de IRC em discussão foi inicialmente consagrado no artigo 7.º da Lei nº 171/99, de 18 de Setembro, diploma que remetia, no seu artigo 13º, para decreto-lei a aprovar pelo Governo, as normas regulamentares necessárias à sua boa execução.
1.17. Aquele diploma, promovendo o combate à desertificação humana, visava, entre outras medidas, o estímulo à criação de emprego.
1.18. Não pode dizer-se que a norma do n.º 2 do art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 55/2008, quando interpretada no sentido de estabelecer que a exigência de manutenção de mais de 75% da massa salarial na área beneficiária é condição obrigatória de acesso ao benefício fiscal em causa viola o princípio da legalidade e a reserva de lei da Assembleia da República porquanto é a própria Lei n.º 53-A/2006 que determina que aos benefícios fiscais relativos à interioridade previstos no então art.º 39.º-B do EBF seriam aplicáveis as regras previstas no Decreto-Lei n.º 310/2001, que viria a ser revogado pelo Decreto-Lei n.º 55/2008.
1.19. Ora, o direito ao benefício fiscal consignado no art.º 43.º do EBF está, pois, dependente da verificação de pressupostos cuja definição não se compreende na regra mais geral contida neste normativo, como o implica expressamente o n.º 7 do mencionado artigo.
1.20. Portanto, é o próprio art.º 43.º do EBF que, ao mesmo tempo que determina a regra geral no seu n.º 1, assume que carece de normas regulamentares para sua “boa execução” no seu n.º 7, não fazendo sentido que o intérprete queira ver aplicado o n.º 1 e, simultaneamente, pretenda a ver ignorado o n.º 7 da mesma disposição.
1.21. O n.º 2 do art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 55/2008 determina que «Considera-se que a actividade principal é situada nas zonas beneficiárias quando os sujeitos tenham a sua sede ou direcção efectiva nessas áreas e nelas se concentre mais de 75% da respectiva massa salarial.».
1.22. Conclui-se portanto que seja atendendo ao teor literal da norma, seja ao elemento histórico, seja à sua ratio, uma entidade que não detém massa salarial – como é o caso da Requerente - não preenche a condição de acesso ao benefício fiscal previsto na alínea b) do n.º 1 do art.º 43.º do EBF.
D – Conclusão do Relatório e Saneamento
1.23. Em face das excepções invocadas pela Requerida na sua resposta, por despacho de 13.06.2016, o Tribunal Arbitral concedeu à Requerente prazo para que, querendo, se pudesse pronunciar sobre elas.
1.24. Entende a Requerente que o Tribunal Arbitral é materialmente competente para conhecer do pedido porquanto a autoliquidação a que se referem os autos se funda na substituição da declaração de rendimentos modelo 22 relativa ao exercício de 2012, a qual se acha de harmonia com as correcções promovidas pela Requerida aquando acção inspectiva de que foi alvo, sendo portanto evidente que a Requerida já tomou posição sobre a autoliquidação controvertida.
1.25. Também entende a Requerente não ser intempestivo o pedido de constituição de tribunal arbitral, porquanto o prazo dos 90 dias previsto na alínea a) do n.º 1 do art.º 10.º do RJAT se iniciou no dia 20.10.2015, tendo terminado no dia 19.01.2016, data em que foi apresentado o pedido.
1.26. Por requerimento de 25.07.2016 a Requerente dá nota do manifesto lapso em que involuntariamente incorrera ao ter juntado aos autos a nota de liquidação de IRC de 2011 e não a de 2012, pedindo a substituição do documento n.º 7 junto com o pedido de pronúncia arbitral pelo documento com o requerimento apresentado e que é a liquidação de IRC de 2012, pedindo ainda a correcção do valor da utilidade económica do presente processo para € 2.189,46 (dois mil cento e oitenta e nove euros e quarenta e seis cêntimos).
1.27. Por despacho de 20.09.2016 o Tribunal Arbitral dispensou a reunião prevista no art.º 18.º do RJAT, uma vez que era seu entendimento terem as partes carreado para o processo todos os elementos de facto necessários e suficientes para a prolação da decisão, que se previu pudesse ter lugar até ao dia 30.09.2016, não tendo as Partes manifestado intenção de apresentarem alegações.
1.28. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade nos termos do art.º 4.º e do n.º 2 do art.º 10.º do RJAT, e art.º 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.
1.29. O processo não padece de qualquer nulidade.
1.30. Foi suscitada pela Requerida, porém, as excepções da intempestividade do pedido e da incompetência material do tribunal arbitral para dele conhecer, pelo que cumpre, desde já, apreciá-las.
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A excepção de intempestividade do pedido de constituição do tribunal arbitral
A alínea a) do n.º 1 do art.º 10.º do RJAT estabelece que o pedido de constituição de tribunal arbitral deve ser apresentado no prazo de 90 dias, contado a partir dos factos previstos nos n.ºs 1 e 2 do art.º 102.º do CPPT, quanto aos actos susceptíveis de impugnação autónoma.
No caso vertente, o facto relevante para efeitos da contagem é o termo do prazo para pagamento voluntário da prestação tributária legalmente notificada ao contribuinte.
Ora, o termo do prazo para pagamento voluntário da prestação tributária é, como se comprova pela nota de liquidação de IRC de 2012, documento junto aos autos pelo requerimento de 25.07.2016, o dia 12.10.2016. Assim, o prazo para a apresentação do pedido de constituição de tribunal arbitral terminou no dia 11.01.2016, uma vez que o dia 10.01.2016 foi um Domingo.
Tendo o pedido de constituição de tribunal arbitral sido apresentado no dia 19.01.2016, não pode o Tribunal Arbitral deixar de concluir pela sua intempestividade.
Sendo o pedido intempestivo, dele não pode conhecer o Tribunal Arbitral, sendo pois desnecessária a análise da excepção da incompetência material do Tribunal Arbitral.
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Decisão
Nos termos e com os fundamentos expostos, o Tribunal Arbitral decide julgar procedente a excepção dilatória da intempestividade do pedido de pronúncia arbitral, absolvendo consequentemente a Requerida da instância nos termos do disposto na alínea e) do n.º 1 do art.º 278.º do Código de Processo Civil, aplicável por força do n.º 1 do art.º 29.º do RJAT.
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Valor do processo
De harmonia com o disposto no n.º 2 do art.º 306.º do CPC, na alínea a) do n.º1 do art.º 97.º-A do CPPT e ainda do n.º 2 do art.º 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 2.189,46 (dois mil cento e oitenta e nove euros e quarenta e seis cêntimos).
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Custas
Para os efeitos do disposto no n.º 2 do art.º 12 e no n.º 4 do art.º 22.º do RJAT e do n.º 4 do art.º 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em € 612,00 (seiscentos e doze euros), nos termos da Tabela I anexa ao dito Regulamento, a suportar integralmente pela Requerente.
Lisboa, 28 de Setembro de 2016
O Árbitro
(Nuno Pombo)
Texto elaborado em computador, nos termos do n.º 5 do art.º 131.º do CPC, aplicável por remissão da al. e) do n.º 1 do art.º 29.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro e com a grafia anterior ao dito Acordo Ortográfico de 1990.