Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 16/2016-T
Data da decisão: 2016-09-28  IVA  
Valor do pedido: € 610.567,35
Tema: IVA – exercício do direito de audição; Dedução de IVA numa SGPS; Atividade económica; Despesas gerais; Custos de acionista
Versão em PDF

 

 

Decisão Arbitral

 

            Os árbitros, José Baeta de Queiroz (árbitro-presidente), Clotilde Celorico Palma e Luísa Anacoreta (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) para formarem o Tribunal Arbitral Coletivo, constituído em 29 de março de 2016, acordam no seguinte:

 

I.         RELATÓRIO

A…, SGPS, S.A. (doravante “A…” ou “Requerente”), pessoa coletiva nº…, com sede na Rua …, nº…, …-… Lisboa, veio, ao abrigo do disposto nos artigos 2º, nº 1, alínea a), 3º, nº 1, e 10º, nº 1, alíneas a) e nº 2, do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, formular o presente pedido de pronúncia arbitral tendo por objeto, segundo a Requerente:

– A decisão de indeferimento, proferida pela Senhora Chefe de Divisão de Gestão e Assistência tributária da Unidade dos Grandes Contribuintes, no âmbito da Reclamação Graciosa nº …2015… em que se discutia a legalidade dos atos de liquidação adicional de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), das Demonstrações de Liquidação dos respetivos juros compensatórios, e das correspondentes demonstrações de acerto de contas, todas emitidas pelo Senhor Diretor-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante “AT”) em 2014 e referentes aos doze períodos tributários de 2012, conforme abaixo se discrimina:

 

Relativamente a IVA:

Nota de Liquidação adicional nº 2014…;

Nota de Liquidação adicional nº 2014…;

Nota de Liquidação adicional nº 2014…;

Nota de Liquidação adicional nº 2014…;

Nota de Liquidação adicional nº 2014…;

Nota de Liquidação adicional nº 2014…;

Nota de Liquidação adicional nº 2014…;

Nota de Liquidação adicional nº 2014…;

Nota de Liquidação adicional nº 2014…;

Nota de Liquidação adicional nº 2014…;

Nota de Liquidação adicional nº 2014…;

Nota de Liquidação adicional nº 2014…;

 

Relativamente a juros compensatórios:

Nota de Liquidação nº 2014… a nº 2014…;

 

Relativamente a acertos de contas:

Nota de Liquidação nº 2014… a nº 2014…;

 

Fundamentou o seu pedido alegando, em síntese:

 

a)      A Requerente, Sociedade Gestora de Participações Sociais sujeita ao regime jurídico consagrado no Decreto Lei 495/88, de 30 de dezembro, (i) gere participações sociais; (ii) faz empréstimos remunerados às suas participadas; (iii) e presta a estas últimas serviços técnicos de administração e de gestão.

b)      Entre as três atividades que a Requerente desenvolve, a prestação de serviços às suas participadas é materialmente a mais importante, aquela que consome a maior parte dos seus recursos (quer horas de trabalho, quer, sobretudo, bens e serviços adquiridos a terceiros).

c)      Para além de determinados gastos de rendimento – aqueles que podem ser diretamente alocados a uma certa atividade - a Requerente suporta regularmente gastos gerais, cujo emprego não pode ser diretamente imputado a uma determinada operação ou a um certo tipo de operações, mas sim ao conjunto da atividade da sociedade.

d)     Estes gastos gerais integram, naturalmente, os elementos constitutivos dos preços praticados no âmbito de todas as operações realizadas pela Requerente, incluindo as prestações de serviços às participadas.

e)      No decurso do ano de 2012, a Requerente não realizou operações relevantes de recomposição do seu portfolio de participações sociais

f)       Nesse mesmo ano, os rendimentos relacionados com a gestão de participações sociais da Requerente atingiram o montante global de € 51.516.636,00.

g)      Quando a Requerente realiza operações de gestão de participações sociais, os principais gastos que suporta são (i) os custos de aquisição de partes sociais; e (ii) os juros associados ao financiamento dessas operações.

h)      No decurso do ano de 2012, a Requerente continuou a financiar esporadicamente as suas participadas, nos termos normais, tendo recebido juros de empréstimos no montante de € 10.538.665 e outros juros no montante de € 1.567.492,00.

i)        Quando a Requerente realiza operações de financiamento às participadas, os principais gastos que suporta são os juros dos seus próprios financiamentos.

j)        A Requerente dispõe continuamente de informação completa e atualizada sobre a situação das suas participadas, não necessitando de recorrer aos serviços de terceiros para avaliar as condições de financiamento a aplicar nas operações em que lhes concede crédito.

k)      A Requerente auferiu rendimentos sujeitos a IVA no valor de € 5.918.142,64, correspondente à soma do valor registado na conta 72 (prestações de serviços de administração às participadas) com o valor registado na subconta 781 (rendimentos suplementares).

l)        Se a Requerente deixasse de gerir participações sociais e de financiar as suas participadas, a sua estrutura não teria de sofrer alterações, pois estas atividades consomem recursos insignificantes.

m)    Tendo por referência os períodos tributários de 2012, a Requerente deduziu a totalidade do IVA suportado nas suas operações passivas, no montante global de € 1.155.924,88.

n)      Em 14 de dezembro de 2014, a Requerente foi notificada do Relatório de Inspeção Tributária elaborado na sequência da ação inspetiva efetuada em cumprimento da Ordem de Serviço n.º OI2014…, de 31 de março de 2014, e relativa aos períodos tributários do ano de 2012.

o)      Neste documento, a Administração tributária conclui pela existência de IVA indevidamente deduzido no montante global de € 562.160,26.

p)      Este valor corresponde ao resultado da soma de três correções distintas:

(i)                 Em primeiro lugar, a Administração tributária desconsiderou, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 20.º do Código do IVA, as deduções do IVA suportado pela Requerente com auditoria e certificação legal de contas, no valor global de € 112.359,60. De acordo o entendimento expresso no Relatório de Inspeção Tributária, aqueles encargos «constituem (…) encargos próprios da sociedade, associados à sua estrutura legal e necessários ao seu bom e correto funcionamento, sendo suportadas exclusivamente no seu interesse, não apresentando qualquer relação de benefício direto, nem sequer reflexo com qualquer uma das suas participadas, nem com a atividade desenvolvida pela SGPS»;

(ii)               A Administração tributária desconsiderou, também ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 20.º do Código do IVA, as deduções do IVA suportado pela Requerente com a aquisição de serviços jurídicos relacionados com a avaliação de ativos de entidades relacionadas, no valor global de € 35.748,31 por entender que os serviços em causa «não pertencem à esfera da A…» mas sim das suas relacionadas e, em consequência, «não estão abrangidos pelo regime de dedução do IVA, pelo que toda e qualquer dedução do imposto associado a estas operações mostra-se indevida».

(iii)             Por último, a Administração tributária corrigiu, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IVA, parte das deduções referentes aos demais gastos da Requerente, no montante global de € 414.052,36. Este valor corresponde à fração do IVA relativo a gastos gerais (utilizados tanto na realização de operações sujeitas a imposto, como em operações não tributadas) que, de acordo com o entendimento da Administração tributária, não é dedutível. Para chegar a esta conclusão, a Administração tributária recorreu a uma chave de repartição de custos utilizada pela Requerente na formação dos preços dos serviços às suas participadas e que é substancialmente influenciada (em cerca de dois terços) por gastos não sujeitos a IVA, como os gastos com.

q)      Em janeiro de 2015, a Requerente foi notificada para atos de liquidação adicional de IVA que concretizam as correções descritas no ponto anterior e totalizam o valor de € 562.160,26.

r)       Na mesma data, a Requerente foi, igualmente, notificada dos atos de liquidação de juros compensatórios a seguir identificados, cujo valor total ascende a € 48.406,99.

s)       Ainda em janeiro de 2015, a Requerente foi notificada das demonstrações de acerto de contas n.º 2014 … a n.º 2014 …, relativas ao IVA e aos juros compensatórios de todos os períodos tributários de 2012.

t)       Ao contrário do que sugere a sua designação, estas demonstrações de acerto de contas não constituem atos de compensação entre os créditos decorrentes do pagamento de liquidações anteriores e o imposto apurado nas liquidações oficiosas acima identificadas, antes se limitando a reproduzir o valor apurado em cada uma daquelas liquidações e a indicar o prazo de pagamento voluntário desses montantes.

u)      Em 19 de março de 2015, a Requerente foi citada para o processo de execução fiscal n.º …2015… e apensos, instaurado pelo Serviço de Finanças de Lisboa –…para cobrança coerciva da dívida de IVA e de juros compensatórios liquidada nos atos tributários acima identificados (€ 610.567,25), e de acrescido, no montante de € 3.962,00 (três mil, novecentos e sessenta e dois euros).

v)      Em 17 de abril de 2015, a Requerente solicitou, ao abrigo do disposto no artigo 169.º, n.º 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, a suspensão do mencionado processo de execução fiscal.

w)    Para o efeito, a Requerente informou o órgão de execução fiscal de que pretendia contestar os atos de liquidação subjacentes àquele processo e apresentou garantia idónea, nos termos previstos no artigo 199.º do mesmo Código de Procedimento e de Processo Tributário [uma fiança pessoal da sociedade participada B…, S.A., pessoa coletiva n.º…, no valor de € 778.547,97].

x)      Em 19 de junho de 2015, a Requerente foi notificada, através do Ofício n.º…, datado do dia 17 do mesmo mês, do Despacho proferido pelo Senhor Diretor-Geral da Unidade dos Grandes Contribuintes, nos termos do qual a garantia oferecida pela Requerente no âmbito do referido processo de execução fiscal n.º …2015… e apensos foi aceite.

y)      A Requerente entende que: (i) as correções efetuadas ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 20.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IVA; (ii) os atos de liquidação adicional de imposto delas decorrentes; e (iii) os atos de liquidação de juros compensatórios acima identificados são ilegais e devem, por isso, ser anulados.

z)      Nesse sentido, em 23 de junho de 2015, a Requerente apresentou a Reclamação Graciosa contra os atos de liquidação de IVA e de juros compensatórios acima identificados, a qual foi autuada com o n.º …2015… .

aa)   Em 5 de outubro de 2015, a Requerente foi notificada, através do Ofício n.º…, da Divisão de Gestão e Assistência Tributária da Unidade dos Grandes Contribuintes, para, no prazo de quinze dias, se pronunciar sobre o projeto de indeferimento da Reclamação Graciosa n.º …2015… .

bb)  Todavia, em 19 de outubro de 2015 - ainda antes de se verificar o termo final do referido prazo de quinze dias para exercício do direito de audição prévia – a Requerente foi notificada da decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa n.º …2015… .

 

 

            O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e, de imediato, notificado à Requerida nos termos legais.

 

            Nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a), do nº 2 do artigo 6.º do RJAT, por decisão do Sr. Presidente do Conselho Deontológico, devidamente comunicada às partes, nos prazos legalmente previstos, foram os signatários designados árbitros, tendo comunicado ao Conselho Deontológico e ao Centro de Arbitragem Administrativa a aceitação do encargo no prazo estipulado no artigo 4.º do Código Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa.

 

            O Tribunal foi constituído no dia 29 de março de 2016, em consonância com a prescrição da alínea c), do nº 1 do artigo 11.º do RJAT.

 

            A AT apresentou resposta ao pedido de pronúncia arbitral, apresentando no essencial e em síntese:

a)      A Requerente é uma sociedade comercial com sede em território nacional, cujo objeto social radica na “Atividade de Gestão de Participações Sociais” (CAE…).

b)      A par do exercício de tal atividade (não económica e não sujeita a IVA), a Requerente pratica adicionalmente, a título acessório, a atividade de prestação serviços técnicos de administração e gestão às sociedades por si participadas, encontrando-se, nessa medida, sujeita ao regime jurídico previsto para este tipo de sociedades, constante do Decreto-Lei n.º 495/88, de 30 de dezembro.

c)      Para efeitos de IVA, trata-se de um sujeito passivo nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do Código do IVA.

d)     Foi verificada a dedução indevida de IVA no montante de € 562 160,26 referente à parte do imposto suportado com a aquisição de serviços especializados, que se concluiu não terem sido utilizados na atividade de prestação de serviços técnicos de administração e gestão, sujeitos a IVA e dele não isentos.

e)      A Requerente recebeu no dia 1 de Outubro de 2015, a notificação (Ofício n.º … de 30 de Setembro de 2015) para, querendo, exercer o seu direito de participação), na modalidade de audição prévia, no prazo de quinze dias relativamente ao projeto de decisão de indeferimento respeitante à Reclamação Graciosa n.º ..2015… .

f)       Nos termos do n.º 3 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.º 121/76, de 11 de Fevereiro, em regra, as notificações e avisos efetuados nos termos dos n.os 1 e 2 desse artigo, presumem-se feitas no terceiro dia posterior ao do registo ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o não seja, não produzindo efeitos anteriores.

g)      No entanto, não existe, no caso em apreço, lugar a tal presunção de notificação, pois, o registo da notificação foi efetuado a 30 de Setembro de 2015 e a entrega efetiva da notificação aos mandatários da ora Requerente foi efetuada no dia 1 de Outubro de 2015.

h)      No dia 1 de Outubro de 2015, a notificação foi rececionada no domicílio profissional dos mandatários da Requerente, pelo que, o prazo de quinze dias, dado pela Autoridade Tributária, para aquela se pronunciar, acabaria dia 16 de Outubro de 2015.

i)        A Requerente "incorreu em encargos com avaliação de ativos, para efeitos de uma operação de permuta, cujos beneficiários diretos são entidades com as quais se encontra em situação de relações especiais." - cfr. fl. 44 do RIT.

j)        Acresce que estes gastos encontram-se relacionados com a avaliação e permuta de ativos, que não pertencem à esfera da A… SGPS, consubstanciando encargos suportados em nome e por conta de terceiros, sobre os quais foi deduzido IVA que totaliza € 35 748,21.

k)      Por se tratar de IVA relativo a outros sujeitos passivos, este deveria ser refaturado, nos termos do artigo 16.º do Código do IVA.

l)        O IVA relativo a encargos que não se destinam à realização de operações tributáveis na esfera da Requerente, não devem ter interferência no apuramento do IVA a ela respeitante. Devem ter, sim, um efeito neutro, sendo a dedução compensada por uma liquidação de IVA, no mínimo, de igual montante.

m)    No que diz respeito à correção referente ao IVA referente aos gastos alegadamente suportados exclusivamente para o desenvolvimento da atividade não tributada, no montante de € 112 359,60, o que está em causa são os denominados “custos de acionista” e outros que não apresentam um nexo direto e imediato com as operações tributáveis a jusante (como, por exemplo, os honorários do ROC).

n)      De facto, é manifesto que estão em causa serviços que estão relacionados com a atividade de aquisição, detenção e gestão de participações sociais desenvolvida pela Requerente, numa ótica de gestão do negócio e expansão da atividade, respeitando à própria A…, enquanto acionista, tendo sido contratados pela Requerente no seu exclusivo interesse e não em benefício de qualquer uma das suas participadas, e que, por definição, não lhes podem ser totalmente imputados.

o)      Não se vislumbrando a existência de qualquer relação direta e imediata com a atividade tributada, ainda que meramente reflexa, também não se afigura que se possa entender que se está perante uma despesa geral nos termos definidos pela jurisprudência comunitária, nomeadamente, no Acórdão Cibo, SKF ou Portugal Telecom.

p)      Efetivamente, de acordo com a jurisprudência comunitária, na ausência de um “direct link” entre os inputs e os outputs tributados (pois o IVA suportado não onera diretamente o preço das operações a jusante que conferem direito à dedução) poderá haver dedução do IVA suportado com os bens e serviços adquiridos, se as respetivas despesas se qualificarem como despesas gerais da atividade e integrarem os elementos constitutivos do preço das operações realizadas pelos sujeitos passivos que conferem direito à dedução.

q)      Mas a Requerente não demonstrou que as despesas relacionadas com a aquisição destes serviços fazem parte do custo dos diversos elementos constitutivos do preço da operação a jusante.

r)       Relativamente à correção referente ao IVA sobre gastos reconhecidamente utilizados na prossecução das várias atividades da ora Requerente, no montante de € 414 052,36, sucedeu que, no procedimento inspetivo, dada a constatação da impossibilidade de afetar integralmente determinados bens e serviços adquiridos a uma das atividades da empresa, visou-se determinar qual a parte do imposto suportado na sua aquisição que é afeta à atividade de prestação de serviços e relativamente à qual se verifica o direito à dedução.

s)       À atividade principal (aquisição, detenção, alienação, gestão de participações sociais, decorrente da qual aufere dividendos, mais-valias, etc) estão alocados um número substancial de recursos, já que o desenvolvimento desta atividade implica, entre outras, a prestação de serviços de assessoria e/ou auditoria relacionados com a potencial aquisição de participação estratégica; a avaliação de oportunidades de investimento; ações destinadas a avaliar projetos de desenvolvimento e internacionalização do grupo, etc.

t)       Assim, jamais poderá ser considerada um sujeito passivo com direito à dedução integral, isto é, com direito à dedução de 100% do IVA suportado a montante com a aquisição de bens e serviços, encontrando-se o seu direito à dedução, necessariamente, limitado.

u)      Existem diversos acórdãos do TJUE segundo os quais uma sociedade holding, como a ora Requerente que, acessoriamente à sua atividade principal de gestão das participações sociais das sociedades de que detém a totalidade ou parte do capital social, adquire bens e serviços que fatura em seguida às referidas sociedades, está autorizada a deduzir o imposto sobre o valor acrescentado pago a montante, na condição de os serviços adquiridos a montante apresentarem um nexo direto e imediato com operações económicas a jusante com direito à dedução.

v)      Quando os referidos serviços são utilizados pela sociedade holding para realizar simultaneamente operações económicas com direito a dedução e operações económicas sem direito à dedução, a dedução só é admitida para a parte do IVA que seja proporcional ao montante relativo às primeiras operações e a Administração Tributária nacional está autorizada a prever um dos métodos de determinação do direito à dedução, enumerados no artigo 173.°, n.° 1 da Diretiva IVA.

w)    No caso em apreço, tendo a Requerente indicado à Autoridade Tributária e Aduaneira, através do dossier de preços de transferência, que parte dos custos operacionais incorridos pela holding se referem a custos suportados no exercício de uma única atividade sujeita a IVA e não isenta, consubstanciada na prestação de serviços de suporte, optou-se por considerar essa proporção numa chave de imputação que traduza os gastos cujo IVA suportado pode ser dedutível.

x)      Estão em causa encargos com aquisição de serviços de assessoria jurídica, de natureza administrativa, técnica e informática, os quais são, necessariamente, comuns às várias atividades.

y)      Pela aplicação do rácio apurado de 35,20% ao total do IVA que se identificou, através de amostragem efetuada, como afeto a custos comuns, apurou-se um montante de IVA dedutível de € 224.917,33, nos termos dos artigos 19.º e 20.º do CIVA, que se considera como referentes a bens ou serviços adquiridos pela Requerente, para a realização das prestações de serviços sujeita a imposto e dele não isentas.

z)      A diferença entre aqueles valores, no montante de € 414 052,36, constitui a parte de IVA não dedutível nos termos do n.º 1 do artigo 20.º do CIVA, por aplicação da alínea a) do n.º 1 do artigo 23.º do mesmo diploma normativo.

 

            Ambas as partes apresentaram alegações, concluindo, no essencial, pela mesma forma que o fizeram nos respetivos articulados.

           

 

II – SANEAMENTO

 

            O Tribunal Arbitral é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º do RJAT.

            As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se regularmente representadas, (cf. artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011 de 22 de Março.

 

O processo não enferma de nulidades.

 

 

 

III - FUNDAMENTAÇÃO

 

A. MATÉRIA DE FACTO

 

Os factos relevantes provados são os seguintes:

 

1.        A Requerente é uma Sociedade Gestora de Participações Sociais (“SGPS”), constituída ao abrigo do Decreto-Lei n.º 495/88, de 30 de dezembro;

2.        A Requerente exerce três tipos de atividades: gere participações sociais, faz empréstimos remunerados às participadas e presta, a estas últimas, serviços técnicos de administração e gestão.

3.        O número de horas de trabalho despendidas pelos colaboradores da Requerente com a atividade de gestão de participações sociais é irrelevante.

4.        Em 2012, a Requerente não realizou operações relevantes de recomposição do seu portfolio de participações sociais.

5.        Em 2012, a Requerente financiou esporadicamente as suas participadas.

6.        Para além de determinados gastos que podem ser diretamente alocados a uma certa atividade, a Requerente suporta regularmente gastos que não podem ser diretamente imputados a uma determinada operação ou a um certo tipo de operações, mas sim ao conjunto da atividade da sociedade;

7.        Os gastos que não podem ser imputados a determinada atividade são considerados para formação dos preços praticados no âmbito das operações que a Requerente realiza que são tributadas em IVA;

8.        A Requerente deduziu a totalidade do IVA suportado nas suas operações passivas, no montante global de € 1.155.924,66.

9.        Em 14 de dezembro de 2014, a Requerente foi notificada do Relatório de Inspeção Tributária elaborado na sequência da ação inspetiva efetuada em cumprimento da ordem de Serviço nº OI2014…, de 31 de março de 2014, relativa aos períodos tributários de 2014.

10.    Consta desse Relatório a existência de IVA indevidamente deduzido no montante global de € 562 160, 26.

11.    Este valor resulta das seguintes ações da AT:

-     Desconsideração da dedução de IVA suportado com despesas com auditoria e certificação legal das contas, no valor de € 112.359,69;

-     Desconsideração da dedução do IVA suportado a aquisição de serviços jurídicos relacionados com a avaliação de ativos detidos por entidades relacionadas, no valor de € 35.748,31;

-     Correção de parte do IVA suportado com restantes gastos da Requerente, parte essa que totaliza € 414.052,36;

12.    Para efeitos do apuramento da correção referida no final do ponto anterior, a AT utilizou a uma chave de repartição de custos baseada no dossier de preços de transferência da Requerente, tendo ainda utilizado nos cálculos sem identificação nem justificação explícita, o montante de € 2.554.695,65.

13.    Em janeiro de 2015, a Requerente foi notificada de atos liquidação adicional de IVA que concretizam as não considerações e correção descritas, bem como de atos de liquidação de juros compensatórios, estes no valor de € 48.406,99;

14.    Em 23 de junho de 2015, a Requerente apresentou Reclamação Graciosa contra os atos de liquidação adicional de IVA e respetivos juros compensatórios;

15.    Em 30 de setembro de 2015, a AT expediu o Ofício … da Divisão de Gestão e Assistência Tributária da Unidade de Grandes Contribuintes que capeava o projeto de indeferimento da referida reclamação.

16.    A Requerente recebeu o Oficio … no dia 1 de outubro de 2015.

17.    No dia 19 de outubro de 2015, a Requerente foi notificada pela Chefe de Divisão de Gestão e Assistência Tributária da Unidade dos Grandes Contribuintes da decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa, proferida em 15 de outubro de 2015.

 

Não há outros factos a considerar, que as partes tenham alegado, provados ou não provados.

No que se refere aos factos provados, a convicção do Tribunal Arbitral fundou-se no acervo documental junto, incluindo o processo administrativo instrutor que inclui o relatório final da inspeção tributária a que se faz alusão, bem como na audição da gravação do depoimento de uma testemunha ouvida no processo CAAD 316/2015-T – efetuada ao abrigo de despacho de tribunal de 16 de junho de 2016 -, o qual apresenta factos relevantes idênticos ao que agora se analisa e que, conforme expressamente descrito na sentença, aparentou depor com isenção e com conhecimento dos factos que referiu.

           

 

B. O DIREITO

 

Encontrando-se fixada a matéria de facto dada como provada, importa seguidamente determinar o direito aplicável aos factos subjacentes, de acordo com as questões supra.

Interessa, assim, decidir quanto a:

I – Aferir a ilegalidade da decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa nº …2015…, por preterição de formalidade legal essencial, violando o disposto na alínea b) do nº 1 e no nº 6 do artigo 60º da Lei Geral Tributária, do nº 1 do artigo 45º do Código do Procedimento e de Processo Tributário e do nº 1 do artigo 122º do Código de Procedimento Administrativo:

II - Aferir se as correções efetuadas que originaram as liquidações adicionais estão em conformidade com as regras que regem este imposto a nível europeu e interno, devendo aceitar-se o exercício do direito à dedução do imposto suportado relativamente às despesas em causa, questão nuclear nestes autos.

 

1. Do exercício do direito de audição prévia

 

A Requerente foi notificada da intenção da AT de indeferir a reclamação graciosa por carta registada expedida em 30 de setembro de 2015.

Tal carta presume-se recebida em 5 de outubro de 2015, posto que dias 3 e 4 foram sábado e domingo, respetivamente, e nesses dias não há distribuição postal – artigo 39º nº 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).

A Requerente tinha o direito de se pronunciar sobre o projeto de indeferimento, direito esse que lhe é atribuído pelos artigos 267º nº 5 da Constituição da República Portuguesa (CRP), 60º nº 1 alínea b) e da Lei Geral Tributária (LGT) e 60º do Regime do Procedimento de Inspecção Tributária e Aduaneira (RCPITA).

Dispondo de quinze dias para se fazer ouvir em audição prévia, tal como fixado naquela carta, a Requerente podia fazê-lo até dia 20 de Outubro de 2015.

Porém, em 15 desse mês, sem aguardar a pronúncia da Requerente, a AT proferiu despacho de indeferimento da dita reclamação graciosa, quando ainda corria o prazo para aquela pronúncia, e notificou essa decisão.

Ao assim proceder, a AT incorreu em preterição de formalidade legal, porque não deu à Requerente oportunidade para se pronunciar sobre o projeto de decisão que lhe era desfavorável, antes da decisão final.

A verificada preterição constitui vício formal do procedimento, invalidante, e suficiente para que se anule a decisão final da AT, e de quanto causalmente se lhe seguiu no procedimento, designadamente, os atos de liquidação ora atacados.

 

É certo que o artigo 39º nº 1 do CPPT não contem senão uma presunção, que seguramente, pode ser ilidida pelo sujeito passivo, quando este pretenda demonstrar que a carta só depois de decorridos três dias após a expedição lhe chegou às mãos.

A AT não dispõe de idêntica faculdade, o que bem se entende, porquanto nunca teria qualquer interesse em ilidir a presunção, provando que a carta registada só fora entregue para além daqueles três dias. Do mesmo modo que o sujeito passivo não poderá elidir a presunção, por falta de interesse atendível, se porventura quiser convencer de que recebeu a correspondência antes dos três dias.

Em todo o caso, parece evidente que a AT já pode ter interesse em ilidir a presunção, provando que a carta foi entregue ao contribuinte antes de terem decorrido os tês dias, caso em que a notificação haveria de ter-se por efetuada em data anterior – a da efetiva receção. Tal como acontece no presente caso

A possibilidade de ilisão da presunção pela AT não está expressamente prevista na lei.

Porém, consagrando o nº 1 do artigo 39º do CPPT uma presunção, ou seja, usando um facto presumido em substituição de um facto que não é conhecido (a efetiva data da recepção), sempre poderia entender-se que nada obsta a que a AT convença de que a receção ocorreu em tempo anterior. E, assim, conhecido o facto, a presunção deixaria de funcionar.

A não ser que se esteja perante uma presunção inilidível, juris et de juri, o que não parece ser o caso, já que o nº 2 do artigo 39º do CPPT é claro no sentido de que a presunção é juris tantum, ao permitir a sua ilisão pelo notificando.

E não é fácil considerar que uma presunção possa ser, simultaneamente, juris et de juri , para quem dela beneficia, e juris tantum, para quem com ela é onerado.

Não obstante, alguma doutrina – vd., designadamente, Jorge de Sousa, no local e obra apontados pela Requerente nas suas alegações – considera que, na falta de norma que o admita, a ilisão da presunção não está ao alcance da AT nem, sequer, do tribunal, mas só do notificando, ex vi nº 2 do citado artigo 39º.

Entendimento este que foi expressamente acolhido e secundado pelo Supremo Tribunal Administrativo, ao menos no processo 1340/2015, em acórdão datado de 31 de Março de 2016.

É este entendimento que também aqui se adopta, em obediência, além do mais, ao artigo 8º nº 2 do Código Civil.

Consequentemente, não se atende à prova feita pela AT, no que concerne à data da notificação efetuada por via da carta expedida em 30 de Setembro de 2015, considerando-se tal notificação concretizada em 5 de outubro seguinte, de onde resulta a ocorrência da preterição da formalidade consubstanciada na falta de audiência prévia da Requerente.

Não obstante a constatação deste vício formal, importa assegurarmo-nos de que a anulação do ato é sua consequência fatal. É que pode não o ser, designadamente, se se concluir que a AT não poderia, mesmo se tivesse respeitado a formalidade preterida, proferir uma decisão diferente da que proferiu. Se a enfermidade já constatada no procedimento não obstou a que ele atingisse o seu resultado útil e legal, ou seja, se, não obstante, ficou assegurada a legalidade da decisão substancial, então, o ato merece ser salvo, como vem sendo de há muito entendido pela jurisprudência.

É o que adiante se verá.

 

 

 

2. Da natureza e amplitude do exercício do direito à dedução

 

No que concerne ao exercício do direito à dedução em IVA, justifica-se tecer algumas considerações prévias, quer sobre a respetiva natureza, quer no que tange ao respetivo âmbito de aplicação e exercício pelos sujeitos passivos, pelo que iremos aqui reproduzir as considerações gerais já antes tecidas por este mesmo Tribunal na sua Decisão Arbitral relativa aos Processos n.º 148/2012 - T/CAAD, n.º 18/2013 – T/CAAD e nº 15/2015 – T/CAAD.

Como é sabido, o IVA é um imposto indireto de matriz comunitária, plurifásico, que atinge tendencialmente todo o ato de consumo[1]. O direito à dedução é um elemento essencial do funcionamento do imposto, devendo garantir a sua principal caraterística – a neutralidade.

Na realidade, o direito à dedução consubstancia-se como o elemento essencial do funcionamento do imposto, a “trave-mestra do sistema do imposto sobre o valor acrescentado[2], assentando no designado método da dedução do imposto, método do crédito de imposto, método subtrativo indireto ou ainda método das faturas. De acordo com este método, e em conformidade com o disposto no artigo 19.º do CIVA, através de uma operação aritmética de subtração, ao imposto apurado nas vendas e prestações de serviços (outputs) e identificável nas respetivas faturas, deduz-se o imposto suportado nas compras e outros gastos (inputs).

Como determina o 2.º parágrafo, do n.º 2, do artigo 1.º, da Diretiva IVA (de ora em diante DIVA)[3], “Em cada operação, o IVA, calculado sobre o preço bem o serviço, é exigível, com prévia dedução do montante do imposto que tenha incidido diretamente sobre o custo dos diversos elementos constitutivos do preço.” O mecanismo do exercício do direito à dedução permite ao sujeito passivo expurgar do seu encargo o IVA suportado a montante, não o refletindo assim como custo operacional da sua atividade, retirando, desta forma, o efeito cumulativo ou de cascata, propiciando a neutralidade económica do imposto.

De acordo com o previsto na DIVA, o Código do IVA determina, como regra geral, a dedutibilidade do imposto devido ou pago pelo sujeito passivo nas aquisições de bens e serviços feitas a outros sujeitos passivos.

As situações expressas de exclusão do direito à dedução são excecionais e reportam-se a casos específicos enunciados pelo legislador nacional em termos taxativos, de acordo com o estatuído na DIVA, em função do tipo de despesas em causa[4].

As regras do exercício do direito à dedução do imposto contemplam requisitos objetivos, mais ligados ao tipo de despesas, subjetivos, relativos ao sujeito passivo, e temporais, atinentes ao período em que é possível exercer o direito à dedução do IVA, os quais se devem verificar em simultâneo para se exercer o direito à dedução[5].

Como requisitos objetivos do exercício do direito à dedução do imposto temos, nomeadamente, o facto de o imposto suportado dever constar de fatura passada na forma legal (ou seja, deverá obedecer, nos seus requisitos, aos termos gerais previstos no artigo 36.º, n.º5, do CIVA), de se tratar de IVA português, e de a despesa, por si, conferir o direito à dedução do IVA (isto é, não se deve tratar de uma despesa excluída do direito à dedução, nos termos do disposto no artigo 21.º do CIVA).

Como requisitos subjetivos do exercício do direito à dedução do imposto determina-se, nomeadamente, que os bens e serviços deverão estar diretamente relacionados com o exercício da atividade em causa. Em conformidade com o disposto no artigo 168.º da DIVA, transposto, em parte, pelo artigo 20.º, n.º 1, alínea a), do CIVA, o sujeito passivo pode deduzir o IVA suportado no Estado-membro em que se encontra estabelecido nas transmissões de bens e prestações de serviços, assim como nas operações assimiladas nas aquisições intracomunitárias de bens e nas importações ali localizadas, “Quando os bens e os serviços sejam utilizados para os fins das suas operações tributadas (…) ”.

Este normativo, em conformidade com as regras do Direito da União Europeia, vem assim exigir que exista um nexo de causalidade entre o bem ou serviço adquirido (input) e o output tributado, para que o IVA seja suscetível de ser dedutível.

Isto é, o IVA suportado a montante numa determinada operação só é dedutível na medida em que possa estar relacionada a jusante com uma operação efetivamente tributada, devendo a relação ser aferida em função do reporte e inclusão do custo suportado, no preço da operação tributada.

Neste contexto o TJUE, no Caso BLP[6], concluiu que os bens ou serviços a montante devem apresentar uma relação direta e imediata com uma ou diversas operações sujeita(s) a imposto a jusante, sendo que o direito à dedução do IVA pressupõe que as despesas em causa devam constituir parte integrante dos elementos constitutivos do preço das operações tributadas.

Inevitavelmente, a análise do alcance daquela expressão “ (…) relação direta e imediata (…)”, deverá ser efetuada casuisticamente, competindo aos órgãos jurisdicionais nacionais aplicar o critério aos factos de cada processo que lhes seja presente e tomar em consideração todas as circunstâncias em que se desenrolam as operações em causa[7].

Não obstante, como concluiu o Advogado-geral no Caso Midland Bank, o emprego dos dois adjetivos «direto» e «imediato» não pode deixar de significar uma relação especialmente próxima entre as operações tributáveis efetuadas por um sujeito passivo e os bens ou serviços fornecidos por outro sujeito passivo[8].

Contudo, a densidade dessa relação pode ser diferente consoante a qualidade do sujeito passivo e a natureza das operações efetuadas e estas variáveis podem também ter repercussões sobre o ónus da prova da existência da relação, o qual cabe ao operador interessado na dedução.

Assim, de acordo com a jurisprudência do TJUE, sempre que um sujeito passivo exercer atividades económicas destinadas a realizar exclusivamente operações tributáveis, não é necessário, para que se possa deduzir na totalidade o imposto, estabelecer, quanto a cada operação a montante, a existência de uma relação direta e imediata com a operação específica sujeita a imposto[9].

O que o legislador apenas exige é que os bens e serviços sejam utilizados ou suscetíveis de o ser “para os fins das próprias operações tributáveis”. Não é necessária a existência de uma relação com uma operação específica tributável, sendo suficiente que exista uma relação com a atividade da empresa.

Quanto ao adjetivo “imediata”, este denota uma grande proximidade temporal entre as duas operações. No entanto, isto não significa que o imposto sobre a operação a montante deva tornar-se exigível antes de a operação a jusante ter sido realizada: basta que o período de tempo entre as duas operações não seja demasiado longo, facto que reforça o caráter financeiro da dedução.

Assim, numa primeira fase, deverá aferir-se se a operação a montante sujeita a IVA apresenta uma relação direta e imediata com uma ou várias operações que confiram direito a dedução, pressupondo o reporte do custo daquele no preço das operações.

Caso tal não se verifique, importa então analisar se as despesas realizadas para a aquisição dos bens ou serviços a montante fazem parte das despesas gerais ligadas ao conjunto da atividade económica do sujeito passivo, pressupondo a incorporação do seu custo nos preços dos bens ou serviços fornecidos pelo sujeito passivo no âmbito das suas atividades económicas.

Por último, como requisito do exercício do direito à dedução temos ainda o requisito temporal, nos termos do qual “O direito à dedução nasce no momento em que o imposto dedutível se torna exigível”, permanecendo, no entanto, o requisito cumulativo da posse da fatura, ou do recibo de pagamento do IVA que faz parte das declarações de importação.

Por sua vez, de acordo com as regras do n.º 1 do artigo 19.º do CIVA, estipula-se que confere direito à dedução, designadamente, o imposto devido ou pago pelo sujeito passivo nas aquisições de bens e serviços feitas a outros sujeitos passivos e o imposto pago pela aquisição dos serviços referidos nas alíneas e), h), i), j) e l) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA.

    Em conformidade com o disposto no n.º 1 do artigo 20.º do CIVA, conferem, nomeadamente, direito à dedução do IVA as transmissões de bens e prestações de serviços sujeitas a imposto e dele não isentas e as transmissões de bens e prestações de serviços que consistam em operações efetuadas no estrangeiro que seriam tributáveis se fossem efetuadas em Portugal.

 

É reconhecido de forma unânime pela jurisprudência do TJUE que o mecanismo do direito à dedução é um elemento essencial do funcionamento do IVA tal como foi desenhado nas Diretivas IVA, assumindo um papel fundamental de garantia da neutralidade do imposto e da igualdade de tratamento fiscal[10]. Assim, é jurisprudência constante do TJUE que, sendo o direito à dedução um elemento fundamental do regime de IVA, só é possível limitar este direito nos casos expressamente previstos pela DIVA e, ainda assim, com respeito pelos princípios da proporcionalidade e da igualdade, não se podendo esvaziar o sistema comum do IVA do seu conteúdo.

Tal como se salienta no Acórdão BP Soupergaz, o chamado método subtrativo indireto, das faturas, do crédito de imposto ou sistema dos pagamentos fracionados, é o mecanismo essencial de funcionamento deste tipo de imposto. Como se refere nas conclusões deste Acórdão, “A este respeito, o direito à dedução previsto nos artigos 17. e seguintes da Sexta Diretiva, que faz parte integrante do mecanismo do imposto sobre o valor acrescentado, não pode, em princípio, ser limitado e exerce-se imediatamente em relação à totalidade dos impostos que incidiram sobre as operações efetuadas a montante, tem incidência no nível do encargo fiscal e deve aplicar-se similarmente em todos os Estados-Membros, de modo que só são permitidas derrogações nos casos expressamente previstos pela diretiva” [11].

E no Acórdão Comissão/França, o TJUE acrescenta que, “As caraterísticas do imposto sobre o valor acrescentado (…) permitem inferir que o regime das deduções visa libertar inteiramente o empresário do ónus do IVA, devido ou pago, no âmbito de todas as suas atividades económicas. O sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado garante, por conseguinte, a perfeita neutralidade quanto à carga fiscal de todas as atividades económicas, quaisquer que sejam os fins ou os resultados dessas atividades, na condição de as referidas atividades estarem, elas próprias, sujeitas ao IVA” [12].

Note-se ainda que, conforme se salienta no Acórdão Metropol, “59. As disposições que preveem derrogações ao princípio do direito à dedução do IVA, que garante a neutralidade deste imposto, são de interpretação restrita” [13].

A amplitude do direito à dedução em IVA é tão grande, que constitui ato claro na jurisprudência do TJUE que este deve inclusive ser concedido no tocante às chamadas atividades preparatórias, não se exigindo que a atividade tenha já começado para se poder deduzir o IVA, podendo ser deduzido relativamente a este tipo de atividades[14].

Note-se a este propósito que, de acordo com o entendimento do TJUE, posição que já foi, aliás, subscrita pela Administração Tributária[15], o direito à dedução, uma vez adquirido, subsiste mesmo que a atividade económica projetada não dê origem a operações tributáveis ou o sujeito passivo, por motivos alheios à sua vontade, não tenha podido utilizar os bens ou serviços que deram origem à dedução no âmbito de operações tribu­tá­veis[16].

Como o TJUE salienta, é a aquisição do bem pelo sujeito passivo, agindo nessa qualidade, que determina a aplicação do sistema do IVA e, portanto, do mecanismo de dedução[17]. O sujeito passivo atua nessa qualidade quando age para os fins da sua atividade económica, na aceção do artigo 9.°, n.° 1, segundo parágrafo, da DIVA[18]. Acresce que, como se conclui no Caso Intiem, o mecanismo da dedução do IVA regulado pela Sexta Diretiva “deve ser aplicado de tal forma que o seu âmbito de aplicação corresponda, na medida do possível, ao âmbito das atividades profissionais do sujeito passivo”[19].

Isto é, como nota o TJUE, o princípio da neutralidade do IVA, no que se refere à carga fiscal da empresa, exige que as despesas de investimento efetuadas para as necessidades e para os objetivos de uma empresa sejam consideradas atividades económicas conferindo um direito à dedução do IVA imediato[20].

Importa ainda notar que, em conformidade com a jurisprudência do TJUE, o princípio da neutralidade do IVA exige que a dedução do imposto pago a montante seja concedida caso os requisitos substanciais tenham sido cumpridos, mesmo que os sujeitos passivos tenham negligenciado certos requisitos formais. Neste contexto, de acordo com o TJUE, desde que a Administração Fiscal disponha dos dados necessários para determinar que o sujeito passivo, enquanto destinatário das operações, é devedor do IVA, não pode impor, no que diz respeito ao seu direito à dedução, condições adicionais que possam ter por efeito a inviabilização absoluta do exercício desse direito[21].

 

Em resumo, da jurisprudência do TJUE resulta claro que o exercício do direito à dedução do IVA é um direito fundamental, que não pode ser limitado senão nos casos expressamente permitidos pelas normas do Direito da União Europeia ou pelos princípios gerais de direito aceites neste domínio, como o princípio do abuso de direito.

 

 

 

3. Do conceito de atividade económica e sua relação com o direito à dedução relativo à aquisição de participações sociais

 

3.1 Jurisprudência do TJUE

 

O TJUE tem vindo a classificar as operações desenvolvidas por um sujeito passivo de IVA em atividades não económicas, que deverão ficar à margem da DIVA, não conferindo direito à dedução, e em atividades económicas. Só as atividades económicas é que estão abrangidas no âmbito da Diretiva, distinguindo-se em atividades não sujeitas, sujeitas e isentas e em atividades sujeitas e não isentas (ou seja, efetivamente tributadas).

Como salienta o Advogado Geral Mengozzi no Caso VNLTO[22], atendendo ao princípio da neutralidade que enforma o sistema comum do IVA, uma pessoa só deve suportar o IVA se este tiver incidido sobre os bens e serviços que utilizou para o consumo privado e não para as suas atividades profissionais tributáveis.

Isto é, não é possível deduzir o IVA suportado a montante caso este respeite à atividade do sujeito passivo que não reveste a natureza de atividade económica na aceção da DIVA.

Tal como referimos supra quanto à amplitude da “relação direta e imediata” entre os inputs que contêm IVA objeto de dedução e as operações tributadas do sujeito passivo, o TJUE tem vindo a acolher uma interpretação cada vez mais abrangente, nomeadamente, para os feitos que ora nos interessam no que se refere à gestão de participações sociais, sendo que o estabelecimento de um nexo causal entre o IVA dedutível e uma determinada operação, individualizada e concretizada, não poderá ser acolhido[23].

Como vimos, de acordo com a jurisprudência do TJUE, “admite‑se igualmente um direito a dedução a favor do sujeito passivo, mesmo na falta de um nexo direto e imediato entre uma determinada operação a montante e uma ou várias operações a jusante com direito a dedução, quando os custos dos serviços em causa fazem parte das suas despesas gerais e são, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos bens que fornece ou dos serviços que presta. Estes custos têm, com efeito, um nexo direto e imediato com o conjunto da atividade económica do sujeito passivo[24]. Contudo, é imperativo que exista uma relação com a atividade económica do sujeito passivo, subsistindo a necessidade da sua demonstração inequívoca.

Como se notou no Caso Cibo[25], “1) A interferência de uma holding na gestão das sociedades em que tomou participações constitui uma atividade económica na aceção do artigo 4.°, n.° 2, da Sexta Diretiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria coletável uniforme, na medida em que implique a realização de transações sujeitas ao imposto sobre o valor acrescentado nos termos do artigo 2.° dessa diretiva, tais como o fornecimento, pela holding às suas filiais, de serviços administrativos, financeiros, comerciais e técnicos.

2) As despesas efetuadas por uma holding com os vários serviços que adquiriu no âmbito de uma tomada de participação numa filial fazem parte das suas despesas gerais, pelo que têm, em princípio, um nexo direto e imediato com o conjunto da sua atividade económica. Portanto, se a holding efetuar tanto operações com direito a dedução como operações sem direito a dedução, decorre do artigo 17. °, n.°5, primeiro parágrafo, da Sexta Diretiva 77/388 que pode unicamente deduzir-se a parte do imposto sobre o valor acrescentado proporcional ao montante respeitante à primeira categoria de operações.” (cfr. §§ 1 a 3 das conclusões)

 

Tal como salienta o TJUE no Caso I/S Fini y Skatteministeriet[26], o conceito de sujeito passivo está sempre vinculado ao de atividade económica, sendo precisamente esta atividade económica a que justifica a qualificação do sujeito passivo com direito a deduzir. Ora, se o exercício, de forma independente, de uma atividade económica é, por si só, condição de incidência subjetiva deste imposto, logo da possibilidade de conferir direito à dedução e se o direito à dedução é, como vimos, o garante da neutralidade do imposto, a delimitação daquele conceito deverá necessariamente ser o mais lata possível.

Como se prevê no artigo 9.º, n.º1, 2.º parágrafo, 2.ª parte, da DIVA, na definição de sujeito passivo de IVA “(…) É em especial considerada atividade económica a exploração de um bem corpóreo ou incorpóreo com o fim de auferir receitas com caráter de permanência (…).”

Ora, é ao nível da gestão das participações sociais que se tem discutido bastante a determinação do alcance deste conceito, sendo especialmente relevantes neste contexto as conclusões do Caso EDM [27].

Como nota o Advogado-geral Philipe Léger nas sua conclusões neste Caso[28],  “(…) constitui jurisprudência constante que o simples exercício do direito de propriedade pelo seu titular não pode, por si só, ser considerado uma atividade económica”.

Já antes no Caso Polystar[29],relativo a uma holding pura, o TJUE tinha concluído que a mera aquisição e detenção de participações sociais, sem intervenção na gestão de outras empresas, não devem ser consideradas uma atividade económica, na aceção da Sexta Diretiva, não conferindo ao seu autor a qualidade de sujeito passivo.

Nas conclusões do Caso EDM[30] refere ainda o TJUE que a simples venda de ações e outros títulos negociáveis, tais como participações em fundos de investimento, assim como os rendimentos inerentes a estes fundos, não constituem uma “atividade económica” na aceção da Sexta Diretiva, pelo que não se encontram abrangidos pelo âmbito da sua aplicação.

Em conformidade com este arresto, a simples tomada de uma participação financeira noutra empresa não constitui uma exploração de um bem com o fim de auferir receitas com caráter de permanência, na medida em que o eventual dividendo, fruto de tal participação, resulta da simples propriedade do bem e não a contrapartida de uma qualquer atividade económica[31]. Já relativamente aos juros recebidos por uma holding relativamente a empréstimos concedidos às suas sociedades participadas não podem, de acordo com as conclusões daquele Acórdão, ser excluídos do âmbito de aplicação de IVA.

Na mesma lógica, a cedência das referidas participações não preenchem igualmente o conceito de atividade económica, conforme se refere no Caso Satam/Sofitam[32]. Não sendo contrapartida de uma atividade económica, no sentido da Sexta Diretiva, a perceção de dividendos não entra no campo da aplicação do IVA, nem pode ser qualificada como uma contraprestação de eventuais serviços prestados pela SGPS à sua filial, que se consumam numa intervenção na sua gestão (vg. serviços de apoio técnico à gestão).

Interessa em particular salientar que no Caso Floridienne e Berginvest[33], que tem subjacente uma sociedade holding, o TJUE refere que se deve considerar como atividade económica a intervenção na gestão das filiais, na medida em que implique transações sujeitas a IVA, tais como o fornecimento de serviços administrativos, contabilísticos e informáticos.

Isto é, interessa em especial sublinhar que o TJUE, no tocante à aquisição de participações financeiras, já decidiu que a situação é distinta, inserindo-se no âmbito do exercício de uma atividade económica, no caso de a aquisição de uma participação financeira numa sociedade ser acompanhada pela “ (…) interferência direta ou indireta na gestão das sociedades (…)”[34] em que se verificou a tomada de participação, sem prejuízo dos direitos que o detentor da participação tenha na qualidade de acionista ou de sócio[35], na medida em que tal interferência implique a realização de transações sujeitas ao IVA nos termos da DIVA, tais como o fornecimento de serviços administrativos, contabilísticos e informáticos.

O TJUE distingue, nesta medida, as holdings que interferem, direta ou indiretamente, na gestão das participadas, daquelas que não o façam[36].

Quanto ao tratamento a conceder à gestão (aquisição, detenção e alienação) de participações sociais para além do caso das holdings, no contexto das participações de uma sociedade-mãe em filiais ou associadas, decorre da jurisprudência do TJUE que as operações relativas às ações ou participações em sociedades são abrangidas pelo âmbito de aplicação do IVA quando efetuadas no quadro de uma atividade comercial de negociação de títulos ou quando constituem o prolongamento direto, permanente e necessário da atividade tributável[37].

Sendo a aquisição de participações sociais uma operação passiva, para aferirmos da dedutibilidade do IVA relativa às despesas associadas teremos, necessariamente, de analisar em que medida aquela participação é detida e quais são as operações a jusante que decorreram daquelas despesas – serão ou não tais operações atividades económicas sujeitas e não isentas de IVA?

Como refere Rui Bastos[38], “Assim sendo, a aquisição de participações numa perspetiva pura de investimento, tendo em vista a obtenção de receitas como dividendos, remete a sua detenção para fora do conceito de atividade económica, sendo que a aquisição num contexto de comercialização de títulos remeteria para o exercício de uma atividade sujeita, embora isenta.

O mesmo não deverá suceder num contexto de aquisição de uma participação que represente o prolongamento natural e necessário da atividade comercial ou industrial da sociedade adquirente, num contexto de reestruturação empresarial ou num processo de expansão, optando pela aquisição de uma filial, em detrimento da constituição de um estabelecimento estável, o mesmo não sucedendo num contexto de intervenção na gestão das participadas e, concomitantemente, em atividades tributadas por elas exercidas.”

No Caso SKF, o TJUE, invocando o princípio da igualdade de tratamento e neutralidade fiscal, conclui pela natureza económica das tomadas de participações acompanhadas com a interferência pela sociedade-mãe na gestão das participadas que deve ser estendida às situações de transmissão de participações que põem termo a essa interferência.

No quadro da transmissão de ações, considera o TJUE no Caso SKF que o direito à dedução do IVA pago a montante sobre prestações destinadas a realizar uma transmissão de ações[39] é conferido, por força do artigo 168.° da DIVA, se existir uma relação direta e imediata entre as despesas relacionadas com as prestações a montante e o conjunto das atividades económicas (tributadas) do sujeito passivo, as denominadas “despesas gerais”.

Naquele processo, a transmissão de ações em causa[40], realizada com vista à reestruturação de um grupo de sociedades pela sociedade‑mãe, foi considerada uma operação de obtenção de receitas com caráter permanente de atividades que excedem o quadro da simples venda de ações. Esta operação apresentava um nexo direto com a organização da atividade industrial exercida pelo grupo e constitui assim o prolongamento direto, permanente e necessário da atividade tributável do sujeito passivo, pelo que aquela operação de venda de ações seria abrangida pelo âmbito de aplicação do IVA, suscetível de conferir direito à dedução do IVA dos respetivos inputs.

O TJUE considera que estas prestações têm uma relação direta e imediata com o conjunto da atividade económica do sujeito passivo, permitindo o direito à dedução da totalidade do IVA das referidas prestações.

Debateu-se se os inputs associados à alienação de participações sociais poderão ser suscetíveis de permitir a dedução do IVA, por via da respetiva qualificação como despesas gerais da atividade, no caso de aquela alienação não estar sujeita a IVA, situação mais frequente, como vimos, nas holdings, ou então, estar sujeita mas isenta, como acontece com a sociedade‑mãe que gere um grupo de sociedades.

No caso da não sujeição, o Advogado-geral, apoiando-se nas conclusões do Caso Krettztechnik, n.º 36, considera suscetível este tipo de despesas serem qualificadas como despesas gerais, possuindo, portanto, uma relação direta e imediata com o conjunto da atividade económica do sujeito passivo, possibilitando a sua dedução.

Pelo contrário, no caso de a alienação de participações sociais se qualificar como isenta de IVA, tal como aconteceu no Caso SKF, o Advogado-geral, apoiando-se nas conclusões do Caso BLP Group, considerou que o IVA pago a montante das prestações adquiridas possuem uma relação direta e imediata com a operação isenta, interrompendo assim a cadeia do IVA.

Ora o TJUE, no Caso SKF, vem pôr o acento tónico no facto de se saber se a sociedade que é sujeito passivo do IVA está ou não envolvida na gestão das sociedades em que tiver ocorrido a tomada de participação, sociedades estas que desenvolvem atividades tributadas.

Neste sentido, considerou o Tribunal que recusar o direito à dedução de IVA pago a montante por despesas de consultoria ligadas a uma transmissão de ações isenta em razão da envolvência na gestão da sociedade cujas ações são cedidas e admitir este direito à dedução para tais despesas ligadas a uma transmissão que se situa fora do âmbito da aplicação do IVA pelo facto de constituírem despesas gerais do sujeito passivo levaria a um tratamento fiscal diferente de operações objetivamente semelhantes, em violação do princípio da neutralidade fiscal[41].

No que toca à dedução do IVA, o TJUE já concluiu no Caso Kretztechnik [42] que numa emissão de ações (apesar de ser, por si só, uma operação que não é abrangida pelo âmbito de aplicação do IVA, dado não se qualificar como transmissão de bens ou prestação de serviços) efetuada num contexto de reforço de capital em proveito da atividade económica geral de uma sociedade, se considera que os custos das prestações adquiridas[43] por uma sociedade fazem parte das suas despesas gerais e são, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos seus produtos.

Como decidiu o TJUE neste Caso, “O direito à dedução do IVA que incidiu sobre a aquisição de bens ou serviços a montante pressupõe que as despesas efetuadas com a sua aquisição tenham feito parte dos elementos constitutivos do preço das operações tributadas a jusante com direito à dedução (…).

Porém, admite-se igualmente o direito à dedução a favor do sujeito passivo, mesmo na falta de uma relação direta e imediata entre uma determinada operação a montante e uma ou várias operações a jusante com direito à dedução, quando os custos dos serviços em causa fazem parte das suas despesas gerais e são, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos bens que fornece ou dos serviços que presta. Estes custos têm, com efeito, uma relação direta e imediata com o conjunto da atividade económica do sujeito passivo.” (cfr. §§ 57 e 58)

 

Por fim, importa lembrar que o direito à dedução é conferido relativamente ao IVA pago a montante pelas prestações realizadas no quadro de operações financeiras se o capital adquirido com estas últimas operações tiver sido afetado às atividades económicas do interessado. Por outro lado, as despesas relacionadas com as prestações a montante têm uma ligação direta e imediata com as atividades económicas do sujeito passivo nos casos em que são exclusivamente imputáveis a atividades económicas efetuadas a jusante e, portanto, são parte apenas dos elementos constitutivos do preço das operações abrangidas pelas referidas atividades (v. acórdão Securenta, já referido, n.os 28 e 29).

 

Decorre do que antecede que deve responder se à terceira questão que o direito à dedução do IVA pago a montante sobre prestações destinadas a realizar uma transmissão de ações é conferido, por força do artigo 17.°, n.os 1 e 2, da Sexta Diretiva, na redação resultante do seu artigo 28.° F, n.° 1, e do artigo 168.° da Diretiva 2006/112, se existir uma relação direta e imediata entre as despesas relacionadas com as prestações a montante e o conjunto das atividades económicas do sujeito passivo.” (cfr. §§ 71 a 73)

 

Também no que se refere à aquisição e detenção de ações, as despesas incorridas serão dedutíveis como despesas gerais, na medida em que tenham “um nexo direto e imediato com o conjunto da atividade económica [da holding]”, como poderão ser os serviços de apoio à gestão das suas participadas[44].

Como vimos, no âmbito da aquisição e detenção de participações sociais, a existência, pela participante, de uma interferência direta ou indireta na gestão da participada condiciona o enquadramento no âmbito da atividade económica das holding, suscitando o direito à dedução do IVA suportado com as despesas relacionadas a montante.

Nesta medida, sendo a aquisição uma operação, por natureza, passiva, a dedutibilidade do IVA das despesas associadas, no todo ou em parte, à mesma, estaria, em rigor, condicionada à forma como a titularidade da mesma será exercida no futuro, ou seja, de forma meramente passiva, limitando-se ao recebimento dos lucros a ela associados ou, alternativamente, de forma ativa, com interferência direta ou indireta na gestão da mesma, dela resultando um prolongamento de uma atividade tributada.

Como salienta Rui Bastos[45], “Não se deverá ver condicionado o direito à dedução das despesas gerais suscetíveis de ser imputadas à componente tributada da atividade económica do sujeito passivo (serviços de apoio à gestão), como poderá acontecer com assistência jurídica contratada a terceiros, estudos em matéria de internacionalização do grupo, gastos administrativos, etc., desde que se comprove a afetação de recursos, como poderão ser os recursos humanos, à referida atividade tributada, qualificando-se aqueles encargos como gastos gerais da atividade e, como tal, repercutíveis no preço das operações tributadas e, portanto, suscetíveis de conferirem integral dedução do IVA, sendo que não se vislumbra, a este nível, nenhuma razão para um tratamento diferenciado de uma holding mista de uma sociedade operacional”.

Como nota o autor, seja numa holding mista, seja numa sociedade-mãe, seja ao nível da aquisição ou detenção, ou no plano da sua alienação, o tratamento em sede de IVA da dedutibilidade dos inputs deverá ser o mesmo. Tratar de forma diferente a dedutibilidade do IVA de inputs consoante a opção estratégia de organização empresarial ou um plano de negócios de expansão de uma atividade económica, seja pela constituição de uma filial ou a criação de uma mera sucursal, gerir diretamente uma atividade tributada ou, por via indireta, mediante a intermediação de uma participação, conduziria a um tratamento discriminatório de situações objetivamente idênticas.

Por sua vez, como o TJUE notou no Caso Abbey[46], “fazem parte das despesas gerais do sujeito passivo e, como tais, são elementos constitutivos do preço dos produtos de uma empresa. Com efeito, mesmo no caso de transferência de uma universalidade de bens, quando o sujeito passivo não realiza mais operações após a utilização dos referidos serviços, os custos destes últimos devem ser considerados inerentes ao conjunto da atividade económica da empresa antes da transmissão.” (cfr. § 35)

(…)

qualquer outra interpretação (…) seria contrária ao princípio que exige que o sistema do IVA seja de uma perfeita neutralidade quanto à carga fiscal de todas as atividades económicas da empresa, na condição de estas estarem elas próprias sujeitas ao IVA, e poria a cargo do operador económico o custo do IVA no âmbito da sua atividade económica sem lhe dar a possibilidade de o deduzir (ver neste sentido, acórdão Gabalfrisa (…)). Assim, proceder-se-ia a uma distinção arbitrária entre, por um lado as despesas efetuadas para os fins de uma empresa antes da exploração efetiva desta e das efetuadas no decurso da referida exploração e, por outro lado, as despesas efetuadas para pôr termo a esta exploração. Os diversos serviços utilizados (…) para os fins da transferência duma universalidade de bens ou de parte dela mantêm portanto, em princípio, uma relação direta e imediata com o conjunto da atividade económica deste sujeito passivo.” (cfr. §§ 35 e 36)

 

 

3.2 Jurisprudência do CAAD

 

No Processo n.º 77/2012-T, de 27 de dezembro de 2012, estava em causa saber se uma sociedade gestora de participações sociais que presta serviços às suas participadas e cujos colaboradores estão principal e quase exclusivamente afetos a essa prestação de serviços pode deduzir todo o IVA suportado a montante com a aquisição de bens e serviços, e inclusivamente o conexionado com atividades como a detenção de participações sociais, o recebimento de dividendos e juros derivados de empréstimos as suas participadas e determinados serviços e pagamentos.

Começou o Tribunal por referir as Conclusões do Caso do TJUE, no contexto do qual se deve afastar “o obstáculo conceitual suscitado pela Autoridade Tributária e Aduaneira da inadmissibilidade de dedução integral do IVA suportado por uma SGPS, atenta a sua natureza, quando se trata de uma sociedade deste tipo que presta serviços às suas participadas [47].

Neste contexto, o Tribunal conclui que a Requerente tem razão ao defender, em primeira linha, que o direito à dedução nasce de uma relação de utilização: se os recursos foram utilizados pela Requerente em atividades que conferem direito a dedução, o IVA será dedutível, independentemente do peso relativo em termos de valor gerado por essa atividade no confronto com a totalidade dos proveitos.

Por outro lado, citando jurisprudência do TJUE, nota-se que «admite-se igualmente um direito a dedução a favor do sujeito passivo, mesmo na falta de um nexo direto e imediato entre uma determinada operação a montante e uma ou várias operações a jusante com direito a dedução, quando os custos dos serviços em causa fazem parte das suas despesas gerais e são, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos bens que fornece ou dos serviços que presta. Estes custos têm, com efeito, um nexo direto e imediato com o conjunto da atividade económica do sujeito passivo».

Neste contexto, o Tribunal conclui que tem cobertura legal a dedução pela Requerente de todo o IVA suportado com serviços e bens adquiridos que tenham nexo direto e imediato com os serviços prestados às suas participadas com direito a dedução ou que, não tendo nexo direto e imediato com determinados serviços, seja IVA suportado com custos que fazem parte das despesas gerais da Requerente que tenham nexo direto e imediato com o conjunto da sua atividade económica.

Igualmente em processo similar ao controvertido (Processo n.º 128/2012-T), já este Tribunal teve ocasião de se pronunciar, em 23 de Abril de 2013, sobre a dedutibilidade de despesas suportadas por uma sociedade operacional, “que tem como atividades principais a fabricação de … e produtos destinados à sua produção e adquire participações noutras sociedades e intervém na sua gestão com o objetivo de potenciar a sua atividade principal, designadamente expandindo internacionalmente a sua área de vendas a novos mercados e assegurando condições para a comercialização dos seus produtos”.

A questão que se colocou foi a de saber se a Requerente poderia deduzir o IVA suportado com a aquisição de bens e serviços necessários à aquisição dessas participações sociais e intervenção noutras empresas.

Neste Caso invocou-se igualmente o Acórdão do TJUE de 6 de Setembro de 2012 proferido no Caso Portugal Telecom.

Como se nota, a interferência da Requerente «na gestão das sociedades em que tomou participações constitui uma atividade económica», para efeitos de tributação em IVA, estando a Requerente autorizada a deduzir o IVA pago a montante, na condição de os serviços adquiridos a montante apresentarem um nexo direto e imediato com operações económicas a jusante com direito à dedução.

Para além disso, como se refere no mesmo Acórdão, «admite-se igualmente um direito a dedução a favor do sujeito passivo, mesmo na falta de um nexo direto e imediato entre uma determinada operação a montante e uma ou várias operações a jusante com direito a dedução, quando os custos dos serviços em causa fazem parte das suas despesas gerais e são, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos bens que fornece ou dos serviços que presta. Estes custos têm, com efeito, um nexo direto e imediato com o conjunto da atividade económica do sujeito passivo».

Nestes termos, conclui este Tribunal que “Assim, tem cobertura legal a dedução pela Requerente de todo o IVA suportado com serviços e bens adquiridos que tenham nexo direto e imediato com os serviços prestados às suas participadas com direito a dedução ou que, não tendo nexo direto e imediato com determinados serviços, seja IVA suportado com custos que fazem parte das despesas gerais da Requerente que tenham nexo direto e imediato com o conjunto da sua atividade económica.

No caso em apreço, provou-se a aquisição de participações e os estudos relacionados com elas, bem como a intervenção de colaboradores da Requerente em sociedades participadas, fiscalizando a atividade desenvolvida e a formação de recursos humanos destas, se inserem na sua estratégia global de comercialização dos seus produtos (… e …), tendo em vista obtenção de novos mercados com ligação com empresas locais (Líbano e vários países africanos) e assegurar o transporte desse produtos (terminal portuário de …) em comercialização interna (caso da aquisição da J... –, S.A.)

Assim, apesar de não se ter provado um nexo direto e imediato entre as despesas de consultadoria que foram objeto das correções efetuadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira e uma ou várias operações a jusante com direito a dedução, provou-se que a existência de um nexo direto e imediato entre essas despesas e o conjunto da atividade económica da Requerente, pelo que os custos dos serviços em causa fazem parte das suas despesas gerais e são, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos bens que fornece ou dos serviços que presta, tratando-se, portanto, de custos com «um nexo direto e imediato com o conjunto da atividade económica do sujeito passivo», o que, na perspetiva da referida jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia basta para conferir o direito à dedução.”

Por fim, no Processo n.º 316/2015-T, de 5 de janeiro de 2016, estava também em causa saber se, numa SGPS que pratica os mesmos três tipos de atividade, gestão de participações sociais, conceção de empréstimos e prestação de serviços de administração e gestão e que se “deixasse de gerir participações sociais, a sua estrutura não teria de sofrer alterações, pois a atividade de gestão envolve poucos recursos” os denominados “custos de acionista”, designadamente os custos com «as prestações de serviços do Secretário da Sociedade, certificação de contas, programa GMTN, prestação de serviços do Conselho Fiscal, manutenção das ações na bolsa de valores, Assembleia-Geral» e outros, como os custos com honorários de empresa de revisores oficiais de contas, publicidade, e imagem para investidores, formação de colaboradores e transporte de material de escritório” originam IVA dedutível.

Neste caso concluiu o Tribunal que “face da jurisprudência da União Europeia, se uma sociedade holding desenvolve uma atividade económica, como é a gestão ativa de participações sociais materializada na prestação de serviços de administração e gestão às participadas, é um sujeito passivo de IVA, não havendo qualquer limitação ao exercício do direito à dedução relativamente a todo o IVA que tenha onerado a aquisição de bens e serviços conexionada com o exercício dessa atividade. Assim, o direito à dedução nasce de uma relação de utilização: se os recursos foram utilizados pela Requerente em atividades que conferem direito a dedução, o IVA será dedutível, independentemente da natureza jurídica de sociedade holding que a Requerente tem e do peso relativo em termos de valor gerado por essa atividade no confronto com a totalidade dos proveitos”.

Refere ainda o Tribunal: “assim, à face da referida jurisprudência do TJUE, é errado o entendimento da Autoridade Tributária e Aduaneira ao considerar como necessariamente não conexionados com a prestação de serviços às participadas os custos relativos ao funcionamento da Requerente que «seriam sempre incorridos ainda que o sujeito passivo não prestasse qualquer serviço acessório», pois, para considerar demonstrada tal conexão, basta que esses custos sejam necessários para a assegurar o funcionamento da Requerente, já que a prestação de serviços, que foi a atividade principal da Requerente, não poderia ser levada a cabo sem que a sociedade suportasse esses custos necessários para assegurar o seu funcionamento global.

No mesmo processo discutia-se, também o direito à dedução de IVA relativo a despesas conexionadas com bens e serviços de utilização mista, como ocorre no presente processo, tendo-se concluído que “o resultado a que chegou a Autoridade Tributária e Aduaneira demonstra, desde logo, a inadequação do método utilizado, já que resulta manifestamente da prova produzida que a afetação de recursos à mera detenção e fruição de participações sociais foi insignificante e a utilização de quase todos os bens e serviços adquiridos deve ser imputada à atividade de prestação de serviços de administração e gestão pela Requerente às suas participadas”.

No caso em análise, a AT tinha, também, utilizado a chave de repartição fornecida pela Requerente do dossiê de preços de transferência. O tribunal considerou que, “à face da prova produzida, é manifesto que a chave aplicada pela Autoridade Tributária e Aduaneira para determinar a repartição dos montantes do imposto sobre o valor acrescentado pago a montante entre atividades económicas e atividades não económicas não tem qualquer relação com a realidade, pois provou-se que, em 2011, a atividade principal da Requerente foi a prestação de serviços de administração e gestão às suas participadas, sendo insignificante a quantidade de recursos onerados com IVA que estão conexionados com a mera detenção e fruição de participações sociais (designadamente, ocorreu apenas a alienação parcial de capital de duas sociedades do grupo), pelo que terá de ser também muito reduzido o grau de imputação a estas atividades dos gastos gerais sujeitos a IVA.

 

4. Aplicação ao caso concreto

 

Considerando a matéria de facto dada como provada e a matéria de direito vinda de enunciar, importa aferir da legitimidade da pretensão da Requerente para deduzir o IVA suportado nos serviços em causa.

Como vimos, o direito à dedução faz parte integrante do mecanismo do IVA sendo garante de uma correta aplicação do princípio basilar da neutralidade do imposto e não pode, em princípio, ser limitado, de onde decorre que qualquer limitação ao mesmo deve ser interpretada restritivamente.

Regra geral, para serem passíveis de dedução os bens ou serviços adquiridos a montante devem apresentar uma relação direta e imediata com as operações a jusante que conferem direito à dedução, sendo indiferente o objetivo final prosseguido pelo sujeito passivo.

De acordo com o TJUE, a mera aquisição e a simples detenção de participações sociais não devem ser consideradas atividades económicas.

Contudo, a interferência de uma sociedade na gestão de sociedades afiliadas é considerada uma atividade económica na medida em que implique a realização de transações sujeitas a IVA tais como o fornecimento de serviços administrativos, financeiros, comerciais e técnicos.

Como vimos, no âmbito da aquisição e detenção de participações sociais, a existência, pela participante, de uma interferência direta ou indireta na gestão da participada condiciona o enquadramento no âmbito da atividade económica das holding, suscitando o direito à dedução do IVA suportado com as despesas relacionadas a montante.

Nesta medida, sendo a aquisição uma operação, por natureza, passiva, a dedutibilidade do IVA das despesas associadas, no todo ou em parte, à mesma, estaria, em rigor, condicionada à forma como a titularidade da mesma será exercida no futuro, ou seja, de forma meramente passiva, limitando-se ao recebimento dos lucros a ela associados ou, alternativamente, de forma ativa, com interferência direta ou indireta na gestão da mesma, dela resultando um prolongamento de uma atividade tributada.

A Requerente defende que, por desenvolver uma atividade económica sujeita a IVA e dele não isenta, o IVA suportado com as despesas gerais é dedutível e que por, em razão da afetação maioritária dos gastos gerais a essa atividade, considerada, portanto, principal, o IVA suportado com esses custos gerais é dedutível na integralidade.

A prova produzida confirma que a principal atividade desenvolvida pela Requerente no ano de 2012 foi a de prestação de serviços de administração e gestão às suas participadas, pois não realizou operações relevantes de recomposição da sua carteira de participações sociais.

Resulta ainda da prova produzida que, se a Requerente deixasse de gerir participações sociais, a sua estrutura não teria de sofrer alterações, pois a atividade de gestão de participações sociais envolve recursos residuais.

Conforme devidamente explicitado em jurisprudência já citada, uma sociedade gestora de participações sociais que, a par da gestão de participações, adquire serviços que fatura em seguida às sociedades que controla, está autorizada a deduzir o imposto sobre o valor acrescentado pago a montante, na condição dos serviços adquiridos a montante apresentarem um nexo direto e imediato com operações económicas a jusante com direito a dedução. Assim, nos casos em que todos os serviços adquiridos apresentam nexo direto e imediato com operações económicas a jusante com direito a dedução, o sujeito passivo fica com o direito de deduzir a integralidade do IVA que tenha onerado a aquisição a montante dos serviços.

O direito à dedução nasce de uma relação de utilização: se os recursos foram utilizados pela Requerente em atividades que conferem direito a dedução, o IVA será dedutível, independentemente da natureza jurídica da Requerente e do peso relativo dos rendimentos gerados por cada tipo de atividade.

Por outro lado, admite-se igualmente o direito à dedução do IVA suportado, ainda que inexista um nexo direto e imediato entre a aquisição de serviços a montante e operações tributadas a jusante, quando os custos dos serviços em causa fazem parte das despesas gerais do sujeito passivo e se apresentam como elementos constitutivos dos serviços tributados que presta, pois, estes custos têm, com efeito, um nexo direto e imediato com o conjunto da atividade económica do sujeito passivo.

Assim, à face desta jurisprudência do TJUE, tem cobertura legal a dedução pela Requerente de todo o IVA suportado com serviços e bens adquiridos que tenham nexo direto e imediato com os serviços prestados às suas participadas com direito a dedução ou que, não tendo nexo direto e imediato com determinados serviços, seja IVA suportado com custos que fazem parte das despesas gerais da Requerente que tenham nexo direto e imediato com o conjunto da sua atividade económica de prestação de serviços.

Assim, para concluir pela indedutibilidade do IVA suportado é necessário constatar que não há um nexo direto e imediato entre a operação a montante e as operações a jusante que admitem direito a dedução e, também, demonstrar também que os custos dos serviços em causa não fazem parte das suas despesas gerais, necessárias para levar a cabo a globalidade da atividade.

 

No caso em apreço, a AT desconsiderou ou corrigiu IVA previamente considerado dedutível pela Requerente em três casos assim classificados:

- IVA deduzido com gastos de terceiros;

- IVA suportado em operações afetas à atividade não económica;

- IVA suportado em gastos gerais.

 

Relativamente ao IVA deduzido relativos a encargos com avaliação de ativos, para efeitos de permuta, cujos beneficiários diretos são entidades com as quais se encontra em situação de relações especiais, este Tribunal entende que, efetivamente, se trata de despesas relativas a outros sujeitos passivos, tendo originado, desde logo, uma correção em sede de matéria coletável de IRC. Ora, também a Requerente parece corroborar desta ideia pois não contesta esta consideração, afirmando até que, por força da correção efetuada pela própria AR em sede de (apenas) IRC, eles foram refaturados. Ora, se aceita a refaturação para efeitos de IRC, deve aceitar também que, ainda que por via da não dedução do IVA, a operação resulte neutra. Ou seja, o IVA suportado com esses serviços ou é deduzido, caso tenha originado IVA liquidado (o que não ficou provado, sendo certo que de facto parece não ter ocorrido já que a refaturação operou apenas como correção em sede de IRC) ou não é deduzido, nem origina IVA liquidado.

 

A AT entendeu ainda que o IVA suportado com os custos com auditorias e revisão de contas e outros, não podia ser deduzido por a aquisição destes serviços estar exclusivamente afeta à utilização da própria Requerente em razão da sua forma legal e necessários ao seu bom e legal funcionamento. A este propósito importa referir que se a Requerente deixasse de gerir participações sociais, a sua estrutura não teria de sofrer alterações, pois a atividade de gestão envolve poucos recursos. Tal indicia que, de facto, há uma relação direta e imediata entre as despesas necessárias para assegurar esse funcionamento global da Requerente e a atividade económica que esta pratica, consubstanciada na prestação de serviços técnicos de gestão às participadas.

Assim, à face da referida jurisprudência do TJUE, é errado o entendimento da AT ao considerar como necessariamente não conexionados com a prestação de serviços às participadas os custos relativos ao funcionamento da Requerente já que a sua atividade principal, a prestação de serviços, não poderia ser exercida se a sociedade não suportasse custos necessários ao seu adequado funcionamento global.

Recorde-se que a Requerente é uma SGPS que não se dedica, enquanto atividade principal, à gestão de participações sociais, mas, antes, desenvolve primacialmente uma atividade económica traduzida na prestação de serviços de administração e gestão às suas participadas.

 

A AT corrigiu ainda IVA suportado com gastos gerais, por considerar que os mesmos não devem ser afetos, na sua integralidade, à atividade de prestação de serviços, tendo optado por, de harmonia com o disposto no artigo 23.º do CIVA, admitir apenas a dedução da parte do IVA proporcional ao montante respeitante a operações tributadas.

Assim, a AT entendeu que não era possível proceder à afetação integral destes gastos a uma das atividades da Requerente, pelo que considerou que os mesmos consubstanciam despesas comuns às diferentes atividades da empresa, passando a determinar qual a parte do imposto suportado na sua aquisição que é afeta à atividade de prestação de serviços.

Para determinar a imputação dos gastos gerais às prestações de serviços, a Autoridade Tributária e Aduaneira utilizou a proporção utilizada pela Requerente, em sede de IRC, para determinar «a proporção dos gastos incorridos com a única atividade exercida que se encontra sujeita a IVA e não isenta». Nos cálculos que apresentou, a AT não foi suficientemente explícita nos valores que utilizou.

A aplicação do método da afetação real decorre do disposto no artigo 23.º, n.º 1, alínea a), do CIVA relativamente ao direito à dedução respeitante ao IVA suportado com bens ou serviços parcialmente afetos à realização de operações não decorrentes do exercício de uma atividade económica, que no caso seria a atividade de gestão de participações.

A imposição da adoção do método da afetação real para repartição dos montantes do imposto sobre o valor acrescentado pago a montante entre atividades económicas e atividades não económicas é admitida pelo direito comunitário, como foi reconhecido no já citado acórdão do TJUE relativo ao processo n.º C-437/06.

A aplicação do método da afetação real traduz-se na utilização de uma fórmula que reflita, com a aproximação possível, a proporção de utilização em cada uma das atividades os recursos onerados com IVA, pois, como se refere no n.º 2 do artigo 23.º do CIVA, está em causa determinar a afetação real de todos ou parte dos bens e serviços utilizados, com base em critérios objetivos que permitam determinar o grau de utilização desses bens e serviços em operações que conferem direito a dedução e em operações que não conferem esse direito.

Em face da prova produzida, é manifesto que a chave aplicada pela AT para determinar a repartição dos montantes do imposto sobre o valor acrescentado pago a montante entre atividade económica e atividade não económica não tem aderência à realidade, pois durante 2012 a atividade principal exercida pela Requerente foi a prestação de serviços de administração e gestão às suas participadas, sendo residuais os recursos com IVA que estão conexionados com a mera gestão de participações sociais, pelo que terá de ser também muito reduzido o grau de imputação a estas atividades dos gastos gerais sujeitos a IVA.

Por isso, tem de se concluir que não pode ser adequada a chave de repartição adotada pela AT, baseada nas estimativas da Requerente, para efeitos de determinação dos preços de transferência a considerar em sede de IRC, sobre a proporção dos gastos com pessoal que cada departamento afetou à prestação de serviços, que foi determinada pela Requerente considerando todos os gastos relevantes, em que se incluem, maioritariamente, gastos com pessoal, não sujeitos a IVA, bem como o montante não explicado de € 2.554.695,65.

 

Concluindo, à Requerente não assiste razão no que se refere à dedução do IVA de encargos associados a serviços jurídicos associados à avaliação de ativos, que deveriam ser suportados por terceiros, cujo valor erradamente deduzido, e devidamente corrigido pela AT, ascende a € 35.748,31. Por outro lado, assiste razão à Requerente no que se refere à dedução do IVA suportado com despesas com auditoria e certificação legal das contas, no valor de € 112.359,69, bem como do IVA suportado com restantes gastos da Requerente, no valor de € 414.052,36

 

 

5. Dos juros compensatórios

 

Sendo ilegais as liquidações de IVA efetuadas com base nas correções referidas, são também ilegais, pelas mesmas razões, as correspondentes liquidações de juros compensatórios, que se integram nas respetivas dívidas de imposto e delas dependem, nos termos do artigo 35.º, n.º 8, da LGT.

 

IV. DECISÃO

Em face do exposto, acorda o coletivo dos árbitros do Tribunal Arbitral em julgar parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral, pelo que decide:

a)      Anular os atos tributários relativos às Demonstrações de Liquidação de IVA emitidas pela Direção de Serviços de Cobrança da AT em 2014 e reportadas ao exercício de 2012, supra discriminadas, no montante de € 526.412,05 (quinhentos e vinte, seis mil e quatrocentos e doze euros e cinco cêntimos);

b)      Anular os atos tributários relativos às Demonstrações de Liquidação dos juros compensatórios relativos aos atos tributários anulados, emitidas pela Direção de Serviços de Cobrança da AT em 2014 e reportadas ao exercício de 2012, supra discriminadas, no montante, calculado proporcionalmente, de 45.328,74 € (quarenta e cinco mil, trezentos e vinte o oito euros e setenta e quatro cêntimos).

c)      Manter o ato tributário proferido pela A.T, relativo a € 35.748,31 (trinta e cinco mil, setecentos e quarenta e oito euros e trinta e um cêntimos), na consideração de que, apesar da verificação de um vício procedimental formal, a Administração Tributária, pela vinculação a que está sujeita à lei, não poderia ter decidido de outro modo, o que degrada em não essencial a preterição de formalidade legal e permite que o ato se salve, na medida em que é substancialmente  conforme à lei.

d)     Manter o ato tributário relativo a juros compensatórios sobre o ato referido em c), no montante, apurado proporcionalmente, de 3.078,25 euros (três mil e setenta e oito euros e vinte e cinco cêntimos).

 

VALOR DO PROCESSO

De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.ºs 1 e 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 610 567,35.

 

CUSTAS

Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 9.180,00 nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a suportar pela Autoridade Tributária e Aduaneira na percentagem de 93,6% e pela Requerente na percentagem de 6,4%, atento o respetivo decaimento.

           

Notifique-se.

 

 

 

 

 

Lisboa, Centro de Arbitragem Administrativa, 28 de setembro de 2016

 

O Tribunal Coletivo,

 

José Baeta de Queiroz

(Árbitro Presidente)

 

 

 

Clotilde Celorico Palma

(Árbitro Vogal)

 

Luísa Anacoreta

(Árbitro Vogal)

 

 

 

 

 

 

 

(Texto elaborado em computador, nos termos do artigo 138.º, n.º 5, do Código de Processo Civil (CPC), aplicável por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do Regime de Arbitragem Tributária, com versos em branco e por nós revistos).



[1] Cfr., XAVIER DE BASTO, A tributação do consumo e a sua coordenação internacional, CCTF n.º 164, Lisboa 1991, p. 39 a 73 e CLOTILDE CELORICO PALMA, Introdução ao Imposto sobre o Valor Acrescentado, Cadernos IDEFF n.º1, Almedina, 6ª edição, setembro 2015, pp. 19 a 34.

[2] Cfr. XAVIER DE BASTO, A tributação do consumo …,  p. 41.

[3] Diretiva 2006/112/CE, de 28 de novembro, publicada no JO n.º L 347, de 11 de dezembro de 2006.

[4] Cfr. MÁRIO ALEXANDRE, “Imposto sobre o Valor Acrescentado, Exclusões e Limitações do Direito à Dedução”, Ciência e Técnica Fiscal, 350, abril-junho, de 1998, e CLOTILDE CELORICO PALMA, “IVA – Algumas notas sobre as exclusões do direito à dedução”, Fisco n.ºs 115/116, setembro 2004.

 

[5] Sobre estas regras vide, XAVIER DE BASTO e MARIA ODETE OLIVEIRA, “Desfazendo mal-entendidos em matéria de direito à dedução de Imposto sobre o Valor Acrescentado: As recentes alterações do artigo 23.° do Código do IVA”, Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal, Ano 1, RITA LA FERIA, “A Natureza das Atividades e Direito à Dedução das Holdings em Sede de IVA”, Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal, Ano 4, n.º 3, 2012, pp. 171-197, RUI LAIRES, “Acórdão do Tribunal De Justiça das Comunidades Europeias (TJCE), de 13 de março de 2008 (Processo c-437/06, Caso Securenta) ”, Ciência e Técnica Fiscal, n.º 421, janeiro-junho, 2008, pp. 209-264, “Acórdão do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias (TJCE), de 12 de fevereiro de 2009 (Processo C-515/07, Caso VNLTO)”, Ciência e Técnica Fiscal, n.º 423, janeiro-junho, 2009, pp. 253-294,ALEXANDRA MARTINS “As operações relativas a participações sociais e o direito à dedução do IVA. A jurisprudência SKF”, Estudos em memória do Prof. Doutor J. L. Saldanha Sanches, Coimbra Editora, Volume IV, 2011 e EMANUEL VIDAL LIMA, “Dois casos sobre o direito à dedução em IVA”, livro de homenagem à Dra. Teresa Graça Lemos, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, junho de 2007, pp. 113 a 122.

[6] Acórdão de 6 de abril de 1995, Proc. C-4/94, Colect., p. I-983, n.ºs 18 e 19. Estava em causa o alcance da expressão “ (…) utilizados para (…)”, empregue no artigo a que atualmente corresponde o artigo 168.º da DIVA.

[7] Conforme referiu o TJUE no Caso Midland Bank, Acórdão de 8 de junho de 2000, Proc. C-98/98, Colect., p. I- 4177, n.º 25.

[8] Conclusões do Advogado-geral António Saggio apresentadas em 30 de setembro de 1999 no Caso Midland Bank, cit., n.º 29.

[9] Cfr. JEAN-PIERRE MAUBLANC, « Déduction de la TVA d´amont : l´exigence d´un lien direct et immédiat est-elle justifiée ? », Revue du Marché commun et de l´Union européenne, n.º 494, 2005.

[10] Sobre o exercício do direito à dedução e a jurisprudência do TJUE, veja-se CLOTILDE CELORICO PALMA, “IVA – Algumas notas sobre os limites das exclusões do direito à dedução, op. cit.

[11] Acórdão de 6 de julho de 1995, Caso BP Soupergaz, Proc.C-62/93, Colect., p. I-188, n.º 16.

[12] Acórdão de 21 de setembro de 1988, Proc. 50/87, Colect., p. 4797, n.º15.

[13] Cfr. o n.º 59 do Acórdão de 8 de janeiro de 2002, Caso  Metropol, Proc.C-409/99, Colect., p. I-00081.

[14] Veja-se, a este propósito, nomeadamente, o Acórdão de 14 de fevereiro de 1985, Caso Rompelman, Recueil 1985, p.00655. Nos casos Lennartz (Acórdão de 11 de julho de 1991, Proc. C-97/90, Colect, p. I-03795), Inzo (Acórdão de 29 de fevereiro de 1996, Proc. C-110/94, Colect., p. I-857), e Gabalfrisa (Acórdão de 21 de março de 2000, Proc.s apensos C-110/98 a C-147/98, Colect., p. I-1577), suscitaram-se questões análogas às do Caso Rompelman, designadamente o âmbito de aplicação do conceito de atividade económica e a inclusão dos atos preparatórios neste conceito, tendo o Tribunal confirmado esta jurisprudência. Mais recentemente veja-se, nomeadamente, o Acórdão de 22 de março de 2011, Caso Klub Ood, Proc. C-153/11, ainda não publicado na Coletânea.

[15] Veja-se no Proc. C503 2002012, disponível no site da AT em Informações fiscais, Informações vin­culativas, IVA.

[16] Veja-se a este propósito, igualmente, o Acórdão de 15 de janeiro de 1989, Caso Ghent Coal Terminal, Proc. C-37/95, Colect., p.I-1.

[17] V., neste sentido, Casos, já referidos, Lennartz, n.° 15, e Eon Aset, n.° 57.

[18] V., neste sentido, Acórdão de 8 de março de 2001, Caso Bakcsi, Proc. C‑415/98, Colect., p. I‑1831, n.° 29. A questão de saber se o sujeito passivo agiu nessa qualidade é uma questão de facto que deve ser apreciada tendo em conta todos os dados da situação em causa.

[19] Acórdão de 8 de março de 1988, Caso Intiem, Proc. 165/86, Colect., p. 1471, n.º 14.

[20] V., neste sentido, Caso Rompelman, já referido, n.° 22, e Acórdão de 23 de abril de 2009, Caso Puffer, Proc., C‑460/07, Colect., p. I‑3251, n.° 47.

[21] V., Acórdãos de 1 de dezembro de 1998, Caso Ecotrade, Proc. C-200/97, Colect., p. I.-7907, n.ºs 63 e 64, de 21 de outubro de 21010, Caso Nidera, Proc. C-385/09, Colect., p. I-0385, n.° 42, de 22 de dezembro de 2010, Caso Dankowski, C-438/09, Colect., p. I-14009, n.° 35, e Acórdão de 12 de julho de 2012, Caso SEM, Proc. C-284/11, ainda não publicado na Coletânea, n.º 63).

[22] Conclusões do Advogado-geral Paolo Mengozzi, apresentadas em 22 de dezembro de 2008 no Proc. C-515/07, tendo por base um reenvio prejudicial efetuado pelo Hoje Raad der Nederlanden (Países Baixos), onde se solicita que o TJUE se pronuncie sobre a questão de saber se o direito de deduzir o IVA pago a montante se aplica não apenas à aquisição de bens de investimento mas pode abranger a aquisição de outros bens e serviços utilizados quer para operações profissionais efetuadas a jusante quer para outros fins, nomeadamente, atividades de natureza não económica.

[23] Sobre este tema do requisito da relação direta e imediata à dedução do IVA vide Jean-Pierre Maublanc, Déduction de la TVA d´amont : l´exigence d´un lien direct et immédiat est-elle justifiée ?, op. cit., pp. 611 e ss.

[24]Acórdão de 29 de outubro de 2009, Caso SKF, Proc. C-29/08, Colect. p. I-10413, n.° 58 e jurisprudência citada. A SKF, sociedade anónima, é a sociedade‑mãe de um grupo industrial com atividades em vários países. Participa ativamente na gestão das suas filiais e presta‑lhes serviços remunerados, tais como a gestão, a administração e a política comercial. A SKF é sujeito passivo de IVA relativamente a estas prestações faturadas às filiais, tendo procedido, no âmbito de uma estratégia de reorganização do grupo, à alienação da totalidade das participações numa filial e a participação remanescente numa associada (26,5%), anteriormente detida em 100%, conseguindo por via de tal facto libertar meios financeiros que visaram financiar as restantes atividade do grupo. Face à informação prévia favorável à dedução do IVA pago a montante sobre serviços adquiridos no âmbito daquela transmissão (redação de contratos, consultadoria jurídica especializada, serviços de avaliação de títulos e de assistência nas negociações).

[25] Acórdão de 27 de setembro de 2001, Proc. C-16/00, Colect., p. I‑6663.

 

[26] Acórdão de 3 de março de 2005, Proc. C-32/03, Colect. p. I-01599, n.º 19. 

[27]Acórdão de 29 de abril de 2004, Proc C-77/01, Colect. p. I-04295.

[28] Apresentadas em 12 de setembro de 2002, n.º 39.

[29] Acórdão de 20 de junho de 1991, Caso Polysar, Proc. C-60/90, Colect., p. I-3111.

[30] O mesmo entendimento já havia sido adoptado pelo TJUE no Acórdão de 20 de junho de 1996, Caso Wellcome Trust, Proc. C-155/94, Proc. C‑155/94, Colect. p. I‑3013, em que estava em causa a compra e venda de ações no quadro da gestão de um “trust”.

[31] Sobre estas conclusões veja-se, nomeadamente, os Acórdãos de 20 de junho de 1991, Caso Polysar, Proc. C-60/90, já cit., de 22 de junho de 1993, Caso Satam/sofitam, Proc. C-333/91, Colect. p. I-3513, de 14 de novembro de 2000, Caso Floridienne e Berginvest, Proc. C-142/99, Colect. p. I-9567, e de 27 de setembro de 2001, Caso Cibo Participations, Proc. C-16/00, já cit..

[32] Acórdão de 22 de junho de 1993, Caso Satam/sofitam, Proc. C-333/91, já cit.

[33] Acórdão de 14 de novembro de 2000, Caso Floridienne e Berginvest, Proc. C-142/99, já cit. A Floridienne era uma sociedade holding que encabeçava um grupo de sociedades no domínio da química, dos plásticos e das indústrias agro-alimentares, e a Berginvest, uma sociedade holding intermédia que dominava o subgrupo dos plásticos, sustentando ambas que intervinham direta ou indiretamente na gestão das suas filiais, nomeadamente fornecendo-lhes serviços administrativos, contabilísticos e informáticos, bem como concedendo-lhes empréstimos de financiamento.

[34] Expressão utilizada pela primeira vez por parte do TJUE no Caso Polysar, que viria a ser delimitada no Caso Floridienne.

[35] Vide, nomeadamente, Acórdãos de 20 de junho de 1991,Caso Polysar, Proc. C‑60/90, já cit., n.° 14, de 14 de novembro de 2000, Caso Floridienne e Berginvest, Proc. C‑142/99, já cti., n.° 18, despacho de 12 de julho de 2001, Caso Welthgrove, Proc. C‑102/00, Colect., p. I‑5679, n.° 15, e Acórdão de 27 de setembro de 2001, Caso Cibo, Proc. C‑16/00, já cit, n.° 20.

[36] A propósito das sociedades holding refere RITA DE LA FERIA, in “A Natureza das Atividades e Direito à Dedução das Holdings em Sede de IVA”, op. cit., p. 189, que se considera que a holding tem uma “interferência direta ou indireta na gestão” das sociedades participadas sempre que se verifiquem as seguintes condições: (a) As atividades não sejam apenas exercidas a título ocasional (Acórdão Floridienne); (b) As atividades não se limitem a gerir os investimentos a exemplo dum investidor privado (Acórdão Floridienne); (c) As atividades sejam efetuadas no âmbito dum objetivo empresarial ou com finalidade comercial (Acórdão Floridienne); (d) pelo menos parte das atividades constituam transações sujeitas a IVA para efeitos do artigo 2.º da Diretiva (Acórdão Welthgrove). Assim, como conclui, sempre que estas condições se verifiquem, uma holding ativa é considerada como tendo efetuado atividades económicas para efeitos do n.º 1 do artigo 9.º da DIVA.

[37] Vide, designadamente, Acórdãos de 20 de junho de 1996, Caso Wellcome Trust, Proc. C‑155/94, já cit., n.° 35, e Caso Harnas & Helm, já cit., n.° 16 e jurisprudência aí mencionada.

[38] Cfr. RUI BASTOS, O direito à dedução do IVA, O caso particular dos inputs de utilização mista, dissertação de mestrado em Fiscalidade apresentada em 30 de julho de 2012, na Escola Superior de Gestão do Instituto Politécnico do Cávado e do Ave, p. 69.

[39] Consistiam em serviços de avaliação de títulos, de assistência nas negociações e de consultoria jurídica especializada para a redação de contratos, portanto inequivocamente associadas à alienação das participações em causa.

[40] No referido caso, o TJUE considerou que aquela sociedade anónima, na qualidade de sociedade‑mãe de um grupo industrial, se envolveu na gestão da filial e da sociedade controlada, fornecendo‑lhe, a título oneroso, diversas prestações de serviços de natureza administrativa, contabilística e comercial, em relação às quais estava sujeita a IVA. Nestes temos, por via da venda das ações detidas na filial e na sociedade controlada, a SKF põe termo à sua participação nestas sociedades.

[41] Este princípio seria, com efeito, ignorado se uma sociedade‑mãe que gere um grupo de sociedades pudesse ser tributada pelas despesas efetuadas no quadro da venda de ações que faz parte da sua atividade económica, ao passo que uma sociedade holding que efetua a mesma operação fora do âmbito de aplicação do IVA beneficiaria do direito à dedução do IVA que onerou as mesmas despesas pelo facto de elas fazerem parte das despesas gerais da sua atividade económica global.

[42] Neste sentido veja-se o n.ºs 36 e 37 do Acórdão de 26 de maio de 2005, Caso Kretztechnik, Proc. C‑465/03, Colect. p. I-4357, e jurisprudência aí mencionada.

[43] No caso, prestações relacionadas com a admissão a Bolsa na sequência de um aumento do capital através da emissão de ações ao portador.

[44] Cfr. Acórdão de 27 de setembro de 2001, Caso Cibo, Proc. C-16/00, já cit., n.º 35.

[45] Cfr. RUI BASTOS, O direito à dedução do IVA, O caso particular dos inputs de utilização mista, op. cit., pp. 79 e 80.

[46] Acórdão de 22 de fevereiro de 2001, Proc. C-408/98, Colect., p. I-1361.

[47]  Proc. C-496/11, Caso Portugal Telecom SGPS SA contra Fazenda Pública, publicado na Coletânea geral.