Decisão Arbitral
Partes
Requerente: A…, Unipessoal, Lda., NIPC PT…, com sede na Rua…, nº…, …, …-… …
Requerida: Autoridade Tributária e Aduaneira (AT)
I. RELATÓRIO
a) Em 28-03-2016, a Requerente entregou no CAAD um pedido solicitando, ao abrigo do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), a constituição de tribunal arbitral singular (TAS).
O PEDIDO
b) A Requerente pede a revogação da decisão que lhe indeferiu um recurso hierárquico que deduziu face à decisão que lhe negou provimento de uma reclamação graciosa, procedimentos que dirigiu contra a liquidação de IRC de 29.10.2014, n.º 2014 … e da liquidação de juros n.º 2014…, no montante global de 7 043,44 euros, imposto e dos juros compensatórios que reputa indevidamente liquidados quanto ao período de tributação de 2011-01-01 a 2011-12-31.
c) Liquidação cuja anulação também peticiona e que resultou do cálculo do IRC, não à taxa reduzida prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 43.º do EBF (taxa ad valorem de 15%) mas sim à taxa geral, uma vez que, como resultado de uma acção inspectiva, a AT notificou-a de uma liquidação adicional.
A CAUSA DE PEDIR
d) A Requerente invoca que preenche todos os requisitos previstos nos n.ºs 1 e 2 do artigo 43.º do EBF em vigor à data dos factos (revogado pela Lei n.º 64-B/2011, de 30.12) e do n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 55/2008, de 26.03.
e) E porque tem a sua sede e direcção efectiva na zona geográfica de … e exerce a sua actividade nessa zona geográfica (uma zona considerada elegível para este benefício nos termos da Portaria n.º 1117/2009, de 30.09), entende que para usufruir do benefício fiscal, não é necessário ter contabilizadas remunerações de trabalho dependente, não lhe sendo aplicável o n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 55/2008, de 26.03.
f) Propugnando no sentido de que o critério aqui definido pelo legislador, de 75% da massa salarial “… unicamente define um critério que permitirá considerar automaticamente preenchido o critério de exercício da actividade principal na região, criando uma presunção inilidível – não exclui outras situações que possam cumprir o mesmo critério”.
DO TRIBUNAL ARBITRAL SINGULAR (TAS)
g) O pedido de constituição do TAS foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT no dia 11-04-2016.
h) Pelo Conselho Deontológico do CAAD foi designado árbitro o signatário desta decisão, tendo sido disso notificadas as partes em 25-05-2016. As partes não manifestaram vontade de recusar a designação, nos termos do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
i) O Tribunal Arbitral Singular (TAS) encontra-se, desde 13-06-2016, regularmente constituído para apreciar e decidir o objecto deste dissídio (artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 30.º, n.º 1, do RJAT).
j) Todos estes actos se encontram documentados na comunicação de constituição do Tribunal Arbitral Singular com data de 13-06-2016 que aqui se dá por reproduzida.
k) Em 14-06-2016 foi a AT notificada nos termos e para os efeitos do artigo 17.º-1 do RJAT. Respondeu em 21.07.2016. Juntou ainda o PA composto por 1 ficheiro informatizado com 186 folhas com 186 laudas escritas e numeradas.
l) Não se realizou a reunião de partes do artigo 18.º do RJAT nem as partes produziram alegações escritas uma vez que prescindiram destas formalidades processuais.
PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
m) Legitimidade, capacidade e representação – As partes gozam de personalidade jurídica, capacidade judiciária, são partes legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
n) Princípio do contraditório - Foi notificada a AT nos termos do inciso k) deste Relatório. Todas as peças processuais e todos os documentos juntos ao processo foram disponibilizados à respectiva contraparte no Sistema de Gestão Processual do CAAD. Da sua junção foram sempre notificadas ambas as partes.
o) Excepções dilatórias - O procedimento arbitral não padece de nulidades e o pedido de pronúncia arbitral é tempestivo uma vez que foi apresentado no prazo prescrito na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do RJAT, como resulta do facto, não contestado, da decisão de indeferimento do recurso hierárquico ter sido notificada pelo ofício datado de 29.12.2015 e o presente pedido de pronúncia ter dado entrada no CAAD em 28-03-2016.
SÍNTESE DA POSIÇÃO DA REQUERENTE
p) A Requerente discorda da leitura que a AT adoptou em sede de relatório de inspecção e nos fundamentos para o indeferimento do recurso hierárquico, do n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 55/2008, de 26.03 (que regulamenta as normas isentivas do artigo 43.º do EBF na redacção em vigor em 2011), no sentido de considerar como requisito necessário para usufruir do benefício fiscal do artigo 43.º - n.º 1 alíneas a) do EBF a “obrigação de exercer a sua actividade principal nas áreas beneficiárias, mediante concentração de mais de 75% da massa salarial”.
q) Propugna no sentido de que, sendo uma sociedade unipessoal, criou pelo menos um posto de trabalho (não dependente), o do seu gerente único, o que reputa de pouca relevância, propugnando no sentido de que a “questão legal da massa salarial não é uma exigência, mas sim o estabelecimento de uma presunção de exercício da actividade a título principal, não se excluindo outros factos subsumíveis ao mesmo enquadramento legal”.
r) Entende que preenche especialmente o requisito – colocado em causa pela AT na decisão que recaiu sobre o recurso hierárquico – do exercício da actividade principal numa região elegível para a aplicação do benefício da alínea a) do n.º 1 do artigo 43.º do EBF na redacção então em vigor, porquanto: 1 – tem a sua sede em…; 2 – não dispõe de instalações em mais nenhum local do território nacional; 3 – tem por objecto “a construção e engenharia civil, consultoria, arquitectura, compra e venda de bens imobiliários e revenda de bens adquiridos para esse fim”; 4 – exerce a sua actividade através do seu único gerente e permitiu a sua fixação em…; 5 – a contabilidade é realizada em …, por TOC localizado em…; 6 – pagou a empresa derrama para o Município de…; 7 – prestou serviços e perícias e recebeu honorários de processos de tribunais de…; 8 – prestou serviços de consultoria para Angola, Moçambique e Guiné Bissau, serviços que lhe advieram do B… (…); 9 – faz consumos quanto à viatura, equipamentos e instalações e outras despesas no concelho de Viseu.
s) Invoca em favor do seu ponto de vista, quanto à inaplicação do requisito da “massa salarial”, a informação …/2011 emitida no processo n.º 2361/2011 da Direcção de Serviços do IRC da AT.
SÍNTESE DA POSIÇÃO DA REQUERIDA
t) Dissentindo do ponto de vista da Requerente, a Requerida propugna por outra leitura da lei, desde logo quanto ao n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 55/2008, de 26 de Março, expressando que: “… não existe naquele preceito qualquer presunção, mas sim condições sine qua non de acesso ao benefício fiscal em questão”. “Uma dessas condições é que o sujeito passivo que pretenda ser beneficiário deverá situar a sua actividade principal nas áreas beneficiárias”. “Por se tratar de um conceito subjectivo entendeu o legislador concretizar o que considerava actividade principal situada nas zonas beneficiárias no n.º 2 daquele artigo fazendo-o do seguinte modo: “Considera-se que a actividade principal é situada nas zonas beneficiárias quando os sujeitos tenham a sua sede ou direcção efectiva nessas áreas e nelas se concentre mais de 75% da respectiva massa salarial””.
u) Reconhece a Requerida que a Requerente “… tem a sua actividade principal na Rua…, n.º…, …, em … …”, mas acrescenta: “… no período de tributação aqui em causa, não apresentou qualquer massa salarial” para depois concluir: “ … atendendo ao carácter específico da principal actividade desenvolvida, isto é construção de edifícios, considera-se difícil imaginar uma empresa desta natureza a exercer a sua actividade sem apresentar qualquer verba a título de “Gastos com pessoal” ou “Subcontratados””.
v) Refere ainda: “… por forma a permitir uma análise mais profunda solicitou-se ao Requerente vários esclarecimentos, a saber: a) Indicação da (s) venda (s) a que corresponde (m) os €150.000,00 do Quadro …-A, Campo A…, nomeadamente a que obra (s) diz (em) respeito e a sua situação geográfica; b) Relativamente à prestação de serviços (Quadro …-A, Campo A…) indicação dos serviços que foram prestados, onde e por quem, no mercado interno no montante de € 2.448,00 e no mercado extracomunitário no montante de € 34.500,00”
w) Da resposta do Requerente retira a AT que:
ü o valor das vendas corresponde à venda de um imóvel na freguesia de…, na … (prédio urbano – Lote…, inscrito sob o artigo…), “que é como quem diz numa zona não abrangida pela Portaria n.º 117/2009, de 30 de Setembro, rectificada pela Declaração de Rectificação n.º 79/2009, de 27 de Outubro”;
ü Os serviços prestados no mercado interno, no montante de € 2.448,00, respeitam a peritagens efectuadas pelo sócio-gerente, Eng.º C…, no âmbito de processos judiciais em curso no Tribunal judicial de… .
ü Relativamente ao montante de serviços prestados no mercado externo, no montante de € 34.500,00, respeita a projectos realizados para o D…, E…e F... .
x) Dos factos expostos na alínea anterior conclui a AT o seguinte:
v “…podemos concluir que do total de proveitos, no montante de € 186.948,00, cerca de 80% correspondente à venda de um imóvel situado numa zona não beneficiária”;
v “E cerca de 18,5 % diz respeito a projectos que, não obstante terem tido a intermediação do B…, dizem respeito a edifícios situados fora do território nacional e que foram facturados directamente ao E…, G…, à F… e ao D… .
v “ … os serviços prestados pela Requerente na zona beneficiária em causa e que foram demonstrados durante o procedimento inspectivo, correspondem a pouco mais de 1%”, e “mesmo com as novas facturas juntas ao processo com a PI, continuam a ser uma ínfima parte dos serviços no global”.
y) Defende que o benefício do artigo 43.º - 1- a) do EBF está subordinado ao regime do “artigo 2.º n.º 2 do Decreto-Lei n.º 55/2008 que … considera que a actividade principal é situada nas zonas beneficiárias quando os sujeitos tenham a sua sede ou direcção efectiva nessas áreas e nelas se concentre mais de 75% da respectiva massa salarial.
z) Propugna no sentido de que as empresas só poderão usufruir de tal benefício se exercerem a sua actividade principal numa das áreas beneficiárias. E só se considera que exercem a sua actividade principal numa dessas áreas se: a) Aí tiverem a sua sede ou direcção efectiva; e b) Aí fixarem mais de 75% da respectiva massa salarial.
aa) E que a definição de “massa salarial” é a facultada pelo “artigo 14.º n.º 6 da Lei n.º 2/2007 … : «Entende-se por massa salarial o valor das despesas efectuadas com o pessoal e escrituradas no exercício a título de remunerações, ordenados ou salários.”
bb) Invoca em favor da sua leitura da lei uma sentença do TAF de Viseu no processo …/12… BEVIS.
cc) Propugna pela improcedência do pedido, com absolvição dos pedidos.
II - QUESTÕES QUE AO TRIBUNAL CUMPRE SOLUCIONAR
Apreciar-se-á se as liquidações em causa padecem de alguma ilegalidade que obste à sua manutenção na ordem jurídica.
O que a AT considera, segundo o relatório de inspecção tributária e a fundamentação da decisão de indeferimento do recurso hierárquico, é o seguinte:
-
A Requerente não cumpre o objectivo de criar emprego e fixar pessoas nas áreas beneficiárias, uma vez que não tem trabalhadores (dependentes);
-
E porque não tem trabalhadores dependentes não “tem massa salarial” e consequentemente não cumpre o pressuposto exigido pela alínea d) do n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 55/2008, de 26.03, ou seja, não situa a sua actividade principal nas áreas beneficiárias, uma vez que para tal deveria concentrar nessas áreas mais de 75% da massa salarial, como o exige o n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 55/2008, de 26.03.
Haverá ainda que analisar, quanto ao caso concreto e ao exercício de 2011 da Requerente, a relevância do que foi apurado em sede de procedimento de recurso hierárquico, que segundo a AT:
v “… podemos concluir que do total de proveitos, no montante de € 186.948,00, cerca de 80% correspondente à venda de um imóvel situado numa zona não beneficiária”;
v “e cerca de 18,5 % diz respeito a projectos que, não obstante terem tido a intermediação do B…, dizem respeito a edifícios situados fora do território nacional e que foram facturados directamente ao E…, G…, à F… e ao D… .
v “ …os serviços prestados pela Requerente na zona beneficiária em causa e que foram demonstrados durante o procedimento inspectivo, correspondem a pouco mais de 1%”, e “mesmo com as novas facturas juntas ao processo com a PI, continuam a ser uma ínfima parte dos serviços no global”.
A principal questão que se coloca no presente processo tem a ver com o apuramento sobre se a Requerente pode ou não beneficiar do incentivo fiscal consagrado na alínea a) do n.º 1 do artigo 43.º do EBF, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 108/2008, de 26 de Junho.
O cerne da questão, para além dos aspectos acima indicados quando à composição dos proveitos obtidos em 2011 pela Requerente, residirá em saber se o regime da parte final da norma contida no n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 55/2008, de 26.03, visa apenas esclarecer o conteúdo da norma da alínea d) do n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 55/2008, de 26.03 que diz o seguinte: “situarem a sua actividade nas áreas beneficiárias” (que reproduz o que já se refere nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 43.º do EBF: “ … entidades cuja actividade principal se situe nas áreas beneficiárias”), ou se constitui mais um elemento constitutivo do benefício fiscal estabelecido no artigo 43.º do EBF dado o teor da redacção da norma: “Considera-se que a actividade principal é situada nas zonas beneficiárias quando os sujeitos tenham a sua sede ou direcção efectiva nessas áreas e nelas se concentre mais de 75% da respectiva massa salarial.»
Simultaneamente poderá fazer sentido analisar se, neste caso, será de adoptar o conceito de “massa salarial” como abrangendo apenas as remunerações do trabalho dependente ou se deve ter-se em conta outros tipos de relações de emprego, como o caso, em que existe claramente trabalho não dependente, pelo menos para o gerente da Requerente, uma vez que é uma sociedade unipessoal.
III. MATÉRIA DE FACTO PROVADA E NÃO PROVADA FUNDAMENTAÇÃO
Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de seleccionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (conforme artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).
Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de direito (conforme anterior artigo 511.º, n.º 1, do CPC, correspondente ao actual artigo 596.º, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).
Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, a prova documental e o PA juntos aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos abaixo elencados, de resto não contestados pelas partes, indicando-se os documentos respectivos (prova por documentos), como fundamentação.
Factos provados
1) A Requerente procedeu ao registo da sua constituição, na Conservatória do Registo Comercial de…, em 26-10-2000, tendo como sede na Rua…, n.º…, …- …e tem como objecto: “construção e engenharia civil, consultoria, arquitectura, compra e venda de bens imobiliários e revenda dos adquiridos para esse fim” – páginas 137 a 139 e 147 do PA – relatório de inspecção – e artigo 16º da resposta da AT.
2) A Requerente exerce a sua actividade principal na Rua…, n.º…, …, em…, iniciou a sua actividade em 12-09-2000 constando como actividade principal “construção de edifícios residenciais e não residenciais”, enquadrando-se no código … do CAE – artigo 16º da resposta da AT e página 139 do PA – relatório de inspecção.
3) A Requerente dispõe de contabilidade organizada, tem a sua sede e direcção efectiva na zona geográfica de … onde desenvolve a sua actividade principal, zona constante da Portaria n.º 1117/2009, de 30 de Setembro, considerada área territorial beneficiária dos incentivos às regiões com problemas de interioridade conforme o disposto nos artigos 6.º e 7.º do Decreto-Lei n.º 55/2008, de 26 de Março – exórdio do pedido de pronúncia, páginas 139 a 141 e 147 do PA – relatório de inspecção – e artigo 16º da resposta da AT.
4) No cumprimento da Ordem de Serviço Interna n.º OI2014…, quanto ao ano de 2011, foi desencadeado um procedimento de inspecção, tendente ao controlo de benefícios fiscais, que culminou com o envio à Requerente do relatório de inspecção, em 21.10.2014, indicando as correcções à colecta do IRC a pagar no valor de 6 959,28 euros, concluindo que o sujeito passivo “usufruiu de redução de taxa – de 15% - sem que reúna as condições” – nºs 1 e 2 do pedido de pronúncia, artigos 2º e 3º da resposta da AT e páginas 137 e 138 do PA – relatório de inspecção.
5) O fundamento da correcção á colecta de IRC é o seguinte:
- página 147 do PA – Relatório de Inspecção.
6) Em data não apurada foi a Requerente notificada da liquidação de IRC de 29.10.2014, n.º 2014 … e da liquidação de juros n.º 2014…, no montante global de 7 043,44 euros, com data limite de pagamento até 29-12-2014 – nºs 2 e 5 do pedido de pronúncia e conforme demonstrações de liquidação de IRC, de juros e de acerto de contas juntas com o pedido de pronúncia.
7) Inconformada a Requerente deduziu reclamação graciosa que lhe foi indeferida e desta decisão encetou procedimento de recurso hierárquico que também lhe foi indeferido por despacho da Directora de Serviços do IRC de 27.11.2015, exarado sobre a informação …/2015 e lhe foi notificada por ofício datado de 29.12.2015 – nºs 7 e 8 do pedido de pronúncia e folhas 109 do PA.
8) Da fundamentação da decisão de indeferimento do recurso hierárquico consta, além do referido em 5), o seguinte quanto ao exercício de 2011 da Requerente: 1 - o valor das vendas corresponde à venda de um imóvel na freguesia de…, na … (prédio urbano – Lote…, inscrito sob o artigo…), “que é como quem diz numa zona não abrangida pela Portaria n.º 117/2009, de 30 de Setembro, rectificada pela Declaração de Rectificação n.º 79/2009, de 27 de Outubro”; 2 - os serviços prestados no mercado interno, no montante de € 2.448,00, respeitam a peritagens efectuadas pelo sócio-gerente, Eng.º C…, no âmbito de processos judiciais em curso no Tribunal judicial de… . 3 - relativamente ao montante de serviços prestados no mercado externo, no montante de € 34.500,00, respeita a projectos realizados para o D…, E… e F… . – artigos 20º a 24 da resposta da AT e página 106 do PA.
9) A Requerente, por referência ao ano de 2011, não dispõe de instalações em mais nenhum local do território nacional; exerce a sua actividade através do seu único gerente e permitiu a sua fixação em…; a sua contabilidade é realizada em…, por TOC localizado em…; pagou a derrama de IRC para o Município de…; prestou diversos serviços e perícias e recebeu honorários de processos de tribunais de…; prestou serviços de consultoria para Angola, Moçambique e Guiné Bissau, serviços que lhe advieram do B… (…) e faz consumos quanto à viatura, equipamentos de escritório e instalações, além de outras despesas no concelho de Viseu – alíneas do nº 37 do pedido de pronúncia, documentos 1, 3 e 5 juntos com o pedido de pronúncia e artigo 30º da resposta da AT.
10) A Requerente não efectuou o pagamento do IRC e juros liquidados – nº 3 do pedido de pronúncia.
11) A Requerente é uma sociedade por quotas unipessoal, não tem trabalhadores dependentes e tem apenas um gerente não remunerado que é o seu sócio único – nº 26 do pedido de pronúncia, relatório de inspecção – folhas 131 a 150 do PA.
12) Em 28-03-2016, a Requerente entregou no CAAD o presente pedido de pronúncia – registo de entrada no SGP do pedido de pronúncia.
Factos não provados
Não existe outra factualidade alegada que não tenha sido considerada provada e que seja relevante para a composição da lide processual.
IV. APRECIAÇÃO DAS QUESTÕES QUE AO TRIBUNAL ARBITRAL SINGULAR (TAS) CUMPRE SOLUCIONAR
Quanto à questão de fundo, escreve-se no artigo 43.º do EBF, em vigor à data dos factos, sob a epígrafe “benefícios fiscais relativos à interioridade” (assinalamos a “bold” as disposições que estão imediatamente em causa):
1 - Às empresas que exerçam, directamente e a título principal, uma actividade económica de natureza agrícola, comercial, industrial ou de prestação de serviços nas áreas do interior, adiante designadas «áreas beneficiárias», são concedidos os benefícios fiscais seguintes:
a) É reduzida a 15 % a taxa de IRC, prevista no n.º 1 do artigo 80.º do respectivo Código, para as entidades cuja actividade principal se situe nas áreas beneficiárias;
b) No caso de instalação de novas entidades, cuja actividade principal se situe nas áreas beneficiárias, a taxa referida no número anterior é reduzida a 10 % durante os primeiros cinco exercícios de actividade;
c) As reintegrações e amortizações relativas a despesas de investimentos até (euro) 500 000, com exclusão das respeitantes à aquisição de terrenos e de veículos ligeiros de passageiros, dos sujeitos passivos de IRC que exerçam a sua actividade principal nas áreas beneficiárias podem ser deduzidas, para efeitos da determinação do lucro tributável, com a majoração de 30 %;
d) Os encargos sociais obrigatórios suportados pela entidade empregadora relativos à criação líquida de postos de trabalho, por tempo indeterminado, nas áreas beneficiárias são deduzidos, para efeitos da determinação do lucro tributável, com uma majoração de 50 %, uma única vez por trabalhador admitido nessa entidade ou noutra entidade com a qual existam relações especiais, nos termos do artigo 58.º do Código do IRC;
e) Os prejuízos fiscais apurados em determinado exercício nos termos do Código do IRC são deduzidos aos lucros tributáveis, havendo-os, de um ou mais dos sete exercícios posteriores.
2 - São condições para usufruir dos benefícios fiscais previstos no número anterior:
a) A determinação do lucro tributável ser efectuada com recurso a métodos directos de avaliação;
b) Terem situação tributária regularizada;
c) Não terem salários em atraso;
d) Não resultarem de cisão efectuada nos últimos dois anos anteriores à usufruição dos benefícios.
3 - Ficam isentas do pagamento de imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis as aquisições seguintes:
a) Por jovens, com idade compreendida entre os 18 e os 35 anos, de prédio ou fracção autónoma de prédio urbano situado nas áreas beneficiárias, destinado exclusivamente a primeira habitação própria e permanente, desde que o valor sobre o qual incidiria o imposto não ultrapasse os valores máximos de habitação a custos controlados, acrescidos de 50 %;
b) De prédios ou fracções autónomas de prédios urbanos, desde que situados nas áreas beneficiárias e afectos duradouramente à actividade das empresas.
4 - As isenções previstas no número anterior só se verificam se as aquisições forem devidamente participadas ao serviço de finanças da área onde estiverem situados os imóveis a adquirir, mediante declaração de que conste não ter o declarante aproveitado anteriormente de idêntico benefício.
5 - As isenções previstas no n.º 3 ficam dependentes de autorização do órgão deliberativo do respectivo município.
6 - Para efeitos do presente artigo, as áreas beneficiárias são delimitadas de acordo com critérios que atendam, especialmente, à baixa densidade populacional, ao índice de compensação ou carência fiscal e à desigualdade de oportunidades sociais, económicas e culturais.
7 - A definição dos critérios e a delimitação das áreas territoriais beneficiárias, nos termos do número anterior, bem como todas as normas regulamentares necessárias à boa execução do presente artigo, são estabelecidas por portaria do Ministro das Finanças.
8 - Os benefícios fiscais previstos no presente artigo não são cumulativos com outros benefícios de idêntica natureza, não prejudicando a opção por outro mais favorável”.
Por sua vez o Decreto-Lei n.º 55/2008, de 26.03 tem a seguinte redacção (assinalando-se a parte que aqui tem interesse, sendo que onde se refere “artigo 39.º-B do EBF” deve entender-se “artigo 43.º do EBF”):
Com o aditamento do artigo 39.º-B ao Estatuto dos Benefícios Fiscais pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, alterado pela Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro, foram renovadas diversas medidas de incentivo à recuperação acelerada das regiões portuguesas que sofrem de problemas de interioridade, tendo sido substituído o regime constante da Lei n.º 171/99, de 18 de Setembro, na redacção introduzida pela Lei n.º 55-B/2004, de 30 de Dezembro.
Encontram-se, pois, reunidas as condições para o Governo proceder à regulamentação das normas necessárias à boa execução do artigo 39.º-B do Estatuto dos Benefícios Fiscais.
Nestes termos, disciplinam-se neste decreto-lei as condições de acesso das entidades beneficiárias, as entidades responsáveis pela concessão dos incentivos, as obrigações a que ficam sujeitas as entidades beneficiárias, bem como as consequências em caso de incumprimento.
Foi ouvida a Associação Nacional de Municípios Portugueses.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
CAPÍTULO I
Objecto e condições de acesso
Artigo 1.º
Objecto
O presente decreto-lei visa estabelecer as normas de regulamentação necessárias à boa execução das medidas de incentivo à recuperação acelerada das regiões portuguesas que sofrem de problemas de interioridade, ao abrigo do n.º 7 do artigo 39.º-B do Estatuto dos Benefícios Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 215/89, de 1 de Julho.
Artigo 2.º
Condições de acesso das entidades beneficiárias
1 - Sem prejuízo do previsto no artigo 39.º-B do Estatuto dos Benefícios Fiscais, as entidades beneficiárias devem reunir as seguintes condições de acesso:
a) Encontrarem-se legalmente constituídas e cumprirem as condições legais necessárias ao exercício da sua actividade;
b) Encontrarem-se em situação regularizada perante a administração fiscal, a segurança social e o respectivo município;
c) Disporem de contabilidade organizada, de acordo com o Plano Oficial de Contabilidade;
d) Situarem a sua actividade principal nas áreas beneficiárias;
e) Comprometerem-se, nos casos dos incentivos previstos na alínea c) do n.º 1 e na alínea b) do n.º 3, ambas do artigo 39.º-B do Estatuto dos Benefícios Fiscais, a manter afecto à respectiva actividade o investimento realizado, bem como a manter a sua localização geográfica, durante um período mínimo de cinco anos a contar da data da realização integral do investimento;
f) Comprometerem-se, no caso dos incentivos previstos na alínea d) do n.º 1 do artigo 39.º-B do Estatuto dos Benefícios Fiscais, a manter os novos postos de trabalho por um período mínimo de cinco anos a contar da data da sua criação;
g) Informarem a entidade responsável a que se refere o artigo 3.º do presente decreto-lei da atribuição de qualquer outro incentivo ou da apresentação de candidatura para o mesmo fim;
h) Obterem previamente, no caso do incentivo previsto nas alíneas a) e b) do n.º 3 do artigo 39.º-B do Estatuto dos Benefícios Fiscais, a autorização a que se refere o n.º 5 do mesmo artigo.
2 - Considera-se que a actividade principal é situada nas zonas beneficiárias quando os sujeitos tenham a sua sede ou direcção efectiva nessas áreas e nelas se concentre mais de 75% da respectiva massa salarial.
Artigo 3.º
Entidades responsáveis
São entidades responsáveis pela atribuição dos incentivos, bem como pela sua fiscalização e controlo:
a) No caso dos incentivos previstos nas alíneas a), b), c) e e) do n.º 1 e no n.º 3 do artigo 39.º-B do Estatuto dos Benefícios Fiscais, a Direcção-Geral dos Impostos;
b) No caso do incentivo previsto na alínea d) do n.º 1 do artigo 39.º-B do Estatuto dos Benefícios Fiscais, a Direcção-Geral dos Impostos, em articulação com o Instituto da Segurança Social, I. P.
Artigo 4.º
Obrigações das entidades beneficiárias
1 - As entidades beneficiárias ficam sujeitas às seguintes obrigações:
a) Manter a situação regularizada perante a administração fiscal, a segurança social e o respectivo município;
b) Facultar todos os elementos relacionados com a concessão do incentivo que lhe sejam solicitados pela entidade responsável referida no artigo 3.º;
c) Comunicar à entidade responsável referida no artigo 3.º qualquer alteração ou ocorrência que ponham em causa os pressupostos subjacentes à atribuição do incentivo;
d) Manter as condições legais necessárias ao exercício da respectiva actividade;
e) Manter a contabilidade organizada de acordo com o Plano Oficial de Contabilidade;
f) Manter na empresa, devidamente organizados, todos os documentos susceptíveis de comprovarem as declarações prestadas aquando da atribuição do incentivo.
2 - No caso dos incentivos previstos na alínea c) do n.º 1 e na alínea b) do n.º 3 do artigo 39.º-B do Estatuto dos Benefícios Fiscais, a entidade beneficiária obriga-se igualmente a não ceder, locar, alienar, afectar a outra actividade ou deslocalizar o investimento, no todo ou em parte, até cinco anos contados da data da realização integral do investimento.
3 - No caso dos incentivos previstos alínea d) do n.º 1 do artigo 39.º-B do Estatuto dos Benefícios Fiscais, a entidade beneficiária obriga-se a manter os postos de trabalho por um período mínimo de cinco anos a contar da data da sua criação.
Artigo 5.º
Incumprimento
1 - O incumprimento de qualquer uma das obrigações definidas no artigo anterior, bem como a prestação de informações falsas, implica a perda dos incentivos usufruídos, ficando as entidades beneficiárias obrigadas, no prazo de 30 dias a contar da respectiva notificação, ao pagamento das importâncias correspondentes às receitas não arrecadadas, acrescidas de eventuais juros compensatórios calculados à taxa legal em vigor acrescida de 3 pontos percentuais.
2 - Relativamente ao incentivo previsto na alínea c) do n.º 1 do artigo 39.º-B do Estatuto dos Benefícios Fiscais, caso se verifique o incumprimento referido no n.º 2 do artigo anterior, a entidade beneficiária deve, na declaração de rendimentos relativa ao exercício em que este ocorra, adicionar o imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas que deixou de ser liquidado, acrescido dos correspondentes juros compensatórios.
CAPÍTULO II
Determinação das áreas territoriais beneficiárias
Artigo 6.º
Áreas territoriais beneficiárias
1 - Para efeitos da aplicação das medidas de incentivo à recuperação acelerada das regiões que sofrem de problemas de interioridade, definidas no artigo 39.º-B do Estatuto dos Benefícios Fiscais, são consideradas como áreas territoriais beneficiárias para os factos verificados em 2007 e 2008, aquelas que são identificadas na Portaria n.º 1467-A/2001, de 31 de Dezembro.
2 - Para os anos subsequentes, compete ao Ministro das Finanças, em conjunto com os membros do Governo responsáveis pelas áreas das autarquias locais e o ordenamento regional, regular por portaria as áreas territoriais beneficiárias, as quais serão identificadas com base nos indicadores definidos no presente decreto-lei, construídos com os últimos dados estatísticos disponibilizados pelo Instituto Nacional de Estatística.
Artigo 7.º
Critérios de determinação das áreas
1 - São beneficiárias as áreas territoriais correspondentes a:
a) Concelhos seleccionados numa perspectiva integrada de desenvolvimento regional equilibrado, tomando, nomeadamente em consideração os seguintes critérios:
i) A densidade populacional;
ii) O nível de produção e de rendimento;
iii) O nível de poder de compra;
b) Freguesias de concelhos não considerados na alínea anterior, cuja população residente se localize maioritariamente nas unidades territoriais Serra e Baixo Guadiana definidas no Plano Regional de Ordenamento do Território do Algarve.
2 - A aplicação dos critérios referidos no número anterior deverá garantir a contiguidade da zona beneficiária no continente de Portugal.
CAPÍTULO III
Disposições finais e transitórias
Artigo 8.º
Disposições comunitárias
1 - As disposições que se revelem necessárias a assegurar, ao longo do período de implementação, o integral respeito pela decisão da Comissão Europeia relativamente aos incentivos em causa, nomeadamente no que se refere à sua aplicação às diferentes actividades económicas, serão objecto de portaria conjunta dos membros do governo da área das Finanças e do Trabalho e Solidariedade Social.
2 - Às medidas de incentivo regulamentadas pelo presente decreto-lei são aplicáveis as regras estabelecidas pela Portaria n.º 170/2002, de 28 de Fevereiro, até à aprovação da portaria referida no número anterior.
Artigo 9.º
Norma revogatória
É revogado o Decreto-Lei n.º 310/2001, de 10 de Dezembro.
Artigo 10.º
Produção de efeitos
O presente decreto-lei produz efeitos desde 1 de Janeiro de 2007.
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Em primeiro lugar, temos que apurar que tipo de benefício fiscal está em causa neste processo, face ao Estatuto dos Benefícios Fiscais.
Estamos a tratar uma matéria que cabe no âmbito do n.º 1 do artigo 8.º da Lei Geral Tributária e não no n.º 2 do artigo 8.º da Lei Geral Tributária.
Nesta linha de pensamento, não parece dever o intérprete raciocinar, depois, como se não estivesse em causa uma “taxa”, ainda que reduzida, uma matéria da competência legislativa da Assembleia da República. Ou seja, haverá que ter em conta que, mesmo que se trate de um benefício fiscal dependente de reconhecimento, este reconhecimento tem sempre “efeito meramente declarativo, salvo quando a lei dispuser em contrário”.
Por outras palavras, é na lei (incluindo as leis de autorização legislativa) que dimana da AR, que deve ser encontrada a amplitude dos benefícios fiscais e não em quaisquer normas emitidas pelo Governo ou pela Administração Tributária que visem apenas regular, entenda-se “controlar”, o normal funcionamento dos benefícios fiscais. Mas tais normativos nunca poderão ter uma tal amplitude que, em termos práticos, obstaculizem ou reduzam de tal forma o benefício, que o colocam em causa. É nesta dimensão que deve ser lido o diploma que regula o benefício fiscal aqui em causa.
Estamos a tratar do benefício fiscal da alínea a) do n.º 1 do artigo 43.º do EBF: Às empresas que exerçam, directamente e a título principal, uma actividade económica de natureza agrícola, comercial, industrial ou de prestação de serviços nas áreas do interior, adiante designadas «áreas beneficiárias», são concedidos os benefícios fiscais seguintes:
a) É reduzida a 15 % a taxa de IRC, prevista no n.º 1 do artigo 80.º do respectivo Código, para as entidades cuja actividade principal se situe nas áreas beneficiárias.
O benefício em causa é uma redução de taxa (n.º 2 do artigo 2.º do EBF). Uma redução de taxa automática, ou seja, que resulta directa e imediatamente da lei (n.º 1 do artigo 5.º do EBF), pela razão de que o contribuinte, sem mais, coloca na sua declaração de rendimentos a taxa “ad valorem” reduzida de IRC de 15% que incide sobre a base tributável e assim obtém uma colecta. E, com esta operação plasmada no seu Modelo 22, calcula a colecta de IRC. É o contribuinte, face à lei, face ao teor do artigo 43.º do EBF (pois só esta norma dimana da AR, por autorização legislativa ao Governo), em respeito pelo princípio da legalidade vertido no n.º 1 do artigo 8.º da LGT, que aplica directamente a norma isentiva.
Naturalmente o contribuinte deve ter em conta todo o demais normativos e orientações que visam controlar, regular, evitar abusos, enfim zelar pelo melhor cumprimento e eficácia da norma isentiva, emitida directamente pela AR ou mediante sua autorização devidamente delimitada.
Sendo o benefício em causa automático, resulta directamente da lei emanada da Assembleia da República.
Dos factos provados resulta:
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A Requerente procedeu ao registo da sua constituição, na Conservatória do Registo Comercial de…, em 26-10-2000, tendo como sede na Rua…, n.º…, … - … e tem como objecto: “construção e engenharia civil, consultoria, arquitectura, compra e venda de bens imobiliários e revenda dos adquiridos para esse fim”.
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A Requerente exerce a sua actividade principal na Rua…, n.º…, …, em …, iniciou-a em 12-09-2000 constando como actividade principal “construção de edifícios residenciais e não residenciais”, enquadrando-se no código … do CAE.
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A Requerente dispõe de contabilidade organizada, tem a sua sede e direcção efectiva na zona geográfica de … onde desenvolve a sua actividade principal, zona constante da Portaria n.º 1117/2009, de 30 de Setembro, considerada área territorial beneficiária dos incentivos às regiões com problemas de interioridade conforme o disposto nos artigos 6.º e 7.º do Decreto-Lei n.º 55/2008, de 26 de Março.
Perante os factos considerados assentes, cumprirá agora apreciar, imediatamente, a fundamentação que está subjacente à decisão de indeferimento do recurso hierárquico e mediatamente a que sustenta a(s) liquidação(ões) ora em causa.
Os fundamentos da(s) liquidação(ões)
Segundo o teor do Relatório de Inspecção é esta a fundamentação que subjaz à(s) liquidação(ões) de IRC aqui em causa:
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A Requerente não cumpre o objectivo de criar emprego e fixar pessoas nas áreas beneficiárias, uma vez que não tem trabalhadores (dependentes);
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E porque não tem trabalhadores dependentes não “tem massa salarial” e consequentemente não cumpre o pressuposto exigido pela alínea d) do n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 55/2008, de 26.03, ou seja, não situa a sua actividade principal nas áreas beneficiárias, uma vez que para tal deveria concentrar nessas áreas mais de 75% da massa salarial, como o exige o n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 55/2008, de 26.03.
Ou seja, o que está em causa, segundo a posição da AT é apenas o não cumprimento, pela Requerente, do requisito do n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 55/2008, de 26 de Março.
Afigura-se-nos que não lhe assiste razão. Com efeito,
Em primeiro lugar cumprirá verificar que quando, nos textos legais-fiscais, se fala em “actividade principal”, a primeira asserção que o intérprete traz à mente é a que resulta do cadastro do contribuinte, ou seja, a destrinça que na declaração de inscrição no registo/início de actividade se faz entre “actividade principal” e “actividade secundária” (veja-se quadro 8 do modelo de declaração disponível no site da AT).
Mas como parece óbvio tal separação terá a ver com meras questões estatísticas, por duas razões: a primeira resulta do próprio texto do modelo fiscal acima indicado onde se retira claramente que o que se pretende é a integração das actividades segundo o CAE; a segunda resulta do facto de, para o IRC, em termos de sujeição a imposto, ser irrelevante se os proveitos resultam de uma actividade principal ou de uma actividade secundária, segundo o registo no cadastro do contribuinte.
Ou seja, do nosso ponto de vista, não será possível considerar que quando se fala nas normas isentivas do artigo 43.º do EBF em “actividade principal”, teremos que considerar que estamos a tratar, apenas, dos proveitos ou custos gerados e motivados pelo desenvolvimento da actividade concretamente indicada na declaração de início de actividade como tal.
É que, no caso, (e certamente em quase todas as sociedades comerciais) o objecto da sua actividade está muito para além do que em termos formais é possível colocar no espaço reservado às actividades prosseguidas, na declaração de início de actividade.
No caso existe uma diferença muito grande entre o objecto da Requerente, a saber:
“construção e engenharia civil, consultoria, arquitectura, compra e venda de bens imobiliários e revenda dos adquiridos para esse fim”,
e o que consta como actividade principal no cadastro do contribuinte, a saber:
“construção de edifícios residenciais e não residenciais”.
A expressão “actividade principal” surge nos textos legislativos, no que a este benefício diz respeito, como tendo o mesmo alcance da expressão “directamente e a título principal”, expressa no n.º 1 do artigo 43.º do EBF.
Parece-nos que o legislador ao expressar “actividade principal”, como relevante para a aplicação do benefício fiscal, quer significar o exercício, pela sociedade, de todas as actividades constantes do seu objecto social, na área geográfica de sede da sociedade e a partir da sede da sociedade, da sua base física de operações. É que, só com esta leitura ampla se afasta uma leitura absurda da lei, que seria, inconsiderar todas as actividades exercidas e comportadas no objecto social que não foi possível expressar, por falta de espaço, na declaração de início de actividade.
Esta leitura da lei parece-nos ser a que melhor serve os objectivos para que o benefício fiscal foi criado, que são, usando as palavras do Relatório de Inspecção: “o combate à desertificação humana através de medidas que promovam o investimento em actividades produtivas, o estímulo à criação de emprego estável e fixação de jovens”
A AT, no Relatório de Inspecção, não coloca em causa, neste processo, o seguinte:
· a Requerente tem a sua sede e direcção efectiva na zona geográfica de…;
· a Requerente desenvolve a sua actividade principal na zona de…;
· a Requerente preenche os requisitos do corpo do n.º 1 e do n.º 2 ambos do artigo 43.º do EBF e das alíneas a) a c) do n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 55/2008, de 26 de Março.
Nem coloca em causa o requisito da alínea d) do n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 55/2008, de 26 de Março, em termos imediatos. Apenas o coloca em causa porque a Requerente não possui “massa salarial”, ou seja, remunerações do trabalho dependente.
Parece-nos notório que a norma do n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 55/2008, de 26 de Março, tal como se encontra redigida, visa apenas esclarecer, para entidades que desenvolvam actividade em mais que uma zona, através de sucursais ou agências, que se considera que a sua actividade principal se situa naquela:
ü Onde tenha a sua sede ou direcção efectiva;
ü E desde que aí concentre mais de 75% da respectiva massa salarial, caso tenha trabalhadores dependentes.
No caso, a AT não coloca em causa o pressuposto da aplicação da norma: que seria colocar em causa, dissentir, do facto da Requerente não exercer a sua actividade principal apenas ou essencialmente na (e a partir da) área considerada elegível para o benefício fiscal (a sua sede).
Por outro lado, não vemos como o benefício do revogado artigo 43.º do EBF, possa estar dependente da criação de emprego, entendendo-se este desiderato apenas integrado com a criação de postos de trabalho dependente (trabalho subordinado).
É discutível que o legislador, ao não colocar na letra da lei esse objectivo de forma clara e objectiva (o requisito de criação apenas de relações de trabalho dependente com vista ao combate à desertificação humana, estímulo à criação de emprego estável e à fixação de jovens) não pretendesse alterar o anterior regime.
Mesmo que a norma do n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 55/2008, de 26 de Março fosse aplicável às entidades que não têm trabalhadores dependentes, sempre a expressão “massa salarial” como integrando apenas as remunerações de trabalho dependente subordinado, é discutível e parece conduzir a uma situação inaceitável e absurda, que será o facto de desconsiderar a criação de postos de trabalho independente.
É consabido que hoje as relações de trabalho dependente são cada vez mais instáveis e a criação de postos de trabalho independente é seguramente uma forma de atingir os mesmos objectivos: combate à desertificação humana, estímulo à criação de emprego estável e à fixação de jovens.
Com efeito, no caso, a Requerente, enquanto sociedade unipessoal, em que a gerência é exercida pelo sócio único, criou, pelo menos, um posto de trabalho independente para este sócio gerente. Fixou-o muito mais à área geográfica, se é que antes já residia na área. A sua actividade empresarial, mesmo exercida através de operações praticadas fisicamente fora da área elegível para o benefício fiscal, irá captar recursos, que de uma forma ou de outra, vão ficar na zona do centro de actividades da empresa e potencialmente aí aplicáveis.
Ao criar, pelo menos, um posto de trabalho independente, para o seu sócio-gerente, cria a Requerente estímulo de emprego tão estável, como se criasse 1 posto de trabalho dependente (face à actual flexibilidade da lei laboral e à instabilidade económica e social), podendo contribuir, com idêntica intensidade, para o combate à desertificação humana do interior.
Seria absurda a leitura da lei que considerasse que esta sociedade se tivesse um trabalhador dependente poderia aceder ao benefício fiscal aqui em causa, mas criando um posto de trabalho independente para o seu único sócio-gerente (essa a finalidade prática de muitas sociedades unipessoais) já não pode aceder.
Teremos, pois, que concluir, sob pena da leitura da lei conduzir a um resultado que não se coaduna com a realidade económica e social do país, que a norma do n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 55/2008, de 26 de Março, não se aplica às entidades que, por natureza (como é o caso da Requerente, uma sociedade unipessoal que é criada, em termos práticos, como instrumento de trabalho do próprio sócio-gerente único), não contratam trabalhadores subordinados e visa apenas determinar o local onde se situa a actividade principal daquelas entidades que pretendem usufruir destes benefícios, porque a exercem em mais que uma área, através de sucursais ou agências, para além da sede que tem que estar na área elegível.
O que na essência interessará apurar é se o requisito do n.º 1 do artigo 43.º do EBF está verdadeiramente cumprido. E no caso, como acima se referiu está plenamente cumprido, o que resulta da posição coincidente das partes.
A Requerente exerce directamente e a título principal várias actividades, a partir da sua sede ou centro de actividades, sediada na área geográfica de…, elegível para a aplicação do benefício fiscal em causa. Quando na alínea a) do n.º 1 do artigo 43.º do EBF se expressa “actividade principal” não se está a alterar ou a restringir o critério que está plasmado no corpo da própria norma isentiva, apenas o reproduz.
Nesta conformidade, procede o pedido de anulação da(s) liquidações.
Fundamento(s) da decisão que indeferiu o recurso hierárquico
À fundamentação acima referida, que serviu de suporte ao Relatório de Inspecção e sequente liquidações de IRC e juros, acrescenta-se em sede de apreciação do Recurso Hierárquico o seguinte quanto aos proveitos da Requerente em 2011:
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O valor das vendas corresponde à venda de um imóvel na freguesia de…, na … (prédio urbano – Lote…, inscrito sob o artigo…), “que é como quem diz numa zona não abrangida pela Portaria n.º 117/2009, de 30 de Setembro, rectificada pela Declaração de Rectificação n.º 79/2009, de 27 de Outubro”.
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Os serviços prestados no mercado interno, no montante de € 2.448,00, respeitam a peritagens efectuadas pelo sócio-gerente, Eng.ºC…, no âmbito de processos judiciais em curso no Tribunal judicial de … .
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Relativamente ao montante de serviços prestados no mercado externo, no montante de € 34.500,00, respeita a projectos realizados para o D…, E… e F… .
E conclui-se:
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“… podemos concluir que do total de proveitos, no montante de € 186.948,00, cerca de 80% correspondente à venda de um imóvel situado numa zona não beneficiária”;
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“e cerca de 18,5 % diz respeito a projectos que, não obstante terem tido a intermediação do B… de Viseu, dizem respeito a edifícios situados fora do território nacional e que foram facturados directamente ao E…, G…, à F… e ao D… .
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“ …os serviços prestados pela Requerente na zona beneficiária em causa e que foram demonstrados durante o procedimento inspectivo, correspondem a pouco mais de 1%”, e “mesmo com as novas facturas juntas ao processo com a PI, continuam a ser uma ínfima parte dos serviços no global”.
Por outro lado a Requerente logrou provar neste processo o seguinte:
“A Requerente, por referência ao ano de 2011, não dispõe de instalações em mais nenhum local do território nacional; exerce a sua actividade através do seu único gerente e permitiu a sua fixação em…; a sua contabilidade é realizada em…, por TOC localizado em…; pagou a derrama de IRC para o Município de…; prestou diversos serviços e perícias e recebeu honorários de processos de tribunais de…; prestou serviços de consultoria para Angola, Moçambique e Guiné Bissau, serviços que lhe advieram do B…(…) e faz consumos quanto à viatura, equipamentos de escritório e instalações, além de outras despesas no concelho de Viseu”.
Afigura-se-nos que também nesta parte não tem razão a Requerida. Se não vejamos:
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Imóvel vendido na … que gerou proveitos de 186 948,00 euros.
Trata-se de uma única operação, um acto. Não se apurou como e em condições entrou na esfera patrimonial da Requerente este bem imóvel. Consta do processo que a Requerente tem dois imóveis, um urbano outro rústico. Não se apurou se foram comprados com o lucro da venda deste imóvel.
Por outro lado a alínea a) do n.º 1 do artigo 43.º do EBF tem a seguinte redacção: “É reduzida a 15 % a taxa de IRC, prevista no n.º 1 do artigo 80.º do respectivo Código, para as entidades cuja actividade principal se situe nas áreas beneficiárias”.
A actividade de uma empresa, por vender um imóvel fora da área da sede ou prestar serviços fora da área da sede, mormente no estrangeiro, não deixa, por esse motivo, de se situar na sua sede.
Há aqui que considerar a regra do n.º 1 do artigo 4.º do Código do IRC, uma vez estamos a tratar de uma norma isentiva ao nível do IRC.
Se fosse a compra de um imóvel fora da área geográfica de … (elegível para o benefício) teria fundamento o raciocínio expendido pela AT. Mas do que se trata é o contrário. É da venda de um imóvel situado fora da área de … para, naturalmente, aplicar o lucro aí obtido na aquisição de bens ou realização de gastos a efectuar essencialmente na área elegível.
Entendemos que o facto do imóvel se situar fora da área elegível será até irrelevante, se quem o vende tem sede na área elegível e exerce aí a sua actividade em termos de ter aí as suas instalações físicas, a sua base operacional, indiciando que é nessa área que vai realizar gastos e efectuar investimentos, com o produto dos lucros obtidos pela empresa.
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Serviços prestados no mercado externo, no montante de € 34.500,00.
Estes proveitos respeitam a projectos realizados para o D…, E… e F… .
No entanto, desde logo se provou que estes serviços foram adjudicados à Requerente através “do B… (…)”, uma entidade com sede na área geográfica do distrito de Viseu.
Valem aqui as considerações que atrás expressámos quanto à leitura que adoptamos da expressão da norma isentiva em causa: “…cuja actividade principal se situe nas áreas beneficiárias”.
Ter uma leitura da norma isentiva no sentido de que estas entidades não podem praticar quaisquer actos que gerem proveitos fora da área geográfica, sob pena de perderem o acesso aos benefícios, parece-nos conduzir a um absurdo, ou seja, a uma leitura da lei, no sentido contrário aos desígnios da sua criação: “combate à desertificação humana através de medidas que promovam o investimento em actividades produtivas, o estímulo à criação de emprego estável e fixação de jovens”.
O objectivo será fixar empresas que gerem lucro, através de negócios feitos em território nacional ou internacional e que o possam trazer para a área os resultados positivos desses negócios, que certamente irão ser reinvestidos, assim potenciando todos os desígnios da atribuição dos benefícios fiscais em causa.
No caso, s.m.o., parece-nos claro que deveria relevar, pelo menos, o facto da entidade contratante ser inclusive sediada na área elegível (B…).
Nestes termos, procede o pedido de pronúncia, uma vez que a decisão que recaiu sobre o recurso hierárquico não está em conformidade com a norma da alínea a) do n.º 1 do artigo 43.º do EBF em vigor à data do acto tributário impugnado, e com o n.º 1 do artigo 4.º do Código do IRC, procedendo, também, pelo mesmo motivo, o pedido de anulação da(s) liquidação(ões).
V. DISPOSITIVO
Nos termos e com os fundamentos acima expostos:
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Julga-se procedente o pedido de anulação da decisão que recaiu sobre o recurso hierárquico (despacho da Senhora Directora de Serviços do IRC de 27.11.2015, exarado sobre a informação …/2015, notificada à Requerente por ofício datado de 29.12.2015);
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Julga-se procedente o pedido de anulação da liquidação de IRC de 29.10.2014, n.º 2014 … e da liquidação de juros n.º 2014…, no montante global de 7 043,44 euros;
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Anulam-se a decisão e as liquidações.
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Valor do processo: de harmonia com o disposto no artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (e alínea a) do n.º 1 do artigo 97.ºA do CPPT), fixa-se ao processo o valor de 7 043,44 euros.
Custas: nos termos do disposto no artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em 612,00 € segundo Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerida.
Notifique.
Lisboa, 30 de Agosto de 2016
Tribunal Arbitral Singular (TAS),
Augusto Vieira
Texto elaborado em computador nos termos do disposto no artigo 131.º, n.º 5, do CPC, aplicável por remissão do artigo 29.º do RJAT.
A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990.