Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 694/2015-T
Data da decisão: 2016-08-01  IMT Selo  
Valor do pedido: € 31.644,75
Tema: IMT e IS – Fundos de Investimento Imobiliário; inconstitucionalidade do art. 236.º, norma transitória no âmbito do Regime Especial Aplicável aos FIIAH e SIIAH, prevista pela Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro; retroatividade da lei fiscal; juros indemnizatórios; caducidade de benefícios fiscais
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Decisão Arbitral

 

 

I - RELATÓRIO

 

1. Em 23 de Novembro de 2015, A….– Sociedade Gestora de Fundos de Investimento, S.A., com sede na …, n.º … –…,…–… …, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa sob o número único de matrícula e de identificação fiscal … (doravante «Requerente»), na qualidade de sociedade gestora do fundo de investimento imobiliário «B… – Fundo de Investimento Imobiliário Fechado para Arrendamento Habitacional» registado junto da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, com o número de identificação fiscal … (adiante «Fundo B…»), requereu a constituição de Tribunal Arbitral, apresentando, nos termos do artigo 2.º número 1, alínea a) do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), Pedido de Pronúncia com vista a apreciação da legalidade de liquidações de IMT (no montante de € 27.764,75) e Imposto do Selo (no montante de € 3.880,00), relativas a aquisição de um prédio inscrito com matriz U-…-…, da freguesia de … e…, com declaração de nulidade ou anulação dos actos tributários e restituição das quantias pagas, assim como reconhecimento do direito a juros indemnizatórios. Junta dois documentos.

2. No pedido de pronúncia arbitral, o Requerente optou por não designar árbitro. Nos termos do n.º 1 do artigo 6.º do RJAT, por decisão do Presidente do Conselho Deontológico, foi designada como árbitro singular, a signatária Maria Manuela do Nascimento Roseiro, que aceitou o encargo no prazo legalmente estipulado.

3. Notificadas as partes e não havendo recusa da referida designação (artigo 11.º, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico), veio o tribunal arbitral a ficar constituído em 1 de Fevereiro de 2016, de acordo com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, sendo, na mesma data, proferido despacho arbitral de notificação da Administração Tributária e Aduaneira (AT ou Requerida) nos termos do artigo 17.º do RJAT.

4. Em 4 de Março de 2015, a Requerida veio apresentar Resposta e requerer dispensa da reunião prevista no artigo 18º do RJAT, e, em 23 de Março, juntou aos autos uma decisão proferida em processo semelhante, a que a Requerente reagiu informando que tal decisão fora objecto de recurso para o tribunal constitucional.

5. Na sequência de anuência da Requerente foi dispensada a realização  da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, marcado prazo de quinze dias para apresentação de alegações, a decorrer sucessivamente, e designado o dia 1 de Agosto de 2016 para comunicação da decisão arbitral.

6. Com as alegações, apresentadas em 31 de Maio e 14 de Junho de 2016, respectivamente, as Partes juntaram decisões arbitrais invocadas como confirmativas das respectivas teses. A Requerente juntou ainda um exemplo de requerimento e um Parecer doutrinário.

 

7. Pedido de pronúncia arbitral 

A Requerente invoca, em síntese (da nossa responsabilidade):

a)      Os artigos 102.º a 104.º da Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro (OE para 2009), aprovaram o regime especial aplicável aos fundos de investimento imobiliário para arrendamento habitacional (FIIAH) e às sociedades de investimento imobiliário para arrendamento habitacional, prevendo no art. 8.º do regime constante do art. 104.º o “regime tributário” dos FIIAH.  

b)      Com base no referido artigo 8.º, após aditamento, pela Lei n.º 83-C/2013, de 31/12 (OE para 2014), dos n.ºs 14 a 16 e de uma disposição transitória, constante do artigo 236.º deste OE, a Requerente solicitou à Autoridade Tributária a liquidação de IMT e de Imposto do Selo (IS), por causa da alienação pelo Fundo B… do prédio U-…-… sito na …, …, …, ..., inscrito na matriz predial urbana da Freguesia de … e … .

c)      Foram emitidas as liquidações n.º…, de IMT, no valor de € 27.764,75, e n.º…, de Imposto do Selo (IS), no valor de € 3.880,00.

d)     O n.º 14 aditado pela Lei n.º 83-A/2013, concretizou de forma inequívoca, e pela primeira vez, o significado da expressão “prédios urbanos destinados ao arrendamento para habitação permanente” como os que são, para efeitos do regime especial, objecto de contrato de arrendamento para habitação permanente no prazo de três anos contados do momento em que passaram a integrar o património do fundo.

e)      As normas aditadas também concretizaram as circunstâncias em que os prédios que integrem o activo dos FIIAH deixam de beneficiar do regime de isenções previsto nos n.ºs 6 e 8 do Regime Tributário dos FIM, prevendo que, nos casos em que os prédios que integrem o património dos FIIAH não tenham sido objecto de arrendamento no prazo de 3 anos a partir do referido ingresso, ou nos casos de alienação de prédios pelo FIIAH, ou liquidação do próprio FIIAH, antes de decorrido o prazo de 3 (três) anos, contado a partir da data da entrada dos prédios relevantes no património do FIIAH, o sujeito passivo solicite à Autoridade Tributária, nos 30 dias subsequentes ao termo do referido prazo a liquidação do imposto respectivo.

f)       Sendo o IMT e o Imposto do Selo impostos de obrigação única, e verificando-se que, à data da entrada em vigor da Lei n.º 83-C/2013, de 31/12, o prédio em causa nos autos estava integrado no património da Requerente e fora adquirido com as isenções previstas nos n.ºs 7 e 8 do Regime Tributário dos FIIAH, reconhecidas previamente a requerimento do Fundo B…, deve entender-se que as isenções ficaram cristalizadas na ordem jurídica.

g)      Porque as isenções não eram, naquela data, condicionadas à verificação ulterior de quaisquer factos ou circunstâncias nem sujeitas a qualquer regime de caducidade, a imposição superveniente relativa a isenções cristalizadas na ordem jurídica enferma de inconstitucionalidade por violação do princípio da não retroactividade da lei fiscal consagrado no art. 103.º da CRP.   

h)      A extensão, prevista no artigo 236.º do OE para 2014, de aplicação do actual Regime dos FIIAH aos prédios que tenham sido adquiridos antes de 1 de Janeiro de 2014 (…) consagra um novo regime de caducidade das isenções previstas nos n.ºs 7, a) e 8 do art. 8.º, violando de forma directa e inequívoca o referido princípio da não retroactividade da lei fiscal.

i)        E porque esse princípio da irretroactividade fiscal reveste o carácter de um direito fundamental, dotado do regime jurídico protector deste direito, o seu desrespeito origina, segundo doutrina citada, a nulidade (ou mesmo a inexistência jurídica) das liquidações, podendo a impugnação ser efectuada a todo o tempo.

j)        Assim, e ainda que se considere estar em causa apenas a anulabilidade, deve ser dado provimento ao Pedido quanto à ilegalidade das liquidações, mandando restituir as importâncias entretanto pagas acrescidas de juros indemnizatórios.  

 

8. A Resposta da Requerida

A Requerida respondeu, em síntese (da nossa responsabilidade):  

a)      Nos termos do n.º 2 do artigo 266.º da CRP, e n.º 1 do artigo 3.º do Código de Procedimento Administrativo (CPA) a administração está obrigada a actuar em conformidade com o princípio da legalidade; os órgãos e agentes administrativos não têm competência para decidir da não aplicação de normas relativamente às quais sejam suscitadas dúvidas de constitucionalidade (neste sentido Pareceres da PGR n.ºs 52/84, 8/85 56, /92, 190/81, 90/83, 16/92, 60/95 e 4/96 e Acórdão do STA de 21-01-2015),

b)      E, ainda que se tivesse verificado violação do artigo 103.º, n.º 3, da CRP, os atos impugnados são apenas passíveis de anulação e não inexistentes ou nulos, conforme doutrina e jurisprudência referidas.

Mas nem se verifica qualquer inconstitucionalidade por violação do artigo 103.º da CRP, porque:

c)      A Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro aprovou um regime especial aplicável aos FIIAH e às SIIAH, constituídos durante os cinco anos subsequentes à entrada em vigor da referida lei e aos imóveis por estes adquiridos no mesmo período.

d)     O regime aprovado pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro, exigia que os beneficiários das isenções em questão, quer em sede de IMT, quer em sede de Imposto do Selo, tivessem que cumprir o pressuposto de que os prédios abrangidos fossem destinados exclusivamente a arrendamento para habitação permanente, pelo que falece razão ao Requerente quando afirma que as isenções em apreço não eram condicionadas por quaisquer factos ou circunstâncias.

e)      A redacção introduzida pela Lei n.º 83-C/2013, de 31/12, veio apenas densificar o critério já exigido, mas com as alterações então introduzidas não se alterou a ratio das isenções consagradas, nem se determinou a extinção imediata do benefício, concedendo-se até um prazo bastante alargado, de três anos, para celebração dos referidos contratos de arrendamento.

f)       Atentos os artigos do EBF, que prevêem o carácter excepcional dos benefícios (art. 2.º, n.º 1), a fiscalização dos benefícios pela AT (art. 7.º), a extinção dos benefícios (art. 14.º, n.ºs 1 e 2), o n.º 16 do artigo 8.º do regime tributário destes Fundos, a nova redacção apenas concretiza uma medida anti-abuso.

g)      No caso dos autos, resulta da alienação dos prédios no ano de 2015 que o Requerente não poderia, de qualquer forma, beneficiar das isenções em causa porque a alienação pressupõe a afectação a um destino distinto do arrendamento, relativamente aos prédios adquiridos antes de 1 de Janeiro de 2014.

h)      Não se trata, pois, de introdução ex novum de um regime de caducidade do benefício nem se verifica qualquer frustração das expectativas dos sujeitos passivos ou violação do princípio da não retroactividade da lei fiscal.

i)        E, uma vez que não estava na disponibilidade da AT decidir de modo diferente daquele que decidiu, não pode ser imputado aos seus serviços erro que tenha determinado o pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido, pelo que, em qualquer caso, não haveria lugar ao pagamento de juros indemnizatórios nos termos do art. 43.º da LGT (cf. Acórdãos do STA de 21/01/2015, in proc. 703/14, e de 03/04/2015, in proc. 01529/2015).

 

9. Questões a decidir

A decisão do presente Pedido implica a apreciação das seguintes questões:

A.    Legalidade das liquidações de IMT e de Imposto do Selo efectuadas pela Requerida aquando da alienação, por um Fundo de Investimento Imobiliário para Arrendamento Habitacional (FIIAH), de prédio que anteriormente adquirira com as isenções previstas no artigo 8.º do regime especial dos FIIAH, criado pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro (OE para 2009), avaliando-se, designadamente, se está em causa a aplicação de normas aditadas pela Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro (OE para 2014), com violação do artigo 103.º da CRP.

B.      Direito a juros indemnizatórios, no caso das liquidações em causa serem ilegais.

 

 10. Saneamento

O Tribunal é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º, n.º 2, e 6.º, n.º 1, do RJAT.

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.

Não foram suscitadas excepções.

O processo não enferma de vícios que o invalidem.

 

Pelo que se passa à decisão de mérito.

 

II. FUNDAMENTAÇÃO

 

11. Factos provados  

11.1. A Requerente, designada por A…– Sociedade Gestora de Fundos de Investimento, S.A., é a sociedade gestora do fundo de investimento imobiliário “B…-Fundo de Investimento Imobiliário Fechado para Arrendamento Habitacional”, abreviadamente “Fundo B…”, registado junto da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários com o número fiscal … (Pedido e Resposta, art. 4º).

11.2. Em 5 de Agosto de 2013 o Fundo B… adquiriu a fracção EE do artigo … da freguesia de…, actual … da União de freguesias de … e … a entidade com NIF …, tendo sido requerida e concedida isenção nos termos do art. 10.º do CIMT (art. 21.º do Pedido e doc. n.º 1 junto com o Pedido).

11.3. Antes da escritura de compra e venda referida no número anterior, em 22 de Julho de 2013, foi efectuada a respectiva liquidação de IMT “usufruindo do benefício fiscal 92, FIIAH/SIIAH (art. 87.º do OE/09)”[1] (menção no doc. n.º 1).

11.4. Em 2015, a Requerente, antes de alienar o imóvel referido em 11.2, requereu pagar IMT e Imposto do Selo pela anterior aquisição do mesmo, tendo a Requerida, em 25 de Agosto de 2015, efectuado liquidação desses dois impostos, nos montantes, respectivamente, de € 27.764,75 (IMT) e € 3.880,00 (IS) (art. 6º do Pedido e art. 5º da Resposta e doc. n.º 1 junto com pedido).

11.5. Nos documentos de liquidação é mencionado, quanto ao IMT, que a liquidação se deve a caducidade da isenção, nos termos dos números 1 e 2 do artigo 34.º do CIMT, por alteração do destino em que assentara a concessão do benefício, dada a prevista celebração de escritura de venda do prédio, a efectuar em 28 de Agosto de 2015 (doc. n.º 1).

11.6. Os impostos liquidados nos termos dos dois números anteriores foram pagos em 26 de Agosto de 2015 (Doc. n.º 2).

 

12. Factos não provados

A matéria dada como provada revela-se suficiente para apreciação da questão de direito, inexistindo factos não provados relevantes para a solução do presente litígio.

 

13. Fundamentação da prova

A fixação da factualidade fez-se com base nos factos alegados pelas partes e não contestados, assim como nos documentos juntos aos autos.

 

14. Aplicação do direito

14.1. Tipo de ilegalidade em apreciação

A Requerente invoca violação do artigo 103.º da CRP, concluindo que se está perante uma situação de nulidade ou mesmo inexistência.

 

Subscrevemos a posição de que os actos de liquidação em causa, ainda que se tenham baseado numa norma violadora de princípios constitucionais, como alegado, serão anuláveis e não nulos, já que não está em causa a violação do conteúdo de um direito fundamental (alínea d) n.º 2 do artigo 133.º do CPA) mas a apreciação da legalidade de actos tributários face ao regime jurídico dos FIIAH e regime jurídico dos benefícios fiscais. 

 

14.2. O regime especial para FIIAH e SIIAH criado pela Lei do OE para 2009

Nos seus artigos 102.º a 104.º, a Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro, aprovou um regime especial aplicável aos fundos de investimento imobiliário para arrendamento habitacional (FIIAH) e às sociedades de investimento imobiliário para arrendamento habitacional (SIIAH) (artigo 102.º), constituídos durante os cinco anos subsequentes à entrada em vigor da mesma lei e aos imóveis por estes adquiridos no mesmo período (ou seja, entre 1 de Janeiro de 2009 e 31 de Dezembro de 2013) (art. 103.º) mandando aplicar à respectiva constituição e funcionamento o Regime Jurídico dos Fundos de Investimento Imobiliário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 60/2002, de 20 de Março (art. 104.º).[2]

 

Os Fundos de Investimento Imobiliário para Arrendamento Habitacional (FIIAH)[3], de acordo com o disposto nos artigos 1.º a 4.º do regime aprovado pelo OE para 2009:

- integravam na sua denominação a expressão “fundos de investimento imobiliário para arrendamento habitacional” ou a abreviatura FIIAH, que só eles (ou seja, com as características dos artigos 2.º a 6.º), poderiam adoptar;

- o respectivo valor do activo total deveria ao fim do primeiro ano atingir o montante mínimo de € 10 milhões e, quando constituído com o recurso a subscrição pública, ter, pelo menos, 100 participantes, cuja participação individual não pode exceder 20 % do valor do activo total do fundo, sendo que o incumprimento do referido limite de participação individual determinava a suspensão imediata e automática do direito à distribuição de rendimentos do FIIAH no valor da participação que exceda aquele limite.

- quanto a composição do património do FIIAH, diz-se aplicável o artigo 46.º [4] do Regime Jurídico dos Fundos de Investimento Imobiliário, mas pelo menos, 75 % do seu activo total é constituído por imóveis, situados em Portugal, destinados a arrendamento para habitação permanente.

 

O artigo 5.º do Regime consagrado pela Lei n.º 64-A/2008, prevê que:

- Os mutuários de contratos de crédito à habitação que procedam à alienação do imóvel objecto do contrato a um FIIAH podem celebrar com a entidade gestora do fundo um contrato de arrendamento (n.º 1);

- Previamente à celebração do contrato de transmissão da propriedade do imóvel para o FIIAH, a respectiva entidade gestora presta ao alienante, em papel ou noutro suporte duradouro, informação sobre os elementos essenciais do negócio, como seja o preço da transacção, incluindo, também, caso seja aplicável, o valor da renda, as respectivas condições de actualização e os critérios de fixação do preço e os termos gerais do exercício da opção de compra (n.º 2); 

- O arrendamento efectuado pelos mutuários, nos termos previstos no n.º 1, constitui o arrendatário num direito de opção de compra do imóvel, ao fundo, susceptível de ser exercido até 31 de Dezembro de 2020, direito de opção que só é transmissível por morte do titular. (n.ºs 3 e 4);

- O referido direito de opção de compra cessa se o arrendatário incumprir a obrigação de pagamento da renda ao FIIAH por um período superior a três meses (n.º 5);

- Os termos e condições do exercício da opção são regulamentados por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças, devendo assegurar o direito do alienante à recompra do imóvel ao FIIAH por referência ao valor actualizado da alienação, bem como, no caso de não exercício do direito de opção, o direito a receber a diferença entre o valor da alienação futura do imóvel e o valor actualizado da aquisição desse mesmo imóvel pelo FIIAH.

 

O artigo 7.º do Regime prevê a criação de uma Comissão de acompanhamento (constituída por três pessoas independentes) para verificar o cumprimento do regime legal e regulamentar aplicável à actividade dos FIIAH, designadamente a observância do regime jurídico e dos princípios de bom governo que devem reger a gestão do FIIAH (p. ex. política de investimento e de financiamento das responsabilidades; respeito, pela entidade gestora, dos direitos dos participantes e dos arrendatários; cumprimento dos deveres de informação) e a verificação, em especial, do cumprimento pelo FIIAH do regime de exercício da opção de compra pelo arrendatário.

O artigo 8.º contém o “Regime tributário” prevendo diversas isenções. Para além de isenções em IRC e IRS[5], prevê-se quanto aos prédios:

- Isenção de IMI, enquanto se mantiverem na carteira do FIIAH, dos prédios urbanos, destinados ao arrendamento para habitação permanente, que integrem o património dos fundos.

- Isenção de IMT quanto às aquisições de prédios urbanos ou de fracções autónomas de prédios urbanos destinados exclusivamente a arrendamento para habitação permanente, pelos fundos de investimento, bem como quanto às aquisições de prédios urbanos ou de fracções autónomas de prédios urbanos destinados a habitação própria e permanente, em resultado do exercício da opção de compra pelos arrendatários dos imóveis que integram o património dos fundos de investimento.

- Isenção de Imposto do Selo quanto a todos os actos praticados, desde que conexos com a transmissão dos prédios urbanos destinados a habitação permanente que ocorra por força da conversão do direito de propriedade desses imóveis num direito de arrendamento sobre os mesmos, bem como com o exercício da opção de compra previsto.

(sublinhados nossos).

 

14.3. Alterações introduzidas pelo Orçamento de Estado para 2014 e sua aplicação no tempo

O Orçamento de Estado para 2014 (aprovado pela Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro) veio, no seu artigo 235.º, estender aos FIIAH constituídos até 31 de Dezembro de 2015 a isenção de rendimentos em IRC prevista no n.º 1 do art. 8.º do Regime e aditar ao mesmo artigo os números 14 a 16, com o seguinte teor: 

«14 — Para efeitos do disposto nos n.ºs 6 a 8, considera-se que os prédios urbanos são destinados ao arrendamento para habitação permanente sempre que sejam objeto de contrato de arrendamento para habitação permanente no prazo de três anos contados do momento em que passaram a integrar o património do fundo, devendo o sujeito passivo comunicar e fazer prova junto da AT do respetivo arrendamento efetivo, nos 30 dias subsequentes ao termo do referido prazo.

 15 — Quando os prédios não tenham sido objeto de contrato de arrendamento no prazo de três anos previsto no número anterior, as isenções previstas nos n.ºs 6 a 8 ficam sem efeito, devendo nesse caso o sujeito passivo solicitar à AT, nos 30 dias subsequentes ao termo do referido prazo, a liquidação do respetivo imposto.

16 Caso os prédios sejam alienados, com exceção dos casos previstos no artigo 5.º, ou caso o FIIAH seja objeto de liquidação, antes de decorrido o prazo previsto no n.º 14, deve o sujeito passivo solicitar igualmente à AT, antes da alienação do prédio ou da liquidação do FIIAH, a liquidação do imposto devido nos termos do número anterior.» (sublinhados nossos)

 

E no artigo 236.º, o OE para 2014 prescreveu um regime transitório para os FIIAH e SIIAH, no sentido de que:

«1 — O disposto nos n.ºs 14 a 16 do artigo 8.º do regime especial aplicável aos FIIAH e SIIAH, aprovado pelos artigos 102.º a 104.º da Lei n.º 64 -A/2008, de 31 de dezembro, é aplicável aos prédios que tenham sido adquiridos por FIIAH a partir de 1 de janeiro de 2014.

2 — Sem prejuízo do previsto no número anterior, o disposto nos n.º 14 a 16 do artigo 8.º do regime especial aplicável aos FIIAH e SIIAH, aprovado pelos artigos 102.º a 104.º da Lei n.º 64 -A/2008, de 31 de dezembro, é igualmente aplicável aos prédios que tenham sido adquiridos por FIIAH antes de 1 de janeiro de 2014, contando -se, nesses casos, o prazo de três anos previsto no n.º 14 a partir de 1 de janeiro de 2014.».

 

Sobre o efeitos das alterações introduzidas pelo artigo 235.º do Orçamento de Estado para 2014 (aprovado pela Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro) nas situações ocorridas na vigência da redacção da Lei do OE para 2009, a Requerente entende que, de acordo com a redacção inicial do artigo 8.º do regime especial para o FIIAH, as isenções de IMT e IS não eram, à data em que o imóvel foi adquirido pelo Fundo B…, condicionadas à verificação ulterior de quaisquer factos ou circunstâncias nem sujeitas a qualquer regime de caducidade, e que continuam a não ser, porque a aplicação da extensão, consagrada pelo artigo 236.º do OE para 2014, às aquisições anteriores a 1 de Janeiro de 2014 representa uma violação do princípio da não retroactividade da lei fiscal constitucionalmente consagrado no artigo 103.º da CRP.

 

Ao contrário, a Requerida entende que o regime aprovado pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro, já exigia que os beneficiários das isenções em questão, quer em sede de IMT, quer em sede de Imposto do Selo, tivessem que cumprir o pressuposto de que os prédios abrangidos fossem destinados exclusivamente a arrendamento para habitação permanente.

 

14.4. O tipo de benefícios em causa e a questão da respectiva caducidade

Na apreciação da situação dos autos, aplicando os princípios de interpretação jurídica consagrados, há que ter em conta a ratio e o contexto da criação do regime jurídico dos FIIAH criado pela Lei do OE para 2009.

 

As condições específicas do tempo em que a lei foi criada confirmam o que deriva da letra da norma, interpretada em conjunto com outras normas do sistema jurídico. «Aquando da sua criação, em 2008 (com efeitos a 1 de Janeiro de 2009), o regime tributário acima descrito destacava-se através das suas isenções tributárias, como “medida de estímulo ao arrendamento (…), com o objectivo de aliviar a carga fiscal sobre proprietários e inquilinos”, permitindo-se que as famílias com empréstimos à habitação, e com dificuldade em pagar a prestação do seu crédito, pudessem converter as respectivas prestações, no pagamento de uma renda, mediante a venda do respectivo imóvel ao FIIAH, e a celebração, com a entidade gestora do fundo (SIIAH), de contrato de arrendamento sobre o mesmo imóvel, podendo ainda manter, até 2020, a opção de compra do imóvel.» [6]

 

Ou, como afirmado no douto parecer junto aos autos pela Requerente, com as suas alegações, o regime dos FIIAH consagrou “um mecanismo que pretendia proteger o interesse dos mutuários de créditos à habitação, com dificuldades de cumprimento, em manterem a possibilidade de aquisição dos imóveis, a prazo (por isso lhes sendo atribuído um direito de opção), embora passassem desde logo a ser meros arrendatários do FIIAH, a quem vendiam o imóvel em causa” (cf. art. 5.º).

 

Ou seja, tudo leva a crer que as isenções previstas no artigo 8.º do Regime Especial para FIIAH se destinavam apenas a imóveis adquiridos com essa afectação concretizada ou a concretizar em breve, em princípio logo no momento da aquisição do imóvel pelo Fundo e integração no respectivo património.

 

Atenta a natureza em si provisória, conjuntural, do “regime especial aplicável aos fundos de investimento imobiliário para arrendamento habitacional (FIIAH)” aprovado pela Lei n.º 64-A/2008 (artigos 102.º a 104.º)[7], designadamente através de concessão de benefícios fiscais (artigo 8.º), não pode deixar de entender-se que os benefícios só se justificavam se reunidas e mantidas as finalidades delineadas para as novas figuras jurídicas de FIIAH

 

Não se tratava de isentar a aquisição de um imóvel destinado em abstracto a arrendamento habitacional, mas sim um imóvel que, em concreto, tinha que ser afectado a essa finalidade. Não se visava isentar os FIIAH relativamente a qualquer aquisição de prédios mas apenas quanto às aquisições de prédios destinados efectivamente a arrendamento habitacional permanente.

 

Assim, apareceria como situação excepcional, não pretendida pelo legislador, que os imóveis adquiridos com expressa destinação para arrendamento para habitação permanente não se encontrassem e permanecessem nessa situação.

 

E o facto de a isenção prevista pretender realizar um interesse público extrafiscal relevante superior ao da tributação que impede (n.º 1 do artigo 2.º do EBF), exige fiscalização da situação (artigo 7.º do EBF). Recorde-se que, atendendo certamente à relevância política e social dos fins deste regime especial, ele próprio prevê a fiscalização, por uma comissão permanente, do cumprimento do regime legal e regulamentar aplicável à actividade dos FIIAH (n. º 7 do art. 8.º do Regime especial).

 

Está-se, pois, perante um benefício fiscal condicionado à verificação de requisitos na lei, previstos desde a redacção inicial do regime especial dos FIIAH.

 

Perante a evidência da ratio da norma é difícil aceitar a conclusão de que “a redação originária das isenções não exigia qualquer requisito relativo ao arrendamento efectivo, muito menos um prazo, sendo apenas necessário o escopo da sua aquisição para arrendamento”[8]. Esta tese parece encerrar uma contradição nos termos, equivalendo a dizer que a concessão de isenção era para prédios a afectar a arrendamento mas também poderiam não o ser

 

Apesar de o Regime constante do artigo 8.º da redacção da Lei do OE para 2009 não especificar nada sobre o período de tempo permitido para que, relativamente aos imóveis adquiridos, se concretize a realização da finalidade “afectação a arrendamento para habitação permanente”, tal omissão parece dever-se ao facto de se ter minimizado as dificuldades de controlo, pensando-se, quiçá, que sendo as transmissões originadas na passagem do mutuário a arrendatário não se encontrariam situações de não afectação dos prédios adquiridos a arrendamento para habitação permanente[9].

 

Mas o Tribunal não subscreve a tese da Requerente no sentido de que as isenções em apreço não eram originalmente condicionadas por quaisquer factos ou circunstâncias, considerando, ao invés, que face à redacção do regime aprovado pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro, não pode deixar de se entender que os benefícios fiscais estariam já então sujeitos a caducidade na medida em que a inobservância das obrigações impostas, fosse imputável ao beneficiário (n.º 2 do artigo 14.º do EBF).

 

E seria, portanto, também aplicável o n.º 3 do artigo 14.º do EBF, que prevê que “Quando o benefício fiscal respeite a aquisição de bens destinados à directa realização dos fins dos adquirentes, fica sem efeito se aqueles forem alienados ou lhes for dado outro destino sem autorização do Ministro das Finanças, sem prejuízo das restantes sanções ou de regimes diferentes estabelecidos por lei”.

 

Porque, tratando-se de um benefício fiscal condicionado à verificação de requisitos na lei, previstos desde a redacção inicial, não poderia deixar de se aplicar as normas existentes sobre a matéria e que garantem a unidade do sistema jurídico. A atribuição pela lei de uma isenção, a conceder no pressuposto de se atingir uma finalidade, não sujeita a controlo de verificação do resultado, seria sim um convite à fraude à lei, resultando numa violação de princípios constitucionais, designadamente a justiça e igualdade tributária.

 

Assim, não parece correcto dizer que “sem as alterações ao Regime Especial aplicável aos FIIAH e SIIAH da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro, a Requerente não teria de, nem nunca iria, apresentar qualquer pedido de liquidação de IMT e IS ao proceder à permuta do imóvel (…)” (§ 26 das alegações).

 

E a afirmação de que “O requisito único da isenção, à data em que a Requerente adquiriu o imóvel em apreço e em que tal isenção se consumou, era o de que os prédios adquiridos pelos FIIAH se destinassem a ser arrendados para habitação permanente (…)” e só com a alteração do Regime que veio dispor que “a alienação de prédios de propriedade dos FIIAH – ou a liquidação do próprio FIIAH – antes de decorrido o prazo de três anos, contados a partir da entrada nos prédios relevantes no património do FIIAH (…) conduz à caducidade da isenção” assenta numa leitura incorrecta do conceito “prédios destinados a arrendamento para habitação permanente” (§ 27 das alegações), como se a afectação efectiva não fosse um pressuposto da isenção, uma condição cuja ausência conduz à caducidade do benefício. 

 

Na prática, o regime aprovado pelo OE para 2009 poderia proporcionar alguma insegurança e desigualdade na aplicação da lei, nos casos em que os prédios que usufruíam de isenção não estivessem de imediato afectados aos fins em vista dos quais lhes fora concedida a isenção. Ou seja, na medida em que não se previa nenhum prazo para a afectação aos fins apontados, dificultava a aplicação do segmento do n.º 2 do artigo 14.º do EBF que prevê a “caducidade na medida em que a inobservância das obrigações impostas, seja imputável ao beneficiário”.

 

Por exemplo, poderiam surgir situações em que, invocando a crise económica e dificuldades em arrendar, os fundos beneficiários da isenção - concedida expressamente pela lei no pressuposto de reunião de determinados requisitos - viessem a conseguir usufruir do benefício fiscal adiando sempre a concretização dos fins extrafiscais legalmente pretendidos (e legitimadores da perda de receita fiscal).

 

Neste aspecto, a previsão da norma transitória contida no artigo 235.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31/12, ao fixar um prazo, bastante dilatado, para a afectação aos fins (3 anos) parece, na prática, ter até alargado esse prazo para os imóveis já adquiridos anteriormente pelos FIIAH, ao prever a possibilidade de afectação ao arrendamento para habitação no prazo de (mais) três anos a partir de Janeiro de 2014[10].

 

Mas a lei não veio acrescentar a obrigatoriedade de afectar a arrendamento para habitação permanente os imóveis anteriormente adquiridos com isenções concedidas porque tal obrigação derivava já, aquando da aquisição dos imóveis, do regime tributário previsto para os FIIAH na Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro.

 

14.5. Conclusão quanto à situação dos autos

Assim, o caso dos autos tem que ser resolvido tendo em conta que:

-          Os FIIAH, constituídos entre 1 de Janeiro de 2009 e 31 de Dezembro de 2013, nos termos da legislação aplicável, com activo constituído em pelo menos 75% por imóveis destinados a arrendamento para habitação permanente, usufruíam de isenção de impostos na aquisição (IMT e Selo) e pela detenção (IMI) dos imóveis adquiridos durante aquele período e destinados a afectação a arrrendamento para habitação permanente.

-          Os benefícios em causa eram concedidos no caso de mutuários de contratos de crédito à habitação que, dentro do mesmo período, procedessem à alienação de imóvel objecto do contrato a um FIIAH, celebrando com a entidade gestora do fundo um contrato de arrendamento, constituindo-se num direito de opção de compra do imóvel (ao FIIAH) susceptível de ser exercido até 31 de Dezembro de 2020.

-          É nesse contexto – preenchidos esses requisitos - que se justifica a isenção de IMT nas aquisições de prédios urbanos ou de fracções autónomas de prédios urbanos, destinados exclusivamente a arrendamento para habitação permanente, pelos fundos de investimento, bem como quanto às aquisições de prédios urbanos ou de fracções autónomas de prédios urbanos, destinados à habitação própria e permanente, em resultado do exercício da opção de compra pelos arrendatários dos imóveis que integram o património dos fundos de investimento.

-          Assim como a isenção do Imposto do Selo dos actos conexos com a transmissão dos prédios urbanos destinados à habitação permanente que ocorra por força da conversão do direito de propriedade desses imóveis num direito de arrendamento sobre os mesmos, bem como no exercício da opção de compra antes referido.

 

No caso dos autos trata-se de uma liquidação de IMT e IS efectuada em 2015, no momento da alienação de um prédio adquirido em Agosto de 2013 (não se sabe exactamente a quem mas não parece tratar-se de um mutuário de crédito para habitação), com isenção prevista no n.º 7 do artigo 8.º do Regime dos FIIAH e em que não foi feita qualquer prova da (ou sequer invocada) afectação a arrendamento para habitação permanente. E a alienação do prédio não foi realizada a um arrendatário ou com qualquer condicionalismo quanto ao destino da sua afectação.

 

Assim, se a isenção concedida, inicialmente, na aquisição de um imóvel adquirido por um FIIAH se mantivesse num caso destes, a finalidade da lei seria completamente inatingida sem correspondente perda de benefício. E, nas situações de aquisição de prédios adquiridos por Fundos de Investimento Imobiliário para Arrendamento Habitacional, estes usufruiriam de isenção de IMT e Imposto de Selo na aquisição e de IMI no período decorrido até revenda sem necessidade de os imóveis virem a estar efectivamente afectados a arrendamento para habitação permanente, bastando a eventualidade de o poderem vir a ser… Ou seja, a concessão de benefício deixava de ser condicionada, bastando a forma jurídica da entidade adquirente.

 

Contudo, os benefícios em sede de IMT, Imposto do Selo e IMI não são concedidos aos Fundos por terem uma determinada actividade mas concedidos aos prédios, se e enquanto destinados, em concreto, a essa actividade. E, claramente determinado pós 2014, dentro de um prazo e por período mínimo previstos na lei.

 

No presente caso, não foi invocada a efectiva afectação do prédio em causa mas sim a mera qualidade do Fundo adquirente que procedeu a revenda de um prédio decorridos dois anos após a respectiva aquisição, de um prédio que terá usufruído de isenções previstas na lei para os prédios afectados a arrendamento para habitação permanente.

 

A Requerente diz, em alegações[11], que quando requereu o pagamento dos impostos em causa invocou o art. 236.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro e não a afectação do imóvel “a destino diferente daquele em que assentou o benefício”.

 

Contudo, é certo que, com base nas declarações da Requerente de que ia alienar o imóvel, a Requerida entendeu que havia caducidade da isenção por alteração do destino do prédio, fundamentando a liquidação na afectação do bem a destino diferente daquele em que assentara o benefício.

 

Não são invocados os aditamentos efectuados pelo artigo 203.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31/12 (cuja inconstitucionalidade de resto não nos parece confirmada dada a interpretação perfilhada acima) mas o artigo 34.º do CIMT, que prevê que os sujeitos passivos peçam a liquidação de imposto antes de ocorrer a caducidade da respectiva isenção. Ainda que a Requerente não tivesse pedido a liquidação prévia, a Requerida poderia vir, com a fundamentação invocada, a realizar a liquidação, de acordo com o artigo 35.º do CIMT. 

 

Nestas condições e com os fundamentos expostos, o tribunal considera legal a liquidação fundamentada na caducidade de isenção por verificação da falta de pressupostos previstos no artigo 104.º da Lei n.º 64-A/2008, de 31/12.

 

Assim, e apesar de resultar da interpretação jurídica acima perfilhada que o tribunal não considera que os aditamentos ao regime dos FIIAH, efectuados pelo artigo 203.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31/12, constituam violação do artigo 103.º da CRP, como a fundamentação da liquidação não invocou, nem tinha que o fazer, a aplicação das normas aditadas pela Lei do OE para 2014, considera-se inútil uma apreciação jurídica mais aprofundada da questão da respectiva inconstitucionalidade.

 

E, improcedendo o pedido arbitral, improcede também o pedido de reembolso de montantes pagos, assim como de juros indemnizatórios.

 

III. DECISÃO

 

15. Em face do exposto, o presente Tribunal Arbitral decide:

a)      Julgar improcedente o presente pedido de declaração da ilegalidade da liquidação de IMT no montante de € 27.764,75 (vinte e sete mil euros, setecentos e sessenta e quatro euros e setenta e cinco cêntimos) e da liquidação de Imposto de Selo no montante de € 3.880,00 (três mil e oitocentos e oitenta euros). 

b)      Condenar a Requerente a pagar as custas do presente processo.

 

16. Valor do processo e custas

Fixa-se o valor do processo em € 31.644,75 (trinta e um mil seiscentos e quarenta e quatro euros e setenta e cinco) nos termos do artigo 97.º- A, n.º 1, do CPPT, aplicável por força do artigo 29.º, n.º 1, a) do RJAT e do artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT).

 

Fixa-se o montante das custas em € 1.836,00 (mil oitocentos e trinta e seis euros), a cargo do Requerente e calculadas de acordo com a Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, tudo nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, do RJAT e artigo 4.º do RCPAT.

 

 

Lisboa, 1 de Agosto de 2016.

 

A Árbitro

 

Maria Manuela Roseiro



[1] Parece existir uma gralha porque deve ter-se pretendido referir o art. 8.º, n.º 7 (do regime aprovado pelo artigo 104.º do OE).

[2] Com as alterações dos diversos diplomas referidos no artigo 100.º da Lei n.º 64-A/2008, veio a ser, posteriormente, alterado e republicado pelo Decreto-Lei n.º 71/2010, de 18 de Junho.

[3] O artigo 9.º dispõe que o regime previsto nos artigos anteriores é aplicável, com as devidas adaptações, às sociedades de investimento imobiliário (SIIAH) que venham a constituir-se ao abrigo de lei especial e que observem o disposto no regime especial aplicável aos FIIAH.

[4] Das regras do artigo 46.º do Regime de FII retenha-se que a) O desenvolvimento de projectos de construção não pode representar, no seu conjunto, mais de 50% do activo total do fundo de investimento; b) O valor de um imóvel não pode representar mais de 25% do activo total do fundo de investimento; c) O valor dos imóveis arrendados, ou objecto de outras formas de exploração onerosa, a uma única entidade ou a um conjunto de entidades que, nos termos da lei, se encontrem em relação de domínio ou de grupo, ou que sejam dominadas, directa ou indirectamente, por uma mesma pessoa, singular ou colectiva, não pode superar 25% do activo total do fundo de investimento; d) O fundo de investimento pode endividar-se até um limite de 25% do seu activo total.

[5] Nos números 1 a 5 prevê-se isenções no âmbito do IRS e IRC, designadamente: isenção de IRC quanto aos rendimentos de qualquer natureza obtidos por FIIAH constituídos entre 1 de Janeiro de 2009 e 31 de Dezembro de 2013, que operem de acordo com a legislação nacional e com observância das condições previstas; isenção de IRS e de IRC quanto aos rendimentos respeitantes a unidades de participação nos fundos de investimento pagos ou colocados à disposição dos respectivos titulares (…)  quer seja por distribuição ou reembolso, excluindo o saldo positivo entre as mais-valias e as menos-valias resultantes da alienação das unidades de participação; isenção de IRS quanto às mais-valias resultantes da transmissão de imóveis destinados à habitação própria a favor dos fundos de investimento, que ocorra por força da conversão do direito de propriedade desses imóveis num direito de arrendamento.

[6] Cita-se Decisão proferida em 20 de Maio de 2016 no processo arbitral n.º 735/2015-T (n.º 6.18.)

[7] O artigo 103.º da Lei nº 64-A/2008, dispõe que “o regime constante da presente secção é aplicável a FIIAH ou SIIAH constituídos durante os cinco anos subsequentes à entrada em vigor da presente lei e aos imóveis por estes adquiridos no mesmo período” e o n.º 2 do art. 9.º do regime “O regime constante da presente secção vigora até 31 de Dezembro de 2020, operando-se nessa data a conversão dos FIIAH em fundos de investimento imobiliário sujeitos na íntegra ao Regime Jurídico dos Fundos de Investimento Imobiliário”.

[8] Como no douto Parecer junto aos autos pela requerida.

[9] Assim, e também ao contrário da tese do Parecer junto aos autos (“existe uma diferença clara entre a comprovação da finalidade da aquisição de imóveis pelos FIIAH, como pressuposto das isenções originariamente previstas e a restrição destas pela introdução de novos pressupostos, como ocorreu em 2014”) crê-se não ser curial entender que a posterior explicitação de prazos e actuações signifique que, na redacção original, a afectação efectiva do prédio a arrendamento para habitação permanente não era já um pressuposto essencial para a atribuição de isenção.

[10] Alargamento de benefícios exprime-se também no n.º 1 do art. 8.º, para os FIIAH constituídos até 31 de Dezembro.

[11] Cf. § 20 a 23. A “título de exemplo” a requerente juntou um requerimento apresentado noutros casos, sem fornecer nenhuns dados concretos sobre o imóvel em causa nos autos, revendido dois anos depois de ter sido adquirido com isenção concedida com o pressuposto da respectiva afectação a arrendamento para habitação permanente e não para revenda (a não ser por opção do arrendatário anterior mutuário).