Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 17/2016-T
Data da decisão: 2016-07-05  IMT  
Valor do pedido: € 86.265,43
Tema: IMT – Reconhecimento de isenção
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Decisão Arbitral

 

            Os árbitros Dr. Jorge Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Dr. Nuno Oliveira Garcia e Dr. A. Sérgio de Matos, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 29-03-2016, acordam no seguinte:

 

1. Relatório

 

A…, S.A., sociedade anónima com sede na Rua …, n.º …, …-… …, com o número único de matrícula e de pessoa colectiva …, adiante designada por "Requerente", que incorporou por fusão a sociedade B… - …, …, S.A., veio, nos termos do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de Janeiro (doravante RJAT) apresentar um pedido de constituição do tribunal arbitral colectivo, em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira.

A Requerente pretende que seja anulada a liquidação de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) relativa à aquisição, em 29-11-2007, do prédio urbano inscrito na matriz predial da actualmente extinta freguesia de … sob o artigo …, no montante de € 65 756,60, e respetivos juros compensatórios, no montante de € 20 508,83.

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 28-01-2016.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral colectivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 11-03-2016 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 29-03-2016.

A Autoridade Tributária e Aduaneira respondeu, defendendo a improcedência do pedido de pronúncia arbitral.

Por despacho de 09-05-2016 dispensou-se a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e decidiu-se que o processo prosseguisse com alegações escritas sucessivas.

As partes não apresentaram alegações.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão devidamente representadas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de nulidades e não se suscita qualquer obstáculo à apreciação do mérito da causa.

Não são suscitadas excepções nem há qualquer obstáculo à apreciação do mérito da causa.

 

 

Matéria de facto

 

2.1. Factos provados

 

Consideram-se provados os seguintes factos:

 

a)                  A Requerente incorporou por fusão a sociedade B… - …; …, S.A. nela sucedendo em todos os seus direitos e obrigações (documento junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

b)                 A C… - … S.A. (doravante referida apenas por C…) é uma sociedade anónima cujo objecto social consiste, entre outras actividades, na gestão e exploração hoteleira (certidão permanente com o código de acesso electrónico …-…-…, junta com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

c)                   A referida sociedade C… era proprietária de um prédio urbano inscrito na matriz predial da actualmente extinta freguesia de …, concelho de Matosinhos, sob o artigo …, que corresponde a um terreno para construção, sito na Rua …;

d)                 Por despacho de 9 de Novembro de 2006, do Senhor Secretário de Estado do Turismo, foi declarada utilidade turística a título prévio do D…, com a categoria provisória de 4 estrelas, que a C… pretendia edificar no terreno supra identificado, despacho este que foi publicado no Diário da República, 2.3 Série, n.º … de …/…/2006, páginas … e … (Documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

e)                  No dia 14 de Novembro de 2007 foi emitido pela Câmara Municipal de … o Alvará de Construção n.º …/07, a favor da C… (Documento n.º 2 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

f)                  No dia 29 de Novembro de 2007, a sociedade B… - … que foi incorporada por fusão na Requerente adquiriu por escritura pública à sociedade C… o referido terreno (Documento n.º 3 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

g)                 O preço de venda ascendeu a €1000.000,00, tendo o prédio o valor patrimonial tributário de € 1.011.640,00 (escritura que consta do documento n.º 3);

h)                 Refere-se na escritura que o imóvel foi adquirido pela sociedade B… - … à C…, destinando-se o mesmo "a ser dado em locação financeira à sociedade vendedora" e que no terreno adquirido "irá ser edificado o D… com a categoria provisória de quatro estrelas, que a sociedade vendedora [e também locatária financeira C…] nele irá levar a efeito e ao qual foi atribuída utilidade turística a título prévio" (documento n.º 3);

i)                   A referida transmissão do imóvel beneficiou de isenção de lMT, ao abrigo do disposto no artigo 20.º i do Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro.

j)                   Na mesma data - 29 de Novembro de 2007 - foi celebrado entre sociedade B…- … e a C… um contrato promessa de locação financeira do mencionado terreno (Documento n.º 4 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

k)                 No dia 11 de Maio de 2008, através do despacho n.º …/2008, do Senhor Secretário de Estado do Turismo, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º … de …/…/2008, foi prorrogado o prazo de validade de utilidade turística atribuída a título prévio ao D… por mais seis meses, sendo a mesma válida até 12 de Maio de 2009 (Documento n.º 5 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

l)                   No dia 9 de Março de 2009, foi emitido pela Câmara Municipal de … o Alvará de Autorização de Utilização n.º …/09, relativamente ao D…, e em 6 de Novembro de 2009 o Secretário de Estado do Turismo emitiu o Despacho n.º …/2009, publicado no Diário da República, 2ª Série, n.º … de …/…/2009, confirmou a utilidade turística do hotel (Documento n.º 6 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

m)               No dia 2 de Abril de 2009, foi celebrado o prometido contrato de locação financeira entre a sociedade B… - … e a C…, onde se prevê que, findo o contrato e cumprido o mesmo, o imóvel passará para a propriedade da C… (Documento n.º 7 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

n)                 No dia 8 de Junho de 2015 foi iniciada pela AT uma acção inspectiva interna à ora Requerente, de âmbito parcial, em sede de IMT, com o objectivo de verificar a legitimidade da isenção de que beneficiou a referida aquisição;

o)                 Nessa inspecção foi elaborado o Relatório da Inspecção Tributária, junto com a Resposta, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais, o seguinte:

III. Enquadramento Legal em sede de isenção de IMT ao abrigo do Benefício Fiscal da Utilidade Turística

Enquadramento legal dos factos, quadro legislativo em que assenta o regime jurídico do Instituto de Utilidade Turística, nomeadamente dos pressupostos em que radica o reconhecimento dos benefícios fiscais a nível de isenção de IMT.

De acordo com o regime jurídico em vigor, a Utilidade Turística consiste na qualificação atribuída aos empreendimentos de caráter turístico que satisfaçam os princípios e requisitos definidos para o efeito no referido regime. Este regime previa um conjunto determinado de benefícios fiscais. Um dos benefícios fiscais contemplados no regime da Utilidade Turística, encontra-se consagrado no n.º 1 do artigo 20º do Decreto-Lei nº 423/83 de 5 de dezembro, de acordo com o qual:

"São isentas de sisa e do imposto s/ as sucessões e doações, sendo o imposto de selo reduzido a 1/5, as aquisições de prédios ou de fracções autónomas com destino à instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística, ainda que tal quantificação seja atribuída a título prévio, desde que esta se mantenha válida e seja observado o prazo fixado para a abertura ao público do empreendimento. "

E acrescenta o nº 2

"A isenção e a redução estabelecidas no número anterior verificar-se-ão também na transmissão a favor da empresa exploradora, no caso de a proprietária ser uma sociedade de locação financeira e a transmissão se operar ao abrigo e nos termos do contrato de locação financeira que determinou a aquisição do empreendimento pela sociedade transmitente. "

No mesmo sentido, pese embora no presente procedimento não se analisar a questão de IMI - imposto municipal sobre imóveis, refira-se que o artigo 47º do EBF, sobre a epígrafe "Prédios integrados em empreendimentos a que tenha sido atribuída a utilidade turística", consagra um conjunto de isenções para os prédios integrados em empreendimentos a quem tenha sido atribuída a Utilidade Turística.

No sentido de delimitar, densificando o conceito de Utilidade Turística, na sua convocação enquanto pressuposto para efeitos da atribuição do "reconhecimento" da isenção de IMT, invocamos o disposto no artigo 1º do Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de dezembro.

Refere o legislador que:

"A utilidade turística consiste na qualificação atribuída aos empreendimentos de carácter turístico que satisfaçam os princípios e os requisitos definidos no presente diploma ..."

Estatuindo no n.º 1 do artigo 3º do referido Decreto-Lei, que a Utilidade Turística só poderá ser atribuída aos empreendimentos que sejam estabelecimentos hoteleiros e similares, conjuntos turísticos, parques de campismo, equipamentos, instalações termais e casas afetas a turismo de habitação, devidamente apreciados pelas autoridades competentes.

III.2. - Da isenção de IMT, por utilidade turística, nas aquisições efetuadas por empresas, quer sejam proprietárias quer exploradoras dos empreendimentos

Neste ponto, acompanharemos de perto, tomando em consideração a orientação firmada no acórdão uniformizador de jurisprudência nº 3/2013 (Processo nº 968/12, 2a Secção), proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo (STA) em 23 de janeiro de 2013.

Tal como sindicado no douto acórdão referido, a questão em apreço traduz-se em saber que aquisições, nos termos do quadro legal suprarreferido (Dec. Lei 423/83) devem beneficiar da isenção de IMT:

 a) as aquisições de prédios ou de frações autónomas por promotores com vista a construir e instalar os empreendimentos turísticos;

b) ou as aquisições de frações autónomas (unidades de alojamento) pertencentes ou integradas em empreendimentos já construídos e instalados, com vista à sua exploração?

Do teor literal do art. 20.º, n.º 1, do Decreto-Lei nº 423/83, importa realçar que o legislador refere claramente que apenas se encontram, na redação à data, "isentas de sisa, as aquisições de prédios ou de fracções autónomas com destino à instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística"

O que quer dizer, nas palavras do juiz relator, que não se trata de uma isenção subjetiva dirigida a beneficiar as empresas, quer sejam proprietárias quer exploradoras dos empreendimentos, mas sim objetiva, uma vez que visa beneficiar a atividade de instalação, podendo apenas requerer e beneficiar da isenção as empresas que se dediquem a "instalar" empreendimentos turísticos e não também as que pretendam dedicar-se à atividade de exploração dos mesmos.

Não oferecendo dúvidas que no caso da isenção do n.º 1 do art. 20.º do Decreto-Lei n.º 423/83, o legislador quis abranger apenas as aquisições destinadas à "instalação" de empreendimentos. Para efeitos dos benefícios a que se reporta o n.º 1 do art. 20.º, do Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro, o conceito de instalação reporta-se à aquisição de prédios (ou de frações autónomas) para construção de empreendimentos turísticos, depois de devidamente licenciadas as respetivas operações urbanísticas, visando beneficiar as empresas que se dedicam à atividade de promoção/criação dos mesmos e não os adquirentes de frações autónomas em empreendimentos construídos/instalados em regime de propriedade plural, uma vez que esta tem a ver com a «exploração» e não com a «instalação».

Continuando a acompanhar a posição jurisprudência vertida no acórdão uniformizador (ponto 5 do articulado) o sentido a extrair do n.º 1 do art. 20.º do Decreto-Lei nº 423/83 é o de que o benefício só tem justificação relativamente a quem procede à instalação do empreendimento e o coloca no mercado e não em relação a todos os que o utilizam e exploram, ainda que através da compra das suas unidades (...)

Como referido no entendimento perfilhado pelo Acórdão n.º 971/12, de 2013-01-30 do Supremo Tribunal Administrativo,

"Ora, questão idêntica à que é objeto dos presentes autos foi já decidida em julgamento ampliado, nos termos do disposto no art. 148.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, no acórdão deste STA, de 23/1/2013, rec. n.º 968/12", que subscrevemos e ao qual aderimos. Assim, remetendo para a fundamentação desse aresto e acolhendo-a, concluímos que, para efeitos do benefício fiscal previsto no n.º 1 do art. 20.º do DL n.º 423/83, de 5/12, a primeira aquisição de fracção destinada à exploração turística não integra já a fase de instalação do empreendimento (...)"

Atente-se, ainda, no acórdão do STA proferido no âmbito do processo n.º 968/12, proferido em 23 de janeiro de 2013 em que os ilustres magistrados referem, que:

"Resulta patente das considerações do Grupo de Trabalho que o legislador pretendeu impulsionar a atividade turística prevendo a isenção/redução de pagamento de Sisa/Selo, para os promotores que pretendam construir/criar estabelecimentos (ou readaptar e remodelar frações existentes) e não quando se trate da mera aquisição de fracções (ou unidades de alojamento) integradas nos empreendimentos e destinadas à exploração, ainda que sejam adquiridas em data anterior à própria instalação/licenciamento do empreendimento.

[O]s promotores dos empreendimentos são os únicos responsáveis pelo investimento imobiliário, impendendo sobre eles o risco do mesmo, bem como pela obtenção das licenças necessárias a torná-los aptos ao funcionamento e exploração.

[N]o conceito de instalação não pode estar incluída a aquisição de unidades de alojamento que fazem parte do empreendimento, porque essa aquisição é feita tendo em vista a sua exploração a qual só pode ocorrer apôs o acto final do procedimento de instalação".

 

O Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de dezembro constitui um instrumento jurídico de fomento de incentivo ao investimento no setor do turismo, em que o legislador entendeu atribuir benefícios fiscais em sede de imposto de sisa (atual IMT) e do selo, às empresas proprietárias que realizam o esforço de investimento, a quem vai criar estabelecimentos turísticos e não a quem se limita a vender frações/empreendimentos já instalados.

"(...) O benefício só tem justificação relativamente a quem procede à instalação do empreendimento e o coloca no mercado e não em relação a todos o que o utilizam e exploram, ainda que através da compra das suas unidades (...).

Os benefícios fiscais, nos termos do n.º 1 do art.º 2.º do EBF, são medidas de caráter excecional instituídas para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes e que sejam superiores aos da própria tributação que impedem,

O n.º 2 do artigo 20.º do aludido Decreto-Lei vem ainda estabelecer, para além do que já foi referido, a única situação em que ocorre isenção de sisa (atual IMT) e redução de imposto do selo, quando a empresa proprietária for uma sociedade de locação financeira e, no âmbito deste contrato de locação que previu a aquisição do empreendimento, vende à empresa exploradora os prédios/fracções. Neste n.º 2 existe um alargamento da isenção de sisa (atual lMT)/selo, que ocorre na transmissão a favor da empresa exploradora, mas apenas no caso de a proprietária ser uma sociedade de Iocação financeira.

Aqui chegados, somos a concluir, por falta de tipicidade legal, para que seja aplicado o benefício fiscal da isenção de IMT, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 423/83 de 5 de Dezembro, à aquisição efetuada pelo Sujeito Passivo na escritura infra analisada.

III.3. - Da aquisição do imóvel, efetuada pelo sujeito passivo, no exercício de 2007 e isento de lMT, a coberto do Instituto da Utilidade Turística

No dia vinte e nove de novembro de dois mil e sete, de acordo com a cópia da escritura, fornecida pelo sujeito passivo, celebrada no Cartório Notarial de E… - Rua … nº …, no …, o sujeito passivo adquiriu o imóvel abaixo indicado, que beneficiou de isenção de IMT ao abrigo Decreto-Lei n.º 423/83 de 5 de Dezembro.

Extrai-se da escritura (Anexo 1) que o vendedor:

C… - …, SA NIF …

Domicílio Fiscal: Rua …, nº … Escritório …, … - … …. É o dono e legítimo do referido imóvel, de acordo com a escritura:

Prédio urbano, composto de terreno para construção, sito na Rua … (confrontação a Sul), freguesia de … Concelho de Matosinhos. Inscrito na matriz sob o artigo …. Que no mesmo irá ser edificado o "D…" com a categoria provisória de quatro estrelas, que a sociedade vendedora nele irá levar a efeito e ao qual foi atribuída utilidade turística a titulo prévio.

Que ao mesmo é atribuído o valor de € 1.000.000,00. Que tem o valor patrimonial tributário de € 1.011.640,00.

E que pela referida escritura, a sociedade vendedora transmitiu o bem identificado, ao sujeito passivo B… - …, …, SA,

Em 2015 o referido imóvel apresentava o seguinte detalhe, na base de dados da Autoridade Tributária:

 

 

Quanto ao Imposto

Atento ao preceituado na escritura, a transmissão, está isenta de imposto municipal sobre (a transmissão onerosa de imóveis nos termos da declaração de Utilidade Turística conferida por despacho do Secretário de Estado do Turismo de 2006-…-… (Anexo 2), pelo qual foi declarada a utilidade turística a título prévio do referido hotel a qual se mantém válida, encontrando-se dentro do prazo para a abertura do empreendimento.

De acordo com o despacho citado, a Utilidade Turística a título prévio foi atribuída ao empreendimento D…, com a categoria provisória de 4 estrelas que a C…, …, SA, pretende levar a efeito na Rua …, freguesia de … concelho de Matosinhos e distrito do Porto.

No dia 2008-…-…, através do despacho n.º …/2008 do Gabinete do Secretário de Estado do Turismo (Anexo 3), foi prorrogado o prazo de validade da utilidade turística atribuída a título prévio ao D… por mais seis meses, sendo a mesma válida até dia 12 maio de 2009.

No dia 2009-11-06, a requerimento pela C…, …, SA, através do despacho n.º …/2009 do Gabinete do Secretário de Estado do Turismo (Anexo 46, foi decidido confirmar a utilidade turística atribuída a título prévio ao F… de 4 estrelas, tendo sido fixada a validade da utilidade turística em 7 anos contados da data do alvará de autorização de utilização (9 de março de 2009), ou seja até 9 de março de 2016.

Foi a C…, …, SA, a entidade que promoveu, requerendo em tempo ao Gabinete do Secretário de Estado do Turismo, o pedido de atribuição de utilidade turística ao empreendimento Hoteleiro.

Da leitura do quadro legal exposto nos supras ponto III.1, III.2, estão isentas de IMT as aquisições de prédios ou de frações autónomas com destino à instalação de empreendimentos qualificadas de utilidade turística.

A concessão deste benefício visa, tão-somente, fomentar o investimento e impulsionar a atividade turística para os promotores que pretendam construir/criar estabelecimentos, não sendo aplicável à mera aquisição de frações integradas em empreendimentos já construídos e instalados.

Deste modo, suportados pela posição do douto acórdão do STA, processo n.º 968/12, de que se transcreve o seguinte trecho,

"O benefício só tem justificação relativamente a quem procede à instalação do empreendimento e o coloca no mercado e não em relação a todos que o utilizam e exploram, ainda que através da compra das suas unidades."

importa pois concluir que dado ter sido a C…, …, SA que procedeu à instalação do empreendimento e a quem foi concedido o benefício de Utilidade Turística, o B… - … … SA não pode usufruir deste benefício, pelo que se mostra indevida a isenção reconhecida na escritura, ora em análise.

 

III.4. – Proposta de Correção

De acordo com o que foi exposto propõe-se a seguinte correção, de natureza meramente aritmética, resultante de imposição legal:

- Que seja liquidado o respetivo IMT, peia aplicação das taxas, previstas no artigo 17.º n.º 1, em função da natureza do prédio, devido pela aquisição abaixo identificada

A base de incidência, foi determinada, de acordo com o disposto no nº1 do art. 12º do CIMT - o IMT incidirá sobre o valor constante do ato ou do contrato ou sobre o valor patrimonial tributário dos imóveis, consoante o que for maior

Quanto à Taxa

Nos termos do artigo 17º n.º 1 do CIMT;

al. d) aquisição de outros prédios urbanos, ....: 6,5%.

 

(...)

E o acórdão uniformizador de jurisprudência que a Administração Tributária e Aduaneira acompanhou apreciou e decidiu a questão do conceito de instalação para efeitos do benefício fiscal a que se refere este artigo. Quando é referido no n.º 1 do artigo 20.º do aludido Decreto-lei com destino à instalação pretende abranger apenas as aquisições destinadas à instalação de empreendimentos. [Por sua vez o conceito de instalação reporta-se à aquisição de prédios (ou de frações autónomas) parai construção de empreendimentos turísticos, depois de devidamente licenciadas as respetivas operações urbanísticas, visando beneficiar as empresas que se dedicam à atividade de promoção/criação dos mesmos. O benefício do artigo 20.º do Decreto-lei n.º 423/83, de 5 de dezembro só tem justificação relativamente a quem procede à instalação do empreendimento e o coloca no mercado.

Por outro lado, e de acordo com o Decreto-lei n.º 423/83, de 5 de dezembro, com a redação dada pelo Decreto-Lei n.º 38/94, de 8 de fevereiro, o sujeito passivo necessita de preencher; determinados pressupostos, cumprir determinadas obrigações para se encontrar abrangido por este regime.

A empresa proprietária da promoção do investimento para além de ter de ver reconhecida a Utilidade Turística do empreendimento que construiu, ampliou ou melhorou, terá ainda de cumprir q prazo que lhe foi estipulado para abertura do mesmo ao público.

O sujeito passivo inspecionado, proprietário do prédio urbano, onde irá ser edificado o "D…" com a categoria provisória de quatro estreias, onde a sociedade C… - …, SA legará a efeito e ao qual foi atribuída Utilidade Turística a titulo prévio, não se encontra adstrito às obrigações legais exigidas para o estabelecimento, dado que não foi este que efetuou qualquer pedido nesse sentido.

Efetivamente, de acordo com o despacho do Secretário de Estado do Turismo, de … de … de 2006, publicado por Aviso no Diário da República, 2ª Série, n.º .., de … de … de 2006 (Parte Especial) foi declarada a Utilidade Turística, a título prévio, ao "D…", com a categoria provisória de 4 estrelas, que a C… - …, SA pretende levar a efeito na Rua …, freguesia de .., concelho de Matosinhos e distrito do Porto.

Posteriormente, o Secretário de Estado do Turismo, por despacho n.º …/2008, publicado no Diário da República, 2ª Série, n.º …, de … de … de 2008, "Atento o pedido de prorrogação do prazo de validade da utilidade turística atribuída a titulo prévio ao D…, sito na Rua …, na freguesia de …, concelho de Matosinhos, de que ê requerente C… -…, S.A.; (.,.)",

E, a requerimento da C… - … SA, o Gabinete de Estado do Turismo, através do despacho n.º …/2009, publicado no Diário da República, 2ª Série, n.º …, de … de … de 2009, foi confirmada a Utilidade Turística atribuída a título prévio ao F…, de 4 estrelas.

Pelo que, e como para efeitos do benefício a que se reporta o n.º 1 do artigo 20.º do Decreto Lei n.º 428/83, de 5 de dezembro, não pode deixar de entender-se como referindo-se precisamente à aquisição de prédios para construção de empreendimentos turísticos, depois de devidamente licenciadas as respetivas operações urbanísticas, visando beneficiar as empresas que se dedicam à atividade de criação dos mesmos, neste caso, a C… - … SA, realidade que o sujeito passivo reconhece no exercício do seu direito de audição " (...) a C…, que foi quem instalou o empreendimento ( )".

E, ao invés do que é referido no direito de audição, e o raciocínio acima exposto o confirma, a Administração Tributária e Aduaneira, não fez uma interpretação incorreta do acórdão, já que o benefício do artigo 20.º do Decreto-lei n.º 423/83, de 5 de dezembro só tem justificação relativamente a quem procede à instalação do empreendimento e o coloca no mercado, e o sujeito passivo não se enquadra nesta situação pelo que não poderá beneficiar da isenção de Sisa/IMT.

“[I]mporta pois concluir que dado ter sido a C…, …, SA que procedeu à instalação do empreendimento e a quem foi concedido o benefício de Utilidade Turística, o B… - … … SA não pode usufruir deste benefício, pelo que se mostra indevida a isenção reconhecida na escritura, ora em análise".

No que concerne ao avocado nos parágrafos 18.º a 25.º, também aqui a Administração Tributária e Aduaneira não concorda com a posição do sujeito passivo como infra se demonstrará.

O regime jurídico do contrato de locação financeira vem consagrado no DL n.º 149/95, de 24 de junho, sucessivamente atualizado pelo DL n.º 265/97, de 2 de outubro, DL 285/2001, de 3 de novembro, e mais recentemente pelo DL 30/2008, de 25 de fevereiro.

De acordo com o artigo 1º do Decreto-Lei n.º 149/95, de 24 de junho: "Locação financeira é o contrato pelo qual uma das partes se obriga, mediante retribuição, a ceder à outra o gozo temporário de uma coisa, móvel ou imóvel, adquirida ou construída por indicação, e que o locatário poderá comprar, decorrido o período acordado, por um preço determinado ou determinável, mediante simples aplicação dos critérios neles fixados"

Neste tipo de contrato existe a obrigação de ceder o gozo de uma coisa, o locador é e continua a ser o proprietário da coisa, a outra parte tem o direito de exigir aquela cedência, do gozo para além de ser temporário é retribuído, o objeto do contrato é adquirido ou construído por indicação do locatário o locatário pode adquirir a coisa decorrido o prazo acordado esse preço deve ser determinado oi determinável mediante simples aplicação dos critérios neles fixados.

Apesar da locação financeira ser um dos instrumentos que as empresas dispõem para financiar a aquisição de bens, não se pode reduzir a uma função financeira. A finalidade do contrato de locação financeira é a cedência do uso da coisa, cedência que só se torna possível com a aquisição prévia da coisa pelo locador. O financiamento inicial ligado a esta operação tem lugar na esfera do locador que só obtém resultados externos através da cedência do uso do bem adquirido com esse financiamento.

E no que à situação interessa, a aquisição de um imóvel por parte da locadora, por indicação do locatário, para de seguida os locar a estes, está sujeita a IMT nos termos gerais sendo a base para a liquidação constituída pelo preço acordado ou pelo VPT (valor patrimonial tributário) dos imóveis, consoante oque for maior, nos termos do n.º 1 do artigo 12.º do CIMT.

No exercício do seu direito de audição, o sujeito passivo ainda faz referência ao preâmbulo do Decreto-Lei n.º 311/82, de 4 de agosto, que estabelece normas sobre o regime fiscal da locação financeira.

O regime da locação financeira, constante do DL n.º 311/82, de 4 agosto, visou uma regulamentação do contrato que assegurasse os seguintes objetivos;

• Eliminação de eventuais obstáculos de índole fiscal ao recurso a este tipo de contrato;

• Impedimento da utilização do contrato de locação com propósito de evasão fiscal;

• Neutralidade fiscal, por forma a que o locatário não suportasse na compra do imóvel locado carga fiscal superior à que resultaria da sua aquisição direta (cf. preâmbulo do diploma)

E no que toca à neutralidade fiscal, ao contrário do afirmado pelo sujeito passivo no seu direito de audição, a mesma ocorre nos termos do art. 3.º Decreto-lei nº 311/82, 4 agosto:

"Está isenta de sisa a transmissão por compra e venda a favor do locatário, no termo da vigência do contrato de locação financeira e realizada nas condições nele estabelecidas, da propriedade ou do direito de superfície constituído sobre os imóveis locados".

Refira-se ainda que o princípio de neutralidade fiscal, também se encontra plasmado no n.º 2 do art.  20.º, do Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de dezembro:

" 2- A isenção e a redução estabelecidas no número anterior verificar-se-ão também na transmissão a favor da empresa exploradora, no caso de a proprietária ser uma sociedade de locação financeira e a transmissão se operar ao abrigo e nos termos do contrato de locação financeira que determinou a aquisição do empreendimento pela sociedade transmitente."

Vem ainda o sujeito passivo no seu direito de audição transcrever uma passagem do preâmbulo do Decreto-lei n.º 311/82, de 4 de agosto, mas também aqui a sua posição não poderá prevalecer. Vejamos, nos termos do artigo 5.º do referido Decreto-Lei (redação à data dos factos), existe a possibilidade de:

"1 - Às sociedades de locação financeira sujeitas a imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas aplicar-se-á a taxa de sisa de 4% pela aquisição de prédios ou de terrenos para construção, ou pela constituição ou aquisição do direito de superfície para este fim, quando esses prédios, através da locação financeira, sejam destinados à instalação de indústrias de interesse para o desenvolvimento económico do País ou à conveniente ampliação de empresas com vista a novos fabricos, redução do custo ou melhoria de qualidade dos produtos, benefício que ficará sem efeito se, por facto imputável à sociedade locadora, for dada ao imóvel afectação diversa no septénio posterior à sua aquisição. "

No entanto, esta redução de taxa "(...) depende de despacho do Ministro das Finanças, a requerimento dos interessados, sobre informação da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, depois de ouvidos os serviços competentes do ministério ou ministérios que superintendam nas actividades respectivas,", conforme estatui o n.º 2 do artigo 5.º do referido DL, com a redação introduzida pela Lei n.º 10B/96, de 23 de março.

Esse requerimento "(...) deverá ser apresentado no prazo a que se refere o n.º 1 do artigo 15.º do Código do Imposto Municipal de Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações,", n.º 3 do artigo 5º do referido DL, com a redação introduzida pela Lei n.º 10B/96, de 23 de março.

Assim, face ao que anteriormente foi exposto, mantém-se sendo, uma vez que o sujeito passivo não exerceu o direito de audição, as correções propostas mantêm-se inalteradas.

 

p)                 Em 19-10-2015, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a liquidação cuja cópia foi junta com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais, o seguinte:

DEMONSTRAÇÃO DO CÁLCULO DE IMT E JUROS COMPENSATÓRIOS

Referente à escritura de compra e venda de 2007-11-29, pela aquisição do artigo urbano … da extinta freguesia de …, (terreno para construção), a C… …, S. A., com o NIPC: …, pelo preço de 1.000.000,OC

A referida aquisição foi efectuada com reconhecimento isenção de IMT, relacionada com benefício de Utilidade Turística previsto no art. 20.° do Decreto-Lei n.° 423/83, o qual constatou não ser aplicável, conforme relatório da Inspeção Tributária - Direção de Finanças de …, já notificado ao sujeito passivo.

-IMT

Artigo … de …

Valor do Negócio = € 1.000.000,00

Valor Patrimonial Tributário = € 1.011.640,00

€1.011.640,00 X 6,5% = € 65.756,60

IMT Devido = € 65.756,60

Imposto do Selo, pago no acto da escritura.

- SÃO DEVIDOS JUROS COMPENSATÓRIOS (ART° 33 CIMT/ 35° LGT)

Valor Base do Imposto: € 65.756,60 Data da Escritura: 2007-11-29 Data da Liquidação: 2015-09-16

q)                 A liquidação e respectiva demonstração foram notificadas à Requerente através de carta registada com aviso de recepção expedida em 16-09-2015;

r)                   Em 19-10-2015, a Requerente procedeu ao pagamento da quantia liquidada (documento n.º 8 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido)

s)                  Em 18-01-2016, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo.

 

2.2. Factos não provados

 

Não há factos relevantes para a decisão da causa que não se tenham provado.

 

 2.3. Fundamentação da fixação da matéria de facto

 

Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos com o pedido de pronúncia arbitral e com a resposta da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

 

3. Matéria de direito

 

3.1. Posições das Partes

 

A C… inclui no seu objecto social, entre outras actividades, na gestão e exploração hoteleira e obteve a atribuição de utilidade turística a título prévio do D…, que pretendia edificar num terreno seu.

A sociedade B… - …, que veio a ser incorporada na Requerente, adquiriu à C… o referido terreno com a finalidade de ele "ser dado em locação financeira à sociedade vendedora", referindo-se na escritura que no terreno adquirido "irá ser edificado o D… com a categoria provisória de quatro estrelas, que a sociedade vendedora [e também locatária financeira C…] nele irá levar a efeito e ao qual foi atribuída utilidade turística a título prévio"

A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que, tendo sido a C… que requereu a atribuição de utilidade turística para o “D…” e que promoveu a construção e instalação do empreendimento hoteleiro, não pode a Requerente (ou a B… - … que na Requerente foi incorporada por fusão) beneficiar da isenção objectiva contida no artigo 20.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro, em que se estabelece o seguinte:

 

Artigo 20.º

 1 - São isentas de sisa e do Imposto sobre sucessões e doações, sendo o imposto do selo reduzido a um quinto, as aquisições de prédios ou de fracções autónomas com destino à instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística, ainda que tal qualificação seja atribuída a título prévio, desde que esta se mantenha válida e seja observado o prazo fixado para a abertura ao público do empreendimento.

2 - A isenção e a redução estabelecidas no número anterior verificar-se-ão também na transmissão a favor da empresa exploradora, no caso de a proprietária ser uma sociedade de locação financeira e a transmissão se operar ao abrigo e nos termos do contrato de locação financeira que determinou a aquisição do empreendimento pela sociedade transmitente.

 

A Requerente defende o seguinte, em suma:           

 

– para se aferir se a aquisição do prédio pela Requerente se enquadra no transcrito preceito, haverá que analisar se a aquisição se destina ou não à instalação de empreendimento qualificado de utilidade turística;

– não é relevante se o adquirente do prédio é ou não o promotor imobiliário, mas apenas se a aquisição faz ou não parte do processo de instalação do empreendimento turístico;

– não definindo o Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro, o conceito de instalação consagrado no n.º 1 do artigo 20.º, deverá recorrer-se ao regime jurídico previsto no Decreto-Lei n.º 167/97, de 4 de Julho, que regulava, à data dos factos, a instalação e funcionamento dos empreendimentos turísticos e que considerava que a instalação de empreendimentos turísticos era "o licenciamento da construção e ou da utilização de edifícios destinados ao funcionamento daqueles empreendimentos";

– a aquisição do imóvel pela Requerente ocorreu após a emissão do alvará de construção, e antes da emissão do alvará de utilização, o que significa que a aquisição se destinou à instalação, a qual só terminou em Março de 2009;

– conclui-se, assim, com base no teor literal do preceito, que a isenção do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro, é aplicável à aquisição do terreno pela ora Requerente;

– esta é também a solução que indubitavelmente mais consentânea se mostra com a ratio do benefício, que visa promover o processo de instalação de empreendimentos de utilidade turística, não sendo dirigido aos que se limitam a explorar aqueles empreendimentos;

– não é isenção subjectiva, mas objectiva, dirigindo-se a incentivar o processo de instalação;

– é precisamente a instalação que está em causa na situação em análise, em que a sociedade C… era detentora de um terreno no qual pretendia instalar um hotel (D…) e, para financiar tal construção, efectuou uma operação de sale and lease back, isto é, vendeu o imóvel à aqui Requerente, que em seguida celebrou um contrato de locação do terreno, no qual se construiu o referido hotel;

– a Requerente (proprietária) interveio directamente na instalação, através do financiamento por via da locação;

– a licença de utilização foi obtida após a aquisição, o que demonstra que a instalação ocorreu após a compra;

– neste mesmo sentido, no Acórdão uniformizador de jurisprudência n.º 3/2013, de 23 de Janeiro de 2013, publicado na 1.ª Série do Diário da República, de 4 de Março de 2013, págs. 1197 a 1217, conclui-se que o conceito de instalação "não pode deixar de ser entendido como referindo-se precisamente à aquisição de prédios (ou de frações autónomas) para construção (quando se trate de novos empreendimentos) de empreendimentos turísticos, depois de devidamente licenciadas as respectivas operações urbanísticas, visando beneficiar as empresas que se dedicam à atividade de promoção/criação dos mesmos".

– é precisamente o caso da Requerente.

– por conseguinte, nem da letra da lei, nem do seu espírito, pode resultar a inaplicabilidade da isenção de IMT prevista no artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro, à aquisição do terreno em apreço, no qual a locatária, C… - …, S.A., instalou um empreendimento ao qual foi reconhecida utilidade turística.

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira defende no presente processo o seguinte, em suma:

 

– o benefício fiscal em referência visa “quem procede à instalação do empreendimento e o coloca no mercado e não em relação a todos os que o utilizam e exploram, ainda que através da compra das suas unidades”, convocando o conceito de instalação plasmado no Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 3/2013, de 23/01/2013, (processo n.º 968/12) proferido pelo STA;

– com base na prova produzida, o Relatório de Inspecção concluiria que tendo sido a C… que requereu a atribuição de utilidade turística para o “D…” e que promoveu a construção e instalação do empreendimento hoteleiro, não podia o Requerente beneficiar da isenção objectiva contida no art. 20.º, n.º 1 do DL n.º 423/83, de 5 de Dezembro;

– com a aquisição do referido imóvel, o Requerente passou a ser juridicamente o seu proprietário, independentemente de ter celebrado com a anterior proprietária do imóvel contrato promessa de locação financeira;

– retira-se do clausulado do referido contrato promessa de locação financeira que os poderes correspondentes ao exercício do direito de propriedade relativamente ao imóvel em causa mantêm-se na esfera jurídica do Requerente e Locador Financeiro;

– assim, a sujeição a IMT ocorre quanto o Requerente e Locador Financeiro adquire o imóvel, sendo este, enquanto adquirente, que deve pagar o imposto;

– o facto de o Requerente ter adquirido o imóvel à C… para, de seguida, o locar à mesma C…, através da outorga do contrato promessa de locação financeira, não retira que aquela aquisição esteja sujeita a IMT nos termos gerais;

– por seu turno, a Locatária Financeira apenas ficará sujeita a IMT quando exercer a opção de compra sobre o imóvel antes do termo do contrato de locação financeira, ficando apenas isenta de IMT, se essa aquisição se der no final do termo do contrato de locação financeira, nos termos do art. 3.º do DL n.º 311/82, de 4 de Agosto;

– a aquisição do bem imóvel em causa não beneficia da isenção prevista no art. 20.º do DL n.º 423/83, por o adquirente não ser a entidade que se propôs construir e instalar o empreendimento hoteleiro, mas antes uma terceira entidade, meramente possuidora precária do imóvel, na qualidade de locatária financeira imobiliária.

 

3.2. Apreciação da questão

 

A Requerente defende, em primeiro lugar, que a sua situação se enquadra no teor literal do artigo 20.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro, e que não é relevante se o adquirente do prédio é ou não o promotor imobiliário, mas apenas se a aquisição faz ou não parte do processo de instalação do empreendimento turístico.

De facto, o artigo 20.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro, atribui a isenção às «aquisições de prédios ou de fracções autónomas com destino à instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística», pelo que se trata de uma isenção de natureza objectiva, que não depende da natureza da entidade adquirente.

A jurisprudência do acórdão uniformizador n.º 3/2013, de 23-01-2013, publicado no Diário da República, I Série, de 04-03-2013, citado pela Autoridade Tributária e Aduaneira, não afasta também a aplicação da isenção.

Na verdade, refere-se aí que o conceito de instalação se reporta «à aquisição de prédios (ou de fracções autónomas) para construção de empreendimentos turísticos, depois de devidamente licenciadas as respectivas operações urbanísticas, visando beneficiar as empresas que se dedicam à actividade de promoção/criação dos mesmos e não os adquirentes de fracções autónomas em empreendimentos construídos/instalados em regime de propriedade plural, uma vez que esta tem a ver com a «exploração» e não com a «instalação».

Na verdade, a B… - … não se enquadra na situação que neste acórdão se refere não ser abrangida pela isenção, pois, não é adquirente de prédio em que existisse empreendimento turístico construído ou já instalado, nem visou proceder à sua exploração, mas sim possibilitar à empresa promotora do empreendimento a disponibilidade de meios financeiros para o concretizar.

Por outro lado, a aquisição ocorreu em 29-11-2007, depois de licenciadas as respectivas operações urbanísticas através do alvará de 14-11-2007, pelo que a situação da Requerente, quanto a este ponto, satisfaz a exigência que naquele acórdão uniformizador se faz de a aquisição se fazer «depois de devidamente licenciadas as respectivas operações urbanísticas».

Assim, não se vê suporte factual para a Autoridade Tributária e Aduaneira entender afastar a isenção com fundamento na jurisprudência do acórdão uniformizador referido, que se pronunciou sobre a não aplicação a quem adquire imóveis com empreendimentos turísticos já instalados, com a finalidade de proceder à sua exploração.

Por outro lado, se é certo que a isenção tem em vista beneficiar as empresas que se dedicam à actividade de promoção e criação dos empreendimentos turísticos, também o é que a B… - …, através da aquisição seguida de locação, participou nessa actividade de promoção e criação, através do financiamento por via da locação, actividade que só terminou posteriormente à aquisição, em 09-03-2009, quando foi emitido o alvará de utilização.

O n.º 2 do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 423/83, ao estabelecer que «a isenção e a redução estabelecidas no número anterior verificar-se-ão também na transmissão a favor da empresa exploradora, no caso de a proprietária ser uma sociedade de locação financeira e a transmissão se operar ao abrigo e nos termos do contrato de locação financeira que determinou a aquisição do empreendimento pela sociedade transmitente», inculca a interpretação de que a sociedade de locação financeira que adquiriu o imóvel destinado ao empreendimento beneficia da isenção referida no n.º 1, sendo essa a explicação para a inclusão da palavra «também» que pressupõe que, na situação descrita, se está perante uma segunda isenção relativa ao mesmo empreendimento turístico.

Aliás, é esta interpretação – ie., de que tanto a transmissão para a sociedade que adquire o imóvel destinado a um empreendimento turístico no âmbito de um contrato de locação financeira, como a posterior transmissão para quem o promoveu e vai explorar estão isentas de IMT – que se compagina com o objectivo de incentivar a criação de empreendimentos de utilidade turística, que deixaria de existir se alguma dessas transmissões fosse onerada com a tributação. Do mesmo modo diga-se que, nenhum elemento – literal ou sistemático – dos n.os 1 e 2 do artigo 20.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro, permite concluir que uma operação como aquela em apreço (sale lease back) – e, de resto, qualquer cessão/transmissão similar àquela sem que o empreendimento ou hotel esteja já instalado na data da cessão/transmissão – não possa beneficiar do benefício respectivo, muito pelo contrário como vimos. Na verdade, não se pode duvidar que, se a empresa de locação financeira que adquire um imóvel para o transmitir para a empresa que promoveu e vai explorar o empreendimento turístico tiver de suportar IMT, esse encargo irá repercutir-se nesta empresa.

Pelo exposto, tanto a letra da lei como a sua razão de ser conduzem à conclusão de que a isenção de IMT se aplica à aquisição efectuada pela B… - ….

Consequentemente, a liquidação impugnada enferma de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, que justifica a sua anulação [artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo de 2015, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 2.º, alínea c), da LGT].

Sendo ilegal a liquidação de IMT, a liquidação de juros compensatórios enferma do mesmo vício, pois «os juros compensatórios integram-se na própria dívida do imposto, com a qual são conjuntamente liquidados» (artigo 35.º, n.º 8, da LGT).

 

 

4. Juros indemnizatórios

 

A Requerente pede ainda que seja determinada a devolução da quantia paga acrescida de juros indemnizatórios calculados desde a data do pagamento do imposto até à data da devolução.

De harmonia com o disposto na alínea b) do art. 24.º do RJAT a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito», o que está em sintonia com o preceituado no art. 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do art. 29.º do RJAT] que estabelece, que «a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto ou situação objecto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão».

Embora o art. 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão «declaração de ilegalidade» para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que em processo de impugnação judicial são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira directriz, que «o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária».

O processo de impugnação judicial, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de actos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do art. 43.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» e do art. 61.º, n.º 4 do CPPT (na redacção dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, a que corresponde o n.º 2 na redacção inicial), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».

Assim, o n.º 5 do art. 24.º do RJAT ao dizer que «é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previstos na Lei Geral Tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário» deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.

Cumpre, assim, apreciar o pedido da devolução do montante indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios.

No caso em apreço, é manifesto que, na sequência da ilegalidade dos actos de liquidação, há lugar a devolução do imposto pago, por força dos referidos arts. 24.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e 100.º da LGT, pois tal é essencial para «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado».

No que concerne aos juros indemnizatórios, é também claro que, na sequência da declaração de ilegalidade da liquidação, há lugar ao pagamento de juros indemnizatórios, pois aquela ilegalidade é imputável à Administração Tributária, que, por sua iniciativa, efectuou a liquidação.

Consequentemente, a Requerente tem direito a juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º, n.º 1, da LGT e do artigo 61.º do CPPT, calculados sobre a quantia que pagou indevidamente, à taxa dos juros legais prevista no artigo 559.º do Código Civil e, actualmente, na Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril (artigos 43.º, n.º 4, e 35.º, n.º 10, da LGT), desde a data que em que efectuou o pagamento, 19-10-2015, até ao reembolso da quantia paga.

 

 

5. Decisão

 

De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral;

 

Nestes termos, acordam neste Tribunal Arbitral em:

a)                  Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;

b)                 Anular a liquidação de IMT relativa à aquisição do prédio urbano inscrito na matriz predial da actualmente extinta freguesia de …, sob o artigo …, em 29/11/2007, no montante de € 65.756,60, e a respectiva liquidação de juros compensatórios, no montante de € 20.508,83, nos termos impugnados, com fundamento na sua ilegalidade por violação de lei;

c)                  Condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a reembolsar a Requerente da quantia de € 86.265,43, acrescida de juros indemnizatórios, à taxa dos juros legais prevista no artigo 559.º do Código Civil e, actualmente, na Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril (artigos 43.º, n.º 4, e 35.º, n.º 10, da LGT), desde 19-10-2015, até ao reembolso da quantia paga.

 

 

6. Valor do processo

 

De harmonia com o disposto no art. 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 86.265,43.

 

 

7. Custas

 

Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 2.754,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerida.

 

 

Lisboa, 05-07-2016

 

Os Árbitros

 

(Jorge Manuel Lopes de Sousa)

 

 

 

(Nuno Oliveira Garcia)

 

 

 

 

 

(A. Sérgio de Matos)