Decisão Arbitral
I. Relatório
1. A…, LDA., NIP …, com sede na …, em …, requereu a constituição do tribunal arbitral em matéria tributária suscitando pedido de pronúncia arbitral contra os atos de liquidação de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) relativos aos períodos de 2013.03, 2013.07 e 2013.11, nos montantes de € 50,69, € 66,71 e € 373,21, respetivamente, perfazendo, no total, a importância de € 490,61. Peticionando a anulação dos referidos atos e consequente reembolso das importâncias indevidamente pagas, a Requerente solicita ainda o reconhecimento do direito aos correspondentes juros indemnizatórios, contados nos termos legais.
2. Fundamentando o pedido, apresentado em 10-12-2015, a Requerente alega, no essencial, não existir base legal que suporte a liquidação adicional de IVA relativa a diferença de taxas aplicáveis às transações de gasóleo rodoviário e gasóleo colorido e marcado nos casos em que não sejam cumpridas as formalidades de comercialização deste último previstas no Código dos Impostos Especiais de Consumo (CIEC), nomeadamente naqueles em que os abastecimentos do referido produto não sejam objeto de registo através de leitura do cartão de microcircuito nos terminais TPA/POS.
3. Em resposta ao solicitado, a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) pronunciou-se no sentido da improcedência do presente pedido de pronúncia arbitral, mantendo-se na ordem jurídica os atos tributários impugnados e, em conformidade, pela absolvição da entidade Requerida.
4. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Sr. Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 17-12-2015.
5. Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31/12, o Conselho Deontológico designou como árbitro do tribunal arbitral singular o signatário, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável, e notificou as partes dessa designação em 02-02-2016.
6. Devidamente notificadas dessa designação, as partes não manifestaram vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
7. Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31/12, o tribunal arbitral singular foi constituído em 17-02-2016.
8. Regularmente constituído o tribunal arbitral é materialmente competente, face ao preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), do RJAT.
9. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT, e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22/03).
10. Atento o conhecimento que decorre das peças processuais juntas pelas partes, que se julga suficiente para a decisão, o Tribunal decidiu dispensar a reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT.
II. Matéria de facto
11. Com relevância para a apreciação do pedido de pronúncia arbitral, destacam-se os seguintes elementos fatuais que, com base nos elementos documentais juntos aos autos, se consideram provados:
11.1. A Requerente é uma sociedade por quotas, com sede na …, em …, cujo objeto social é o comércio a retalho de combustível para veículos a motor.
11.2. No período que decorreu entre 20 de novembro de 2014 e 22 de dezembro de 2014, a Requerente foi destinatária de uma ação de inspeção desenvolvida pela Divisão Operacional do Sul (DOS) da Direção de Serviços Antifraude Aduaneira, (DSAFA) centrada no âmbito da comercialização de gasóleo colorido e marcado e, no plano temporal, no último trimestre de 2013.
11.3. No âmbito da referida ação inspetiva foram analisados os registos do TPA/DOS (terminal de pagamento automático/point of sale) onde, nos termos legais, são objeto de registo os movimentos de cartões de microcircuito dos beneficiários de utilização de gasóleo colorido e marcado, bem como as contas correntes e vendas correspondentes.
11.4. Relativamente a diversos adquirentes, titulares de cartão microcircuito emitido pela Direção-Geral da Agricultura e do Desenvolvimento Rural, verificou-se na referida ação inspetiva que haviam sido emitidas faturas relativas a transmissões de gasóleo colorido e marcado sem que os abastecimentos tivessem sido objeto de registo no TPA/POS.
11.5. Constataram ainda os serviços de inspeção tributária que a empresa fornecedora havia solicitado a regularização desses abastecimentos junto da DGADR- Coordenação Nacional do Gasóleo Agrícola com indicação dos números dos beneficiários dos cartões microcircuito, não tendo essa entidade aceite os pedidos de regularização.
11.6. Relativamente às quantidades de gasóleo colorido e marcado fornecido aos adquirentes sem que fossem observados os procedimentos legais adequados foi considerado em dívida o valor resultante da diferença de tributação aplicável ao gasóleo rodoviário normal em sede de Imposto sobre os Produtos Petrolíferos (ISP) e Contribuição de Serviço Rodoviário (CSR), sendo imputada à ora Requerente a responsabilidade pelo respetivo pagamento.
11.7. Nas referidas condições foi apurado o valor total de € 2 237,05, correspondente ao imposto (ISP e CSR) e correspondentes juros compensatórios, tendo o respetivo pagamento sido efetuado em 3 de fevereiro de 2015.
11.8. Para efeitos de liquidação de IVA, os serviços aduaneiros remeteram cópia do relatório de inspeção aos serviços tributários de ….
11.9. Face às conclusões do Relatório, a Direção de Finanças de … promoveu procedimento de inspeção interno de que resultou concluir ser de aplicar a taxa norma de IVA às transmissões de bens em causa incluindo na base tributável os valores de ISP e de CSR adicionalmente liquidados pelos serviços aduaneiros competentes.
11.10. Em consequência da diferença de taxas aplicáveis às transmissões de gasóleo rodoviário e gasóleo colorido e marcado, foram apurados os seguintes valores em dívida:
- Período 2013.3: € 50,69,
- Período 2013.07: € 66,70
- Período: 2013.11: € 373,21
12. Não foi feita prova de que o imposto liquidado tenha sido pago. Não existem outros factos relevantes para a decisão de mérito que não se tenham provado.
III. Matéria de direito
13. Está em causa decidir, com base no fatos acima sumariamente descritos, sobre a legalidade das questionadas liquidações adicionais de IVA incidentes sobre os valores de ISP e de CSR adicionalmente liquidados, com referência a transmissões de gasóleo colorido e marcado efetuadas em violação das regras de comercialização deste produto.
14. De acordo com a Requerente não existe suporte legal para a tributação em IVA à taxa normal das transmissões de gasóleo colorido e marcado nos casos em que não sejam observadas as formalidades relativas à comercialização deste produto nas condições exigíveis para beneficiar de redução de taxa de ISP ao abrigo do artigo 93.º. do Código dos Impostos Especiais de Consumo (CIEC).
15. Acresce ainda, segundo a argumentação da Requerente que, em todo o caso, o valor do referido tributo não integra a base tributável do IVA.
16. Por seu lado, entende a Requerida não assistir razão à Requerente, sustentando que a aplicação da taxa intermédia de IVA às transmissões de gasóleo colorido e marcado pressupõe que as mesmas sejam efetuadas com observância das disposições legais relativas ao benefício da redução de taxa de ISP, tal como estabelecidas no respetivo Código e legislação complementar.
17. Quanto à inclusão no valor tributável do IVA dos imposto especiais de consumo, liquidados a posteriori, considera a Requerida também não assistir razão à Requerente, apelando para as disposições legais constantes dos artigos 78.º da Diretiva 2006/112/CE (Diretiva IVA) e artigo 16.º. n.º 5, al. a), que estabelecem, inequivocamente, que o valor tributável das transmissões de bens e prestações de serviços sujeitas a imposto inclui "os impostos, direitos, taxas e outras imposições, com exceção do próprio imposto sobre o valor acrescentado."
18. Face às posições expressas pelas Partes, acima sintetizadas, importa, desde já, uma referência ao quadro legislativo aplicável à data da ocorrência dos factos geradores da obrigação de imposto, situados, no tempo, entre março e novembro de 2013.
Do Imposto sobre os Produtos Petrolíferos
19. Por razões extrafiscais relevantes, os combustíveis podem ser objeto de transmissão a taxa reduzida. É o caso do gasóleo que se destine a ser utilizado em atividades agrícolas, na pesca, transportes por caminho-de-ferro e outras utilizações expressamente previstas no artigo 93.º do Código do IEC.
20. Com vista a assegurar a utilização deste combustível apenas nos fins que justificam a atribuição do benefício fiscal, e prevenir situações de fraude e evasão, o gasóleo fornecido aos utilizadores a taxa reduzida de ISP ostenta uma coloração e uma marca fiscal específicas.[i]
21. A utilização do gasóleo colorido e marcado é, nos termos do n.º 3 do artigo acima referido, restrita a:
- Motores estacionários utilizados na rega;
- Embarcações de navegação costeira e interior, destinadas a pesca, aquicultura e dragagem;
- Tratores agrícolas, ceifeiras-debulhadoras, motocultivadores, moto-enxadas, moto-ceifeiras, colhedores de batata automotrizes, colhedores de ervilha, colhedores de forragem para silagem, colhedores de tomate, gadanheiras-condicionadoras, máquinas de vindimar, vibradores de tronco para colheita de azeitona e outros frutos, bem como outros equipamentos, incluindo os utilizados para a atividade aquícola, aprovados por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças, da agricultura e do mar;
- Veículos de transporte de passageiros e de mercadorias por caminhos-de-ferro;
- Motores fixos;
- Motores frigoríficos autónomos, instalados em veículos pesados de transporte de bens perecíveis, alimentados por depósitos de combustível separados, e que possuam certificação ATP (Acordo de Transportes Perecíveis), nos termos a definir em portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças, da agricultura e dos transportes.
22. Além da coloração e marcação e limitações quanto à sua utilização, a comercialização do produto em causa encontra-se subordinada a um conjunto de condicionalismos estabelecidos, essencialmente, na portaria n.º 361-A/2008, de 12/05. [ii]
23. De entre os condicionalismos estabelecidos na referida Portaria destacam-se, pela relevância que revestem na situação em análise:
" 2.º O gasóleo colorido e marcado é um produto de venda condicionada, cuja disponibilização no mercado nacional só pode ser efetuada pelas empresas petrolíferas que tenham celebrado com o Estado, representado pela Direcção-Geral de Agricultura e do Desenvolvimento Rural (DGADR), um contrato para o efeito, no qual aquelas se comprometam a disponibilizar a venda ao público de gasóleo colorido e marcado, na proporção de, pelo menos, um posto de abastecimento por cada 600 000 l vendidos.
3.º O gasóleo colorido e marcado só pode ser fornecido ou vendido a titulares de postos de abastecimento devidamente licenciados que sejam detentores de terminais point of sale (POS).
4.º O disposto no número anterior é aplicável aos distribuidores, desde que disponham igualmente de terminais POS.
5.º O gasóleo colorido e marcado só pode ser vendido nos postos de abastecimento aos beneficiários de uma isenção ou redução de taxa de ISP que sejam titulares de cartões de microcircuito emitidos para o efeito pela DGADR, através dos quais são registadas todas as transações de gasóleo colorido e marcado no sistema informático gerido pela Sociedade Interbancária de Serviços (SIBS).
6.º As vendas a que se refere o número anterior são obrigatoriamente registadas nos terminais POS no momento em que ocorram.
24. Por outro lado, e de acordo com o n.º 5 do artigo 93.º do Código dos IEC, na redação em vigor à data da ocorrência dos factos a que se refere o presente processo, " O gasóleo colorido e marcado só pode ser adquirido pelos titulares do cartão eletrónico instituído para efeitos de controlo da sua afetação aos destinos referidos no n.º 3, sendo responsável pelo pagamento do montante de imposto resultante da diferença entre o nível de tributação aplicável ao gasóleo rodoviário e a taxa aplicável ao gasóleo colorido e marcado, o proprietário ou o responsável legal pela exploração dos postos autorizados para a venda ao público, em relação às quantidades que venderem e que não fiquem devidamente registadas no sistema eletrónico de controlo. "
25. Na situação em análise, verifica-se que a Requerente, em diversos períodos de 2013, forneceu 7 355 litros de gasóleo colorido e marcado a titulares de cartão eletrónico e emitiu as correspondentes faturas mas sem que esses fornecimentos fossem objeto de registo no TPA/POS, conforme determina a norma citada.
26. Esta irregularidade na comercialização do produto afasta o benefício fiscal previsto no n.º 1 do artigo 93.º do Código dos IEC e determina a aplicação da tributação pelo nível normal, definindo-se como sujeito passivo da obrigação de imposto o proprietário ou o responsável legal pela exploração do TPA/POS que forneceu o gasóleo colorido e marcado em violação das regras legais aplicáveis (Cf. CIEC, arts. 93.º, n.º 5 e 4.º, n.º 2, al. h).
27. Notificada da liquidação efetuada, no valor total de € 2 237,05 - ISP e CSR - a Requerente efetuou o respetivo pagamento em 03-02-2015.
Do Imposto sobre o Valor Acrescentado
28. Com base nos elementos constantes do relatório dos serviços de inspeção, a Direção de Finanças de … promoveu as liquidações oficiosas do IVA considerado em falta, no montante global de € 490, 61, distribuído pelos períodos de tributação correspondentes às transações irregulares do gasóleo colorido e marcado.
29. As liquidações efetuadas tomam como base tributável o valor do ISP e da CSR decorrente da diferença do nível de tributação normal e do benefício aplicado às transações em causa, sujeitando esse valor à taxa normal de IVA -23% - em vigor à data da exigibilidade do imposto.
30. Em causa está, pois, saber se a infração às regras de comercialização do gasóleo colorido e marcado estabelecidas no artigo 93.º do Código dos IEC e diplomas regulamentares implica, como imediata consequência, a tributação da transmissões desse produto à taxa normal do IVA e se no cômputo da respetiva base tributável se inclui, ou não, o valor do ISP adicionalmente liquidado ao proprietário ou responsável legal pela exploração dos postos autorizados.
31. Esta matéria foi já objeto de análise em decisão arbitral de 11-06-2013, proferida no processo 145/2012-T, cujas conclusões, a que inteiramente se adere, a seguir se transcrevem:
" A reação legal à comercialização irregular do gasóleo colorido e marcado existe no plano contraordenacional, sancionando-se quer o adquirente ou consumidor irregular, quer o vendedor (art. 109, nº 2, als. p) e q)).Este último de modo potencialmente mais gravoso, como decorre da elevação do montante máximo da coima quanto ao seu montante máximo para o dobro (de 150.000 € para 300.000 €, portanto, nos termos do n º 6 do mesmo artigo).
A esta consequência no plano contraordenacional acresce no âmbito do ISP a reação do art. 74º, nº 5 do CIEC [hoje art. 93º] mas para efeitos do IVA a lei não responsabiliza o proprietário ou o responsável legal pela exploração dos postos autorizados pelo pagamento do montante de imposto resultante da diferença entre a taxa de imposto aplicável ao gasóleo rodoviário e a taxa aplicável ao gasóleo colorido e marcado, em relação às quantidades que venderem e que não fiquem devidamente registadas no sistema informático subjacente aos cartões de microcircuito atribuídos.
12. A tributação do gasóleo colorido e marcado a uma taxa de IVA diversa da prevista na lei, em consequência da comercialização irregular de tal produto, carece de base legal prévia, de acordo com a reserva de lei fiscal, nos termos dos artigos 165º, nº 1, al. i) e e 103º, nº 2, da Constituição da República Portuguesa [2].
No caso dos autos essa base legal não existe e mesmo que se entendesse haver aqui uma lacuna [3], a reserva de lei fiscal proíbe a integração analógica [4], pelo que não pode ser aplicado em sede de IVA o art. 74º, nº 5 do CIEC [hoje art. 93º].
De resto, a própria “ATA” não efetuou qualquer alteração à taxa de IVA incluída na fatura emitida pela requerente aos seus clientes, mantendo aqui a taxa de 12%, apenas aplicando a taxa de 20% sobre a diferença positiva entre o nível de tributação do gasóleo rodoviário e o nível de tributação de tributação aplicada ao gasóleo colorido e marcado, em sede de ISP. No entanto, há que observar gasóleo em causa não deixou de ser marcado e colorido e não passou a ser considerado gasóleo rodoviário pela circunstância de não terem sido cumpridas as formalidades da Portaria n.º 361- A/2008 de 12 de Maio. Para efeitos de ISP é aplicável a responsabilização prevista no art. 74º, nº 5 do CIEC [actualmente art. 93º].Mas tal responsabilização, pelas razões apontadas, não tem reflexo na taxa de IVA.
13. Poder-se-á pôr ainda a questão do eventual aumento do valor tributável para efeitos de IVA em função da consideração para este efeito do valor da responsabilização da requerente em sede de ISP.
Todavia, independentemente da questão de saber se o ISP se deve incluir nos impostos a que se refere o art. 16º, nº 5, al. a) do CIVA, para determinar o valor tributável para efeitos de IVA [5] , uma vez que as obrigações tributárias emergentes dos dois impostos têm origem em factos tributários distintos, assim como os factos que determinam a exigibilidade e podem ser liquidados em momentos distintos, o certo é que, como acima foi dito, o produto vendido continua a ser gasóleo colorido e marcado e não gasóleo rodoviário e quem o utilizar como tal está sujeito à sanção prevista no art. 109º, nº 2, al. q) do RGIT.
A responsabilização prevista no art. 74º, nº 5 do CIEC [hoje art. 93º] não tem, no nosso modo de ver, a natureza de imposto, pois não se funda no facto que determina o nascimento da dívida tributária. É uma responsabilidade que nasce posteriormente a este e que tem a sua causa no incumprimento das regras estabelecidas para a venda de gasóleo colorido e marcado [6].
Assim sendo, o seu valor não pode ser incluído no valor tributável previsto no art. 16º, nº 5, al. a) do CIVA."
32. A fundamentação da decisão acima transcrita, que, sem reservas, se subscreve é identicamente aplicável ao presente pedido de pronúncia arbitral.
33. Com efeito, à data da exigibilidade do imposto a que se reportam as liquidações que constituem o objeto do presente pedido, estabelecia da Verba 2.3 da Lista II anexa ao Código do IVA serem tributadas à taxa intermédia, prevista no artigo 18.º, n.º 1, alínea b),do mesmo Código, as transmissões de " Petróleo e gasóleo, coloridos e marcados, e fuelóleo e respetivas misturas."[iii]
34. A referida norma não subordina a tributação a taxa intermédia de IVA ao condicionalismo estabelecido no artigo 93.º do CIEC e, admitindo-se que a natureza jurídica do gasóleo colorido e marcado se não altera em consequência da violação das regras de comercialização a que o mesmo se encontra sujeito [iv], não pode, por interpretação, transpor-se para o domínio daquele tributo as regras especificamente aplicáveis no domínio dos impostos especiais de consumo.
35. A confirmar a existência de lacuna e da impossibilidade da sua integração por via interpretativa, destaca-se o fato de ter a mesma sido preenchida pela Lei n.º 82-B/2014, de 31/12, que alterou a redação da referida Verba no sentido de nela se conterem apenas as transmissões de " Petróleo e gasóleo, coloridos e marcados, comercializados nas condições e para as finalidades legalmente definidas, e fuelóleo e respetivas misturas."
36. O legislador, porém, não atribuiu natureza interpretativa à norma em causa e, não existido quaisquer elementos que permitam concluir-se em sentido diverso, não pode deixar-se de entender-se que a mesma apenas dispõe para situações que ocorram após a sua entrada em vigor.
37. Assim, considerando a redação da Verba 2.3 da Lista II anexa ao Código do IVA, na redação vigente à data da exigibilidade do imposto a que se referem as liquidações impugnadas, e com os fundamentos acima expressos, não pode deixar de considerar-se que as mesmas carecem de base legal pelo que, consequentemente, devem ser anuladas.
38. Relativamente ao pedido de reconhecimento do direito a juros indemnizatórios e considerando que, nos termos do artigo 43.º, n.º 1 da LGT, o referido direito pressupõe que o imposto indevido tenha sido pago, facto de que não foi feita prova, não pode o mesmo proceder.
IV - Decisão
Nestes termos, e com os fundamentos expostos, o Tribunal decide:
a) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral e consequentemente anular os atos de liquidação de Imposto sobre o Valor Acrescentado a que se referem as notas de liquidação anexas ao pedido, relativas aos períodos de 2013.03, 2013.07 e 2013.11, nas importâncias de € 50,69, € 66.70 e de € 373;21, respetivamente;
b) Julgar improcedente o pedido de reconhecimento do direito a juros indemnizatórios.
Valor do processo: Fixa-se o valor do processo em € 490,61, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT, aplicável por remissão do artigo 29.º, n,º1, alíneas a) e b), do RJAT e artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
Custas: Ao abrigo do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, e nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixo o montante das custas em € 306, 00, a cargo da Requerida (AT).
Lisboa, 01 de julho de 2016
O árbitro,
Álvaro Caneira.
[i] Cf. Directiva 95/60/CE, do Conselho, de 6 de Dezembro, Portaria n.º 1509/2002, de 17 de Dezembro e Regulamento de Execução da Comissão n.º 2011/544/UE, de 16 de Setembro de 2011.
[ii] De acordo com o art. 5.º do Decreto-Lei n.º 73/2010, que aprovou o actual Código dos IEC, “As disposições regulamentares do Código dos Impostos Especiais de Consumo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 566/99, de 22 de Dezembro, constantes de portaria ou de despacho ministerial mantêm-se em vigor até à entrada em vigor da regulamentação prevista no CIEC”.
[iii] Redacção da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro.
[iv] Neste sentido,Cf. STA, Ac. de 3.10.2007 - Proc. 363/07.