DECISÃO ARBITRAL
1. RELATÓRIO
1.1. A Requerente A…, S.A. (Requerente), contribuinte n.º … na qualidade de sociedade gestora do fundo de investimento imobiliário B…– Fundo de Investimento Imobiliário Fechado para Arrendamento Habitacional, contribuinte n.º…, com sede na Avenida …, …, em Lisboa, apresentou em 29/02/2016, pedido de pronúncia arbitral tendo em vista a apreciação e declaração de ilegalidade dos actos de liquidação de Imposto sobre a Transmissão de Imóveis (IMT) e de Imposto do Selo, no valor total de € 10.272,18 (dez mil e duzentos e setenta e dois euros e dezoito cêntimos) a um imóvel de que é proprietário.
1.2. O Exmo. Senhor Presidente do Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) designou, em 07/04/2016, como árbitro singular o signatário desta decisão.
1.3. No dia 12/05/2016 ficou constituído o tribunal arbitral.
1.4. Cumprindo-se o disposto no n.º 1 do artigo 17.º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT) foi a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) notificada, em 12/05/2016, para, querendo, apresentar resposta e solicitar a produção de prova adicional.
1.5. Em 25/05/2016 a AT apresentou resposta, defendendo-se por impugnação, na qual solicitou, ainda, a dispensa de junção do processo administrativo.
1.6. Em 27/05/2016 o tribunal arbitral decidiu dispensar a realização da reunião a que n.º 1 do artigo 18.º do RJAT se refere, com fundamento no princípio da autonomia do tribunal arbitral na condução do processo, convidando ambas as partes para, querendo, apresentarem alegações escritas facultativas e agendou a data para prolação da decisão final.
1.7. Em 17/06/2016 a AT apresentou alegações escritas.
1.8. A Requerente não apresentou alegações escritas.
2. SANEAMENTO
O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente.
As partes têm personalidade e capacidade judiciária e são legítimas, não ocorrendo vícios de patrocínio.
O processo não enferma de vícios que afectem a sua validade.
Verificam-se, consequentemente, as condições para ser proferida a decisão final.
3. POSIÇÕES DAS PARTES
São duas as posições em confronto, a da Requerente, vertida no pedido de pronúncia arbitral e a da AT na sua resposta (e nas alegações escritas subsequentes).
Para fundamentar o seu pedido a Requerente alega que as liquidações objecto desta petição são ilegais pois entende ser inconstitucional, por violação do disposto no n.º 3 do artigo 103.º, da Constituição da República Portuguesa, o artigo 236.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro, que aprovou o Orçamento do Estado para 2014.
Entende, ainda, a Requerente que as liquidações impugnadas são nulas ao abrigo do disposto na alínea d), do n.º 2, do artigo 133.º do Código do Procedimento Administrativo
(CPA) porquanto ofendem o conteúdo essencial de um direito fundamental, e como tal, são impugnáveis a todo o tempo.
Doutro modo, a AT, sustenta que o pedido de declaração de nulidade das liquidações controvertidas deverá ser julgado improcedente.
Defende-se a AT invocando que no ordenamento jurídico-administrativo português, o regime regra de invalidade dos actos é, por razões de segurança jurídica, a mera anulabilidade, incluindo para os praticados com fundamento em deliberações ilegais ou inconstitucionais, tendo o Supremo Tribunal Administrativo vindo a pronunciar-se nesse mesmo sentido.
Mais refere a AT que a declaração de nulidade aparece reservada aqueles actos que ofendem o conteúdo essencial de um direito fundamental, contendendo com os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, mas não aqueles que contendem com o princípio da legalidade, como é o caso nos autos.
Nesta medida, os actos em causa, sendo, sem que em tal se conceda, violadores do princípio da legalidade tributária, seriam, assim, anuláveis, mas não nulos.
Por outro lado, sustenta a AT que a lei em apreço não é ferida de retroactividade, não tendo estabelecido nenhum novo requisito para aplicação da isenção prevista no regime especial aplicável aos fundos de investimento imobiliário para arrendamento habitacional (FIIAH), mas apenas tendo concedido um prazo para cumprimento de um requisito já subjacente ao próprio regime, prazo esse que apenas se inicia após a entrada em vigor da lei nova.
Não se trata, pois, de alterar os pressupostos, condições de atribuição ou de reconhecimento de um benefício fiscal, mas tão só e apenas, regular o período de tempo para efeitos de comprovação do cumprimento de um requisito previamente estabelecido.
Em face do exposto, entende a AT que a norma em apreço não é inconstitucional, devendo ser declarada improcedente o presente pedido de pronúncia arbitral.
4. QUESTÕES A DECIDIR
Nos presentes autos a questão a decidir consiste em determinar-se a ilegalidade, ou não, das liquidações de IMT e IS efectuadas ao abrigo do artigo 236.º da Lei 83-C/2013, de 31 de Dezembro (Orçamento do Estado para 2014).
5. MATÉRIA DE FACTO
5.1. FACTOS QUE SE CONSIDERAM PROVADOS
Em face dos documentos carreados para o processo, dá-se como provado que:
5.1.1. O fundo de investimento imobiliário B…– Fundo de Investimento Imobiliário Fechado para Arrendamento Habitacional era, à data das liquidações em apreço, proprietário do prédio sito na Avenida …, …, … …/… e Rua …, …, … A/…, Bloco…, … Esq., inscrito na freguesa de …, em Lisboa, sob o artigo matricial n.º…;
5.1.2. O prédio em causa foi adquirido em 19/11/2013, beneficiando da isenção de IMT ao abrigo da alínea a) do n.º 7 do artigo 8.º do regime especial aplicável aos fundos de investimento imobiliário para arrendamento habitacional (FIIAH), e foi alienado em 02/12/2015;
5.1.3. Em conformidade com o mencionado no pedido de pronúncia arbitral e na resposta dada pela AT, foi efectuada a liquidação de IMT, …, no valor de € 8.381,38 (oito mil, trezentos e oitenta e um euros e trinta e oito cêntimos) e de Imposto do Selo n.º…, no montante de € 1.890,80 (mil oitocentos e noventa euros e oitenta cêntimos), as quais foram pagas;
5.1.4. Estas liquidações foram feitas ao abrigo do artigo 236.º da Lei 83-C/2013, de 31 de Dezembro (Orçamento do Estado para 2014).
5.2. FACTOS QUE NÃO SE CONSIDERAM PROVADOS
Não existem factos com relevo para a decisão que não tenham sido dados como provados.
6. O DIREITO
6.1. DA (I)LEGALIDADE DO ACTO DE LIQUIDAÇÃO DE IMT E DE IMPOSTO DO SELO
Como é sabido, a Lei n.º 64-A/2008, de 31 Dezembro aprovou o regime especial aplicável aos fundos de investimento imobiliário para arrendamento habitacional (FIIAH).
Ao abrigo do disposto no n.º 7 do artigo 8.º, ficavam isentos de IMT:
a) As aquisições de prédios urbanos ou de fracções autónomas de prédios urbanos destinados exclusivamente a arrendamento para habitação permanente, pelos fundos de investimento referidos no n.º 1;
b) As aquisições de prédios urbanos ou de fracções autónomas de prédios urbanos destinados a habitação própria e permanente, em resultado do exercício da opção de compra a que se refere o n.º 3 do artigo 5.º pelos arrendatários dos imóveis que integram o património dos fundos de investimento referidos no n.º 1.
Já a Lei do Orçamento de Estado para 2014 veio alterar o referido artigo 8.º, nos seguintes termos:
“14 - Para efeitos do disposto nos n.ºs 6 a 8, considera-se que os prédios urbanos são destinados ao arrendamento para habitação permanente sempre que sejam objeto de contrato de arrendamento para habitação permanente no prazo de três anos contados do momento em que passaram a integrar o património do fundo, devendo o sujeito passivo comunicar e fazer prova junto da AT do respetivo arrendamento efetivo, nos 30 dias subsequentes ao termo do referido prazo.
15 - Quando os prédios não tenham sido objeto de contrato de arrendamento no prazo de três anos previsto no número anterior, as isenções previstas nos n.ºs 6 a 8 ficam sem efeito, devendo nesse caso o sujeito passivo solicitar à AT, nos 30 dias subsequentes ao termo do referido prazo, a liquidação do respetivo imposto.
16 - Caso os prédios sejam alienados, com exceção dos casos previstos no artigo 5.º, ou caso o FIIAH seja objeto de liquidação, antes de decorrido o prazo previsto no n.º 14, deve o sujeito passivo solicitar igualmente à AT, antes da alienação do prédio ou da liquidação do FIIAH, a liquidação do imposto devido nos termos do número anterior.” [sublinhado nosso].
Conforme referido anteriormente, o imóvel em apreço foi adquirido pelo fundo de investimento imobiliário B…– Fundo de Investimento Imobiliário Fechado para Arrendamento Habitacional em 2014, beneficiando de isenção de IMT ao abrigo da alínea a), do n.º 7, do artigo 8.º do regime especial aplicável aos fundos de investimento imobiliário para arrendamento habitacional (FIIAH).
Esta norma obriga a que o imóvel seja destinado ao arrendamento para habitação permanente para que possa beneficiar da referida isenção.
Nesta medida, a obrigatoriedade de destinar o imóvel ao arrendamento habitacional não é requisito das alterações introduzidas pela Lei do Orçamento do Estado para 2014, mas sim um requisito regime especial aplicável aos fundos de investimento imobiliário para arrendamento habitacional (FIIAH) ab initio, aliás, decorrência natural dos objectivos e motivações que presidiram à criação destes fundos.
O Orçamento de Estado para 2014 vem, é certo, estabelecer um novo requisito para a isenção: caso a afectação a arrendamento para habitação permanente não ocorra no período de 3 anos após a entrada do imóvel no fundo, o fundo deverá requerer a liquidação do IMT que não foi liquidado.
Contudo, não foi este o caso em apreço, ao contrário do que parece decorrer da argumentação da Requerente, senão vejamos.
As liquidações de IMT e de Imposto do Selo em causa não tiveram por base a sua manutenção no fundo por um período igual ou superior a 3 anos sem que tivesse havido afectação a arrendamento para habitação permanente. Como decorre, de resto, da documentação junta ao processo o imóvel apenas esteve no fundo por alguns meses.
De facto, as liquidações em apreço, conforme decorre das notas de liquidação juntas ao processo, basearam-se no facto de ter sido dado aos imóveis “destino diferente daquele em que assentou o benefício”.
Sobre esta matéria é já abundante a jurisprudência arbitral no sentido da legalidade dos atos impugnados, nos processos n.º 398/2015-T, n.º 688/2015-T, n.º 689/2015-T, n.º 709/2015-
-T, n.º 710/2015-T e n.º 729/2015-T, senão vejamos.
Decisão arbitral n.º 398/2015-T
“Ora, cumpre então avaliar da legalidade das liquidações de IMT sub judice.
Conforme supra mencionado, ambos os imóveis objecto de liquidação foram adquiridos pelo Requerente no início de 2014, beneficiando de isenção de IMT ao abrigo da alínea a) do n.º 7 do artigo 8.º do regime jurídico dos FIIAH. Tal norma obriga a que o imóvel seja destinado ao arrendamento para habitação permanente para que possa beneficiar de tal isenção.
Ora, a obrigatoriedade de destinar o imóvel ao arrendamento habitacional não é requisito das alterações introduzidas pelo Orçamento de Estado para 2014, mas sim um requisito do regime fiscal dos FIIAH ab initio, aliás natural decorrência das motivações que levaram à criação destes fundos.
[…] As liquidações de IMT efectuadas no que aos imóveis acima descritos se refere não tiveram por base a sua manutenção no fundo por um período igual ou superior a 3 anos sem que tivesse havido afectação a arrendamento para habitação permanente. Aliás, como decorre da documentação junta ao processo ambos os imóveis estiveram no fundo por apenas alguns meses. As liquidações em apreço, aliás conforme decorre das notas de liquidação juntas ao processo, basearam-se no facto de ter sido dado aos imóveis “destino diferente daquele em que assentou o benefício”. Ora, a esta afirmação efectuada pela AT de que foi dado destino diferente aos imóveis, ou seja, que não foram afectos a arrendamento para habitação permanente, o Requerente responde apenas nas suas alegações que “Não entende, porém, onde foi a Autoridade Tributária buscar semelhante ideia”, nada mais referindo sobre aquele que é requisito essencial da aplicação da isenção.
Assim sendo, entendemos que não está em questão a retroactividade ou não da norma aplicada, o que seria o caso, se, a título de exemplo, o imóvel estivesse por um período de 3 anos no fundo sem que ainda tivesse sido afectado ao arrendamento para habitação permanente e, por esse facto, houvesse liquidação de IMT.
No caso em concreto não é disso que se trata. Os imóveis em questão são alienados sem que tenham cumprido o seu destino - afectação ao arrendamento habitacional permanente. Não se trata de uma questão de prazo. Alienados que sejam, esse destino já não pode ser cumprido, pelo que não se cumpriu o requisito estabelecido para que a isenção de IMT seja aplicável.
Para cumprimento da alínea a) do nº 7 do artigo 8. º não basta uma intenção declarada na aquisição do imóvel mas uma efectiva afectação ao arrendamento para habitação permanente. Ora, o Requerente não comprova de forma alguma neste processo, nem no procedimento administrativo anterior o preenchimento desse requisito.
Entendemos assim que não está em causa a retroactividade ou não da lei, nem tão pouco existe lesão de expectativas do Requerente ou agravamento da sua posição fiscal. O racional para atribuição de um benefício fiscal em sede de IMT aos FIIAH foi estabelecido claramente desde o início – “As aquisições de prédios urbanos ou de fracções autónomas de prédios urbanos destinados exclusivamente a arrendamento para habitação permanente, pelos fundos de investimento...”;
Ora, entendemos assim que a liquidação de IMT em apreço é legal ao abrigo da alínea a) do n.º 7 do artigo 8.º. Vejamos agora então o racional da liquidação de IMT ao abrigo do artigo 235.º n.º 16 da Lei 83/2013 de 31 de Dezembro.” [realce nosso].
Decisão arbitral n.º 688/2015-T
“Ora, tendo em consideração a alienação do imóvel identificado no ponto 5.2.2., supra, para fins diferentes daqueles para que foram concedidos os benefícios fiscais acima descritos, tal determinaria (e determinou no caso em análise), a reposição automática da tributação regra.
Assim, face ao acima exposto, entende este Tribunal Arbitral que o estatuído no n.º 16 do artigo 236.º do Regime Transitório, aplicado em conjugação com o disposto no nº 15º do mesmo artigo em nada altera a substância ou requisitos de aplicabilidade das isenções estabelecidas pelo artigo 8.º, n.º 7 e n.º 8 do regime especial aplicável aos FIIAH e às SIIAH, no que diz respeito às liquidações em crise.
Nestes termos, tendo em consideração as conclusões decorrentes da análise acima apresentada, entende o Tribunal que será negativa a resposta a dar à questão colocada no ponto 6.1., supra, ou seja, que as liquidações de IMT e de Imposto do Selo objecto do pedido de pronúncia arbitral não enfermam de qualquer ilegalidade, pelo que deverá ser considerado improcedente o pedido de pronúncia arbitral.”.
Decisão arbitral n.º 689/2015-T
“O facto de a Requerente ter procedido à alienação do prédio que, ao adquirir, declarou iria afetar a fim que lhe permitia fosse reconhecida – como foi – a isenção de IMT e IS, sempre determinaria, ainda que o aditado número 16 não o previsse expressamente, a caducidade de tais isenções, por efeito do disposto no artigo 12.º e no n.º 3 do artigo 14.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (antigo 12.º, n.º 3, na redação do EBF que se encontrava em vigor previamente à republicação do mesmo pelo Decreto-Lei n.º 108/2008, de 26/06), segundo o qual “Quando o benefício fiscal respeite a aquisição de bens destinados à direta realização dos fins dos adquirentes, fica sem efeito se aqueles forem alienados ou lhes for dado outro destino sem autorização do Ministro das Finanças, sem prejuízo das restantes sanções ou de regimes diferentes estabelecidos por lei.”.
A Requerente não alegou nem, por maioria de razão, demonstrou ter obtido a autorização lá prevista, ou qualquer outra circunstância que obstasse a que as concedidas isenções ficassem sem efeito em consequência da alienação.
É por esse motivo que, como supra já adiantamos, entendemos que não coloca no caso em apreço a questão da alegada inconstitucionalidade das disposições aditadas, na medida em que, na parte correspondente à alienação do imóvel, o n.º 16 do artigo 8.º do Regime Jurídico dos FIIAH se limita a reiterar o que já resultava do disposto no Estatuto dos Benefícios Fiscais.
O que, aliás, bem se compreende, atendendo ao ratio da concessão dos benefícios fiscais.
A ratio para atribuição do benefício fiscal em sede de IMT e IS aos FIIAH é, claramente, a sua afetação a arrendamento para habitação permanente - "As aquisições de prédios urbanos ou de frações autónomas de prédios urbanos destinados exclusivamente a arrendamento para habitação permanente, pelos fundos de investimento..." – pelo que a consequência de lhe ser dado diverso destino é a de que a isenção não poderia ter sido concedida, havendo que repor a legalidade, liquidando-se os impostos que, não fosse a declaração de intenção efetuada aquando da aquisição, haveriam de ter sido liquidados.
O que a Requerente reconheceu, tanto mais que é isso mesmo que consta das declarações efetuadas pela própria Requerente para liquidação do IMT e do IS.”.
Decisão arbitral n.º 709/2015-T
“Para cumprimento do disposto na alínea a), do n.° 7, do artigo 8.° do regime especial aplicável aos fundos de investimento imobiliário para arrendamento habitacional (FIIAH) não basta uma intenção declarada na aquisição do imóvel mas antes uma efetiva afetação ao arrendamento para habitação permanente.
Ora, o Requerente não comprova de forma alguma neste processo o preenchimento desse requisito.
[…] Entendemos assim que não está em causa a retroatividade ou não da lei, nem tão pouco existe lesão de expectativas do Requerente ou agravamento da sua posição fiscal. O racional para atribuição de um benefício fiscal em sede de IMT aos FIIAH foi estabelecido claramente desde o início - “As aquisições de prédios urbanos ou de frações autónomas de prédios urbanos destinados exclusivamente a arrendamento para habitação permanente, pelos fundos de investimento...”.
Decisão arbitral n.º 710/2015-T
“E, assim sendo e neste segmento decisório, voltamos a aderir à posição expressa na decisão do CAAD no processo n.° 398/2005 - T, no sentido de que não está sequer em questão um teste de retroactividade da norma aplicada, mas sim o facto de a fracção em apreço ter sido alienada «sem que tenha cumprido o seu destino - afectação ao arrendamento habitacional permanente» e que «alienad[a] que seja [a fracção], esse destino já não pode ser cumprido, pelo que não se cumpriu o requisito estabelecido para que a isenção de IMT seja aplicável» (cit., p. 10).
[...] Assim sendo, e uma vez que as liquidações em crise resultaram de declaração do Requerente, não é sequer preciso alongarmo-nos sobre a correcção das liquidações no que respeita à sua oportunidade. Em qualquer caso, relembre-se que estabelece o n.° 15 do Regime Especial, tal como aditado pela Lei do Orçamento do Estado para 2009 que quando os prédios não tenham sido objecto de contrato de arrendamento no prazo de três anos os benefícios ficam sem efeito, cabendo ao sujeito passivo solicitar à AT, nos trinta dias subsequentes ao termo do referido prazo, a liquidação do respectivo imposto. Ora, como vimos, no caso em apreço houve aquisição e alienação de uma fracção que não chegou a ser afectos a arrendamento para habitação permanente pelo Requerente, pelo que este - como de resto o fez - cabia solicitar a liquidação do respectivo imposto.” [realce nosso].
Decisão arbitral n.º 729/2015-T
“A ratio para atribuição do benefício fiscal em sede de IMT e IS aos FIIAH é, claramente, a sua afetação a arrendamento para habitação permanente— "As aquisições de prédios urbanos ou de frações autónomas de prédios urbanos destinados exclusivamente a arrendamento para habitação permanente, pelos fundos de investimento..." - pelo que a consequência de lhe ser dado diverso destino é a de que a isenção não poderia ter sido concedida, havendo que repor a legalidade, liquidando-se os impostos que, não fosse a declaração de intenção efetuada aquando da aquisição, haveriam de ter sido liquidados.
O que a Requerente reconheceu, tanto mais que é isso mesmo que consta das declarações efetuadas pela própria Requerente para liquidação do IMT e do IS.
Concluindo, a alienação da fraçao sempre determinaria a caducidade da isenção por aplicação do disposto no n.° 3 do artigo 14.° do EBF, não estando, portanto, em causa, na situação sub judice, qualquer aplicação retroativa de norma que venha a introduzir novo regime de caducidade das isenções, tampouco existe lesão de expectativas do Requerente ou agravamento da sua posição fiscal, pelo que entendemos assim que as liquidações de IMT e Imposto de Selo em crise são legais.
Fica, pois, prejudicada a análise da questão suscitada pela Requerente quanto à alegada retroatividade do regime previsto pelo artigo 236.° da Lei do Orçamento de Estado para 2014 na medida em que, como supra ficou demonstrado, os condicionalismos que originaram as liquidações de imposto em crise em nada se relacionam com os aditamentos originados pelo referido artigo, tão só com a alienação do imóvel e consequente afetação a fim diferentes daquele para que foram concedidas as isenções de IMT e de Imposto do Selo.” [realce nosso].
Aqui chegados, entendemos que não está em causa a retroactividade, ou não, da norma aplicada, o que seria o caso, se, a título de exemplo, o imóvel estivesse por um período de 3 anos no fundo sem que ainda tivesse sido afectado ao arrendamento para habitação permanente e, por esse facto, tivesse havido liquidação de IMT.
Ora, no caso em apreço não é disso que se trata.
O prédio em causa foi alienado sem que tenha cumprido o seu destino – afectação ao arrendamento habitacional permanente. Não se trata, pois, de uma questão de prazo. Alienado que seja o prédio, esse destino já não pode ser cumprido, pelo que não se cumpriu o requisito estabelecido para que a isenção de IMT seja aplicável.
Para cumprimento do disposto na alínea a), do n.º 7, do artigo 8.º do regime especial aplicável aos fundos de investimento imobiliário para arrendamento habitacional (FIIAH) não basta uma intenção declarada na aquisição do imóvel mas antes uma efectiva afectação ao arrendamento para habitação permanente.
Ora, a Requerente não comprova de forma alguma neste processo o preenchimento desse requisito.
Entendemos, assim, que não está em causa a retroactividade, ou não, da lei, nem tão pouco existe lesão de expectativas da Requerente ou agravamento da sua posição fiscal.
De facto, o racional para atribuição de um benefício fiscal em sede de IMT aos FIIAH foi estabelecido claramente desde o início – “as aquisições de prédios urbanos ou de fracções autónomas de prédios urbanos destinados exclusivamente a arrendamento para habitação permanente, pelos fundos de investimento (…)”.
Por todo o exposto, é de concluir que as liquidações de IMT e de Imposto do Selo em apreço são legais ao abrigo da alínea a), do n.º 7, do artigo 8.º do regime especial aplicável aos fundos de investimento imobiliário para arrendamento habitacional (FIIAH).
7. DECISÃO
Com os fundamentos expostos, o tribunal arbitral decide julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral, com todas as consequências legais.
8. VALOR DO PROCESSO
Fixa-se o valor do processo em € 10.272,18 (dez mil duzentos e setenta e dois euros e dezoito cêntimos), nos termos do artigo 97.º-A do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT).
9. CUSTAS
Custas a suportar pela Requerente, no montante de € 918,00 (novecentos e dezoito euros), nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, nos termos do n.º 2 do artigo 22.º do RJAT.
Notifique.
Lisboa, 30 de Junho de 2016
O árbitro,
(Hélder Filipe Faustino)
Texto elaborado em computador, nos termos do disposto no n.º 5 do artigo 131.º, do CPC, aplicável por remissão da alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT. A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990.