Processo arbitral n.º 73/2012 - CAAD
Acordam, nestes autos, os juízes-árbitros, Conselheiro Benjamim Silva Rodrigues, presidente, e Prof. Doutor João Sérgio Ribeiro e Prof. Doutor João Catarino, vogais:
A – Relatório
a - … FUND, com direcção efectiva em …, Los Angeles, CA …, com número de contribuinte especial de entidade não residente …, doravante designada por Requerente, requereu, ao abrigo do art.º 10.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 10/2012, de 20 de Janeiro (doravante RJAT), a constituição de tribunal arbitral, em matéria tributária, tendo por objecto a declaração de invalidade, por ilegalidade, do acto de retenção na fonte do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) que incidiu sobre os dividendos resultantes da sua participação no capital da …, SGPS, S.A., postos à sua disposição, em 18 de Maio de 2008, pelo Banco …, S.A. (…), no montante de €7.502.625,00.
b – Como fundamento do seu pedido, a Requerente alegou em síntese que;
1) - O acto de retenção na fonte viola a Convenção entre a República Portuguesa e os Estados Unidos da América para evitar a dupla tributação em matéria de Impostos sobre o Rendimento e o Património (doravante, Convenção), porquanto foi aplicada, nele, a taxa interna de 20% em vez da taxa de 15%, estabelecida na Convenção;
-
depois da prática do acto de retenção na fonte apresentou um pedido de reembolso parcial, ao abrigo do disposto no n.º 7 do art.º 90.º-A do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC), através do formulário 22-RFI (pedido de reembolso do imposto português sobre dividendos de acções e juros de valores mobiliários representativos de dívida, efectuado ao abrigo da convenção para evitar a dupla tributação entre Portugal e os EUA), o qual foi objecto de um projecto de decisão no sentido do seu indeferimento, do qual que foi notificada em 29 de Junho de 2009;
-
entretanto, apresentou, também, à Direcção-Geral dos Impostos um pedido para promoção da revisão oficiosa do referido acto de retenção na fonte, ao abrigo do disposto no art.º 78.º, n.º 1, 2.ª parte da Lei Geral Tributária (LGT), sobre o qual já se verificou a presunção de indeferimento tácito para efeitos do disposto no artigo 102.º, n.º 1, alínea d), do Código de Procedimento e de Processo Tributário (ex vi artigo 10.º, n.º 1, alínea a), do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro), já que não foi notificada de decisão que sobre ele tenha recaído.
c – A Autoridade Tributária e Aduaneira respondeu alegando, desde logo, que, ao contrário do alegado pela Requerente sobre a presunção de indeferimento, o pedido de revisão oficiosa do acto tributário havia sido expressamente indeferido por despacho da Senhora Subdirectora-Geral dos Impostos, com poderes delegados na área dos impostos sobre o rendimento, de 25.05.2012.
Por outro lado, sustentou a sua absolvição da instância e, subsidiariamente, a improcedência do pedido.
Com o primeiro sentido, a Requerida afirma que:
- dirigindo-se o pedido à declaração de ilegalidade do acto de retenção na fonte e consequente anulação parcial, essa impugnação directa do acto de retenção na fonte estará prejudicada, quer pela manifesta intempestividade do pedido (o acto data do ano de 2007), quer pela não apresentação da prévia e necessária reclamação graciosa a que alude o disposto no art.º 132.º do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT);
- considerada a pretensão arbitral sem a subordinação a esta exigência, a sua apreciação está afastada do âmbito das matérias susceptíveis de serem sujeitas a arbitragem (art.º 2.º, alínea a), da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março;
- olhada a pretensão de anulação do acto de retenção na fonte enquanto efeito decorrente da impugnação da decisão de indeferimento do seu pedido de revisão oficiosa, é questionável que o âmbito de competência dos Tribunais Arbitrais, nos termos da alínea a) do n.º 1 do art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 10/2010, contemple a possibilidade de sindicância dos actos de indeferimento de pedidos de revisão oficiosa, pois que a conclusão a tirar do facto de o legislador desse Diploma não a ter consagrado expressamente terá de ser a de que ela não foi pretendida, até porque a lei de autorização (art.º 124.º, n.º 4, alínea a), da Lei n.º 3-B/2010, de 20 de Abril) abria a possibilidade de a mesma ter lugar;
- tendo sido proferida decisão de indeferimento expresso do pedido de revisão oficiosa, a pretensão da Requerente tem de ser analisada em função desse acto e não da presunção de indeferimento;
ora, analisados os termos em que esta decisão se mostra fundamentada, verifica-se que ela se abonou no facto de considerar, por um lado, a manifesta intempestividade do pedido no que concerne ao disposto na primeira parte do art.º 78.º da LGT, e, por outro lado, no não preenchimento dos pressupostos procedimentais dos quais a lei faz depender a concretização da revisão, no que importa à falta de erro imputável aos serviços;
- a impugnação dos fundamentos de uma tal decisão expressa, que não comporta a apreciação do acto de liquidação, apenas é possível, enquanto acto administrativo em matéria tributável, em sede de acção administrativa especial, de acordo com o art.º 97.º, n.º 1, alínea p), e n.º 2 do CPPT e esta acção está fora do âmbito das matérias susceptíveis de apreciação em sede arbitral, como decorre do art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 10/2010 quando confrontado com a lei de autorização.
Com o sentido da improcedência do pedido, a Requerida alega, em suma, que a decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa do acto de retenção na fonte assentou, também, na consideração de que, no caso, não ocorrera qualquer erro imputável aos serviços que fundamentasse legalmente a revisão, porquanto, sendo o acto revidendo praticado não pela administração tributária, mas pelo substituto tributário, a susceptibilidade de ser imputado o erro do acto de retenção na fonte à administração dependia de esta se ter pronunciado sobre a matéria, em sede de impugnação administrativa em que essa ilegalidade haja sido questionada e que tal não aconteceu, pois não pode haver-se como equivalendo-se a tal meio de impugnação a apresentação do pedido de restituição efectuado com a apresentação do modelo 14-RFI, ao abrigo do então n.º 7 do art.º 90.º-A, do CIRC.
Por outro lado, não é exacta a afirmação da Requerente de que o Banco … procedeu à retenção na fonte à taxa de 20% “por não ter sido apresentada a declaração referida no ponto 3.2. da Circular n.º 6/2009, da Direcção de Serviços Internacionais, porquanto o acto de retenção é de data anterior”.
d – A Requerente respondeu às excepções deduzidas pela Requerida, pugnando pela sua improcedência.
No que concerne à excepção de competência do tribunal arbitral, a Requerente argumenta, em resumo, que o que resulta do convocado art.º 2.º, alínea a), da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, é que os tribunais arbitrais não possam conhecer da impugnação directa de actos de retenção na fonte sem que essa impugnação judicial haja sido precedida de reclamação graciosa para a administração tributária, e não que os tribunais arbitrais não possam conhecer dos pedidos de impugnação dos actos de indeferimento de pedidos de revisão oficiosa dos actos de retenção na fonte, efectuados ao abrigo do art.º 78.º da LGT, pois que, neste caso, a possibilidade de apreciação, pela administração tributária, da ilegalidade dos actos tributários própria do procedimento da reclamação graciosa, pode ocorrer, igualmente, no procedimento de revisão oficiosa, precisamente porque se trata de um procedimento dirigido à apreciação da administração.
No que respeita à alegada excepção de erro na forma do processo, a Requerente defende que, tendo ela pretendido sindicar apenas a decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa do acto tributário de retenção na fonte; tendo este procedimento de revisão por objecto o acto tributário e sendo o processo de impugnação judicial a forma de processo adequada para impugnar essa decisão, não pode deixar de considerar-se o processo arbitral tributário como sendo, também, o processo adequado, por este ser um processo alternativo da impugnação judicial.
e – Na reunião realizada nos termos do art.º 18.º do RJAT, o Tribunal Arbitral decidiu facultar à Requerente o exercício do direito de resposta, ao abrigo do qual foi apresentado o articulado acabado de referir, e possibilitar às partes a formulação de alegações escritas sobre a causa.
f – Apenas a Requerida exerceu esse direito processual, continuando a defender a sua absolvição da instância com base nas excepções antes alegadas e, subsidiariamente, a improcedência do pedido por não se verificarem os pressupostos estabelecidos no art.º 78.º, n.º 1, da LGT, quer no tocante à tempestividade do pedido de revisão, quer no que importa à exigência de o acto revidendo resultar de erro imputável aos serviços.
B – Fundamentação
1 – A primeira questão a decidir, nestes autos, é a de saber qual é o acto administrativo-tributário que é objecto do processo arbitral ou cuja anulação a Requerente intenta conseguir.
Trata-se, na verdade, de uma questão cuja resolução precede todas as demais, por todas estas, incluindo as excepções de incompetência material do Tribunal Arbitral e do erro na forma do processo, dependerem da determinação e natureza do concreto acto que é objecto do processo.
Ora, a análise do requerimento inicial dirigido ao Tribunal Arbitral não deixa quaisquer dúvidas de que a Requerente afronta a legalidade do acto de indeferimento tácito do pedido de revisão do acto de retenção na fonte do IRC relativo ao ano de 2007, pretendendo que esse acto de indeferimento seja anulado e, decorrentemente, também anulado o acto de liquidação do imposto efectuado a título de retenção na fonte sobre o qual aquele acto decidiu.
E porque já na pendência do processo arbitral, o qual deu entrada, em 10.05.2012, foi proferida, em 25.05.2012, pela Sudirectora-Geral dos Impostos, decisão expressa de indeferimento, passou o processo arbitral, em alteração legal da instância, a ter como seu objecto imediato este acto de indeferimento expresso do pedido de revisão oficiosa, nos termos do art.º 70.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, aplicável subsidiariamente nos termos do art.º 29.º, n.º 1, alínea c), do RJTA.
Embora alegada, pela Requerente, a apresentação à administração tributária de um pedido de reembolso parcial de imposto pago, o certo é que ela não formulou qualquer pedido relativamente a esse acto.
Se dúvidas houvesse quanto ao objecto deste processo arbitral, elas tinham de ter-se por completamente dissipadas com a alegação pela Requerente, na Resposta às excepções deduzidas pela AT, de que “não foi formulado, nesta sede, qualquer pedido anulatório [do acto incidente sobre o pedido de reembolso] (não constituindo tal decisão, consequentemente, objecto dos presentes autos).
Em face desta definição do objecto do processo ficam prejudicadas as questões que se deixaram referidas que a Requerida colocou no pressuposto de se estar perante uma impugnação directa do acto de retenção na fonte – de intempestividade e de inimpugnabilidade por falta de atempada reclamação graciosa e de incompetência do tribunal para conhecer da impugnação directa do acto de retenção na fonte sem precedência de reclamação.
2 – As demais questões a decidir nestes autos foram já abordadas em casos paralelos, conhecidos em outros processos arbitrais julgados no âmbito do CAAD, nomeadamente nos Processos n.ºs 48/2012 e 50/2012, mediante decisões arbitrais proferidas, respectivamente, em 06/07/2012 e 12/07/2012, disponíveis em www.caad.org.pt/jurisprudência tributária.
3 – A matéria de facto relevante para conhecer de tais questões é a seguinte:
a) Em 15 de Maio de 2007, a …, SGPS distribuiu à Requerente dividendos no montante de € 7.502.625,00 (doc. n.º 5 e art.º 6.º do requerimento inicial e 58.º da resposta);
b) Na mesma data, o Banco …, na qualidade de substituto tributário, procedeu à retenção na fonte de Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Colectivas (IRC), no montante de € 1.500.525,00, que incidiu sobre os dividendos colocados à disposição da Requerente pela ..., SGPS (doc. n.º 5 e art.º 8.º do requerimento inicial e 60.º da resposta);
c) Em 18 de Abril de 2008, a Requerente apresentou um pedido de recuperação parcial de imposto retido sobre o pagamento de dividendos relativamente à Requerente, juntando ao requerimento o formulário Modelo 22-RFI, designado por “pedido de reembolso do imposto português sobre dividendos de acções e juros de valores mobiliários representativos de dívida, efectuado ao abrigo de convenção para evitar a dupla tributação entre Portugal e EUA” (doc. n.º 5, art.ºs 9 e 10.º do requerimento inicial e 61.º e 62.º da resposta da AT);
d) Em 18 de Agosto de 2011, a Requerente apresentou à administração tributária um pedido de revisão oficiosa do “acto de retenção na fonte sobre dividendos distribuídos em 18 de Maio de 2007 pela sociedade …, SGPS, S.A., (doravante “...”), com referência às acções detidas à data pelo …, nos termos do n.º 1 do art.º 78.º da Lei Geral Tributária”;
e) Sobre o pedido de revisão oficiosa, foi emitido pela Direcção de Serviços das Relações Internacionais da Direcção-Geral de Impostos o parecer n.º …/2011, de 21 de Outubro, que consta do processo administrativo apenso, cujo teor se dá como reproduzido, em que, depois de se transcrever o art. 78.º da LGT, se refere o seguinte, além do mais:
“6. Verificamos, assim, que, nos termos do disposto no n.º 1 deste preceito a revisão oficiosa a pedido do sujeito passivo apenas pode ser efectuada desde que seja pedida por este no prazo de reclamação administrativa e com fundamento em qualquer ilegalidade.
7. Ora, no presente caso, de facto a requerente invoca ilegalidade na retenção de IRC no ano de 2007, uma vez que entende que, por força do disposto na CDT celebrada por Portugal e os Estados Unidos da América, o imposto retido não poderia exceder 15% do montante bruto dos dividendos e foi-lhe retida a quantia correspondente a 20% dos mesmos dividendos.
8. No entanto, o seu pedido foi formulado para além do prazo de reclamação graciosa e mesmo do procedimento especial previsto no artigo 98º do Código do IRC.
9. De facto, o prazo para a apresentação de pedido de reclamação graciosa é de 2 anos a contar da data em que foi efectuada a retenção na fonte, conforme o determinado no artigo 132º do CPPT.
10. O mesmo prazo encontra-se previsto para o pedido de reembolso no caso de ter sido aplicada uma taxa superior à prevista numa convenção celebrada por Portugal para evitar a dupla tributação, conforme consta do n.º 7 do artigo 98º do Código do IRC.
11. Ora, no presente caso, a retenção na fonte ocorreu na data da distribuição dos dividendos, ou seja, 15 de Maio de 2007.
12. Por seu lado, o requerimento deu entrada nos serviços da DGCI a 11 de Agosto de 2011, por isso já para além dos 2 anos previstos quer no artigo 132º do CPPT, quer no n.º 7 do artigo
13. Assim, sendo, o presente pedido de revisão oficiosa não pode ser aceite com base na primeira parte do n.º 1 do artigo 78º da LGT.
III – DO PEDIDO DE REVISÃO OFICOSA E SEU ENQUADRAMENTO NA SEGUNDA PARTE DO Nº 1 DO ARTIGO 78º DA LGT
14. Relativamente à 2.ª parte do mesmo preceito legal, constatamos que a revisa oficiosa pode ser efectuada por iniciativa da administração no prazo de 4 anos após a liquidação, ou a todo o tempo se o imposto ainda não estiver pago, mas desde que se constate que tenha havido erro imputável aos serviços.
15. Ora, no presente caso, a retenção na fonte cuja revisão oficiosa é solicitada pela requerente, resultou da normal aplicação das regras de liquidação de tributação de dividendos distribuídos ou postos à disposição de entidades não residentes por sociedades residentes em território português.
16. É certo que a sujeito passivo invoca, agora, que poderia beneficiar do disposto no n.º 2 do artigo 10º da Convenção para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, aprovada pela Resolução da Assembleia da Republica n.º 39/95, e publicada no Diário da Republica, I Série A, n.º 236/95, de 12 de Outubro, e cujo Aviso de troca de instrumentos de ratificação foi publicado no Diário da República I Série A, n.º 7 de 9 de Janeiro de 1996 (CDT EUA) caso tivesse apresentado a documentação comprovativa de que estavam reunidos os pressupostos de aplicação daquela norma convencional, o que não aconteceu.
17. Tal como continua a não acontecer, uma vez que continua a não apresentar a documentação necessária para se aferir dessa aplicabilidade ou não, nomeadamente os documentos referidos na Circular n.º 6/2009, de 6 de Abril, ou seja, a certificação de residência e a declaração de que reúne os requisitos exigidos pelo artigo 17º da CDT EUA conjugado com o n.º 3 do Protocolo anexo à mesma convenção.
18. Não existe, por isso, qualquer erro que possa ser imputável aos serviços. Se existiu erro no momento em que se processou a retenção na fonte, o mesmo ficou a dever-se à falta de prova apresentada pela requerente.
19. Para além disso, há que levar em linha de conta que o pedido de revisão oficiosa deu entrada nesta direcção de serviços já depois de decorridos mais de quatro anos sobre a data da distribuição dos dividendos (a data da distribuição foi 15 de Maio de 2007 e a data do pedido é de 11 de Agosto de 2011).
20. Nestes termos, afigura-se-nos ser de indeferir o presente pedido de revisão oficiosa da liquidação de IRC relativo a retenção na fonte efectuada sobre os dividendos distribuídos em 15 de Maio de 2007, pela empresa portuguesa ..., SGPS, SA, por falta de suporte legal conforme as conclusões do presente parecer”.
f) A Requerente foi notificada para se pronunciar sobre o parecer referido na alínea e), no exercício do direito de audição (processo administrativo apenso);
g) Na sequência do referido na alínea f), a Direcção de Serviços das Relações Internacionais da Direcção-Geral de Impostos emitiu a informação n.º …/2011, que consta do processo administrativo apenso, cujo teor se dá como reproduzido, da qual consta, além do mais, o seguinte:
“II – DA ANÁLISE DO PEDIDO E PROPOSTA DE DECISÃO
4. O processo foi objecto de análise pelo nosso Parecer n.º …/2011, de 21 de Outubro último, tendo concluído que o presente pedido de revisão oficiosa não tinha enquadramento nem na norma invocada pelo requerente, o n.º 1 do artigo 78° da LGT, nem em qualquer outra norma do citado artigo 78° da LGT.
5. Perante essa constatação, foi por nós proposto o indeferimento do pedido de revisão oficiosa da retenção na fonte do IRC efectuada aquando da distribuição de dividendos pela empresa portuguesa em 15 de Maio de 2007.
6. A nossa proposta mereceu a concordância do Sr. Director de Serviços das Relações Internacionais que, por despacho de 24 de Outubro último, determinou a notificação da requerente para efeitos do exercício do direito de participação na decisão previsto no artigo 60° da LGT.
7. O prazo concedido pelo referido despacho para a resposta da requerente foi de 15 dias.
8. A requerente foi notificada, na pessoa do seu representante, para efeitos do exercício do direito de participação na decisão através da audição prévia pelo nosso ofício n.º …, de 24 de Outubro último.
III – DO EXERCÍCIO DO DIREITO DE PARTICIPAÇÃO NA DECISÃO
9. A requerente veio exercer o seu direito de participação na decisão através de resposta recebida nesta direcção de serviços a 16 do corrente mês.
10. Na sua resposta, a requerente vem alegar, em primeiro lugar, o seu direito a poder utilizar a figura da revisão oficiosa para obter o reembolso da importância em causa.
11. Alega, ainda, que a revisão, embora oficiosa, pode ser solicitada pelo próprio sujeito passivo, dispondo, para tanto do prazo previsto de 4 anos para o efeito, independentemente do decurso ou não de outros prazos, nomeadamente dos de reclamação graciosa.
12. Alega, por último que a forma de contagem do prazo de 4 anos não ocorre desde a data em que foi efectuada a retenção na fonte, mas do final do ano em que esta ocorreu.
IV- DA ANÁLISE DOS ARGUMENTOS DA RESPOSTA DADA NO EXERCÍCIO DO DIREITO DE PARTICIPAÇÃO
13. Relativamente à questão da possibilidade de utilização do prazo de 4 anos para efeitos do pedido de revisão oficiosa, não foi por nós afastada essa hipótese na proposta de indeferimento efectuada no nosso Parecer n.º …/2011, de 21 de Outubro último.
14. De facto, alegámos nós que a 2.ª parte do n.º 1 do art.º 78.º da LGT previa que a revisão oficiosa podia ser efectuada por iniciativa da administração no prazo de 4 anos após a liquidação, ou a todo o tempo se o imposto ainda não estivesse pago, mas desde que se constatasse que tinha havido erro imputável aos serviços.
15. Mais concluímos, no entanto que, para aplicação deste prazo é necessário que estejam verificados os pressupostos referidos na norma legal.
16. Este prazo não se aplica à verificação de outros pressupostos diferentes dos previstos na 2.ª parte do n.º 1 do art.º 78.º da LGT.
17. Ora, da análise que efectuamos ao caso concreto concluímos que a retenção na fonte cuja revisão oficiosa era solicitada pela requerente, resultava da normal aplicação das regras de liquidação de tributação de dividendos distribuídos ou postos à disposição de entidades não residentes por sociedades residentes em território português.
18. E que, pese embora o sujeito passivo ter invocado que poderia beneficiar do disposto no n.º 2 do art.º 10.º da Convenção para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, aprovada pela Resoluação da Assembelai da República n.º 39/95, e publicada no Diário da república, I Série A, n.º 236/95, de 12 de Outubro, e cujo Aviso de troca de instrumentos de ratificação foi publicado no Diário da República I Série A, n.º 7 de 9 de Janeiro de 1996 (CDT EUA) caso tivesse apresentado a documentação comprovativa de que estavam reunidos os pressupostos de aplicação daquela norma convencional, o que era certo é que não o tinha feito.
19. Concluindo, assim que não existia qualquer erro que pudesse ser imputado aos serviços. Se existia erro no momento em que se processou a retenção na fonte, o mesmo ficava a dever-se à falta de prova apresentada pela requerente.
V – DA PROPOSTA DE DECISÃO FINAL
10. Assim, atento a fundamentação expressa no nosso Parecer n.º …/2011, de 21 de Outubro último, complementada com as conclusões do presente parecer, afigura-se nos ser de concluir que não existe fundamento legal para se proceder à revisão oficiosa apresentado pela requerente, pelo que deve ser o mesmo ser indeferido nos termos propostos”.
h) Na 1.ª página do parecer referido na alínea g), o Director de Serviços das Relações Internacionais, proferiu despacho com o seguinte teor:
“Confirmo. Com efeito, sendo manifesta a extemporaneidade do pedido face ao prazo previsto na 1.ª parte do n.º 1 do art.º 78.º da LGT e perante a inexistência de erro imputável aos serviços, uma vez que em causa está o ato de retenção na fonte praticado pela entidade pagadora dos rendimentos, não pode a pretensão da requerente obter vencimento.
É que, contrariamente ao que acontece com a autoliquidação cujos erros se consideram imputáveis aos serviços (n.º 2 do citado art.º 78.º), não existe norma que estabeleça idêntica equiparação quanto a eventuais erros cometidos nos atos de retenção na fonte.
Nesta conformidade sou de parecer que é de indeferir o pedido como vem proposto.
À consideração superior”.
i) Com data de 25.05.2012, a Subdirectora-Geral proferiu, com invocação de delegação de competência, despacho do seguinte teor:
“Indefiro o pedido de revisão oficiosa com os fundamentos invocados na informação e no parecer do Sr. Chefe de Divisão”.
j) O pedido de reembolso, a que alude a alínea c), foi indeferido por despacho da Directora de Serviços das Relações Internacionais de 31.07.2009, notificado à requerente pelo ofício, da mesma data, com o n.º … (articulado de resposta da AT).
4 – Factos não provados:
a) Não se provou que o Banco…, conhecesse, quando procedeu à retenção na fonte, os factos que a Requerente afirma nos artigos 2.º, 3.º, 4.º e 8.º do pedido de constituição do tribunal arbitral, de 99,81% das unidades de participação que refere serem detidas por investidores residentes nos EUA; a razão por que não se dão como provados tais factos é não se ter produzido ou apresentado qualquer prova de que o alegado conhecimento existisse, designadamente que tivesse sido apresentado àquele substituto tributário qualquer documento sobre tal matéria;
b) Não se provou que o referido substituto tributário tivesse procedido à retenção na fonte de IRC à taxa de 20%, por «não ter sido apresentada a declaração referida no ponto 3.2. da Circular n.º 6/2009, da Direcção de Serviços das Relações Internacionais» como a Requerente alega no art. 8.º do pedido de constituição do tribunal arbitral; a razão por que tal facto não se dá como provado é a referida Circular em que se exige tal declaração ter sido emitida em 06 de Abril de 2009, depois da retenção na fonte, que foi efectuada em 18 de Maio de 2007.
5 – Sobre questões idênticas às que resta conhecer neste processo discreteou-se no referido Acórdão do Tribunal Arbitral, proferido no Proc. n.º 48/2012, de 6 de Julho de 2012, do seguinte jeito:
“4 – A competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD é, em primeiro lugar, limitada às matérias indicadas no art. 2.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (RJAT).
Numa segunda linha, a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD é também limitada pelos termos em que Administração Tributária se vinculou àquela jurisdição, concretizados na Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, pois o art. 4.º do RJAT estabelece que «a vinculação da administração tributária à jurisdição dos tribunais constituídos nos termos da presente lei depende de portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça, que estabelece, designadamente, o tipo e o valor máximo dos litígios abrangidos».
Em face desta segunda limitação da competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, a resolução da questão da competência depende essencialmente dos termos desta vinculação, pois, mesmo que se esteja perante uma situação enquadrável naquele art. 2.º do RJAT, se ela não estiver abrangida pela vinculação estará afastada a possibilidade de o litígio ser jurisdicionalmente decidido por este Tribunal Arbitral.
Na alínea a) do art. 2.º desta Portaria n.º 112-A/2011, excluem-se expressamente do âmbito da vinculação da Administração Tributária à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD as «pretensões relativas à declaração de ilegalidade de actos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário».
A referência expressa ao precedente «recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário», deve ser interpretada como reportando-se aos casos em que tal recurso é obrigatório, através da reclamação graciosa, que é o meio administrativo indicado naqueles arts. 131.º a 133.º do CPPT, para que cujos termos se remete. Na verdade, desde logo, não se compreenderia que, não sendo necessária a impugnação administrativa prévia «quando o seu fundamento for exclusivamente matéria de direito e a autoliquidação tiver sido efectuada de acordo com orientações genéricas emitidas pela administração tributária» (art. 131.º, n.º 3, do CPPT, aplicável aos casos de retenção na fonte, por força do disposto no n.º 6 do art. 132.º do mesmo Código), se fosse afastar a jurisdição arbitral por essa impugnação administrativa, que se entende ser desnecessária, não ter sido efectuada.
Mas, a impugnação directa do acto de retenção na fonte só pode fazer-se sem prévia reclamação graciosa nos referidos casos em que o tiver sido efectuada «de acordo com orientações genéricas emitidas pela administração tributária, como resulta do preceituado naqueles arts. 132.º, n.º 6, e 131.º, n.º 3, do CPPT. No caso em apreço, não se está perante uma situação deste tipo, não sendo mesmo alegado que a Administração Tributária tivesse emitido orientações no sentido de a retenção ter sido efectuada nos termos em que foi, pelo que tem de concluir-se que a impugnação do acto de retenção na fonte estava dependente de prévia reclamação graciosa.
Assim, não tendo havido prévia reclamação graciosa, a pretensão de declaração directa da ilegalidade do acto de retenção na fonte (sem ser corolário da ilegalidade do acto de indeferimento da revisão oficiosa) está afastada da competência deste Tribunal Arbitral, por a Administração Tributária ter expressamente excluído tais pretensões do âmbito da sua vinculação à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD.
Assim, não tendo havido prévia reclamação graciosa, a pretensão de declaração directa da ilegalidade do acto de retenção na fonte (sem ser corolário da ilegalidade do acto de indeferimento da revisão oficiosa) está afastada da competência deste Tribunal Arbitral, por a Administração Tributária ter expressamente excluído tais pretensões do âmbito da sua vinculação à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD.
Por isso, procede a excepção da incompetência no que concerne à pretensão da Requerente, interpretada como impugnação directa do acto de retenção na fonte, pelo que fica prejudicado o conhecimento da questão da intempestividade dessa pretensão, que também é colocada pela Autoridade Tributária e Aduaneira.
5 – No entanto, como se referiu, tem de ser apreciada também a questão da competência deste Tribunal Arbitral para apreciar a legalidade do acto de indeferimento do pedido de revisão oficiosa.
Como se refere no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 12-6-2006, proferido no processo n.º 402/06, o dever de proceder à revisão oficiosa de actos de liquidação constitui um reconhecimento, no âmbito do direito tributário, do dever de revogar de actos ilegais, que é corolário dos princípios da justiça, da igualdade e da legalidade, que a administração tributária tem de observar na globalidade da sua actividade (art. 266.º, n.º 2, da CRP e 55.º da LGT), que impõem, como regra, que sejam oficiosamente corrigidos todos os erros das liquidações que tenham conduzido à arrecadação de tributo em montante superior ao que seria devido à face da lei (1).
Porém, como se refere no mesmo acórdão, este dever «sofre limitações, justificadas por necessidades de segurança jurídica, designadamente quando as receitas liquidadas foram arrecadadas, o que justifica que sejam estabelecidas limitações temporais».
A revisão do acto tributário «constitui um meio administrativo de correcção de erros de actos de liquidação de tributos, que é admitido como complemento dos meios de impugnação administrativa e contenciosa desses actos, a deduzir nos prazos normais respectivos, que tem em vista possibilitar sanar injustiças de tributação tanto a favor do contribuinte como a favor da administração». «No entanto, não é indiferente para o contribuinte impugnar ou não os actos de liquidação dentro dos respectivos prazos, pois em caso de anulação em processo impugnatório, judicial ou administrativo, pode ser invocada qualquer ilegalidade e há direito a juros indemnizatórios desde a data do pagamento indevido até à emissão da nota de crédito (arts. 43.º, n.º 1, da LGT e 61.º, n.º 3, do CPPT), enquanto nos casos de revisão oficiosa da liquidação (quando não é feita a pedido do contribuinte, no prazo da reclamação administrativa, situação que é equiparável à de reclamação graciosa) apenas há direito a juros indemnizatórios nos termos do art. 43.º, n.º 3, da LGT e a anulação apenas pode ter por fundamento erro imputável aos serviços e duplicação de colecta (art.78.º, n.ºs 1 e 6, da LGT)». «Essencialmente, o regime do art. 78.º, quando o pedido de revisão é formulado para além dos prazos de impugnação administrativa e contenciosa, reconduz-se a um meio de restituição do indevidamente pago, com revogação e cessação para o futuro dos efeitos do acto de liquidação, e não a um meio anulatório, com destruição retroactiva dos efeitos do acto». «A esta luz, o meio procedimental de revisão do acto tributário não pode ser considerado como um meio excepcional para reagir contra as consequências de um acto de liquidação, mas sim como um meio alternativo dos meios impugnatórios administrativos e contenciosos (quando for usado em momento em que aqueles ainda podem ser utilizados) ou complementar deles (quando já estiverem esgotados os prazos para utilização dos meios impugnatórios do acto de liquidação).
Esta restrição dos poderes de revogação de actos no âmbito do procedimento de revisão do acto tributário, quando o pedido não é apresentado dentro dos prazos de impugnação judicial e reclamação graciosa de actos de liquidação de tributos, não é materialmente inconstitucional, designadamente à face do art. 266.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, pois a preclusão de direitos impugnatórios pelo seu não exercício tempestivo é justificada por razões de segurança jurídica, que também é um valor constitucional, de importância primacial, sendo corolário do princípio do Estado de Direito democrático (art. 2.º da Constituição da República Portuguesa). Por outro lado, a limitação dos poderes de revisão aos casos de erro imputável aos serviços, constitui uma solução equilibrada, apresentando-se como resultado de uma justa e adequada ponderação das actuações da Administração Tributária, censurável apenas nos casos em que praticou um erro a si mesma imputável, e do sujeito passivo do tributo, cuja situação deixa de merecer protecção jurídica ou merece menor protecção quando, por negligência sua, deixou passar os prazos de impugnação de actos.
Por isso, não é inconstitucional o regime de revisão do acto tributário previsto no art. 78.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária, ao limitar o fundamento de revisão ao erro imputável aos serviços, nos casos em que o pedido não é apresentado no prazo da reclamação administrativa, designadamente, no da reclamação graciosa dos actos de retenção na fonte, previsto no art. 132.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
6 – Na apreciação das questões atinentes ao pedido de revisão oficiosa do acto de retenção na fonte, importa, antes de mais, esclarecer se a apreciação de actos de indeferimento de pedidos de revisão do acto tributário, previstos no art. 78.º da LGT, se inclui nas competências atribuídas aos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD pelo art. 2.º do RJAT.
Na verdade, neste art. 2.º não se faz qualquer referência expressa a estes actos, ao contrário do que sucede com a autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, que refere os «pedidos de revisão de actos tributários» e «os actos administrativos que comportem a apreciação da legalidade de actos de liquidação». No entanto, a fórmula «declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta», utilizada na alínea a) do n.º 1 do art. 2.º do RJAT, numa mera interpretação declarativa, não restringe o âmbito da jurisdição arbitral aos casos em que é impugnado directamente um acto de um daqueles tipos. Na verdade, a ilegalidade de actos de liquidação pode ser declarada jurisdicionalmente como corolário da ilegalidade de um acto de segundo grau, que confirme um acto de liquidação, incorporando a sua ilegalidade. A inclusão nas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD dos casos em que a declaração de ilegalidade dos actos aí indicados é efectuada através da declaração de ilegalidade de actos de segundo grau, que são o objecto imediato da pretensão impugnatória, resulta com segurança da referência que naquela norma é feita aos actos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta, que expressamente se referem como incluídos entre as competências dos tribunais arbitrais. Com efeito, relativamente a estes actos é imposta, como regra, a reclamação graciosa necessária, nos arts. 131.º a 133.º do CPPT, pelo que, nestes casos, o objecto imediato do processo impugnatório é, em regra, o acto de segundo grau que aprecia a legalidade do acto de liquidação, acto aquele que, se o confirma, tem de ser anulado para se obter a declaração de ilegalidade do acto de liquidação. A referência que na alínea a) do n.º 1 do art. 10.º do RJAT se faz ao n.º 2 do art. 102.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, em que se prevê a impugnação de actos de indeferimento de reclamações graciosas, desfaz quaisquer dúvidas de que se abrangem nas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD os casos em que a declaração de ilegalidade dos actos referidos na alínea a) daquele art. 2.º do RJAT tem de ser obtida na sequência da declaração da ilegalidade de actos de segundo grau. Aliás, foi precisamente neste sentido que a Administração Tributária, através da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, interpretou estas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, ao afastar do âmbito dessas competências as «pretensões relativas à declaração de ilegalidade de actos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário», o que tem como alcance restringir a sua vinculação os casos em que esse recurso à via administrativa foi utilizado.
Obtida a conclusão de que a fórmula utilizada na alínea a) do n.º 1 do art. 2.º do RJAT não exclui os casos em que a declaração de ilegalidade resulta da ilegalidade de um acto de segundo grau, ela abrangerá também os casos em que o acto de segundo grau é o de indeferimento de pedido de revisão do acto tributário, pois não se vê qualquer razão para restringir, tanto mais que, nos casos em que o pedido de revisão é efectuado no prazo da reclamação administrativa, ele deve ser equiparado a uma reclamação graciosa (2). Conclui se, assim, que não há obstáculo a que a declaração de ilegalidade de actos de retenção na fonte seja obtida, em processo arbitral, através da declaração de ilegalidade de actos de indeferimento de pedidos de revisão oficiosa”.
7 – Passar-se-á a analisar a questão de saber se, em relação a pretensões de declaração de ilegalidade de actos de retenção através da declaração de ilegalidade de actos de indeferimento de pedidos de revisão oficiosa, é exigível a reclamação graciosa prévia, pela alínea a) do art. 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março. Como já se referiu, a referência feita nesta norma ao «recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário» deve interpretar-se como reportando-se apenas aos casos em que tal recurso, através da reclamação graciosa, (a que, como se referiu, é equiparável o pedido de revisão do acto tributário formulado dentro do prazo de reclamação administrativa) é imposto por aquelas normas do CPPT.
Nos casos em que é formulado um pedido de revisão oficiosa de acto de liquidação é proporcionada à Administração Tributária, com este pedido, uma oportunidade de se pronunciar sobre o mérito da pretensão do sujeito passivo antes de este recorrer à via jurisdicional, não sendo exigível que, cumulativamente com a possibilidade de apreciação administrativa no âmbito desse procedimento de revisão oficiosa, se exija uma nova apreciação administrativa através de reclamação graciosa (3).
Para além disso, se hipoteticamente se pretendesse naquela Portaria, sem justificação plausível, afastar a jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD nos casos em que é formulado um pedido de revisão oficiosa sem prévia reclamação graciosa (criando, assim, uma nova situação de reclamação graciosa necessária privativa desta jurisdição arbitral), não se compreenderia a referência expressa que na alínea a) do art. 2.º da Portaria n.º 112-A/2011 é feita aos «termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário», pois, essa hipotética nova situação de reclamação graciosa necessária não seria exigida «nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário».
Conclui-se assim, que a falta de reclamação graciosa não é obstáculo à apreciação pelos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD de pretensões de declaração de ilegalidade de actos de retenção na fonte que seja corolário da ilegalidade de actos de indeferimento de pedidos de revisão oficiosa.
8 – Mas, a Autoridade Tributária e Aduaneira defende também que está afastada da jurisdição deste Tribunal Arbitral, por não estar abrangida pelo art. 2.º, n.º 1, do RJAT, a apreciação de actos de indeferimento de pedidos de revisão oficiosa que não comportam a apreciação da legalidade de actos de liquidação.
Trata-se de uma questão diferente das abordadas nos pontos 5 e 6 deste acórdão, que se coloca quando está já assente, pelo que aí se disse, que a declaração de ilegalidade de actos de retenção na fonte pode ser obtida, em processo arbitral, através da declaração de ilegalidade de actos de indeferimento de pedidos de revisão oficiosa e que, nestes casos, não é exigida prévia reclamação graciosa.
A questão é, agora, a de saber se se inclui nas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD declarar a ilegalidade de actos de retenção na fonte quando essa ilegalidade não foi apreciada pelo acto que indeferiu o pedido de revisão oficiosa.
No art. 2.º do RJAT, em que se define a «Competência dos tribunais arbitrais», não se inclui expressamente a apreciação de pretensões de declaração de ilegalidade de actos de indeferimento de pedidos de revisão oficiosa de actos tributários, pois, na redacção introduzida pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro (vigente à data da apresentação do pedido de constituição deste Tribunal Arbitral) apenas se indica a competência dos tribunais arbitrais para «a declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta» e «a declaração de ilegalidade de actos de fixação da matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, de actos de determinação da matéria colectável e de actos de fixação de valores patrimoniais».
Porém, o facto de a alínea a) do n.º 1 do art. 10.º do RJAT fazer referência aos n.ºs 1 e 2 do art. 102.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, em que se indicam os vários tipos de actos que dão origem ao prazo de impugnação judicial, inclusivamente a reclamação graciosa, deixa perceber que serão abrangidos no âmbito da jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD todos os tipos de actos passíveis de serem impugnados através processo de impugnação judicial, abrangidos por aqueles n.ºs 1 e 2, desde que tenham por objecto um acto de um dos tipos indicados naquele art. 2.º do RJAT.
Aliás, esta interpretação no sentido da identidade dos campos de aplicação do processo de impugnação judicial e do processo arbitral é a que está em sintonia com a autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, concedida pelo art. 124.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, em que se revela a intenção de o processo arbitral tributário constitua «um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária» (n.º 2).
Mas, este mesmo argumento que se extrai da autorização legislativa conduz à conclusão de que estará afastada a possibilidade de utilização do processo arbitral quando no processo judicial tributário não for utilizável a impugnação judicial ou a acção para reconhecimento de um direito ou interesse legítimo.
Na verdade, sendo este o sentido da referida lei de autorização legislativa e inserindo-se na reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República legislar sobre o «sistema fiscal», inclusivamente as «garantias dos contribuintes» [arts. 103.º, n.º 2, e 165.º, n.º 1, alínea i), da CRP] ( 4 ), e sobre a «organização e competência dos tribunais» [art. 165.º, n.º 1, alínea p), da CRP], não pode o referido art. 2.º do RJAT, sob pena de inconstitucionalidade, por falta de cobertura na lei de autorização legislativa que limita o poder do Governo (art. 112.º, n.º 2, da CRP), ser interpretado como atribuindo aos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD competência para a apreciação da legalidade de outros tipos de actos, para cuja impugnação não são adequados o processo de impugnação judicial e a acção para reconhecimento de um direito ou interesse legítimo.
Assim, para resolver a questão prévia suscitada apela Autoridade Tributária e Aduaneira de saber se o art. 2.º, n.º 1, do RJAT, abrange a apreciação do acto de indeferimento de pedido de revisão oficiosa de acto de retenção na fonte que está em causa neste processo torna-se necessário apurar se a legalidade desse acto de indeferimento podia ou não ser apreciada, num tribunal tributário, através de processo de impugnação judicial ou acção para reconhecimento de um direito ou interesse legítimo.
9 – O acto de indeferimento de um pedido de revisão oficiosa do acto tributário constitui um acto administrativo, à face da definição fornecida pelo art. 120.º do CPA [subsidiariamente aplicável em matéria tributária, por força do disposto no art. 2.º, alínea d), da Lei Geral Tributária, 2.º, alínea d), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, e 29.º, n.º 1, alínea d), do RJAT], pois constitui uma decisão de um órgão da Administração que ao abrigo de normas de direito público visou produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta.
Por outro lado, é também inquestionável que se trata de um acto em matéria tributária pois é feita nele a aplicação de normas de direito tributário.
Assim, aquele acto de indeferimento do pedido de revisão oficiosa constitui um «acto administrativo em matéria tributária».
Das alíneas d) e p) do n.º 1 e do n.º 2 do art. 97.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) infere-se a regra de a impugnação de actos administrativos em matéria tributária ser feita, no processo judicial tributário, através de impugnação judicial ou acção administrativa especial (que sucedeu ao recurso contencioso, nos termos do art. 191.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos) conforme esses actos comportem ou não comportem a apreciação da legalidade de actos administrativos de liquidação (5).
Eventualmente, como excepção a esta regra poderão considerar-se os casos de impugnação de actos de indeferimento de reclamações graciosas, pelo facto de haver uma norma especial, que é o n.º 2 do art. 102.º do CPPT, de que se pode depreender que a impugnação judicial é sempre utilizável (6 ) Outras excepções àquela regra poderão encontrar-se em normas especiais, posteriores ao CPPT, que expressamente prevejam o processo de impugnação judicial como meio para impugnar determinado tipo de actos (7).
Mas, nos casos em que não há normas especiais, é de aplicar aquele critério de repartição dos campos de aplicação do processo de impugnação judicial e da acção administrativa especial.
À face deste critério de repartição dos campos de aplicação do processo de impugnação judicial e da acção administrativa especial, os actos proferidos em procedimentos de revisão oficiosa de actos de retenção na fonte apenas poderão ser impugnados através de processo de impugnação judicial quando comportem a apreciação da legalidade destes actos de retenção. Se o acto de indeferimento do pedido de revisão oficiosa de acto de retenção na fonte não comporta a apreciação da legalidade deste será aplicável a acção administrativa especial (8 ).
Esta constatação de que há sempre um meio impugnatório processual adequado para impugnar contenciosamente o acto de indeferimento do pedido de revisão oficiosa de acto de retenção na fonte, conduz, desde logo, à conclusão de que não se está perante uma situação em que no processo judicial tributário pudesse ser utilizada a acção para reconhecimento de um direito ou interesse legítimo, pois a sua aplicação no contencioso tributário tem natureza residual, uma vez que essas acções «apenas podem ser propostas sempre que esse meio processual for o mais adequado para assegurar uma tutela plena, eficaz e efectiva do direito ou interesse legalmente protegido» (art. 145.º, n.º 3, do CPPT).
Uma outra conclusão que permite a referida delimitação dos campos de aplicação do processo de impugnação judicial e da acção administrativa especial é a de que, restringindo-se a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD ao campo de aplicação do processo de impugnação judicial, apenas se inserem nesta competência os pedidos de declaração de ilegalidade de actos de indeferimento de pedidos de revisão oficiosa de actos de retenção na fonte que comportem a apreciação da legalidade destes actos.
A preocupação legislativa em afastar das competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD a apreciação da legalidade de actos administrativos que não comportem a apreciação da legalidade de actos de liquidação, para além de resultar, desde logo, da directriz genérica de criação de um meio alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para reconhecimento de um direito ou interesse legítimo, resulta com clareza da alínea a) do n.º 4 do art. 124.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, em que se indicam entre os objectos possíveis do processo arbitral tributário «os actos administrativos que comportem a apreciação da legalidade de actos de liquidação», pois esta especificação apenas se pode justificar por uma intenção legislativa no sentido de excluir dos objectos possíveis do processo arbitral a apreciação da legalidade dos actos que não comportem a apreciação da legalidade de actos de liquidação.
Por isso, a solução da questão da competência deste Tribunal Arbitral conexionada com o conteúdo do acto de indeferimento do pedido de revisão oficiosa, depende da análise do acto de indeferimento do pedido de revisão oficiosa.
10 – A Autoridade Tributária e Aduaneira defende que resulta da fundamentação do acto de indeferimento do pedido de revisão, reproduzida na matéria de facto fixada, que o indeferimento se baseou na inadmissibilidade da revisão oficiosa, por não estarem reunidos os requisitos de que o art. 78.º da LGT a faz depender, não se tendo naquele acto apreciado a legalidade do acto de retenção na fonte.
Por isso, entende a Autoridade Tributária e Aduaneira que se estará perante um pedido de declaração de ilegalidade de acto que não comporta a apreciação da legalidade do acto de retenção na fonte e, por isso, a apreciação da sua ilegalidade não se inserirá na competência deste Tribunal Arbitral.
A Requerente defende posição oposta, dizendo, em suma, que
– «a decisão proferida no âmbito do procedimento de revisão oficiosa contém, efectivamente, a apreciação da (i)legalidade do ato de retenção na fonte em causa»;
– «que, no caso concreto, a autoridade tributária não se limitou a indeferir o pedido que lhe foi dirigido com fundamento na sua intempestividade ou na não verificação de outros pressupostos formais»;
– que isso «resulta inequívoco quando, na decisão em causa, se afirma que “[No] presente caso, a retenção na fonte cuja revisão é solicitada pela requerente, resultou da normal aplicação das regras de liquidação de tributação de dividendos distribuídos ou postos à distribuição de entidades não residentes por sociedades residentes em território português";
– «ou, de igual modo, quando se afirma que a ora REQUERENTE “estava obrigada a apresentar a documentação comprovativa de que estavam reunidos os pressupostos de aplicação daquela norma convencional, o que não aconteceu e continua a não acontecer, uma vez que continua a não apresentar a documentação necessária para se aferir dessa aplicabilidade ou não, nomeadamente os documentos referidos na Circular n.º 6/2009, de 6 de Abril, ou seja, a certificação de residência e a declaração de que reúne os requisitos exigidos pelo Artigo 17.° da CDT EUA conjugado com o n.º 3 do Protocolo anexo à mesma convenção."»
– «Dos transcritos excertos da decisão de indeferimento elo pedido de promoção de revisão oficiosa extrai-se, em suma, o juízo segundo o qual o ato de retenção na fonte ai apreciado é legal na medida em que: i) consubstancia a estrita aplicação das normas legais vigentes – com o sentido e alcance que a Administração tributária lhes imprime – e, bem assim, ii) que a REQUERENTE não apresentou os documentos que, segundo a Autoridade tributária, seriam necessários para comprovação dos requisitos de que dependia a aplicabilidade das normas convencionais de atenuação da dupla tributação».
É inequívoco que a parte decisória do despacho de indeferimento do pedido de revisão oficiosa apenas se aprecia a questão da admissibilidade do pedido de revisão oficiosa, afirmando não se estar perante qualquer das situações em que a revisão oficiosa é admitida.
Na verdade, no Parecer n.º …/2011, referido na alínea f) da matéria de facto fixada, termina-se com a seguinte «proposta de decisão»:
Nestes termos, afigura-se-nos ser de indeferir o presente pedido de revisão oficiosa da liquidação de IRC relativo à retenção na fonte efectuada sobre os dividendos distribuídos em … de … de 2008, pela empresa portuguesa …, por falta de suporte legal conforme as conclusões do presente parecer.
No Parecer …/2011, referido na alínea h) da matéria de facto fixada, faz-se a seguinte «proposta de decisão final»:
10. Assim, atento a fundamentação expressa no nosso Parecer n.º …/2011, de … de … último, complementada com as conclusões do presente parecer, afigura-se-nos ser de concluir que não existe fundamento legal para se proceder à revisão oficiosa apresentado pela requerente, pelo que deve ser o mesmo ser indeferido nos termos propostos.
O despacho que recaiu sobre esta última proposta tem o teor «Concordo e indefiro o pedido, nos termos e fundamentos aqui expressos» [alínea i), da matéria de facto fixada], pelo que não pode haver dúvida de que o que se decidiu foi não estarem reunidos os requisitos para proceder à revisão oficiosa.
Porém, no caso em apreço, esta conclusão foi obtida com análise da legalidade do acto de retenção na fonte, designadamente quanto à existência ou não de erro imputável aos serviços, e com uma prévia decisão também sobre essa questão, como se conclui do ponto 18 do Parecer n.º …/2011: «18. Não existe, por isso, qualquer erro que possa ser imputável aos serviços. Se existiu erro no momento em que se processou a retenção na fonte, o mesmo ficou a dever-se à falta de prova apresentada pela requerente».
E, como salienta a Requerente, ao pronunciar-se sobre as questões prévias, esta decisão sobre a inexistência de erro imputável aos serviços baseou-se na análise da legalidade do acto de retenção na fonte, ao dizer-se que:
– «no presente caso, a retenção na fonte cuja revisão oficiosa é solicitada pela requerente, resultou da normal aplicação das regras de liquidação de tributação de dividendos distribuídos ou postos à disposição de entidades não residentes por sociedades residentes em território português» (ponto 14. do Parecer n.º …/2011); e – «é certo que a sujeito passivo invoca, agora, que poderia beneficiar do disposto no n.º 2 do artigo 10.º da Convenção para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, aprovada pela Resolução da Assembleia da Republica n.º 39/95, e publicada no Diário da Republica, I Série A, n.º 236/95, de 12 de Outubro, e cujo Aviso de troca de instrumentos de ratificação foi publicado no Diário da República I Série A, n.º 7 de 9 de Janeiro de 1996 (CDT EUA) caso tivesse apresentado a documentação comprovativa de que estavam reunidos os pressupostos de aplicação daquela norma convencional, o que não aconteceu»; «Tal como continua a não acontecer, uma vez que continua a não apresentar a documentação necessária para se aferir dessa aplicabilidade ou não, nomeadamente os documentos referidos na Circular n.º 6/2009, de 6 de Abril, ou seja, a certificação de residência e a declaração de que reúne os requisitos exigidos pelo artigo 17.º da CDT EUA conjugado com o n.º 3 do Protocolo anexo à mesma convenção (pontos 16. e 17. do Parecer n.º …/2011).
Por isso, está-se perante um acto administrativo que comporta (porque a inclui) a apreciação da legalidade de um acto de retenção na fonte, para cuja impugnação em processo judicial tributário é adequado o processo de impugnação judicial.
Consequentemente, não se está perante um caso excluído das competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD.
11 – A Autoridade Tributária e Aduaneira coloca também a questão do erro na forma de processo, conexionada com a repartição dos campos de aplicação do processo de impugnação judicial e da acção administrativa especial.
Porém, essa questão não é de colocar no caso dos processos arbitrais que funcionam no CAAD, pois há uma única forma de processo, havendo diferenças apenas a nível da composição dos tribunais e não da tramitação dos processos.
A ser adequada a acção administrativa especial nos tribunais tributários para apreciação da legalidade do acto de indeferimento do pedido de revisão oficiosa, estar-se-ia perante uma situação de falta de competência deste Tribunal Arbitral e não erro na forma de processo.
Assim, improcede a questão prévia de erro na forma de processo suscitada pela Autoridade Tributária e Aduaneira.
12 – Os pedidos de revisão de actos tributários, nos casos em que são apresentados no prazo da reclamação administrativa, podem ter por fundamento «qualquer ilegalidade», como resulta da parte inicial do n.º 1 do art. 78.º da LGT.
No caso em apreço, é manifesto que o pedido de revisão, apresentado em …-…-2011 [alínea e) da matéria de facto fixada], relativamente a um acto de retenção na fonte praticado em …-…-2008 [alínea b) da matéria de facto fixada], foi formulado muito para além do prazo da reclamação administrativa, quer se considere que o prazo é o de dois anos, previsto no art. 132.º, n.ºs 3 e 4, do CPPT, quer se entenda aplicável o prazo de 15 dias, previsto no art. 162.º do Código do Procedimento Administrativo ( 9 ).
Por isso, tem razão a Autoridade Tributária e Aduaneira quanto à intempestividade do pedido de revisão oficiosa, à face da 1.ª parte do n.º 1 do art. 78.º da LGT.
Porém, o pedido de revisão oficiosa foi apresentado dentro do prazo de quatro anos, previsto na 2.ª parte daquele n.º 1 do art. 78.º, pelo que não procede a excepção de intempestividade quanto à possibilidade de conhecimento da pretensão da Requerente nos termos aí previstos, mais limitados do que os que possibilita a apresentação do pedido de revisão no prazo da reclamação administrativa.
Nos casos em que o pedido de revisão é apresentado fora daquele prazo de reclamação administrativa, apenas pode ser efectuada revisão oficiosa de actos de liquidação com fundamento em erro imputável aos serviços ou duplicação de colecta (10).
Assim, no caso dos autos, não sendo aventada a existência de duplicação de colecta, a revisão oficiosa só pode ser efectuada, se se puder concluir que o acto de retenção na fonte enferma de vício de erro imputável aos serviços. O acto de retenção na fonte não foi praticado pela Administração Tributária, mas sim por uma entidade particular, o …, na qualidade de substituto tributário.
O substituto tributário é sujeito passivo do tributo que retém, como resulta do preceituado no n.º 3 do art. 18.º da LGT, pelo que o acto de retenção na fonte, consubstanciando uma liquidação efectuada por um sujeito passivo do imposto, deverá ser considerado como um acto de autoliquidação, designadamente para efeitos do disposto no n.º 2 do art. 78.º da LGT, em que se estabelece que «considera-se imputável aos serviços, para efeitos do número anterior, o erro na autoliquidação».
Porém, para que seja viável a revisão do acto tributário é necessário que se demonstre que houve um erro no acto de retenção.
No caso em apreço, não se provou que a Requerente tivesse apresentado ao …, até à data em que efectuou a retenção, qualquer documento comprovativo de que se verificassem os pressupostos de aplicação do regime previsto na Convenção entre a República Portuguesa e os Estados Unidos da América para evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento, aprovada para ratificação pela Resolução da Assembleia da República n.º 39/95, publicada no Diário da República, I Série-A, de 12-10-1995.
Nestas condições, a efectivação da retenção na fonte sem considerar a redução prevista nesta Convenção era imposta ao … pelos artigos 88.º, n.º 1, alínea c), e 90.º-A do CIRC, na redacção vigente em …-…-2008, designadamente por não se verificar a situação prevista no n.º 2 e sua alínea a) deste último artigo ou qualquer outra situação de dispensa parcial de retenção na fonte.
Dependendo a dispensa parcial de retenção na fonte da «prova perante a entidade que se encontra obrigada a efectuar a retenção na fonte, até ao termo do prazo estabelecido para entrega do imposto que deveria ter sido deduzido nos termos das normas legais aplicáveis» «da verificação dos pressupostos que resultem de convenção destinada a eliminar a dupla tributação ou de um outro acordo de direito internacional ou ainda da legislação interna aplicável, através da apresentação de formulário de modelo a aprovar por despacho do Ministro das Finanças certificado pelas autoridades competentes do respectivo Estado de residência» [art. 90.º-A, n.º 2 e alínea a), do CIRC], conclui-se que, se não foi apresentado o necessário formulário até à data da retenção, não se verificam os pressupostos de que estas normas fazem depender a dispensa parcial de retenção, pelo que a sua efectivação sem considerar essa dispensa parcial não enferma de qualquer erro de facto ou de direito.
Por isso, o substituto tributário fez precisamente aquilo, e tudo aquilo, que deveria ter feito perante a informação que lhe foi disponibilizada, não lhe cabendo, nem mesmo cabendo à administração tributária, dispensar o contribuinte de preencher todas as formalidades de que depende o exercício de um direito. Poderá alegar-se que se trataria de formalidades "ad probationem", e que o substituto tributário, ou depois dele a administração tributária, poderia conhecer oficiosamente o resultado material dessas formalidades não preenchidas.
Mas, isso não afasta a circunstância de não ter havido erro – única circunstância que aqui releva, pois na ausência desse erro não há lugar a revisão oficiosa nos termos pretendidos pela Requerente.
Conclui-se, assim, que não se demonstrou que o acto de retenção na fonte enfermasse de qualquer erro de facto ou de direito.
Por isso, não se verifica uma situação em que fosse permitido à Administração Tributária proceder a revisão oficiosa do acto de retenção na fonte.
13 – A Requerente coloca também no pedido de constituição do tribunal arbitral a questão de o acto de retenção na fonte enfermar de vício derivado da aplicação de exigências feitas na Circular n.º 6/2009, da Direcção de Serviços das Relações Internacionais, sancionada pelo Senhor Director-Geral dos Impostos.
Como se refere nos «factos não provados» e é evidente, sendo o acto de retenção na fonte praticado em 2008, antes de ser emitida aquela Circular, de 2009, não é concebível a possibilidade de a aplicação do estabelecido nesta Circular constituir vício do acto de retenção.
Por outro lado, quanto ao pedido de reembolso, que não foi apreciado pela Administração Tributária, não é objecto do presente processo, pois foi pedida a anulação do acto de retenção na fonte e não a anulação do indeferimento tácito do pedido de reembolso.
Para além disso, como se referiu, só pode ser fundamento da revisão do acto tributário ao abrigo da 2.ª parte do n.º 1 do art. 78.º da LGT o erro imputável aos serviços, de que enferme o acto a rever, no caso o de retenção na fonte, cuja anulação parcial é pedida.
Neste contexto de poderes de cognição restritos que podem ser exercidos na revisão do acto tributário, é irrelevante, por não constituir erro de facto ou de direito do acto de retenção a rever, únicos fundamentos de anulação admissíveis no pedido de revisão oficiosa em causa, que a Requerente tenha ou não demonstrado perante a Administração Tributária, depois de praticado o acto de retenção na fonte, que estaria em condições de beneficiar de tributação mais favorável ao abrigo da Convenção referida.
Assim, improcede necessariamente o pedido de anulação com fundamento em aplicação da referida Circular, que não foi aplicada, e, fica prejudicado, por não poder ter influência na decisão do presente processo, o conhecimento das questões de inconstitucionalidade e legalidade da referida Circular que a Requerente coloca que, não tendo ela sido aplicada, se reconduzem a puras questões de inconstitucionalidade e legalidade abstractas, cujo conhecimento é da exclusiva competência do Tribunal Constitucional, em processo próprio, como resulta do disposto no art. 281.º da Constituição da República Portuguesa”.
6 – Este Tribunal Arbitral adere aos fundamentos de direito que vêm de ser transcritos, proferidos em caso inteiramente paralelo, atenta a sua inteira bondade.
7 – Assim sendo, não pode solução dada a cada uma das questões deixar de ser a mesma, até pela inteira sobreponibilidade dos elementos de facto que induzem as questões de direito.
Deste modo, tem de considerar-se improcedentes as excepções de incompetência do tribunal arbitral para conhecer do pedido de declaração de ilegalidade do acto de retenção na fonte enquanto efeito subsequente do conhecimento do pedido de declaração de ilegalidade do acto de indeferimento do pedido de revisão oficiosa, formulado ao abrigo do art.º 78.º da LGT, bem como do erro na forma de processo, ambas deduzidas pela AT.
8 – Outrossim, há que considerar, perante a factualidade dada como provada, que a Requerente não demonstrou que o acto de retenção na fonte padecesse de qualquer erro de facto e de direito e, consequentemente, que a AT pudesse, sequer, com observância da LGT, proceder à revisão oficiosa do acto de retenção na fonte aqui sindicado.
Do mesmo jeito, perante o probatório, há que considerar improcedente o pedido de anulação do mesmo acto com fundamento na aplicação da referida Circular e prejudicado o conhecimento das questões de constitucionalidade construídas em torno dessa alegada aplicação.
9 – Independentemente da resposta dada às questões analisadas, poder-se-á dizer, ex abundante, que sempre a situação seria de não aplicação da Convenção entre a República Portuguesa e os Estados Unidos para Evitar a Dupla Tributação em Matéria de Impostos sobre o Rendimento e o Património, por não se encontrarem comprovados todos os elementos que podem sustentar essa aplicação. Isto porque, independentemente de a Requerente ter dado como provados, por um lado a residência nos EUA e, por outro, o facto de aí se qualificar como pessoa que por virtude da legislação norte-americana aí estaria sujeita a imposto, não comprovou que a tributação a que aí estaria sujeita era uma tributação de base mundial – essencial para a aplicação da referida convenção. Dito por outras palavras, a comprovação dos dois requisitos enunciados em primeiro lugar, que no entender da Requerente seriam suficientes para sustentar a integração da situação sub judice no âmbito da aplicação da convenção entre Portugal e os EUA, por si só não basta.
É certo que a convenção celebrada entre Portugal e os EUA, à semelhança da maior parte das convenções, não determina quem é ou não residente num dado Estado, deixando esse exercício para o Estado relativamente ao qual se pretende determinar a verificação dessa condição. Todavia, combina essa remissão para o direito interno do Estado da residência, com a exigência de que apenas se pode considerar como residente num determinado Estado, o indivíduo que, à luz do direito interno desse Estado, for aí tributado de acordo com uma tributação de base mundial, isto é, para usar a linguagem da convenção, não se inclui qualquer pessoa que está sujeita a imposto nesse Estado, apenas relativamente ao rendimento de fontes localizadas nesse Estado. Reconduz-se, nessa linha, à condição de residente mesmo aquelas situações em que, apesar de o critério não ser a residência estrita, os efeitos a nível de tributação são os mesmos, ou seja, a sujeição a uma tributação de base mundial.
Assim, não estando provado (não tendo a Requerente sequer aludido à questão), que a tributação da Requerente nos EUA seria uma tributação de base mundial, não se pode jamais sustentar a aplicação da convenção entre Portugal e os EUA.
C – Decisão
Destarte, atento tudo o exposto, acordam, neste Tribunal Arbitral, em:
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julgar como sendo o objecto do processo o acto de indeferimento do pedido de revisão oficiosa do acto de retenção na fonte do IRC relativo ao ano de 2007;
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julgar prejudicado o conhecimento das excepções de intempestividade e de inimpugnabilidade por falta de atempada reclamação graciosa e de incompetência do tribunal para conhecer da impugnação directa do acto de retenção na fonte sem precedência de reclamação;
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julgar improcedentes as excepções de incompetência do tribunal arbitral e de erro na forma do processo;
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julgar improcedentes os pedidos de declaração de ilegalidade e de anulação parcial do acto de retenção na fonte identificado na alínea b) do probatório, absolvendo a Administração Tributária dos mesmos;
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julgar prejudicado o conhecimento da questão de inconstitucionalidade da Circular n.º 6/2009.
De acordo com o disposto no art.º 315.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se o valor do processo em €406.427,20.
Nos termos do art.º 22.º, n.º 4, do RJTA, fixa-se o montante das custas em €6.732,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, sendo devidas pela Requerente.
A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia antiga.
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Lisboa, 23 de Outubro de 2012
Os Árbitros,
Benjamim Silva Rodrigues
João Sérgio Ribeiro
João Catarino