Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 9/2012-T
Data da decisão: 2012-09-07  IRC  
Valor do pedido: € 111.543,02
Tema: Derrama - Correção ao lucro tributável referente a perda na alienação de quotas e na alienação de crédito pela realização de prestações suplementares
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CAAD – Arbitragem Tributária

Proc nº 9/2012 – T


 

ACÓRDÃO


 

I RELATÓRIO

... – ..., SA (doravante também designada por “requerente” ou, abreviadamente, por “SP”), NIF ..., com sede em ..., veio requerer a constituição de Tribunal Arbitral nos termos do disposto nos artigos 10º-2 e 30º, do DL nº 10/2011 e 1º e 2º, da Portaria nº 112-A/2011, tendo por objeto a apreciação da “(…) parte da liquidação de imposto (IRC) e correspondentes juros compensatórios, relacionada com a questão das perdas na transmissão de (créditos pela realização de) prestações suplementares (…)” e que constituía parte do objeto do pedido na impugnação judicial pendente no TAF de ... – Unidade Orgânica ... – Proc. nº ... (Cfr. artigos 1º e 15º, do pedido de constituição deste Tribunal, doravante designado por “ petição” ou “PI”).

Conclui, em síntese, a requerente no seu pedido de constituição de tribunal arbitral, que parte da liquidação de IRC e derrama municipal consequente (n.º ...), padece de vício material de violação de lei e, em consequência, pede que:

  1. seja declarada a ilegalidade da (e consequentemente anulada a) referida liquidação, na parte correspondente à correção ao lucro tributável referente a perda na alienação de quotas e na alienação de crédito pela realização de prestações suplementares, correção esta no valor total de € 371.693,13;

  2. em consequência da supra referida ilegalidade, seja declarada a ilegalidade da liquidação de juros compensatórios, na parte proporcionalmente correspondente;

  3. tudo isto correspondendo a um imposto (derrama municipal consequente incluída, o que origina uma taxa global de 27,5%) no valor de € 102.215,61, e a juros compensatórios que lhe são proporcionalmente imputáveis no valor de € 9.327,41, num montante global de € 111.543,02, aqui se peticionando a declaração de ilegalidade da liquidação de IRC e derrama municipal consequente n.º ..., e dos correspondentes juros compensatórios, nesta parte e montante;

  4. montante este (€ 111.543,02) sobre o qual se deverão contar, em benefício da requerente, juros indemnizatórios à taxa legal desde a data do seu pagamento - 10.12.2007 - até à data do seu integral reembolso.


 

Cumpridos os necessários e legais trâmites processuais, designadamente os previstos no DL 10/2011 e Portaria 112-A/2011, foi constituído, em 28 de março de 2012, este Tribunal (Cfr ata respetiva).

A fundamentar o seu pedido, alega e requer o SP, no essencial e de forma muito abreviada:

a) Em processo de impugnação judicial entrado em juízo em 20.02.2009, a correr seus termos sob o n.º ... no Tribunal Administrativo e Fiscal de ..., Unidade Orgânica ... (Doc. n.º 1, que aqui se tem por reproduzido), a ora requerente impugnou, nos termos dos artigos 99.º e 102.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, conjugado com o disposto no (à data) artigo 128.º do Código do IRC, a parte da liquidação de IRC nº ..., relativo ao exercício de 2004 e em que, arguida, em reclamação graciosa (nº ...) a parcial invalidade dessa liquidação, foi tal pedido indeferido;

b) Decorridos mais de dois anos desde a entrada em juízo da atrás referida impugnação, a mesma se encontra ainda pendente de decisão;

c) o ato objeto do pedido de pronúncia arbitral é o atrás mencionado ato de liquidação n.º ... (cfr. Doc. n.º 2, onde se inclui a demonstração de acerto de contas), referente a IRC (e derrama consequente) e respetivos juros compensatórios, no que respeita aos montantes € 102.215,61 e € 9.327,41 (conforme cálculos explicitados infra), respetivamente, decorrentes de correções efetuadas ao lucro tributável (cfr. relatório da Inspeção tributária, que anexa, nas suas partes relevantes como Doc. n.º 3);

d) Uma vez que (i) parte das correções que motivaram esta liquidação não foram, nem são, contestadas pela requerente, (ii) parte desta liquidação foi entretanto anulada e, (iii) da restante parte ainda em litígio, a requerente só pretende pronúncia arbitral quanto à parcela da liquidação que se baseia na correção abaixo melhor identificada, é pedida a pronúncia arbitral apenas quanto a parte deste ato tributário, com manutenção da impugnação judicial supra referida quanto às restantes matérias e correspondente parte do ato de liquidação aqui em causa, nos termos do disposto nos artigos 3.º, n.º 2, e 30.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro;

e) Desse contencioso pendente (objeto de impugnação judicial apresentada) apenas se pretende (cfr. artigo 3.º, n.º 2, e artigo 30.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro) constituição de tribunal arbitral para apreciar a parte da liquidação de imposto (e correspondentes juros compensatórios) relacionada com a questão das perdas na transmissão de (créditos pela realização de) prestações suplementares; as restantes questões pendentes, objeto de impugnação judicial, continuarão pois a ser dirimidas nessa sede;

f) A correção em causa neste pedido de constituição de tribunal arbitral é a relativa a perda na transmissão de créditos por prestações suplementares, no valor de € 371.693,13, a qual representa um imposto (de IRC e derrama consequente, à taxa aplicável em 2004, em termos acumulados, de 27,5%) de € 102.215,61;

g) Conforme se pode ler no Relatório da Inspeção tributária (RIT, doravante) (Doc. n.º 3, pág. 11 do RIT), a requerente procedeu à alienação à ..., SGPS, S.A. (entidade detida a 100% pelo Estado, à data dos factos, através da …, SGPS, S.A.; sobre a constituição da ... SGPS, S.A., como holding do Estado Português que promoveria a privatização do universo “...” que então se avizinhava, cfr. o Decreto-Lei nº 39/93, de 13 de Fevereiro) da sua participação social na ..., Lda., e, bem assim, dos seus créditos por prestações suplementares realizadas em benefício da referida ..., tendo, na sequência dos registos contabilísticos efetuados, apurado uma perda no valor de € 491.110,76, na conta 6941 (menos valias com a alienação de participações financeiras), apurada como segue:

Valor recebido em numerário

280.787,52 €

Valor recebido em espécie – Anulação da dívida a pagar à ... (por transferência para o comprador das quotas)

31.966,84 €

Total dos movimentos a crédito na 6941

312.754,36 €

Anulação do valor dos Investimentos Financeiros

265.787,06 €

Anulação dos ajustamentos em capital (Equivalência Patrimonial)

538.078,06 €

Total dos movimentos a débito na 6941

803.865,12 €

Saldo apurado com o lançamento (perda)

491.110,76 €


 

h) Segregando a menos-valia em função dos dois ativos alienados (participação social e crédito pela realização de prestações suplementares) temos os seguintes valores (cfr. pág. 12 do RIT)

 

Valor balanço

Valor realização

Resultado

Quotas

205 307,64

53 923,17

-151 384,47

Prest. Suplem.

598 557,48

258 831,19

-339 726,29

 

i) Com base nesta factualidade, a Administração tributária retirou duas consequências que levaram à correção que aqui se contesta.

ii) considerou que (págs. 12 e 13 do RIT), a anulação, por referência ao passivo da requerente, da dívida desta à ..., Lda. (no valor de € 31.966,84 ), por assunção da mesma pelo comprador das quotas relativas a esta sociedade e dos créditos por prestações suplementares sobre a mesma, não faria parte do preço de transmissão; em consequência, a Administração tributária corrigiu para mais a menos-valia na venda das participações sociais referentes à ..., Lda., e na venda dos créditos por prestações suplementares, aumentando (contra-intuitivamente), na sequência desta correção (para mais) à menos-valia, o resultado fiscal da vendedora e ora requerente;

iii) a esta correção a Administração tributária juntou uma outra: não só a menos-valia associada às participações sociais, mas também a menos-valia associada aos créditos pela realização de prestações suplementares (previamente corrigida – aumentada - de € 339.726,69 para € 365.503,89, em razão da imputação a este ativo alienado de € 25.755,55, na qualidade de parte integrante da correção de € 31.966,84 acima referida), teria de ser considerada fiscalmente irrelevante.

j) Há assim duas correções com origens e fundamentos distintos:

i) uma primeira relativa ao cálculo da menos-valia, aumentado pela Administração tributária (e que contra-intuitivamente, absurdamente, deu origem a correção desfavorável ao contribuinte) em € 6.189,29 no que respeita à participação social, e em € 25.777,55 no que respeita à alienação do crédito pela realização de prestações suplementares, num total de € 31.966,84 e

ii) uma segunda correção relativa à não aceitação para efeitos fiscais da perda com a alienação de créditos por prestações suplementares, cujo montante (antes da correção referente ao recálculo do quantum) se cifra em € 339.726,29;

iii) a soma destas duas correções (distintas na origem e fundamentação, mas quantitativa e imperfeitamente separadas no RIT) é de € 371.693,13 (€ 31.966,84 + € 339.726,29) (cfr. págs. 2, 15 e 16 do RIT).

k) no entender da Administração tributária a segunda correção, referente à desconsideração fiscal das menos-valias com a alienação de créditos pela realização de prestações suplementares, seria imposta pelo n.º 7 do artigo 23.º do Código do IRC (atualmente n.º 5 do mesmo artigo) e créditos pela realização de prestações suplementares preencheriam o conceito de “partes de capital” (daí a aplicação que faz do citado artigo 23.º, n.º 7, do Código do IRC) pelo que, tendo sido apuradas em transação entre entidades relacionadas (por força de o Estado deter, direta ou indiretamente, quer 100% da entidade compradora destes créditos pela realização de prestações suplementares - a ... SGPS, S.A. -, como se viu atrás, quer uma participação minoritária de 25,72% na vendedora e ora requerente – cfr. a Resolução do Conselho de Ministros n.º 62.º-A/2004, de 18 de Maio, e a pág. 33 do Relatório e Contas Consolidadas da ora requerente – ... - de 2004, consultável na íntegra no sítio da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários sob o endereço eletrónico www.cmvm.pt) , seriam automaticamente, sem apelo nem agravo, indedutíveis (cfr. pág. 16 do RIT);

l) A mencionada correção operada pela Inspeção Tributária improcede porque ao contrário do que a Inspeção tributária pretende, o preço de venda com base no qual se apurou a menos-valia contabilística (e fiscal) não foi inferior em € 31.966,84 àquele que o contribuinte considerou (a Inspeção tributária incorre em erro nos pressupostos de facto);

m) É ilegal qualificar como partes do capital os créditos pela realização de prestações suplementares, na medida em que aquelas são apenas ações, quotas e outras participações no capital social de uma sociedade – Cfr artigo 23º-7, do CIRC (redação de 2004), correspondente ao nº 5, do citado artigo 23º, na redação atual1;

n) Esta norma exceciona da regra geral da relevância dos gastos e perdas para o apuramento do lucro tributável, certas menos-valias associadas à alienação de partes de capital, e só estas, devendo ser interpretada restritivamente como norma excecional que é;

o) A expressão simples “capital” corresponde, também no direito da contabilidade, ao conceito de “capital social”, no que às sociedades respeita, pelo que a expressão composta “partes de capital” corresponderá, no que às sociedades respeita também, ao conceito de “partes de capital social”, vulgo quotas e ações ou, mais genericamente, identificar-se-á com a expressão “participações sociais”;

p) Uma coisa são “partes de capital” (quotas e ações, resultantes da subscrição de capital social), e coisa diferente, que se não confunde com esta primeira (correspondendo, efetivamente, a realidades jurídica, económica e contabilisticamente distintas), são os “créditos resultantes da realização de prestações suplementares”;

q) O Ministério Público no seu parecer junto aos autos de impugnação judicial que precedeu este pedido de constituição de Tribunal Arbitral (a correr os seus termos sob o n.º …/………, no Tribunal Administrativo e Fiscal de …, Unidade Orgânica …), pronunciou-se no sentido da relevância fiscal da perda aqui em causa, por inaplicabilidade ao caso dos artigos 23.º, n.º 7, e 42.º, n.º 3 (na redação em vigor em 2004), do Código do IRC;

r) Esta inaplicabilidade resulta do facto de “prestações suplementares” (que no máximo, e, mesmo aí de modo errado, se chamam por vezes de prestações suplementares de capital, como chama a atenção o Ministério Público no seu parecer, devidamente suportado em doutrina inquestionavelmente autorizada) não se confundirem com “partes de capital”, o que resultou aliás reconfirmado, como faz também notar o Ministério Público no seu parecer, pela redação que a partir de 1 de janeiro de 2006 (cfr. Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro) assumiu o então artigo 42.º, n.º 3, do Código do IRC (atual artigo 45.º, n.º3, do Código do IRC) – cfr. pág. 5 do parecer do Ministério Público junto aos autos de impugnação a correr seus termos sob o n.º …/………, no Tribunal Administrativo e Fiscal de …, Unidade Orgânica …, que aqui se junta como Doc. n.º 23;

s) O artigo 23.º, n.ºs 5 e 7 (atualmente, n.ºs 3 e 5), do Código do IRC, na parte em que atinge indiscriminadamente todas as transações entre entidades relacionadas, é inconstitucional2;

t) A liquidação de juros compensatórios com referência à liquidação de IRC n.º …, que ascendia inicialmente a € 89.226,74 (Doc. n.º 2), é também parcialmente inválida e, consequentemente, deve ser declarada a sua ilegalidade e ser anulada na parte proporcional ao valor do IRC aqui impugnado (€ 102.215,61) e, mais concretamente, deverá ser anulada na parte correspondente a € 9.327,41 (89.226,74 x 102.215,61 / 977.802,69), conforme melhor visto supra, porque a ilegalidade parcial da liquidação de IRC sub judice acarreta a ilegalidade da liquidação dos respetivos juros compensatórios;

u) Acresce que a demonstração da liquidação dos juros compensatórios não contém o mínimo de fundamentação exigível (cfr. Doc. n.º 2), bastando atender, por exemplo, a um recente acórdão do STA (Acórdão de 11 de Fevereiro de 2009 – Rec. N.º 01002/083);

v) Adicionalmente, por ter pago imposto em montante superior ao legalmente devido (cfr. Doc. n.º 2), a requerente vem peticionar, ao abrigo do n.º 1 do artigo 43.º da Lei Geral Tributária (LGT), que lhe seja em consequência reconhecido o direito ao ressarcimento através de juros indemnizatórios, calculados sobre o montante do imposto e correspondentes juros compensatórios indevidamente pagos, no valor total de € 111.543,02 (€ 102.215,61 + € 9.327,41), e contados desde a data do referido pagamento indevido (10.12.2007 - cfr. Doc. n.º 2) até ao integral reembolso do mesmo.


 

A Autoridade Tributária e Aduaneira, no prazo que lhe foi concedido, pelas razões então invocadas (Cfr ata de constituição do Tribunal), tendo sido integralmente mantido o ato tributário sob impugnação (cfr comunicação da respetiva decisão, nos termos do artigo 13º-1, da LAT), apresentou resposta, contrariando o peticionado pela requerente, com os fundamentos que constam do respetivo articulado em que alega, em breve síntese e no essencial:

Quanto à alegada omissão de fundamentação:

a) Não tem razão a requerente quando alega (art.º 29º do pedido) que a Administração Tributária não demonstrou a existência de relações especiais entre vendedor e comprador, pelo que há omissão de fundamentação: é que a requerente na sua declaração modelo 22 já não havia deduzido as menos-valias realizadas, precisamente por resultarem de perdas com a transmissão onerosa de partes de capital a entidades com as quais existiam relações especiais e fê-lo adequadamente, nos termos do disposto no nº 7 do art.º 23º do CIRC (atual nº5) como é reconhecido no relatório de inspeção (fls. 20 do anexo 1 do PA);

b) As correções efetuadas resultaram tão só do recalculo do valor da menos-valia contabilística que deveria ser acrescido no quadro 7 da declaração para efeitos da determinação do lucro tributável, considerando não apenas as perdas resultantes da transmissão das quotas mas igualmente as resultantes da transmissão das prestações suplementares;

c) Ou seja, os fundamentos das correções assentam na não aceitação como custos das menos valias contabilísticas (recalculadas em função das correções ao valor de realização e da inclusão das perdas resultantes da alienação das prestações suplementares) por não corresponderem a menos valias realizadas, determinadas nos termos dos art.ºs 43º e 44º (atuais 45º e 46º) do CIRC, as únicas aceites como custos, nos termos previstos na al. f) do nº 1 do art.º 23º;

d) Estas correções seriam devidas quer existissem relações especiais entre vendedor e comprador, quer não;

e) Daí não carecer a Administração Tributária de fazer qualquer prova da existência dessa especialidade, tanto mais quando o próprio sujeito passivo já não havia deduzido as menos valias realizadas;

f) A correção aqui tem apenas a ver com a quantificação das menos valias contabilísticas a acrescer ao lucro tributável e não com a não aceitação das menos valias realizadas como custo fiscalmente dedutível;

g) Donde se conclui que o que carecia de ser fundamentado pelos Serviços de Inspeção era tão só as razões de facto e de direito subjacentes às correções ao valor de realização e ao valor dos ativos alienados, em nada relevando, para este efeito, a especialidade das relações entre vendedor e comprador.

Quanto à determinação do valor de realização

h) A assunção da dívida da requerente à … (€ 31.968,84) não é, ao contrário do alegado, uma contrapartida em espécie (e, como tal, parte do preço de venda das quotas e prestações suplementares) na medida em que o valor da venda (€ 280.787,52) e preço global efetivamente pago corresponde ao da situação líquida da … à data de 31/08/2004 e, logo, o valor daquela dívida já está influenciado negativamente pelo valor do passivo.


 

Quanto à questão das prestações suplementares e a sua relação com o artigo 23º-5, do CIRC

i) A Lei 60-A/2005, de 30/12, veio precisar que a limitação prevista no art.º 42º nº 3 se aplica a quaisquer perdas ou variação patrimoniais negativas respeitantes a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, designadamente prestações suplementares;

j) As prestações suplementares não deverão, para efeitos da sua qualificação e determinação do seu regime fiscal, deixar de ser tratadas como partes de capital, dado tratarem-se sempre de investimentos financeiros dos sócios que se subordinam, quer em termos fiscais, quer em termos contabilísticos, ao regime das entradas de capital, de que se aproximam, do ponto de vista do regime comercial substantivo;

k) A relevância fiscal destes investimentos financeiros (a realização de prestações suplementares) implica a sua equiparação às “partes de capital”, nos termos que vieram a constar expressamente do art.º 42º nº 3 do CIRC, na redação introduzida pela Lei 60-A/2005, de 30 de dezembro (atualmente art.º 45º) e que antes já decorriam de uma interpretação sistemática da lei (designadamente da inclusão das prestações suplementares no conceito de “entradas de capital” para efeitos do disposto na al. a) do nº 1 do art.º 21º do CIRC);

l) Não sendo relevante, para efeitos de qualificação e determinação do regime fiscal das prestações suplementares, o argumento utilizado pela requerente de que as prestações suplementares devem distinguir-se das participações sociais, para efeitos de determinação do respetivo custo de aquisição e ser consideradas autonomamente, porquanto essa separação é necessária para efeitos de determinação do custo de aquisição das participações sociais, atendendo ao princípio contabilístico do custo histórico, que determina que o valor de um ativo deva ser calculado com referência ao seu valor de aquisição e as prestações suplementares não entram para o cômputo desse custo de aquisição;

m) Ademais, além de o próprio CIRC reconduzir as prestações suplementares a “entradas de capital”, do ponto de vista da entidade recetora, afastando-as da determinação do lucro tributável (cfr. art.º 21º nº 1 al. a) do CIRC), estas prestações devem considerar-se como inerentes à participação social, por ser esse o regime para que aponta o Código das Sociedades Comerciais;

n) As prestações suplementares, embora não se confundam com o capital social, são sempre contabilizadas como capital próprio por parte de quem as recebe (conta 53 do POC);

o) E configuram-se, em termos fiscais, como variações patrimoniais que devem ser incluídas no art.º 21º nº 1 al. a) do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (CIRC) quando são efetivadas e no art.º 24º nº 1 al. c) do CIRC quando são devolvidas ou retransmitidas, não sendo abrangidas pelo lucro tributável porquanto o legislador fiscal excecionou expressamente “as entradas de capital”, a qualquer título, incluindo portanto não só os valores correspondentes às entradas para o capital da sociedade em sentido próprio mas quaisquer outros valores com que, por qualquer forma, os sócios entram para a sociedade, incluindo as prestações suplementares;

p) As prestações suplementares, embora não se confundam com o capital social, são sempre contabilizadas como capital próprio por parte de quem as recebe (conta 53 do POC);

q) E configuram-se, em termos fiscais, como variações patrimoniais que devem ser incluídas no art.º 21º nº 1 al. a) do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (CIRC) quando são efetivadas e no art.º 24º nº 1 al. c) do CIRC quando são devolvidas ou retransmitidas, não sendo abrangidas pelo lucro tributável porquanto o legislador fiscal excecionou expressamente “as entradas de capital”, a qualquer título, incluindo portanto não só os valores correspondentes às entradas para o capital da sociedade em sentido próprio mas quaisquer outros valores com que, por qualquer forma, os sócios entram para a sociedade, incluindo as prestações suplementares;

r) As prestações suplementares são contabilizadas como Investimentos Financeiros, por parte do sócio que as realiza (conta 41 do POC), incluindo-se no conceito de ativo imobilizado para efeitos do POC;

s) Os conceitos fiscais de mais valia e menos valia encontram-se associados aos ganhos ou perdas ocorridos com a transmissão onerosa de elementos do ativo imobilizado – corpóreo, incorpóreo ou financeiro (cfr. art.º 43º nº 1, atual 46º, do CIRC), logo, as perdas associadas à sua alienação são perdas em imobilizações, mais especificamente perdas em alienações de investimentos financeiros, tendo como regime aplicável para efeitos fiscais o das mais valias e menos valias realizadas, previsto no art.º 43º do CIRC (atual art.º 46º);

t) As menos valias e outras perdas extraordinárias realizadas com a transmissão de elementos do ativo imobilizado, concorrem como componentes negativas para a determinação do lucro tributável, desde que sejam indispensáveis para a formação dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, nos termos do disposto no art.º 23º nº 1 do CIRC;

u) O art.º 43º nº 2 cria um regime especial para as menos valias resultantes da transmissão onerosa de partes de capital, determinando que concorrem para o lucro tributável em apenas metade do seu valor;

v) Sendo que, caso se verifique alguma das situações então reguladas no art.º 23º nº s 5, 6 e 7 do CIRC, as menos valias resultantes da alienação dessas partes sociais não concorrem de todo como custos para a formação do lucro tributável;

x) As prestações suplementares deverão, para efeitos da sua qualificação e determinação do seu regime fiscal, ser tratadas como partes de capital, dado tratarem-se sempre de investimentos financeiros dos sócios que se subordinam, quer em termos fiscais, quer em termos contabilísticos, quer ainda do ponto de vista do regime comercial substantivo das entradas de capital;

z) Além de o próprio CIRC reconduzir as prestações suplementares a “entradas de capital”, do ponto de vista da entidade recetora, afastando-as da determinação do lucro tributável (cfr. art.º 21º nº 1 al. a) do CIRC), estas prestações devem considerar-se como inerentes à participação social, por ser esse o regime para que aponta o Código das Sociedades Comerciais;

z-1) Embora não configurando participações sociais, as prestações suplementares estão intrinsecamente ligadas às mesmas, devendo integrar o conceito de “partes de capital” quer para os efeitos previstos no art.º 42º nº 3 do CIRC (na redação aplicável que não referia expressamente as prestações suplementares) quer para os efeitos previstos no art.º 23º nº 7 do CIRC;

z-2) As normas excecionais – como é o nº 7 do art.º 23º do CIRC – não admitem interpretação analógica mas admitem interpretação extensiva (art.º 11º do Código Civil) e é disso que se fala quando se estende a aplicação daquele regime a casos não previstos na sua letra mas compreendidos no seu espírito;

z-3) O art.º 23º nº 7 do CIRC postula a aplicação a casos que não são diretamente abrangidos pela letra da lei mas são abrangidos pela finalidade da mesma, ou seja, ainda que expressamente apenas refira “partes de capital”, por identidade de razão (face à semelhança conceitual e de regime) deverá estender-se a sua aplicação a outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a outras componentes do capital próprio, designadamente às prestações suplementares de capital.4


 

Relativamente à alegada inconstitucionalidade dos nºs 5 e 7, do art. 23º, do CIRC

z-4) Em acórdão de 11/02/2009, o STA pronunciou-se negativamente em relação à inconstitucionalidade do art. 23º-7, do CIRC, por violação dos princípios da igualdade, da tributação do rendimento real, do direito de propriedade privada e da proporcionalidade;

z-5) O artigo 23º-7, do CIRC (red. de 2004, correspondente ao atual art. 23º-5) respeita os princípios constitucionais, designadamente o da tributação pelo rendimento real consagrado no artigo 104º-2, da Constituição.


 

Ambas as partes apresentaram alegações finais por escrito conforme requerimento oportunamente formulado e deferido, em que, no essencial, defendem as posições assumidas nos respetivos articulados, reforçando as respetivas linhas argumentativas.


 

Este Tribunal Arbitral, regular e legalmente constituído, é materialmente competente (arts. 2º-1/a) e 30º/1, do RJAT).

As partes, que detêm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas (arts. 4º e 10º-2, do RJAT e 1º, da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de março).

Inexistem, alegadas ou de conhecimento oficioso, quaisquer exceções ou questões prévias de que cumpra conhecer.

O processo está isento de nulidades que o invalidem.

Foi cumprido o princípio do contraditório em todas as fases.


 

II FUNDAMENTAÇÃO

A – Os Factos

Com relevo para a decisão, consideram-se provados os seguintes factos:

a) A requerente, ... –…, SA, vendeu, no ano de 2004, à ..., SGPS, SA pelo preço de € 280.787,52 – valor que a requerente recebeu em numerário -, a totalidade das quotas e prestações suplementares que detinha na sociedade comercial …, Lda.;

b) O mencionado preço correspondia ao valor da situação líquida da …, Lda., em 31 de agosto de 2004;

c) Na citada situação líquida incluía-se um crédito, na importância de € 31.966,84, da …, Lda. sobre a ora requerente, tendo a ... SGPS, SA, assumido inteira e exclusiva responsabilidade pelo respetivo pagamento (Cfr fls. 55 a 57 do anexo 1, do PA e Doc. 6, junto pela requerente);

d) As quotas e prestações suplementares referidas supra, em a), tinham o valor de balanço de 205.307,64 e 598.557,48, respetivamente;

e) A requerente espelhou contabilisticamente a venda à ..., SGPS, SA da sua participação na ..., Lda., com apuramento de perda de € 491.110,76 na conta 6941, do seguinte e esquemático modo:

  • Valor de realização das quotas e prestações suplementares

    280.787,52

    Anulação da dívida a pagar à ...

    31.966,84

    Total dos movimentos a crédito na 6941

    312.754,36

    Anulação dos valores dos Investimentos Financeiros

    265.787,06

    Anulação dos ajustamentos em capital (Equiv. Patrimonial)

    538.078,06

    Total dos movimentos a débito na 6941

    803.865,12

    Saldo apurado com o lançamento (perda)

    491.110,76


 

f) A requerente foi objeto de ação inspetiva da DSIT da qual resultaram um conjunto de correções melhor identificadas no relatório que integra o processo administrativo junto a estes autos e que ulteriormente deu origem à liquidação de IRC, ora sob impugnação parcial, nº ..., relativa ao exercício de 2004 (Cfr PA e Docs 2 e 3, juntos com a PI);

g) Apresentou a requerente reclamação graciosa relativamente àquelas correções e que foi parcialmente deferida por despacho do 30/01/2009 do chefe de Divisão da Justiça Tributária da DF de ... (Cfr anexo 2, do PA);

h) A requerente apurou a menos valia (conta 6941) em função dos dois ativos alienados, da seguinte forma:


 

  • Ativo

    Valor balanço

    Valor realização

    Resultado

    Quotas

    205.307,64 €

    53.923,17 €

    -151.384,47 €

    Prest. Suplem.

    598.557,48 €

    258.831,19 €

    -339.726,29 €

    Total

    803.865,12 €

    312.754,36 €

    -491.110,76 €


 

i) Face à documentação de suporte dos registos contabilísticos, a Administração Tributária, efetuou duas correções com diferentes origens e fundamentos:

  1. Quanto à determinação do valor de realização entendeu a Administração Tributária que deveria ser corrigido de € 312.754,36 € (correspondente ao valor da contraprestação pelo integral pagamento da totalidade das quotas e prestações suplementares no valor de € 280.787,52 acrescido de € 31.966,84 correspondente à dívida da requerente perante a sociedade alienada, que foi assumida pelo adquirente) para € 280.757,52 correspondente ao valor da contraprestação, no qual foi tomado em consideração a situação líquida da empresa alienada, situação líquida essa que já está influenciada pelo crédito da ... sobre o sujeito passivo, nos termos definidos no nº 3 do art.º 43º do CIRC (atual art.º 46º).

  2. Quanto à determinação do valor dos ativos alienados, entendeu a Administração Tributária que, para efeitos de cálculo das menos valias, não pode apenas ser considerado o valor das quotas alienadas e a sua valorização pela equivalência patrimonial mas também o valor resultante da alienação das prestações suplementares por integrarem o conceito de “partes de capital”, não sendo as perdas aceites como custo para efeitos fiscais nos termos do art.º 23º nº 7 do CIRC (atual art.º 23º nº 5).


 

j) Dos ajustamentos a introduzir resultou o recalculo, pela Administração Fiscal, da menos valia contabilística da seguinte forma:

  • Ativo

    Valor balanço

    Valor realização *

    Resultado

    Quotas

    205.307,64 €

    47.733,88 €

    -157.573,76 €

    Prest. Suplem.

    598.557,48 €

    233.053,64 €

    -365.503,84 €

    Total

    803.865,12 €

    280.787,52 €

    -523.077,60 €

* A repartição do valor de realização foi proporcional ao peso de cada rubrica no total do valor do balanço


 

k) Em 10-12-2007 a requerente procedeu ao pagamento da liquidação adicional que teve por base o citado relatório da DSIT em causa – IRC e Derrama consequente nº … - na importância de € 1.167.629,43 (€ 1.078.402.69, relativa a IRC e derrama consequente + € 89.226,74, relativa a juros compensatórios)


 

A MOTIVAÇÃO

Não ressaltando dos autos e documentos, qualquer controvérsia factual entre as partes, poderá, duma forma geral, justificar-se a convicção do Tribunal em resultado do acervo documental (Processo administrativo e demais documentos juntos pela SP) e não impugnação, expressa ou tácita, dos factos alegados no requerimento de constituição deste Tribunal.

Poderá mesmo dizer-se que as questões trazidas à apreciação e decisão do Tribunal são meramente de Direito como se irá ver.


 

O DIREITO

Importa precisar que o ato tributário sujeito à apreciação e decisão é tão só e apenas a liquidação nº …, respeitante a IRC (e derrama consequente) à taxa aplicável em 2004, em termos acumulados, de 27,5% e respetivos juros compensatórios, nos montantes de €102.215,61 e €9.327,41, respetivamente, decorrentes de correções ao lucro tributável da requerente no ano de 2004, na parte em que considerou abrangida pelo disposto no artigo 23º-7, do CIRC/2004 a “menos valia” decorrente de alienação de prestações suplementares5.

Vejamos então mais detalhadamente a questão:

Em 20.02.2009, a requerente impugnou, nos termos dos artigos 99.º e 102.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, conjugado com o disposto no (à data) artigo 128.º do Código do IRC, a parte da liquidação de IRC identificada respeitante às matérias que mereceram indeferimento da Reclamação Graciosa previamente apresentada (processo de reclamação graciosa n.º …), arguindo a sua (parcial) invalidade.

A mencionada impugnação judicial deu entrada no Tribunal Administrativo e Fiscal de …, Unidade Orgânica …, tendo corrido termos sob o n.º …, tendo a requerente recorrido atempadamente ao mecanismo previsto no artigo 30º-1, do RJAT6, para submeter à apreciação arbitral parte do pedido formulado no processo pendente no TAF de ….

A correção em causa no pedido de constituição deste tribunal arbitral é, segundo a requerente, a relativa “a perda na transmissão de créditos por prestações suplementares, no valor de € 371.693,13, a qual representa um imposto (de IRC e derrama consequente, à taxa aplicável em 2004, em termos acumulados, de 27,5%) de € 102.215,61.”

Tendo em conta que os juros compensatórios incidentes sobre a liquidação de IRC (e derrama consequente) acima referida foram calculados sobre o montante da mesma (€ 1.078.402,69), expurgado da desconsideração (omissão) nessa liquidação (que aumentou o valor da mesma) do PEC pago pela requerente (no valor de € 100.600,00), o total dos juros compensatórios em causa na liquidação de imposto em referência foram calculados sobre imposto no valor de € 977.802,69 (1.078.402,69 – 100.600,00).

Nestes termos, a parte dos juros compensatórios correspondente à parte da liquidação objeto deste pedido de constituição de tribunal arbitral ascende a € 9.327,41 (89.226,74 x 102.215,61 / 977.802,69).

O valor da parte da liquidação cuja declaração de ilegalidade é pedida é, pois, juros compensatórios incluídos, de € 111.543,02 (102.215,61 + 9.327,41).

Invoca ainda a requerente a inconstitucionalidade do artigo 23.º n.ºs 5 e 7 (atuais n.ºs 3 e 5), na parte em que atinge indiscriminadamente todas as transações entre entidades relacionadas.

Proceder-se-á à abordagem e decisão de cada uma das referidas questões, na ordem em que as mesmas foram colocadas.


 

1ª - A DEDUTIBILIDADE FISCAL - PERDAS DAS PRESTAÇÕES SUPLEMENTARES

Nos termos do relatório da inspeção (cfr. p. 15) e liquidação subsequente, a menos valia contabilística foi recalculada para incluir as perdas relativas às prestações suplementares “como efetivas participação no capital”, desconsiderando-se a menos-valia contabilística no valor de € 523.077,60 no lucro tributável, por força do disposto no n.º 7 do artigo 23.º do CIRC (redação de 2004, correspondente ao atual nº 5, do mesmo artigo 23º).

Dispunha então este, para este efeito, o n.º 7 do artigo 23.º do CIRC (atual n.º 5) que não são, igualmente, aceites como custos ou perdas do exercício os suportados com a transmissão onerosa de partes de capital (nosso sublinhado), qualquer que seja o título por que se opere, a entidades com as quais existam relações especiais, nos termos do n.º 4 do artigo 58.º, ou a entidades com domicílio em país, território ou região com regime de tributação claramente mais favorável, constante de lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças, ou entidades residentes em território português sujeitas a um regime especial de tributação.

No cerne da questão está, pois, o conceito fiscal de “partes de capital”.

Vejamos:

Em obediência às regras de interpretação previstas no artigo 11.º da LGT, verifica-se que o Código do IRC e demais legislação fiscal não definem o conceito de “partes de capital”.

Ainda assim, em termos sistemáticos, o legislador separa claramente o conceito de partes de capital do conceito de capital próprio utilizado no artigo 61.º do CIRC7 (atual artigo 67.º) e no n.º 3 do artigo 42.º (atual artigo 45.º), na redação que lhe é dada pela Lei n.º 60-A/2005, de 30 de dezembro. Ou seja, o legislador usa o conceito de capital próprio na exata aceção contabilística (que analisaremos adiante) o que permite concluir que, atentos aos elementos literal e sistemático das normas do Código do IRC, o conceito de “capital” na expressão “partes de capital” não é sinónimo de “capital próprio”.

Ainda num sentido literal, não podemos deixar de notar que o n.º 3 do artigo 42.º (atual artigo 45.º), na redação que lhe é dada pela Lei n.º 60-A/2005, de 30 de dezembro (que não se aplica no caso dos autos porquanto tem vigência posterior a 2004), afasta de forma clara as prestações suplementares e as suas variações do conceito de partes de capital: “ (…) A diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital, bem como outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, designadamente prestações suplementares (nosso sublinhado), concorrem para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor.

Ou seja: só a partir da entrada em vigor da Lei nº 60-A/2005 é que foi introduzida, de forma inovatória e não meramente interpretativa da norma anterior, a inclusão de “outras componentes do capital próprio, designadamente prestações suplementares”, admitindo a sua ponderação em metade para efeitos de formação do lucro tributável.

Por outro lado, a inexistência de uma definição fiscal de “partes de capital”, leva o intérprete a buscá-la no direito comercial e no direito contabilístico, atentos, neste último caso, ao modelo de dependência parcial que se estabelece entre a contabilidade e o direito fiscal no apuramento do lucro tributável.


 

Do conceito de “partes de capital” no direito comercial

Não é controvertida a assunção de que o conceito de parte de capital abrange o capital social tal como referido amiúde no Código das Sociedades Comerciais (a título de exemplo, os artigos 9.º, 14.º, 32.º, 35.º, 176.º, 178.º, 197.º, 201.º, 202.º, 271.º, 272.º, 276.º, etc.…).

A vexata quaestio é, no entanto, saber se a legislação comercial inclui também no conceito de capital ou partes de capital as prestações suplementares. Analisemos, para o efeito, o seu regime jurídico.

Da natureza das prestações suplementares

O artigo 209.º do Código das Sociedades Comerciais estabelece que se o contrato da sociedade assim o permitir, os sócios podem deliberar que lhes sejam exigidas prestações suplementares.

As prestações suplementares “são entradas em dinheiro que podem ser realizadas pelos sócios de sociedade por quotas para reforço do património desta, para além do capital social, não vencendo juros e podendo ser-lhes restituídas, as quais não se incluem no capital social da sociedade” (Luís Brito Correia, Direito Comercial, 2.º vol., 1989, p. 297).

Nos termos do n.º 1 do artigo 210.º, as prestações suplementares só podem ser exigidas aos sócios se estiverem previstas no pacto social que deverá fixar (i) o montante global das prestações suplementares, (ii) os sócios que ficam obrigados a efetuar prestações suplementares entre os sócios a elas obrigados e (iii) o critério de repartição das prestações suplementares entre os sócios a elas obrigados.

A competência da decisão de chamada de prestações suplementares é da assembleia geral que deve fixar o montante tornado exigível e o prazo da prestação, o qual não poderá ser inferior a 30 dias a contar da comunicação aos sócios.

Atendendo a que apenas aos sócios podem ser exigidas prestações suplementares, a sua qualificação está intrinsecamente ligada à qualidade de sócio. Havendo uma cessão de quotas, com é o caso dos autos, as prestações suplementares também se transmitem. “Não é lícito separar no contrato de cessão, a obrigação de prestação suplementar para a manter no cedente, pois o direito da sociedade exerce-se contra o sócio, qualidade que o cedente deixou de ter.” (RAUL VENTURA, Sociedades por Quotas, Vol. 1, 2.ª Ed., 1993, p. 244).

As limitações à restituição das prestações suplementares previstas no artigo 213.º constituem uma das características mais importantes – senão a mais relevante – deste instituto: as prestações suplementares só podem ser restituídas aos sócios (i) desde que a situação líquida

não fique inferior à soma do capital e da reserva legal; (ii) o sócio já tenha liberado a sua quota; e (iii) não tenha sido declarada a insolvência da sociedade.

Do exposto, constata-se que as prestações suplementares têm uma natureza mista: são, em primeiro lugar, empréstimos, com uma natureza muito especial, embora, dos sócios à sociedade que, contrariamente ao capital social, podem ser devolvidos e, em segundo lugar, constituem um “reforço do património social” (cfr. Acórdão do STJ, de 9 de Janeiro de 1992, Proc. 77834, disponível em www.dgsi.pt) porque as limitações à sua restituição conferem-lhe um carácter de permanência superior à de um vulgar empréstimo ou suprimento de um sócio.

Nas palavras de RAUL VENTURA, “Dos traços fundamentais do seu regime acenam um, na direção dos credores e outro na direção dos sócios; por um lado, as prestações efetuadas não podem ser restituídas se ou enquanto não permanecer ou não estiver reconstituída a garantia dos credores consistente no capital social; por outro lado, o sócio não perde a esperança de reaver a prestação desde que para isso estejam preenchidos os requisitos legais”. (RAUL VENTURA, Sociedades por Quotas, Vol. 1, 2.ª Ed., 1993, p. 237).

A propósito da inexigibilidade das prestações suplementares, a opinião taxativa expressa ainda por Raul Ventura: “ (…) Enquanto a sociedade vive a sua vida normal, não pode o sócio exigir a restituição da prestação suplementar, mas quando a sociedade é liquidada (excetuada a liquidação em caso de falência, por força do art. 213°, n.º 3), há necessariamente um momento em que as prestações suplementares devem ser restituídas (…) ”. (RAUL VENTURA, “Sociedades por Quotas”, Vol. I, 2ª Ed., p. 272)

As prestações suplementares não se confundem com a obrigação de entradas para o capital social (artigos 25.º a 30.º do CSC e regras especiais para as sociedades em nome coletivo – 176.º n.º 1, al. a), 178.º e 179.º; para as sociedades por quotas – 202.º a 208.º e para as sociedades anónimas – 277.º e 285.º e 286.º).

As regras relativas à obrigação de entrada dos sócios para o capital social são distintas do regime das prestações suplementares; o capital social é obrigatório enquanto as prestações suplementares têm carácter facultativo e dependem de expressa deliberação dos sócios; as prestações suplementares, contrariamente ao capital social, podem ser restituídas, etc.

Em suma, apesar de o capital social e as prestações suplementares constituírem uma contribuição dos sócios para o reforço do património da sociedade, são obrigações intrinsecamente distintas e, por isso, o legislador nunca integrou as prestações suplementares no conceito de “parte de capital”.


 

Do conceito de “partes de capital” no direito contabilístico

Para respondermos de forma conveniente, há que atender ao objeto e função das regras contabilísticas e da própria contabilidade ou direito contabilístico.

A contabilidade tem uma função funcional ou instrumental fundamental para os seus utilizadores: proporciona informação sobre a posição e desempenho financeiro das entidades ou empresas, informação que é útil para a tomada de decisões económicas ou de gestão dos diferentes utilizadores. Ora, o reconhecimento dos factos com relevância contabilística - como é o caso do capital social ou das prestações suplementares - é feito atendendo à natureza desses factos e não por imposição ou alteração da sua configuração jurídica ou económica. O objetivo da contabilidade é demonstrar uma imagem verdadeira e apropriada da realidade patrimonial de uma entidade. E, neste sentido, a relevação contabilística e apresentação nas demonstrações financeiras da realidade patrimonial de uma determinada entidade é feita tendo como objetivo permitir a um qualquer utilizador conhecer a respetiva posição e desempenho financeiros.

Dito isto, cabe referir, desde já, que, em momento algum, o POC e as Notas Explicativas que o integram confundem capital social e prestações suplementares: em sede de escrituração ou registo, na ótica de quem recebe estas entradas, o capital social é reconhecido numa “conta 53 – Prestações Suplementares” e o capital social numa “conta 51 – Capital Social”.

Na perspetiva do sócio/acionista, as entradas para o capital social são registadas na conta 411 – Partes de Capital; o investimento em prestações suplementares deve ser registado numa subconta a abrir para o efeito na conta 415 – Outras Aplicações Financeiras. Esta opção não é fruto de uma qualquer técnica mecanicista mas resulta do reconhecimento da diferente natureza destas prestações; não é neutro ou irrelevante para um utente da informação contabilística (investidor, acionista, banca ou até administração fiscal) a destrinça entre um investimento em capital social ou em prestações suplementares.

Não se olvida que, nos termos prescritos pelo POC, as prestações suplementares e o capital social integram, com outras rubricas, o denominado capital próprio da entidade que deles beneficia.

Ora, o capital próprio é definido como o interesse residual nos ativos da empresa depois de se lhe deduzir todos os seus passivos (Cfr parágrafo 49.º da Estrutura Conceptual, Aviso n.º 15652/2009 in DR nº 173 – II Série, de 7 de setembro).

O capital próprio, considerado como um todo, não é uma coisa ou direito suscetível de ser objeto de transmissão na medida em que nem pode ser qualificado como coisa composta ou universalidade de facto nos termos do artigo 206º, do C. Civil porquanto as suas componentes não têm um destino unitário, sem prejuízo destas (componentes) poderem ser objeto de transmissão, entre outras as prestações suplementares, de acordo com o regime jurídico que lhe for aplicável.

Daí que, a agregação para efeitos de balanço dos valores que em conjunto são designados como capital próprio não envolve qualquer natureza jurídica comum de forma a poderem ser transmitidos como tal.

Assim sendo, o entendimento de que a expressão inserta nos citados nºs 5 e 7, do CIRC – “transmissão onerosa de partes de capital” – se deve considerar com o aditamento de “próprio”, só poderá ser sufragado por quem admita que possa validamente ocorrer uma transmissão de capital próprio, entendido este como um todo. O que, manifestamente não é possível.

À luz do POC então vigente, existia o seguinte conjunto heterogéneo de rubricas que, na sua globalidade – e não exclusivamente o capital social e as prestações suplementares -, constituíam o capital próprio:

51 – Capital

52 - Ações (quotas) próprias

521 - Valor nominal

522 - Descontos e prémios

53 - Prestações suplementares

54 - Prémios de emissão de ações (quotas) 55 - Ajustamentos de partes de capital em filiais e associadas:

551 - Ajustamentos de transição

552 - Lucros não atribuídos

553 - Outras variações nos capitais próprios

554 - Depreciações

56 - Reservas de reavaliação

57 – Reservas

571 - Reservas legais

572 - Reservas estatutárias

573 - Reservas contratuais

574 - Reservas livres

575 - Subsídios

576 – Doações

59 - Resultados transitados.


 

Será admissível interpretar a expressão “partes” como referindo-se a qualquer dessas rubricas?

A resposta não pode deixar de ser inquestionavelmente negativa na medida em que a expressão “partes” tem como significado “quota parte”, “participação” ou “quinhão” e reportar essa expressão a “capital próprio” seria algo, salvo o devido respeito, absurdo já que traduziria uma decomposição, inadmissível, como se viu, do capital próprio.8

No que toca ao caso concreto, conforme refere RUI PINTO DUARTE, a consideração das prestações suplementares como capital (próprio) “não significa, que haja igualdade de natureza (económica e jurídica) entre as prestações suplementares e o capital social. Não há – também indiscutivelmente.” (RUI PINTO DUARTE, Suprimentos, Prestações Acessórios e Prestações Suplementares, Problemas do Direito das Sociedades, IDET, 2002, p. 277.

Assim, das normas contabilísticas aplicáveis, não decorre o enquadramento das prestações suplementares no conceito fiscal de “partes de capital” porque o capital próprio como tal não é, como anteriormente se demonstrou, alienável nem foi intenção do legislador incluir em parte de capital, por exemplo, os resultados transitados ou até os subsídios e doações.

É nesta linha argumentativa que, no atual SNC (Sistema de Normalização Contabilística, que substituiu o POC – DL 158/2009, de 13 de julho), se revelam, de forma clara, a autonomização dos conceitos de partes de capital e capital próprio, evidenciando-se sempre no primeiro o reporte claro ao capital social – cfr., v.g., arts. 6º-3/a) e b e 4; 7º-3/a) e b) e 8º-3/b) 11º 1/c) e 2.

Pelo exposto, conclui-se que o cálculo da menos valia contabilística resultante da alienação das partes de capital não pode integrar as perdas das prestações suplementares porque estas não englobam o conceito de partes de capital.

Partes de capital para efeitos de subsunção ao disposto no artigo 23º-7, do CIRC/2004 (Custos não aceites como gastos) só serão assim, no caso, as quotas transmitidas (Cfr. supra, alínea j), do elenco de factos provados).

Daí que, o ato de liquidação ora em causa, na parte em que desconsiderou as menos-valias com a alienação de créditos pela realização de prestações suplementares, não tenha suporte legal, designadamente no disposto no citado artigo 23º-7, do CIRC (versão de 2004 e atual artigo 23º-5), como pretende a Administração Fiscal, uma vez que tais créditos não preenchem o conceito de partes de capital.

No cálculo da menos-valia decorrente da alienação à ..., SGPS, das partes de capital da requerente na ..., Lda., não podem ser ponderadas as perdas relativas às prestações suplementares na medida em que estas não se incluem no conceito de “partes de capital” a que alude o artigo 23º-7, do CIRC, na redação de 2004.


 

2ª A (IN)CONSTUCIONALIDADE DO ARTIGO 23º, NºS 5 E 7, DO CIRC

Alega ainda a Requerente a inconstitucionalidade dos artigos 23.º n.ºs 5 e 7 por violação dos princípios da proporcionalidade e tributação do lucro real.

Concluindo-se, como se viu, ilegalidade decorrente da subsunção da liquidação ao disposto nestes normativos, ficaria sempre prejudicada a apreciação do vício decorrente da alegada inconstitucionalidade desses mesmos normativos.

De todo o modo sempre se dirá, seguindo de muito perto o entendimento sufragado em Jurisprudência do STA9 que, por vezes, as normas fiscais desconsideram custos (em função da sua impertinência empresarial), e consideram preços diferentes dos que foram acordados pelas partes. Estas normas são genericamente consideradas como normas anti-abuso. Tais normas, apontando o tipo específico de abuso que querem prevenir, condicionam a liberdade de conformação dos negócios. A cláusula geral anti-abuso é uma inovação recente no Direito Fiscal Português e está prevista no artigo 38.º da Lei Geral Tributária. Esta disposição, colocando-se sob a perspetiva da ineficácia do ato em que se procura tornear a lei fiscal, estabelece a ineficácia “no âmbito tributário” dos “atos ou negócios jurídicos essencial ou principalmente dirigidos, por meios artificiosos ou fraudulentos e com abuso de formas jurídicas, à redução, eliminação ou diferimento temporal de impostos que seriam devidos em resultado de factos, atos ou negócios jurídicos de idêntico fim económico, ou à obtenção de vantagens fiscais que não seriam alcançadas, total ou parcialmente, sem a utilização desses meios, efetuando-se e não se produzindo as vantagens fiscais referidas”

O n.º 7 do artigo 23.º do Código do IRC (versão de 2004, atual nº 5) reveste claramente a natureza de uma norma anti-abuso de tipo específico. O n.º 7 do artigo 23.º do Código do IRC visa introduzir moralização no âmbito da dedução de certos “prejuízos”. É uma norma teleologicamente direcionada a contrariar o aproveitamento resultante de condições de transmissão de bens acordadas por entidades com “relações especiais” entre si, mormente nos termos do n.º 4 do artigo 58.º do Código do IRC («em que uma tem o poder de exercer, direta ou indiretamente, uma influência significativa nas decisões de gestão da outra»). Tal disposição intenta muito claramente acautelar que determinadas transmissões onerosas de partes de capital social possam ocasionar uma evasão fiscal que se concretizaria através do apuramento, na pessoa do alienante, de uma menos-valia materialmente relevante e parcialmente dedutível, sendo que, na pessoa do adquirente, o ganho obtido numa posterior transmissão não viria, ou viria de forma insignificante, a influenciar o respetivo lucro tributável.

Pese embora a multiplicação das alterações de disposições avulsas feitas com a intenção expressa de atingir comportamentos abusivos, e cujo casuísmo, quantas vezes, põe em perigo a coerência e a sistematicidade do ordenamento jurídico-tributário, poderá dizer-se que – ao não aceitar, para efeitos fiscais, os custos ou perdas do exercício suportados com a transmissão onerosa de partes de capital a «entidades com as quais existam relações especiais, nos termos do n.º 4 do artigo 58.º» – a norma do n.º 7 do artigo 23.º do Código do IRC, em bom rigor, e em nosso entendimento, andará à procura fundamentalmente daquele (mítico) «rendimento real» projetado na Constituição da República Portuguesa, a qual, no n.º 2 do seu artigo 104.º, preceitua que “(…)A tributação das empresas incide fundamentalmente sobre o seu rendimento real (…)”.

Por isso é que se conclui que o n.º 7 do artigo 23.º do Código do IRC não viola, e antes respeita, o princípio de tributação das empresas fundamentalmente pelo «rendimento real», consagrado no n.º 2 do artigo 104.º da Constituição da República Portuguesa (…)”. [[Cfr Acórdão do STA, de 11-02-2009, Proc. 0862/08, disponível em www.dgsi.pt ]].


 

A questão dos juros

De harmonia com o disposto no artigo 24º-b), do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exatos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, “(…)restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os atos e operações necessários para o efeito (…)” – Cfr também artigo 100º, da LGT10, aplicável ex vi artigo 29º-1/a), do RJAT.

O processo de impugnação judicial, independentemente de correr termos em tribunal estadual tributário ou, como é o caso, em tribunal arbitral, é sempre, no essencial, um processo que visa a anulação de atos tributários.

É admitida, no entanto, a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios (Cfr., v. g., artigo 43º-1, da LGT e 61º-4, do CPPT).

Por outro lado, e no que expressamente concerne à arbitragem tributária, o artigo 24º-5, do RJAT, vem clara e expressamente permitir o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.

No caso destes autos, tendo a requerente, decorrente da liquidação, efetuado o respetivo pagamento acrescido de juros compensatórios, tem direito, conforme peticionado, à devolução, na respetiva proporção, do que pagou de molde a ser restabelecida a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado.

Quanto ao pedido de juros indemnizatórios, sendo claro o reconhecimento da ilegalidade do ato tributário, esta (ilegalidade) é, naturalmente, imputável à Administração Tributária que, por sua iniciativa praticou esse mesmo ato sem para tanto ter o necessário suporte legal.

Tem assim a requerente direito ao pagamento de juros indemnizatórios nos termos do artigo 43º-1, da LGT e 61º, do CPPT.


 

III DECISÃO

Destarte, decide este Tribunal Arbitral:

A – Julgar procedente o pedido de declaração de ilegalidade da liquidação adicional nº … e Derrama consequente na parte em que considerou como custos ou perdas abrangidos pelo disposto no artigo 23º-7, do CIRC (na redação de 2004), as menos-valias decorrentes de alienação de prestações de capital e, proporcionalmente, originou a liquidação de IRC e derrama na importância de € 102.215,61;

B – Julgar procedente o pedido de declaração de ilegalidade da liquidação dos correspondentes juros compensatórios na importância de € 9.327,41;

C – Julgar procedente o pedido de reconhecimento do direito da requerente ao reembolso dos montantes pagos (importância da liquidação e juros compensatórios) em consequência da liquidação ora declarada ilegal;

D – Julgar procedente o pedido de reconhecimento do direito da requerente a que lhe sejam pagos juros indemnizatórios, contados à taxa legal sobre € 111.543,02, desde a data em que efetuou o pagamento mencionado em C) – 10 de dezembro de 2007 -, até à data do efetivo e integral reembolso.

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Valor do processo: € 111.543,02 – arts. 315º-2 (in fine),CPC; 97º-A/1-a), CPPT e 3º-2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

Custas: Nos termos do artigo 22º-4, do RJAT, fixam-se as custas em € 3.060, 00, ficando o respetivo pagamento integral a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira, atento o seu decaimento.

Lisboa e CAAD, 7 de setembro de 2012


 

Os árbitros


 

José Poças Falcão (presidente)


 

Graça Martins


 

Amândio Silva


 


 


 


 


 


 


 

1 A requerente expende sobre a questão diversas considerações - Cfr arts 39º e ss., da douta petição.

2 Os fundamentos para esta conclusão constam dos artigos 161º e ss., da petição.

 

3 I - Em matéria de fundamentação de decisões de cálculo de juros compensatórios, o art. 35.º, n.º 9, da LGT estabelece que «a liquidação deve sempre evidenciar claramente o montante principal da prestação e os juros compensatórios, explicando com clareza o respetivo cálculo e distinguindo-os de outras prestações devidas». “II - Assim, é de concluir que a mínima fundamentação exigível em matéria de atos de liquidação de juros compensatórios terá de ser constituída pela indicação da quantia sobre que incidem os juros, o período de tempo considerado para a liquidação e a taxa aplicada, para além da indicação das normas legais em que assenta a liquidação desses juros e que esses elementos devem ser indicados na liquidação, diretamente ou por remissão para algum documento anexo”.

 

4 Cfr. os desenvolvimentos nos arts. 72º e ss., da douta resposta da AT.

5 É suscitada ainda a questão de não ter sido considerado pela Administração Fiscal, para igual efeito, o valor de € 31.966,84 relativo a denominada “libertação de passivo” decorrente de alegada assunção desta dívida da requerente pela entidade adquirente das participações sociais e créditos por prestações suplementares, sendo certo nenhum reflexo ter na liquidação sub juditio nem a requerente formula qualquer pedido com base em tal alegada fatualidade.

 

6 Acrónimo de “Regime Jurídico da Arbitragem Tributária”, aprovado pelo Dec.-Lei nº 10/2011, de 20 de janeiro.

7 Conceito que é, inclusive, objeto de expressa definição no n.º 5 para os efeitos previstos no regime de subcapitalização.

8 Cfr. Parecer do Professor Rui Pinto Duarte e da Dra. Ana Mafalda Garcia (Doc 19, junto pela requerente).

9 Neste sentido, Acórdão do STA, de 30/11/2011, Proc. n.º 107/11, Ac. de 29/06/2011, Proc. 943/10, Ac. 20/05/2009, Proc. 01077/08, Ac. de 07/02/2007, Proc. n.º 1046/05 e Ac. de 10/07/2002, Proc. 246/02, disponíveis no sítio www.dgsi.pt.

10 (…) a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do SP, à imediata e plena reconstituição da legalidade do ato ou situação objeto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão (…)”