Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 624/2015-T
Data da decisão: 2016-04-28  IUC  
Valor do pedido: € 98.304,76
Tema: IUC - Liquidações ano 2011; importador; cumulação de pedidos; incidência subjetiva
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Decisão Arbitral

 

 

REQUERENTE: A…, S.A

 

REQUERIDA: Autoridade Tributária e Aduaneira

 

Os árbitros Dr. Juiz José Poças Falcão (árbitro-presidente), Dr. António Manuel Melo Gonçalves e Profª. Doutora Maria do Rosário Anjos, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para constituir o Tribunal Arbitral, acordam no seguinte:

 

 

I RELATÓRIO

 

A)    As Partes e a Constituição do tribunal Arbitral

 

  1. A…, S.A., anterior B…, S.A., pessoa coletiva n.º…, com sede na Rua…, n.º …B, freguesia de … e …, …-… Porto, notificada através do Ofício n.º…, de 25 de Junho de 2015, do despacho da Senhora Chefe de Divisão de Justiça Administrativa, da Direção de Finanças de Lisboa, que negou provimento à reclamação graciosa deduzida contra as autoliquidações de Imposto Único de Circulação, relativas ao ano de 2011, no valor total de € 98.304,76, descritas minuciosamente na petição do pedido arbitral formulado, todas constantes dos documentos e referenciadas na decisão de reclamação graciosa e respetivo processo administrativo (PA), que se dão por integralmente reproduzidos, deduziu pedido de constituição de Tribunal Arbitral coletivo, nos termos e para efeitos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º e dos artigos 10.º e seguintes, todos do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (“RJAT”). Com este pedido pretende a Requerente impugnar o despacho da Senhora Chefe de Divisão de Justiça Administrativa, da Direção de Finanças de Lisboa, de 24 de Junho de 2015 que negou provimento à reclamação graciosa deduzida, bem assim como, as autoliquidações de IUC, relativas ao ano de 2011, supra mencionadas, peticionando a sua anulação.

 

  1. O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi apresentado em 28-09-2015, foi aceite pelo Exmo. Sr. Presidente do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) e notificado à entidade Requerida em 30-06-2015. A Requerente optou por não designar árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no nº1 do artigo 6º do RJAT, foram designados, pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa, em 23-11-2015, os juízes árbitros supra mencionados para constituir o Tribunal Arbitral Coletivo. A nomeação foi aceite e as partes notificadas da designação dos árbitros, não tendo manifestado a vontade de recusar a designação.

 

  1. Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c), do nº 1, do artigo 11º, do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228º da Lei nº 66-B/2012, de 31 de Dezembro (RJAT), o Tribunal Arbitral Coletivo foi constituído em 15-12-2015. A entidade requerida, Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) foi notificada, em 12-01-2016, para apresentar resposta no prazo legal, nos termos e para os efeitos do disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 17º do RJAT.

 

  1. A AT apresentou a sua resposta em 12-02-2016, a qual se dá por integralmente reproduzida. Atendendo ao conteúdo do Pedido arbitral e da Resposta apresentada foi proferido em 22-02-2016 o seguinte despacho arbitral:

 

“ A Requerida, Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), apresenta na sua douta Resposta defesa por impugnação e por exceção.

Assim sendo, torna-se necessária a pronúncia da Requerente circunscrita exclusivamente à matéria que não configure defesa por impugnação (artigos 16º-a) e 18º-1/b) e 19º-1, in fine, do RJAT e 571º-2/2ª parte, do CPC ex vi artigo 29º, do RJAT).

Entende-se que tal pronúncia deve operar-se por escrito e no prazo de 10 dias.

II - Por outro lado, importa também que ambas as partes se pronunciem sobre a possível dispensa, por inutilidade, da reunião prevista no artigo 18º, do RJAT, sem prejuízo de oportunamente apresentarem alegações finais por escrito.

Prazo: 10 dias

III – À luz do princípio da cooperação com o Tribunal (artigo 7º, do CPC) e com vista a facilitar a tarefa de elaboração da decisão final, solicite-se às partes o envio ao CAAD dos respetivos articulados em formato editável.”

 

Em 23-02-2016 pronunciou-se a Requerente sobre a matéria de exceção invocada pela Requerida, conforme requerimento que juntou aos autos e que se dá por integralmente reproduzido. Na mesma data, veio também a Requerida AT pronunciar-se nos autos a favor da dispensa de reunião prevista no artigo 18º do RJAT.

 

  1. Em 09-03-2016 foi proferido Despacho Arbitral com o seguinte conteúdo:

“Fica dispensada a reunião, considerando:

a) A concordância das partes;

b) que se trata, no caso, de processo não passível duma definição de trâmites processuais específicos, diferentes dos comummente seguidos pelo CAAD na generalidade dos processos arbitrais;

c) que, relativamente à exceção/questão prévia suscitada pela AT – e que será conhecida a final aquando da apreciação do mérito do pedido - foi já cumprido o princípio do contraditório (cfr. resposta da requerente) e

c) que não há aparente necessidade de correção de peças processuais.

II – Prova testemunhal

Analisadas as peças processuais de ambas as partes e a posição da AT relativamente ao quadro factual invocado, considera o Tribunal inexistir controvérsia relativamente aos factos essenciais alegados para a boa decisão da causa, sendo suficiente a prova documental não impugnada.

Assim sendo, ponderada a inutilidade da requerida diligência de inquirição de testemunhas e atento o disposto nos artigos 16º-c), do RJAT e 130º, do CPC, aplicável ex vi artigo 29º-1/e), o RJAT, indefere-se o pedido de produção de prova testemunhal formulado pela requerente.

III – Alegações finais

Ambas as partes apresentarão, no prazo sucessivo de 15 (quinze) dias (a começar pela requerente), alegações escritas, de facto e de direito.

IV – Data para prolação e notificação da decisão final

Fixa-se o dia 6-6-2016 como data limite para a prolação e notificação da decisão arbitral final.

V – Taxa de arbitragem remanescente

A requerente deverá dar cumprimento ao disposto no artigo 4º-3, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.”

 

  1. A Requerente apresentou as suas alegações em 24-03-2016 e a Requerida em 12-04-2016, as quais se dão por integralmente reproduzidas.

 

B) DO PEDIDO FORMULADO PELA REQUERENTE:

 

  1. A Requerente formula o presente pedido de pronúncia arbitral pugnando pela ilegalidade, com a consequente anulação, de todas as liquidações de IUC identificadas no artigo 5º da PI, referentes ao ano de 2011, todas juntas aos autos de procedimento de reclamação graciosa e constantes do Processo Administrativo (PA), que se dá por integralmente reproduzido.

 

  1. Em síntese, a requerente alega que no âmbito da sua atividade importa veículos que, por motivos comerciais e contratuais estabelecidos com os fabricantes, por vezes, matricula em Portugal mas que são, posteriormente, vendidos e expedidos para outros Estados-Membros da União Europeia ou, em certos casos, exportados para terceiros Estados. Ainda no âmbito da sua atividade comercial, importa veículos que, por vezes, são matriculados e, posteriormente, vendidos a empresas de Rent-a-Car, a empresas suas concessionárias e a clientes finais, bem assim como, por vezes, comercializa veículos usados.

 

  1. As situações em discussão nos presentes autos traduzem autoliquidações Imposto Único de Circulação, com referência ao ano de 2011, as quais se traduzem em 160 liquidações de IUC referentes a viaturas vendidas a concessionários, 619 liquidações referentes a exportações, 11 vendidas a rent-a-car e 5 viaturas usadas, tudo no valor global de €98.304,76.

 

  1. Todas estas liquidações se encontram devidamente identificadas e discriminadas na tabela apresentada no artigo 5º da petição do pedido arbitral, com identificação da matrícula do veículo a que respeitam, da situação jurídica em que se encontravam ao tempo em que ocorreu o facto tributário e respetivo valor liquidado, pelo que se dá por integralmente reproduzido o seu teor. Apesar de ter efetuado o seu pagamento por motivos económicos a requerente discorda de todas estas liquidações por considerar que não é sujeito passivo de IUC relativamente às viaturas e aos períodos em causa, isto porque em relação a todas estas viaturas, à data do facto tributário, a Requerente já não era a sua proprietária. Ocorre, assim, um motivo de exclusão da incidência subjetiva de imposto. Entende que não estão satisfeitos os requisitos de incidência subjetiva do imposto, previstos no artigo 3º do CIUC, conjugado com os artigos 4º e 6º do referido Código.

 

  1. Alega a requerente que o artigo 3º do CIUC estabelece uma presunção ilidível, nos termos da qual o proprietário da viatura se presume como sendo aquela pessoa singular ou coletiva que consta como tal no registo automóvel. Ilidida a presunção, como pretende ter alcançado nos presentes autos, deve considerar-se que a requerente não era sujeito passivo de imposto à data em que ocorreu o facto tributário. Neste mesmo sentido pronunciou-se o Tribunal Arbitral no âmbito de pedido apresentado pela ora Requerente contra as autoliquidações de Imposto Único de Circulação referentes ao ano de 2012 e que correu termos sob o n.º 595/2014-T. Neste processo o Tribunal arbitral decidiu que “limitar os sujeitos passivos deste imposto apenas aos proprietários dos veículos em nome dos quais os mesmos se encontrem registados – ignorando as situações em que estes já não coincidam com os reais proprietários ou os reais utilizadores -, constitui restrição que, à luz dos fins do IUC, não encontra base de sustentação. O registo gera, portanto, apenas uma presunção ilidível, i.e., uma presunção que pode ser afastada mediante prova em contrário (prova de que o registo já não produz no momento da obrigação de imposto, a verdade material que lhe teria dado origem).

 

  1. Conclui pela ilegalidade dos atos de liquidação por erro sobre os pressupostos do facto tributário, o que consubstancia vício de violação de lei. Invoca diversa jurisprudência a favor da interpretação que preconiza. Alega que, por força da necessidade de regularização da sua situação tributária, efetuou o pagamento de todas as liquidações impugnadas, pelo que, em resultado da anulação das autoliquidações de imposto, deve ser ressarcida das quantias indevidamente pagas, acrescidas de juros indemnizatórios. Invoca como sustentação do seu pedido o disposto no artigo 43.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária, nos termos do qual “são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.” Estabelecendo o n.º 2 do supra citado preceito que se considera “também haver erro imputável aos serviços nos casos em que, apesar de a liquidação ser efectuada com base na declaração do contribuinte, este ter seguido, no seu preenchimento, as orientações genéricas da administração tributária, devidamente publicadas.

 

  1. Sobre a incidência subjetiva do Imposto Único de Circulação e a exigibilidade deste imposto, a AT tem sempre sustentado, através de Ofícios Circulados e de informações vinculativas que são sempre sujeitos passivos do Imposto Único de Circulação os proprietários dos veículos, considerando-se como tais as pessoas, coletivas ou singulares, em nome das quais os veículos se encontrem registados. Assim, a AT tem sempre sustentado que a presunção derivada do Registo Automóvel é uma presunção inilidível, não admitindo prova em contrário. Neste sentido, invoca entre outras, a Informação Vinculativa proferida no Processo n.º 2012… que mereceu o Despacho concordante de 19 de Abril de 2012, do Substituto Legal do Diretor-Geral dos Impostos, segundo a qual, “Em sede de IUC é tributada a propriedade dos veículos, independentemente do respectivo uso ou fruição. Assim, enquanto a situação da referida viatura não for regularizada junto das referidas entidades, continuará a ser liquidado o respetivo imposto em nome do requerente, registado como proprietário da mesma na Conservatória de Registo Automóvel. Efetivamente, nos termos do Código do IUC, o imposto é devido pelo proprietário do veículo até ao seu cancelamento ou abate em virtude da Lei. Nestes termos enquanto o IMTT não cancelar a matrícula, o imposto continua a ser devido pelo seu proprietário que é o mesmo que consta das bases de dados da Conservatória de Registo Automóvel e do IMTT ”.

 

  1. Contata-se que, o erro de que padecem as liquidações impugnadas assenta em diversas orientações genéricas da AT, nos termos das quais resulta o entendimento que é sujeito passivo do Imposto Único de Circulação, independentemente, do uso ou fruição do veículo ou até mesmo depois da sua transmissão em momento anterior ao imposto se tornar exigível, a pessoa em nome da qual o veículo se encontra registado ou, na sua ausência, o sujeito passivo do Imposto sobre Veículos. A título de exemplo cita o Ofício Circulado n.º 40096, de 16 de Outubro de 2009.

 

15.     Conclui, pois a requerente que o despacho de indeferimento da reclamação graciosa, bem assim como, as autoliquidações de Imposto Único de Circulação em causa nos presentes autos são ilegais e foram praticadas em conformidade com as orientações genéricas da AT, pelo que deverá concluir-se que a procedência do presente Pedido de Pronúncia Arbitral, materializa o “erro imputável aos serviços”, para efeitos do disposto no artigo 43.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária. Assim, pretende a requerente que em resultado da anulação dos atos de autoliquidação, seja restituído à Requerente o montante de imposto pago indevidamente, acrescido de juros indemnizatórios à taxa legal, nos termos do artigo 43.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária.

 

C – A RESPOSTA DA REQUERIDA

 

  1. A Requerida AT, devidamente notificada para o efeito, apresentou tempestivamente a sua resposta na qual, na qual contestou, por exceção e por impugnação, o pedido arbitral apresentado pela requerente. Por exceção, alega que não estão preenchidos os pressupostos processuais para o prosseguimento dos autos, porquanto nos mesmos se cumulam pedidos ilegalmente, na medida em que não estão reunidos os pressupostos para tal cumulação.

 

  1. Mesmo que assim não se entenda, alegou a requerida por impugnação, em síntese, que não assiste razão à Requerente, cuja posição tem subjacente uma errada interpretação e aplicação das normas legais subsumíveis ao caso sub judice, notoriamente, errada. Do ponto de vista da AT, o artigo 3º do CIUC não comporta qualquer presunção legal, pelo que o sujeito passivo do imposto é o proprietário da viatura, tal como resulta das bases de dados que servem de base à AT para proceder à liquidação, ou seja, a base de dados do Instituto da Mobilidade dos Transportes Terrestres (IMTT) e do Instituto de Registo e Notariado/Conservatória do Registo Automóvel (IRN). Alega, ainda, que o entendimento defendido pela requerente incorre numa enviesada leitura da letra da lei, corresponde a uma interpretação que não atende ao elemento sistemático, violando a unidade do regime consagrado em todo o CIUC e, mais amplamente, em todo o sistema jurídico-fiscal e decorre ainda de uma interpretação que ignora a ratio do regime consagrado no artigo em apreço, e bem assim, em todo o CIUC.

 

  1. Segundo a AT, o legislador estabeleceu expressa e intencionalmente que “se consideram como tais as pessoas em nome das quais os mesmos se encontrem registados,” porquanto é esta a interpretação que preserva a unidade do sistema jurídico-fiscal e que outra interpretação seria ignorar o elemento teleológico de interpretação da lei: a ratio do regime consagrado no artigo em apreço, e bem assim, em todo o CIUC.

 

  1.  Pugna, em suma, pela procedência da exceção invocada ou, caso não seja esse o entendimento, pela improcedência total do pedido arbitral. Entende que, em nenhum caso, mesmo que o tribunal decida pela procedência do pedido, deverá a AT ser responsabilizada pelo pagamento de juros indemnizatórios, nem pelo pagamento das custas processuais, por ser inteiramente imputável à Requerente a emissão das liquidações

 

II - SANEAMENTO

 

  1. O Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído e é materialmente competente, nos termos do artigo 2º, nº1, alínea a) do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro.

 

  1. As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se legalmente representadas nos termos do disposto nos artigos 4º e 10º, nº 2, do DL nº 10/2011 e artigo 1º, da Portaria nº 112/2011, de 22 de Março.

 

  1. Posto isto, cumpre decidir:

 

  1. A questão prévia da exceção por ilegal cumulação de pedidos;
  2. A questão de mérito suscitada nos autos, dependendo da decisão a dar à questão prévia, suscitada a título de exceção.

 

Quanto à alegada exceção de ilegalidade de cumulação dos pedidos, cumpre decidir:

 

23.  Na resposta da Requerida, é suscitada a questão da cumulação ilegal de pedidos. Assim, são identificadas as seguintes situações:

- Veículos que foram expedidos ou exportados e faturados antes do termo do prazo de registo (619);

- Veículos que foram expedidos ou exportados e faturados no prazo de 30 dias concedido para liquidação e pagamento (109);

- Veículos que foram vendidos a empresas de rent-a-car, os quais foram transmitidos para estas empresas até ao termo do prazo legalmente concedido para registo (11);

- Veículos que foram vendidos a empresas concessionárias, até 60 dias contados da atribuição de matrícula (160);

- Veículos que foram vendidos a terceiros, antes do facto gerador de imposto e

- Veículos usados, que foram vendidos até 60 dias após a matrícula (5).

 

24.  No entendimento da AT não se verificam as mesmas circunstâncias de facto, e ainda que se «possa alvitrar que os procedimentos factuais possam ser transversais a todas as liquidações, o que é certo, é que estamos perante situações fáticas díspares consubstanciadas em veículos diferentes, com datas de venda diferentes, procedimentos diferentes, em datas diferentes e a proprietários totalmente díspares, por valores completamente diferenciados», citando em seu abono a Decisão Arbitral 691/2014-T onde, alega que numa situação de idêntica configuração factual, se decidiu «é forçoso concluir que a procedência dos 391 pedidos cumulados não depende, essencialmente da apreciação das mesmas circunstâncias de facto nem são as mesmas questões jurídico-fiscais a apreciar. Não existe nenhuma questão jurídico-fiscal central comum a todos os pedidos».

 

25.  Conclui que não deve a mesma ser admitida por parte do tribunal arbitral, devendo ser notificada a requerente nos termos e para os efeitos do anterior artigo 47.º n.º 5 do CPTA, sob cominação da absolvição da instância.

 

26.  Ouvida a Requerente, em sede de contraditório, veio a mesma defender que se encontram preenchidos os pressupostos legais de que depende a cumulação de pedidos, tendo salientado que a AT perfilhou tal entendimento em sede de reclamação graciosa, ao considerar, dentro dos poderes discricionários que lhe são conferidos pela Lei, que da cumulação de pedidos não resultava qualquer prejuízo para a celeridade da decisão. A própria AT faz um reconhecimento implícito ao admitir na sua resposta que «… embora a Requerente proceda ao fracionamento das questões a serem sindicadas no âmbito do presente pedido de pronúncia arbitral … as questões são transversais às normas legais aplicáveis, ir-se-á proceder à apreciação dos argumentos da Requerente, em bloco, e não de per si».

 

27.  Apreciando, o artigo 3.º, n.º 1 do RJAT preceitua que «A cumulação de pedidos ainda que relativos a diferentes atos e a coligação de autores são admissíveis quando a procedência dos pedidos dependa essencialmente da apreciação das mesmas circunstâncias de facto e da interpretação e aplicação dos mesmos princípios ou regras de direito.».

 

28.  Por seu turno, o artigo 104.º do CPPT prevê que a admissão de pedidos é admissível em caso de identidade da natureza dos tributos, dos fundamentos de facto e de direito invocados e do tribunal competente para a decisão.

 

29.  Nesta matéria, o Tribunal Arbitral Coletivo não vê razões para se afastar do entendimento expresso na Decisão Arbitral n.º 13/2015 – T, de 30 de outubro de 2015, e em que dois dos árbitros seus intervenientes, são igualmente participantes na formação da presente decisão.

Nela se escreveu o seguinte:

«No caso dos autos, pese embora os factos se refiram, como alega a AT, a veículos diferentes, com datas de venda diferentes, procedimentos diferentes de vendas efetuadas a concessionários e vendas em datas diferentes e a proprietários totalmente díspares, por valores completamente diferenciados, a verdade é que não se vislumbra como poderá tal circunstância impedir a cumulação de pedidos.”

 

30.  Com efeito, independentemente da diferente situação fáctica existente, como alega a AT, a verdade é que se verifica total identidade (i) da natureza dos tributos (ii) dos fundamentos de facto e de direito invocados e (iii) do tribunal competente para a decisão.

 

Senão vejamos:

 

31.  Em todas as situações invocadas pela Requerente, o tributo em causa é o IUC.

 

32.  Aliás, sempre se dirá que, no âmbito de pedido de pronúncia arbitral, não se exige, para este efeito, a identidade de tributos, atento o facto de esta identidade não se encontrar prevista no artigo 3.º n.º 1 do RJAT e as normas previstas no CPPT serem de aplicação subsidiária, conforme decorre do disposto no artigo 29.º n.º 1ª) do RJAT.

 

33.  Da mesma forma, os fundamentos de facto e de direito invocados pela Requerente são exatamente os mesmos em todas as situações, reconduzindo-se os primeiros à alegada alienação das viaturas em momento anterior à data do facto gerador do imposto e os segundos à apreciação das normas legais relativas à incidência subjetiva de IUC.

 

34.  A identidade do tribunal competente para a decisão parece evidente em todas as situações elencadas pela Requerente, sendo o presente tribunal materialmente competente para o efeito.

 

35.  Por onde se conclui necessariamente pela verificação dos pressupostos de que a lei faz depender a possibilidade de cumulação inicial de pedidos.

Nem se diga, como faz a AT, que o facto de as situações invocadas se referirem a veículos diferentes, com datas de vendas diferentes, procedimentos diferentes de vendas efetuadas a concessionários e vendas em datas diferentes e a proprietários totalmente díspares, por valores completamente diferenciados, impediria a cumulação. A ser assim, ver-se-ia a Requerente forçada a impugnar separadamente cada liquidação de IUC, o que manifestamente não poderá ser defendido.

 

36.  Pelo que, considerada a verificação dos pressupostos legais de que depende a cumulação de pedidos, não se justifica a requerida notificação da Requerente nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 47.º n.º 5 do CPTA.».

 

Face ao supra exposto, acresce concluir que:

 

  1. O processo não enferma de nulidades que o invalidem ou que obstem ao julgamento do mérito da causa, pelo que o Tribunal está em condições de decidir a questão de mérito em discussão nos presentes autos arbitrais.

 

III. MATÉRIA DE FACTO

 

A)    Factos Provados

 

  1. Como matéria de facto relevante para a decisão a proferir, o Tribunal dá por assente os seguintes factos:
  2. A Requerente, A…, S.A., anterior B…, S.A., pessoa coletiva n.º…, com sede na Rua…, n.º … B, freguesia de … e …, …-…, no Porto, é uma sociedade comercial que se dedica, no âmbito da sua atividade, à importação de veículos que, por motivos comerciais e contratuais estabelecidos com os fabricantes, por vezes, matricula em Portugal mas que são, posteriormente, vendidos e expedidos para outros Estados-Membros da União Europeia ou, em certos casos, exportados para terceiros Estados;
  3. Ainda no exercício da sua atividade comercial a requerente importa veículos que, por vezes, são matriculados e, posteriormente, vendidos a empresas de Rent-a-Car, a empresas suas concessionárias e a clientes finais;
  4. Por vezes, a requerente também comercializa viaturas usadas;
  5. A Requerente constatou que no portal das finanças se encontravam em pagamento o IUC referente ao ano de 2011, imputável a um conjunto numeroso de viaturas, as quais se encontram devidamente identificadas e pormenorizadas na tabela contida no artigo 5º do pedido arbitral, que aqui se dá por integralmente reproduzido;
  6. A requerente procedeu, em conformidade com a informação contida no portal, às autoliquidações em causa e procedeu ao seu pagamento, para evitar as consequências negativas, com impacto direto na sua atividade, advindas da instauração de processos de execução fiscal;
  7. A Requerente procedeu ao pagamento de todas estas autoliquidações, no valor global de 98.304,76; conforme resulta dos comprovativos juntos aos autos e é aceite pela Requerida; (vd. doc. 6 Partes I e II juntos aos autos)
  8. As situações de facto subjacentes às autoliquidações do Imposto Único de Circulação relativo ao ano de 2011 impugnadas nos autos, contidas na tabela referida em d) podem ser sintetizadas em cinco grupos distintos, nos termos seguintes:

                                                              i.      160 autoliquidações de IUC relativas a veículos vendidos às concessionárias, todos vendidos até 60 dias após a matrícula;

                                                            ii.      619 autoliquidações de IUC relativas a veículos exportados, todos vendidos até 60 dias após a matrícula ;

                                                          iii.      11 autoliquidações relativas a veículos vendidos a empresas de Rent-a-Car, ;

                                                          iv.      5 autoliquidações relativas a veículos usados, todos vendidos até 60 dias após a matrícula;

                                                            v.      1 autoliquidação relativa a um veículo vendido a uma concessionária e 109 autoliquidações relativas a veículos exportados, todos vendidos entre 60 a 90 dias após a matrícula;

  1. A requerente foi notificada pela AT para se pronunciar, em sede de audição prévia, sobre o projeto de liquidação oficiosa de Imposto Único de Circulação referente aos anos de 2009, 2010, 2011 e 2012, o qual foi exercido em 14 de Outubro de 2013; (doc. nº 5 e 7 junto aos autos)
  2. A Requerida proferiu decisão final e manteve todas as autoliquidações relativas ao ano de 2011 impugnadas nos presentes autos; (doc. 7 junto aos autos).
  3. A Requerente deduziu reclamação graciosa contra as referidas autoliquidações, como consta do PA junto aos autos pela Requerida e do documento nº 4 junto aos autos pela requerente.
  4. Através do Ofício n.º…, de 12 de maio de 2015, a Divisão de Justiça Administrativa da Direção de Finanças de Lisboa notificou a requerente para se pronunciar em sede de direito de audição sobre o projeto de decisão da reclamação graciosa, o qual não foi exercido;
  5. Por Ofício n.º…, de 25 de junho de 2015, da Divisão de Justiça Administrativa, da Direção de Finanças de Lisboa foi notificado à Requerente a decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra as autoliquidações em causa nos autos;
  6. As transmissões para os concessionários, as exportações, bem assim como para as rent-a-car e/ou clientes finais são tituladas por faturas emitidas nos termos legais, que a requerente juntou aos autos (docs. 11 a 19 juntos aos autos);
  7. Todas as exportações estão tituladas com os respetivos documentos de expedição, juntos aos autos, bem assim como os comprovativos das declarações efetuadas junto da Direção Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo para efeitos de cumprimento das correspondentes obrigações declarativas e fiscais que cumpriu;
  8. As viaturas logo que entram em Portugal são depositadas nas instalações dos concessionários ou das empresas de Rent-a-Car, é processado o correspondente Imposto sobre Veículos (ISV) que se repercute no preço final a pagar pelos adquirentes, e é promovida a respetiva matrícula em Portugal;
  9. Assim, no momento em que é efetuada a matrícula dos veículos, a Requerente já os vendeu a terceiros, efetuando só então a matrícula em conformidade com a prática comercial e as regras legalmente estabelecidas;
  10. Resulta do procedimento descrito supra que o primeiro titular do registo automóvel da viatura é a Requerente;
  11. Todos os veículos constantes das liquidações impugnadas nos presentes autos têm um primeiro registo de propriedade em nome da Requerente;
  12. As liquidações de imposto impugnadas foram pagas pela requerente, que juntou os respetivos comprovativos, e totalizam o valor global de €98.304,76;
  13. A Requerida manteve, ao longo de todos os procedimentos tributários supra descritos e apesar das intervenções da Requerente e de toda a documentação junta apesar disso, o seu propósito inicial e promoveu a emissão das respetivas liquidações oficiosas de IUC;
  14.  À data dos atos tributários de liquidação impugnados a requerida AT dispunha de todos os elementos de informação suficientes sobre a situação das viaturas em causa nos presentes autos, quer dos que inicialmente dispunha quer dos que lhe foram entregues pela Requerente com o exercício do direito de audição.

 

B)    FUNDAMENTAÇÃO DOS FACTOS PROVADOS

 

  1. A decisão sobre a matéria de facto nos termos supra descritos tem por base a prova documental que as Partes juntaram ao presente processo, a requerente em anexo ao pedido formulado e a Requerida com a junção do Processo Administrativo.

 

  1. O Tribunal considerou em especial, a realidade factual descrita no pedido arbitral quanto às situações negociais respeitantes aos diversos veículos, comprovada pelos documentos juntos em anexo ao pedido arbitral e ainda pela informação constante do processo administrativo carreada nos autos.

 

C)    FACTOS NÃO PROVADOS

 

  1. Não existem outros factos dados como não provados, uma vez que todos os factos relevantes para a apreciação do pedido foram dados como provados.

 

IV- Decisão de mérito: Fundamentação de direito

 

  1. Atendendo às posições das Partes assumidas nos argumentos apresentados, ao Tribunal cumpre decidir a questão de mérito, a qual se reporta à interpretação das normas de incidência do IUC e sua aplicação ao caso concreto descrito nos presentes autos. No essencial, a questão de direito sobre a qual o tribunal arbitral tem de se pronunciar consiste em apreciar os termos da configuração da incidência subjetiva do IUC à luz do disposto no artigo 3º do Código do Imposto Único de Circulação (CIUC), nomeadamente, a questão de saber se a incidência subjetiva assenta estritamente na inscrição da titularidade do veículo no Registo Automóvel, ou se, o registo opera apenas como uma presunção de incidência tributária, ilidível, em conformidade com o disposto no artigo 73.º, da Lei Geral Tributária. Sobre esta matéria é já abundante e bastante definida a jurisprudência arbitral vertida em diversas decisões arbitrais.

 

Vejamos pois qual a adequada decisão sobre esta questão.

 

Da incidência subjetiva: o facto gerador de imposto e os efeitos do registo automóvel em sede de incidência de IUC

 

43.  A questão a decidir tem estritamente a ver com os pressupostos de incidência de IUC, referentes ao caso concreto e, nessa medida, impõe-se conhecer da alegada ilegalidade por vício de violação de lei por erro sobre os pressupostos que conduziu a AT a emitir as liquidações impugnadas.

 

44.  Analisada a matéria de facto carreada nos autos, o regime jurídico aplicável resultante das disposições conjugadas do CIUC, do ISV e do Código da Estrada, impõe-se aferir da sua aplicação ao caso concreto para poder concluir se as liquidações de IUC impugnadas são ou não ilegais.

Atendendo ao disposto no CIUC estabelece, como regra de incidência, que os sujeitos passivos são os proprietários dos veículos, considerando como tais as pessoas em nome das quais os mesmos se encontrem registados. O quadro jurídico fundamental aplicável nesta matéria é o previsto nos artigos 1º a 6º, do CIUC, aprovado pela Lei nº 22-A/2007, de 29 de junho. O artigo 2º do CIUC define a incidência objetiva do imposto, distinguindo os veículos por categorias especificadas, norma que se afigura clara e sem dificuldades de aplicação. Porém, o mesmo já não sucede com a norma de incidência subjetiva contida no nº1, do artigo 3º do CIUC, a qual está na origem do presente litígio e constitui, assim, questão a decidir no caso em apreciação. A análise de ambos os preceitos (artigos 2º e 3º) permitem concluir que no funcionamento do IUC o registo automóvel tem um papel fundamental, mas a correta aplicação do regime proposto pelo legislador impõe o recurso a outros elementos interpretativos. Importa, pois, determinar qual o sentido e alcance da norma de incidência subjetiva, constante do artigo 3º, nº 1, do CIUC e da eventual existência ou não de uma presunção ilidível, conexionada com a questão dos efeitos jurídicos do registo automóvel, suscitada pela Requerente.

 

45.  Dispõe o artigo 3º do CIUC:

 

“ARTIGO 3º

INCIDÊNCIA SUBJETIVA

1 – São sujeitos passivos do imposto os proprietários dos veículos, considerando-se como tais as pessoas singulares ou coletivas, de direito público ou privado, em nome das quais os mesmos se encontrem registados.

2 – São equiparados a proprietários os locatários financeiros, os adquirentes com reserva de propriedade, bem como outros titulares de direitos de opção de compra por força do contrato de locação”.

 

            Estabelece o nº1, do artigo 11º, da LGT que:

 

“Na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam, são observadas as regras e princípios gerais da interpretação e aplicação das leis”.

 

46.  A interpretação e aplicação da norma jurídica, pressupõe a realização de uma atividade interpretativa, a qual deve ser objetiva, equilibrada, e conforme com a letra e o espírito da lei. Qualquer texto, e a lei não é exceção, comporta múltiplos sentidos e contém com frequência expressões ambíguas ou obscuras. Por essa razão, embora a letra da lei seja “o fio condutor” do intérprete, ela deve ser interpretada tendo em conta os objetivos subjacentes, “a ratio” ou a motivação do legislador ao estabelecer a norma em análise. A estes elementos acresce um outro segundo o qual a interpretação da norma jurídica deve respeitar a “unidade do sistema jurídico”, a sua coerência e lógica intrínseca. O artigo 9º, do Código Civil (CC), fornece as regras e os elementos fundamentais para a interpretação da norma jurídica, ao qual também a interpretação da lei fiscal deve obedecer, o qual começa por dizer que a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dela o “pensamento legislativo”. A estes princípios gerais acrescem, ainda, os princípios constantes da LGT, nomeadamente no artigo 73º, que estabelece que as presunções contidas em normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário.

 

47.  No que se refere à questão em análise, há que salientar o contributo das decisões arbitrais já proferidas nos processos nºs 14/2013-T, de 15 de outubro, 26/2013-T de 19 de julho, 27/2013-T, de 10 de setembro, 217/2013-T de 28 de fevereiro e, mais recentemente, nas decisões proferidas nos processos 286/2013-T, de 2 de maio de 2014, 293/2013-T, de 9 de junho de 2014, 46/2014-T de 5 de setembro, 212/2014 – T de 23 de fevereiro de 2015, 250/2014 – T, de 17 de novembro de 2014, 43/2014 – T e 13/2015 T de 28 de outubro de 2015, as quais, entre outras, revelam uma apurada reflexão sobre a questão fundamental em apreciação. Às decisões arbitrais mencionadas acresce a jurisprudência do Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS), plasmada no Acórdão de 19 de março de 2015, proferido no proc. nº 08300/14, disponível in www.dgsi.pt.

 

48.  É, pois, neste quadro de fundo, utilizando os princípios hermenêuticos fundamentais acabados de referir, acolhidos pela Jurisprudência dos nossos tribunais superiores, que devemos procurar encontrar a interpretação adequada aos normativos em presença.

 

Assim, constata-se que o facto gerador do imposto, nos temos do CIUC é constituído pela propriedade do veículo, tal como atestada pela matrícula ou registo em território nacional, no ano da sua importação ou introdução no mercado nacional (artigo 3.º, n.º 1, do CIUC). O imposto considera-se exigível no primeiro dia do período de tributação (artigo 6.º, n.º 3, do Código do IUC), o qual corresponde ao ano que se inicia na data da matrícula (cfr. artigo 4.º, n.º 2, do Código do IUC).

 

49.  Ora, no caso dos presentes autos constata-se que, por força das regras legais aplicáveis e pelos procedimentos necessários à atividade comercial da requerente o primeiro registo foi efetuado em nome da ora Requerente. Mas em todos os casos concretos das viaturas em causa nos presentes autos, parte substancial das viaturas foram expedidas, exportadas e faturadas antes do prazo de registo ou no prazo de 30 dias concedidos para a liquidação e pagamento, até ao prazo legal concedido para o registo ou, ainda, vendidos até sessenta dias após a matrícula, em todo o caso, antes do facto gerador do imposto.

Na ausência de registo de propriedade do veículo efetuado dentro do prazo legal, é o imposto devido no ano da matrícula do veículo, liquidado e exigido ao sujeito passivo do imposto sobre veículos (ISV) com base na declaração aduaneira do veículo, ou com base na declaração complementar de veículos em que assenta a liquidação desse imposto, ainda que não seja devido (artigo 18.º, n.º 1, alínea a), do CIUC.

Ora, no caso em apreço nos presentes autos está em causa o IUC devido pelo ano de 2011, referente a:

            a. 619 viaturas expedidas ou exportadas e faturadas até 60 dias após a matrícula (antes do prazo de registo);

            b. 109 viaturas expedidas ou exportadas e faturadas no prazo de 30 dias concedido para a liquidação e pagamento, e uma viatura usada vendida a concessionária, em todo o caso, todos vendidos entre 60 a 90 dias após a matrícula;

            c. 11 viaturas vendidas a empresas de rent-a-car até ao termo legalmente concedido para o registo;

            d. 160 viaturas vendidas a empresas concessionárias até 60 dias contados da atribuição da matrícula;

            e. 5 viaturas usadas vendidas a terceiros no prazo de 60 após a matrícula e uma viatura usada vendida a um concessionário até sessenta dias após a matrícula.

 

50.  Isto mostra que, embora os veículos em causa tivessem um primeiro registo a favor da Requerente (nalguns casos em momento muito anterior ao ano de 2011) como se compreende pelo procedimento legalmente estabelecido e ao qual está sujeita, os veículos já eram, à data do facto tributário, propriedade de outros proprietários, por terem sido vendidos, faturados e expedidos ou exportados, conforme documentação junta aos autos e mencionada na base factual supra descrita.

A documentação junta ao presente pedido arbitral, sufragada pelo processo administrativo junto aos autos pela Requerida, condensa toda a informação relativa à data da venda/transferência contratual, data da matrícula e registo de cada uma das viaturas. Estes factos foram, aliás, invocados, descritos e documentados na reclamação graciosa apresentada e indeferida.

 

51.  Assim, se a Requerente não era a sua efetiva proprietária à data da ocorrência dos factos tributários (2011) que determinam a obrigação de imposto, dado terem os mesmos sido já vendidos aos respetivos concessionários ou a terceiros, expedidos ou exportados em data anterior à ocorrência do facto tributário, conforme faturação emitida, que junta como elemento probatório, não se compreende nem justifica a liquidação do IUC, referente ao ano de 2011, à Requerente.

 

52.  Esta conclusão decorre, também, da interpretação das normas do n.º 1 do artigo 17.º e do artigo 18.º do CIUC, relativas ao prazo de pagamento do imposto e liquidação oficiosa, respetivamente, os quais assentam no pressuposto de que "no ano da matrícula o sujeito passivo do IUC é o proprietário do veículo na data em que findarem aqueles 60 dias contados da data da atribuição da matrícula, que o deverá liquidar e entregar ao Estado nos 60 dias subsequentes." Ora, no caso dos presentes autos, é certo que todas as viaturas foram vendidas até aos sessenta dias após a matrícula (a maior parte das viaturas em causa) ou entre os sessenta e os noventa dias após a matrícula. E, sendo assim, todas as viaturas tinham já sido vendidas dentro no prazo legalmente estabelecido, e de todas essas vendas havia documentação bastante para o comprovar (faturas, documentos de expedição/exportação, documentos aduaneiros, entre outros que se encontram junto aos autos). Resulta demonstrado que a Requerente não era, à data do facto tributário, o sujeito passivo de IUC.

 

53.  Outro entendimento seria ir manifestamente contra os princípios subjacentes à reforma do IUC e até contra a sua natureza de imposto sobre a circulação da viatura automóvel. Na verdade, na atividade desenvolvida pela ora Requerente, a transmissão da propriedade dos veículos opera, normalmente, antes mesmo da data da matrícula. Isto porque a Requerente procede à admissão em território português de veículos novos, que, em momento anterior ao da respetiva matrícula, transmite aos seus clientes, concessionários. Todavia, por força das normas legais aplicáveis, o registo dos veículos em causa é efetuado em nome da Requerente, ainda que, no momento em que se efetiva, não seja esta já a sua proprietária. Este procedimento, aliás, resulta do disposto nos artigos 117.º, n.º4, do Código da Estrada, que atribui à pessoa, singular ou coletiva, que proceder à admissão, importação ou introdução no consumo em território nacional, a obrigatoriedade de requerer a matrícula dos veículos, bem assim como, do disposto no artigo 24.º, n.º 1, do Regulamento do Registo Automóvel, que determina que o registo inicial de propriedade de veículos importados, admitidos, montados, construídos ou reconstruídos tem por base o respetivo requerimento. Das referidas normas resulta, pois, que a Requerente, na qualidade de operador registado que procede à admissão de veículos novos em território nacional, necessariamente figura no respetivo registo inicial como sua proprietária, ainda que no momento em que este se efetua, a propriedade dos mesmos tenha sido já transmitida a terceiros. E, se assim é, por imposição do legislador, tal visa o controlo da atividade pelas autoridades competentes de forma a controlar quem vem a adquirir tais viaturas e quando. Disto decorrem, entre outras, diversas obrigações fiscais.

 

54.  Nesta conformidade estamos perante a questão de saber se está em causa a interpretação do artigo 3º, nº1, do CIUC, no sentido de se determinar se a mesma consagra, ou não, uma presunção relativa à qualificação como proprietário, e consequentemente, como sujeito passivo deste imposto, a pessoa, singular ou coletiva, em nome da qual a propriedade do veículo se contra registada e, caso de conclua nesse sentido, a sua elisão com base dos elementos probatórios que o integram.

 

55.  Não obstante o Código do IUC erigir como princípio estruturante deste tributo o princípio da equivalência, entendido como compensação pelos efeitos nefastos em termos ambientais e energéticos resultantes da circulação de veículos, o referido Código elege, no tocante à incidência subjetiva, o proprietário do veículo, considerando como tal a pessoa em nome da qual o mesmo se encontre registado (artigo 3.º, n.º 1, do CIUC). Apesar disso, o legislador ressalvou alguns casos particulares em que a propriedade formal ou jurídica do veículo foi secundarizada pela utilização do mesmo, imputando a este último a obrigação de pagamento do IUC, como sucede com os locatários financeiros, os adquirentes com reserva de propriedade, bem como outros titulares de direito de opção de compra por força de contrato de locação (artigo3.º, n.º 2, do CIUC) [1].

 

56.  Certo é que a norma de incidência, ao remeter para os elementos do registo automóvel, não distingue entre o registo inicial do veículo e os registos posteriores: o sujeito passivo do imposto é o proprietário do veículo, considerando-se como tal a pessoa, singular ou coletiva em nome da qual o veículo se encontrar registado. É, pois sobre a interpretação da norma do n.º 1 do artigo 3.º que, como já referido, se evidenciam as diferentes posições expressas pela Requerente e pela Requerida. Segundo a Requerente, a referida norma estabelece uma presunção de propriedade, com base no registo, ilidível nos termos gerais e, em especial, por força do disposto no artigo 73.º da Lei Geral Tributária. Para a Requerida, estabelecendo o CIUC a sujeição passiva bem como o facto gerador da obrigação de imposto, por referência aos elementos constantes do registo automóvel, conforme decorre dos artigos 3º e 6º do CIUC e sendo a Requerente a solicitar a emissão do certificado de matrícula e encontrando-se os veículos registados em seu nome no períodos de tributação encontram-se reunidos os pressupostos do facto gerador do IUC, bem como da sua exigibilidade, sendo a Requerente sujeito passivo do imposto com referência ao período em causa.

 

57.  Esta matéria tem sido objeto de diversas decisões arbitrais que, reiterada e uniformemente, se têm pronunciado no sentido de considerar que a norma do nº 1, do artigo 3º do CIUC estabelece uma presunção, ilidível, nos termos gerais e, em especial, for força do disposto no artigo 73.º da LGT. Também este tribunal seguirá de perto essa orientação[2].

 

58.  Com efeito, o recurso ao registo automóvel como elemento estruturante do sistema de liquidação deste tributo evidencia-se ao longo de todo o respetivo Código. Mas impõe-se atender ao disposto no seu artigo 6º, relativo à definição do facto gerador da obrigação de imposto, cujo nº 1 dispõe que é facto gerador da obrigação de imposto “a propriedade do veículo, tal como atestada pela matrícula ou registo em território nacional".

Deste preceito decorre que os veículos automóveis que não estejam, nem devam estar, registados em território português, apenas ficam abrangidos pela incidência objetiva deste tributo, se no mesmo permanecerem por período superior a 183 dias, conforme dispõe o nº 2 do mesmo artigo. Não há dúvida que o legislador recorreu ao registo automóvel como suporte fundamental para operacionalizar o imposto. Apesar disso, não se pode extrair, como imediata conclusão, que a norma de incidência subjetiva, no segmento em que considera como proprietário a pessoa em nome da qual o veículo se encontre registado, não constitua uma presunção de incidência. Segundo noção contida no artigo 349º do C. Civil, presunções são as ilações que a lei ou o julgador, tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido. Acresce que, estabelece o artigo 341º do Código Civil que as presunções constituem meios de prova, tendo esta por função a demonstração da realidade dos factos, de tal modo que, quem tem a seu favor a presunção legal escusa de provar o facto a que ela conduz (cfr. nº1 do artigo 350º do Código Civil).

Dito isto, acresce que as presunções, que podem ser explícitas ou implícitas, salvo nos casos em que a lei o proibir, podem ser ilididas, mediante prova em contrário, como aliás resulta expressamente do disposto no nº 2, do artigo 350º do Código Civil.

Por fim, e com manifesta relevância para a decisão do caso concreto, convém ter presente que, tratando-se de presunções de incidência tributária, estas são sempre ilidíveis, conforme expressamente dispõe, o artigo 73º, da LGT.

 

59.  A controvérsia em torno desta questão veio a surgir no âmbito na nova lei, porquanto a expressão “presumindo-se” foi substituída pela expressão “considerando-se”. No mesmo sentido, estabelece o artigo 3.º, n.º 1, do Regulamento dos Impostos de Circulação e Camionagem, aprovado pelo DL n.º 116/94, de 3/05, que são sujeitos passivos destes tributos "os proprietários dos veículos presumindo-se como tais, até prova em contrário, as pessoas singulares ou coletivas em nome das quais os mesmos se encontrem registados."

Entendemos, contudo, que se está perante uma mera questão semântica, que não altera minimamente o conteúdo da norma em questão.

Assim, quanto à questão de saber, face ao teor literal do disposto no nº1, do artigo 3º, do CIUC, qual o alcance da expressão “considerando-se como tais”, dado que na atual versão o legislador não usou o termo “presumem-se” (o qual constava do extinto Regulamento do Imposto Sobre Veículos), entende o Tribunal que só pode ser o seguinte: o legislador presume (considera) que os proprietários são as pessoas em nome das quais os veículos se encontrem registados (sublinhado nosso). Significa isto que, tal presunção, implícita, é naturalmente ilidível nos termos previstos no artigo 73º da LGT.

Na versão atual do Código, apenas mudou o verbo, optando agora o legislador pela expressão “considerando-se”. Certo é que, entre as versões legislativas anteriores e a atual entrou em vigor a LGT, que consagrou, expressamente, o princípio contido no artigo 73º, do qual resulta que em matéria de incidência tributária qualquer presunção admite sempre prova em contrário. Logo, torna-se indiferente a adoção de uma presunção expressa ou implícita, porquanto, uma como a outra são igualmente ilidíveis.

 

60.  Entende-se, deste modo, que o facto de o legislador, na atual versão do CIUC, ter optado por uma presunção implícita (usando a expressão “considerando-se”) em vez de uma presunção expressa (com recurso à expressão “presumindo-se”), como acontecia anteriormente, não traduz uma alteração substancial no que respeita à incidência subjetiva do imposto. Não é, pois, a titularidade constante do registo automóvel condição, por si só determinante de incidência tributária, mas sim a propriedade tal qual resulta do registo, o que resulta numa mera presunção ilidível. Acresce que, podemos facilmente apontar diversos exemplos, extraídos do ordenamento jurídico tributário, em que o legislador optou pela utilização do verbo “considerar”, com sentido presuntivo. Além do que, como já se disse supra, tratando-se de norma de incidência tributária, nunca seria admissível a consagração de uma presunção inilidível. Como afirmam, Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa (Lei Geral Tributária, anotação ao nº 3, do artigo 73º, da LGT), “as presunções em matéria de incidência tributária podem ser explícitas, reveladas pela utilização da expressão presume-se ou semelhante (…). No entanto, as presunções também podem estar implícitas em normas de incidência, designadamente de incidência objetiva, quando se consideram como constituindo matéria tributável determinados valores de bens móveis ou imóveis, em situações em que não é inviável apurar o valor real” [3].

 

61.  São muitos os exemplos de normas em que é utilizado o verbo “considerar” para estabelecer presunções ilidíveis, como sucede com o disposto nº 2 do artigo 21º do CIRC, no artigo 89º-A da LGT ou no artigo 40º, nº1 do CIRS entre outros. Tendo em conta que o sistema jurídico deve formar um todo coerente, os exemplos acima referidos, bem como a doutrina e jurisprudência indicadas, permitem concluir que não é só quando é usado o verbo “presumir” que estamos perante uma presunção, mas também o uso de outros termos ou expressões, como o termo “considera-se” podem servir de base a presunções. E, como se referiu supra, sendo o elemento literal o primeiro instrumento de interpretação da norma jurídica, em busca do pensamento legislativo, importa confrontá-lo com os demais elementos de interpretação, nomeadamente o elemento racional ou teleológico, o elemento histórico e o sistemático.

 

62.  No que toca ao elemento histórico, há que referir, que desde a origem do imposto de circulação, com a entrada em vigor do Decreto-Lei nº 599/72, de 30 de dezembro, foi, explicitamente, consagrada uma presunção, relativamente aos sujeitos passivos do imposto como sendo aqueles em nome de quem os veículos se encontravam matriculados ou registados. Essa versão da lei usava a expressão literal “presumindo-se como tais”.

Porém, atendendo aos fins do imposto em presença, há que reconhecer que o uso da expressão “considera-se”, na atual versão, contempla uma expressão com um efeito semelhante àquela, consubstanciando, igualmente, uma presunção. Isso mesmo sucede na formulação contida no nº 1, do artigoº 3º, do CIUC, em que se consagrou uma presunção, revelada por via do uso da expressão “considerando-se”, de significado semelhante e de valor equivalente à expressão “presumindo-se”, em uso desde a criação do imposto em questão. O uso da expressão “considerando-se” justifica-se por se afigurar, porventura, mais em sintonia com o reforço conferido à propriedade do veículo, que passou a constituir o facto gerador do imposto, nos termos constantes do artigo 6º do CIUC.

Pelo que, à luz do elemento literal da interpretação, nada obsta ao entendimento de que, o disposto no nº1, do artigo 3.º, do CIUC, consagra uma presunção ilidível.

 

Assim, quanto à incidência subjetiva do imposto, é de concluir que não se verificam alterações relativamente à situação anteriormente em vigor no âmbito do Imposto Municipal sobre Veículos, Imposto de Circulação e Imposto de Camionagem, como aliás é amplamente reconhecido pela doutrina, continuando a valer uma presunção ilidível nesta matéria. 

 

63.  Este entendimento é, ainda, o único que se afigura adequado e conforme ao princípio da verdade material e da justiça, subjacentes às relações fiscais, com o objetivo de tributar o real e efetivo proprietário e não aquele que, por circunstâncias de diversa natureza, não passa, por vezes, de um aparente e falso proprietário, por constar do registo automóvel, como sucede no caso concreto com a Requerente, por força da sua atividade de importadora e para cumprimento das regras legalmente aplicáveis à matrícula dos veículos novos importados e introduzidos no território nacional. Neste sentido, também as decisões arbitrais proferidas nos processos nºs 150/2014-T e 220/2014-T, confirmam o mesmo entendimento já plasmado em decisões arbitrais anteriores, no sentido de que: “(…) se o legislador tivesse, como pretende a Requerida, estabelecido na lei uma qualificação não presuntiva sobre quem é proprietário dos veículos (uma ficção legal), estaria com isso a estabelecer, através de uma diferente formulação, uma regra em tudo idêntica à regra hipotética referida. Estaria a fazer assentar a incidência subjetiva do imposto numa ficção legal, em total desconexão com uma qualquer substância económica como base da incidência subjetiva. (…) E, se assim é, forçoso será também concluir que o artigo 3º, n.º 1, só pode estabelecer uma presunção de propriedade do veículo, mesmo com todas as consequências negativas que essa conclusão acarretará, decerto, em termos de eficiência da administração do imposto.”

Esta posição foi também a que veio a ser, recentemente, reconhecida pelo STA no Acórdão de 19-03-2015.

64.  Sobre a questão em análise, é, pois, unânime o entendimento que tem vindo a ser defendido nas sucessivas, diversas e numerosas decisões arbitrais proferidas. Por ser assim, tem de se permitir ao titular inscrito no registo automóvel a possibilidade de apresentar elementos probatórios bastantes para a demonstração de que o efetivo proprietário é, afinal, pessoa diferente da que consta do registo, e que inicialmente, e em princípio, se supunha ser o verdadeiro proprietário. Caso contrário, aceitar-se-ia a supremacia da verdade formal do registo sobre a verdade material, e seria admitir a violação grosseira dos princípios fundamentais fiscais enunciados e, ainda, do princípio contido no artigo 73º, da LGT segundo o qual não existem presunções inilidíveis em matéria de incidência fiscal.

 

65.  A tudo o que se deixa supra exposto acresce que, outro entendimento, traduziria a violação dos princípios da legalidade, da proporcionalidade e da justiça, bem como o do inquisitório, consagrados, respetivamente, nos artigos 55º e 58º da LGT. De resto, é possível extrair, ainda, um outro argumento do disposto no artigo 7º do Código de Registo Predial (o qual constitui a base jurídica fundamental em matéria de registo de propriedade) o qual dispõe que “o registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define.”

À luz do princípio da uniformidade e coerência intrínseca do sistema jurídico, nenhum fundamento se afigura aceitável para que o princípio vigente no registo de propriedade em geral, sofresse uma inflexão ou mesmo “atropelo” injustificado em matéria de registo automóvel.

 

66.  Mas, se alguma dúvida persistisse, sempre se diria que, quanto aos elementos de interpretação de pendor racional ou teleológico, a exposição de motivos da Proposta de Lei n.º 118/X de 07/03/2007, subjacente à Lei nº 22-A/2007, de 29/06, é bastante expressiva ao esclarecer que a reforma da tributação automóvel é concretizada por via da deslocação de parte da carga fiscal do momento da aquisição dos veículos para a fase de circulação e visa “formar um todo coerente” que, embora destinado à angariação de receita pública, pretende que a mesma seja angariada na “medida dos custos ambientais que cada indivíduo provoca à comunidade”, acrescentando-se, a propósito do imposto em causa e dos diferentes tipos e categorias de veículos, que “como elemento estruturante e unificador (…) consagra-se o princípio da equivalência, deixando-se assim claro que o imposto, no seu conjunto, se subordina à ideia de que os contribuintes devem ser onerados na medida do custo que provocam ao ambiente e à rede viária, sendo esta a razão de ser desta figura tributária”, referindo, ainda, ser “(…) este princípio que dita a oneração dos veículos em função da respetiva propriedade e até ao momento do abate (…)”.

 

67.  Assim, a lógica e racionalidade do novo sistema de tributação automóvel pressupõe e almeja um sujeito passivo coincidente com o proprietário do veículo, no pressuposto de ser esse, e não outro, o real e efetivo sujeito causador dos danos ambientais, tal como decorre do princípio da equivalência inscrito no artigoº 1º, do CIUC. Este princípio da equivalência, que informa o atual imposto único de circulação, tem subjacente o princípio do poluidor - pagador, e concretiza a ideia, nele inscrita, de que quem polui deve, por isso, pagar. Trata-se, afinal, de alcançar as externalidades ambientais negativas que advêm da utilização dos veículos automóveis, sejam assumidos pelos seus proprietários e/ou pelos utilizadores, como custos que só eles deverão suportar. A este propósito, a posição vertida na Decisão Arbitral nº 286/2013-T de 2 de maio de 2014, sufragada por muitas outras posteriormente proferidas, é bastante esclarecedora ao afirmar que é “este princípio (da equivalência) que dita a oneração dos veículos em função da respetiva propriedade e até ao momento do abate, o emprego comum de uma base tributável específica, a revisão do quadro de benefícios fiscais vigente e a afetação de uma parcela da receita aos municípios da respetiva utilização. Ora, pretender, como o faz a Requerida, que o legislador, no artigo 3.º, n.º 1 do CIUC, fixou, seja qual for o meio técnico subjacente, a incidência subjetiva do imposto nas pessoas em nome de quem os veículos se encontram registados, com total independência de serem ou não, no período tributário relevante, titulares do direito de utilização do veículo, maxime da sua propriedade, implicaria desprezar aquela finalidade que preside à normatividade tributária, bem manifestada na incidência objetiva e na base tributável associada às diversas categorias de veículos (cfr. arts 2.º e 7.º do CIUC). É que uma inscrição registral, sem correspondência com a titularidade subjacente, nenhuma valia possui para dar satisfação e cumprimento a tal finalidade, pois não são as pessoas em nome de quem os veículos se encontrem inscritos quando não sejam titulares de direitos sobre a sua utilização que provocam custos ambientais e viários, mas antes tais custos ambientais e viários são causados pelos efetivos utilizadores dos veículos, nos termos das situações jurídicas substantivas pertinentes, mesmo que não constem, como deviam, do registo automóvel. O registo, na verdade, em nada depõe ou serve quanto ao princípio da equivalência estabelecido no artigo 1.º do CIUC. Aliás, assumir que o elemento determinativo da incidência tributária subjetiva é simples e exclusivamente o registo automóvel também não permite afirmar uma ligação com uma qualquer manifestação de capacidade contributiva relevante, o que, via de regra, nos tributos não estritamente comutativos, é imprescindível, já que deve existir, sem prejuízo de exigências de praticabilidade, uma qualquer ligação efetiva entre o imposto e um pressuposto económico materialmente relevante capaz de fundamentar o tributo. A razão de ser da figura tributária afasta, pois, a ideia de que a incidência respetiva se prende estrita e exclusivamente com a própria inscrição registral da titularidade dos veículos tributários e não com as situações substantivas atributivas do direito de utilização dos veículos (artigo 3.º, nºs 1 e 2 do CIUC) a que o registo se destina a dar publicidade (cfr. artigo 1.º e artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 54/75, de 12 de fevereiro, com as alterações posteriores, que regula o registo automóvel).” 

 

68.  Acresce, ainda, salientar que o DL n.º 54/75, de 12/02, que disciplina o registo de veículos automóveis, não prevendo qualquer norma acerca do caráter constitutivo do registo da propriedade automóvel, estabelece, no n.º 1 do seu artigo 1.º que o registo automóvel visa apenas dar publicidade à situação jurídica dos bens. De acordo com o artigo 7.º do Código do Registo Predial, supletivamente aplicável ao registo automóvel, por remissão do artigo 29.º daquele diploma, determina que o registo apenas "(...) constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define." Pronunciando-se sobre esta matéria, o STJ, em acórdão de 19-02-2004, proferido no processo n.º 3B4369, conclui que "(...) o registo não surte eficácia constitutiva, pois que se destina a dar publicidade ao ato registado, funcionando (apenas) como mera presunção, ilidível (presunção "juris tantum") da existência do direito (arts- 1.º, n.º 1, e 7.º, do CRP84 e 350.º, n.º2, do C. Civil) bem como da respetiva titularidade, nos termos dele constantes (...)".

 

69.  Quanto aos efeitos do registo, resulta claro do disposto nos artigos 1.º e 7º do Código de Registo Predial (CRP), que o registo tem uma dupla finalidade: dar publicidade à situação jurídica dos bens e constituir presunção de que o direito existe e pertence ao titular nele inscrito. Estas presunções são, porém, ilidíveis mediante prova em contrário, como resulta expressamente do disposto artigo 350.º, n.º 2, do Código Civil (CC) e, em matéria tributária, reforçado pelo artigo 73º da LGT. É pacífico para a doutrina e para a jurisprudência dos nossos tribunais superiores que o registo não é condição de validade dos negócios a ele sujeitos ou subjacentes, dele não depende a transmissão da propriedade e não pertence ao transmitente o ónus de promover o registo, pelo que nenhuma sanção lhe pode ser imposta pelo não cumprimento dessa obrigação por parte do adquirente (este sim obrigado a promover o registo) [4].

 

70.  Assim, acompanhando-se a reiterada jurisprudência arbitral, supra mencionada, relativa a situações idênticas, não pode deixar de se entender que a expressão "considerando-se como tais" constante da referida norma, configura uma presunção legal[5], e que esta é ilidível, nos termos gerais, e, em especial, por força do disposto no artigo 73.º da LGT que determina que as presunções consagradas nas normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário. Esta é, também, a posição do tribunal arbitral nos presentes autos, sufragando as posições já anteriormente plasmadas nas diversas decisões arbitrais supra mencionadas, pelo que, se entende que a presunção ilidível, inscrita no nº1, do artigoº 3º, do CIUC, corresponde à interpretação mais ajustada à prossecução dos objetivos almejados pelo legislador.

 

Da Elisão da Presunção

 

71.  As presunções de incidência tributária podem ser ilididas através do procedimento contraditório próprio previsto no artigo 64.º do CPPT ou, em alternativa, pela via de reclamação graciosa ou de impugnação judicial dos atos tributários que nelas se baseiem. No caso dos autos, a Requerente não utilizou aquele procedimento próprio, tendo antes optado pelo presente pedido de decisão arbitral que, assim, constitui meio próprio para ilidir a presunção de incidência subjetiva do IUC em que se suportam as liquidações tributárias cuja anulação constitui o seu objeto, pois que se trata de matéria que se situa no âmbito da competência material deste tribunal arbitral (arts. 2.º e 4.º do DL 10/2011).

Para ilidir a presunção derivada da inscrição do registo automóvel, a Requerente ofereceu, como meio de prova, cópias de faturas, documentos aduaneiros, comprovativos de expedição e exportação das viaturas e outros que constam dos processos de reclamação graciosa e dos quais resultou o entendimento do Tribunal, avaliados criticamente esses meios de prova, de que ocorrera a venda de todas as viaturas e liquidações de imposto aos respetivos adquirentes, de modo que ao tempo dos factos tributários e dos primeiros registos de propriedade efetuados, a Requerente já não era a proprietária dos veículos em causa. Não colhe, por fim, o argumento da unilateralidade das faturas, porquanto estas são meios de prova da ocorrência das transmissões de propriedade, pelo menos, se acompanhadas de outros documentos que não deixem dúvidas sobre a concretização daquele negócio em concreto, como sucede no presente caso.

 

72.  Diverge-se, assim, do entendimento da Requerida, o qual, a ser seguido, resultaria na exigência de uma prova impossível de alcançar. Sendo certo que, todos os documentos que a Requerente junta aos autos são documentos comerciais, contabilísticos e fiscais, reconhecidos para diversos efeitos legais, beneficiando as faturas e demais documentos aduaneiros ou de natureza fiscal da presunção de veracidade contida no artigo 75º da LGT. Presunção que a Requerida não afastou.

 

73.  Em suma: nenhum dos veículos aqui em causa era, à data da matrícula, propriedade da Requerente, pelo que se considera ilidida a presunção decorrente do primeiro registo automóvel efetuado.

Acrescente-se, ainda, que na situação em análise, se está perante contratos de compra e venda relativos a coisa móveis, que não estando sujeitos a quaisquer formalismos especiais (C. Civil, artigo 219.º), operam a correspondente transferência de propriedade por mero efeito do contrato e tradição da coisa. (C. Civil, artigo 408.º, n.º 1).

No entanto, estando em causa um contrato de compra e venda, que tem por objeto um veículo automóvel, em que o registo é obrigatório, o seu cumprimento pontual pressupõe a emissão da declaração de venda necessária à inscrição no registo da correspondente aquisição a favor do comprador, conforme vem sendo entendido pela jurisprudência dos tribunais superiores[6].

 

Tal declaração, relevante para efeitos de registo, poderá constituir prova da transação, embora não seja o único ou exclusivo meio de prova de tal facto. E, para efeitos registrais, também não é exigível qualquer formalismo especial, bastando a apresentação à entidade competente de requerimento subscrito pelo comprador e confirmado pelo vendedor, que, através de declaração de venda confirma que a propriedade do veículo foi por aquele adquirida por contrato verbal de compra e venda.

 

74.  Ora, com base nos documentos que integram o presente processo verifica-se que, à data da exigibilidade do imposto, os veículos identificados já não eram propriedade da Requerente em virtude de, por esta, terem sido transmitidos a terceiros. Pelo que fica assim ilidida a presunção de propriedade derivada do registo automóvel acolhida no n.º 1 do artigo 3.º do CIUC, relativamente aos veículos e períodos a que se reportam todas liquidações questionadas, com referência aos veículos nelas identificados, conforme lista anexa ao presente pedido de pronúncia arbitral. Assim, o entendimento subjacente às liquidações impugnadas nos presentes autos, segundo o qual os sujeitos passivos do IUC são, em definitivo e sem admissão de prova em contrário, as pessoas em nome de quem os veículos automóveis se encontram registados, sem considerar os elementos probatórios para identificação dos efetivos e verdadeiros utilizadores e atuais proprietários dos veículos, conduziu à liquidação ilegal do IUC, assente na errada interpretação e aplicação das normas de incidência subjetiva do Imposto Único de Circulação. Tais liquidações afiguram-se, pois, ilegais o que impõe a anulação dos correspondentes atos tributários.

 

75.  Nestes termos, atendendo ao disposto no artigo 3.º, n.ºs 1 e 2, do CIUC, ilidida a presunção contida no nº 1, conclui-se que a Requerente não constitui sujeito passivo do IUC, liquidado em relação ao ano de 2011, quanto aos veículos identificados nos autos. Em consequência de todo o supra exposto, resulta que todas liquidações impugnadas são ilegais, padecem do vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto e de direito, pelo que, devem ser objeto de anulação, procedendo-se, consequentemente, ao reembolso à Requerente do montante indevidamente pago acrescido dos juros à taxa legal.

 

Juros indemnizatórios

 

76.  A Requerente pede o reembolso do imposto indevidamente pago, no montante global de €98.304,76, acrescido de juros indemnizatórios, à taxa legal, nos termos do art. 43.º da LGT e 61.º do CPPT.

 

77.  De harmonia com o disposto na alínea b) do art. 24.º do RJAT a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exatos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, “restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os atos e operações necessários para o efeito”, o que está em sintonia com o preceituado no art. 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do art. 29.º do RJAT] que estabelece, que “a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do ato ou situação objecto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão”.

 

78.  Embora o art. 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão “declaração de ilegalidade” para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que em processo de impugnação judicial são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT e em que se proclama, como primeira diretriz, que “o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária”.

 

79.  O processo de impugnação judicial, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de atos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do art. 43.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que “são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido” e do art. 61.º, n.º 4 do CPPT (na redação dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, a que corresponde o n.º 2 na redação inicial), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».

 

80.  Assim, o n.º 5 do art. 24.º do RJAT ao dizer que “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário” deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral. No caso em apreço, é manifesto que, na sequência da ilegalidade dos atos de liquidação impugnados, há lugar a reembolso do imposto, por força dos referidos arts. 24.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e 100.º da LGT, pois tal é essencial para “restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado”, na parte correspondente à correção que foi considerada ilegal.

 

81.  No que concerne aos juros indemnizatórios, é também claro que a ilegalidade do ato é imputável à Administração Tributária e Aduaneira, que, por sua iniciativa praticou sem suporte legal. Está-se perante um vício de violação de lei substantiva, consubstanciado em erro nos pressupostos de direito, imputável à Administração Tributária. Tanto mais que, teve oportunidade de reparar o ato ilegal, quer em sede de reclamação graciosa quer após a notificação da apresentação do presente pedido arbitral.

Consequentemente, a Requerente tem direito a juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º, n.º 1, da LGT e do artigo 61.º do CPPT, calculados sobre a quantia que pagaram indevidamente.

Assim, deverá a Autoridade Tributária e Aduaneira dar execução à presente decisão arbitral, nos termos do art. 24.º, n.º 1, do RJAT, determinando o montante a restituir à Requerente e calcular os respetivos juros indemnizatórios, à taxa legal supletiva das dívidas cíveis, nos termos dos arts. 35.º, n.º 10, e 43.º, n.ºs 1 e 5, da LGT, 61.º, do CPPT, 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril (ou diploma ou diplomas que lhe sucederem).

Os juros indemnizatórios são devidos desde as datas dos pagamentos efetuados até à do processamento da nota de crédito, em que são incluídos (art. 61.º, n.º 5, do CPPT).

 

V - Decisão

 

            De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral em:

 

I) Julgar improcedente a exceção invocada pela Requerida;

II) Julgar procedentes os pedidos de declaração da ilegalidade do indeferimento da Reclamação Graciosa e das autoliquidações de IUC objeto dos autos e identificadas supra;

III) Anular as referidas liquidações;

IV) Julgar procedente o pedido de restituição das quantias pagas correspondentes às referidas liquidações, no total de € 98.304,76 e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a restituí-las;

V) Julgar procedente o pedido de pagamento de juros indemnizatórios e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a pagá-los à Requerente, calculados sobre a quantia a restituir, desde as datas dos pagamentos até à do processamento da nota de crédito, em que devem ser incluídos (art. 61.º, n.º 5, do CPPT), às taxas legais que vigorarem até ao pagamento, nos termos do artigo 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril (ou diploma ou diplomas que lhe sucederem).

VI) Condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira nas custas do presente processo.

 

VALOR DO PROCESSO

Em conformidade com o disposto nos artigos 305º, nº 2 do CPC, artigo 97º - A, nº 1, alínea a), do CPPT e artigo 3º, nº 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de €98.304,76.

 

Custas

 Ao abrigo do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, e nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em €2.754,00.

 

 

Notifique-se, registe-se e, oportunamente, arquive-se o processo

 

  Lisboa, 28 de abril de 2016

 

 

               O Tribunal Arbitral Coletivo,

 

 

_____________________________________

Dr. Juiz José Poças Falcão (Presidente)

 

 

 

                                               _____________________________

Dr. António Manuel Melo Gonçalves

 

 

 

_____________________________

      Prof. Dra. Maria do Rosário Anjos

 



[1] Vd. Sérgio Vasques, "Os Impostos Especiais de Consumo", Almedina, 2000 e Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.º 118-X, que deu origem à Lei n.º 22-A/2007, de 29/05 (reforma da tributação automóvel).

[2] Neste sentido, cfr.: Decisões Arbitrais de 19.7.2013, Proc. 26/1013-T, de 10.9.2013, Proc. 27/2013-T, de 15.10.2013, Proc. 14/2013-T, de 5.12.2013, Proc. 73/2013-T, de 14.2.2014, Proc. 170/2013-T, de 30.4.2014, Proc. 256/2013-T, de 2.5.2014, Proc. 286/2013, de 16.6.2014, Proc. 289/2013-T, de 14.7.2014, Proc.43/2014-T, de 6.6.2014, Proc. 294/2013-T, de 15.9.2014, Procs. 63/2014-T e 220/2014 e proc. 250/2014 – T de 7/11.e, ainda, Ac. TCAS de 19-03-2015.

[3]  Cfr também. Jorge de Sousa, CPPT, 6.ª Edição, Áreas Editora. Lisboa, 2011, pags. 586; ainda neste sentido cfr. Ac. STA, Acs. de 29.2.2012 e de 2.5.2012, Procs. 441/11 e 381/12.

[4] Neste sentido, vd, entre outros, os seguintes Acórdãos do STJ: Ac. STJ de 31.05.1966, in Proc. nº 060727 (Relator: Conselheiro Lopes Cardoso), decisão especificamente referente ao registo automóvel; Ac. STJ de 5.05.2005 (Relator: Conselheiro Araújo Barros) e Ac. STJ de 14.11.2013, in Proc. nº 74/07.3TCGMR.G1.S1(Relator: Conselheiro Serra Batista) exímios na afirmação do predomínio do princípio da substância sobre a forma, valendo a prova, por qualquer meio idóneo, de quem é substantivamente titular do direito de propriedade, a qual faz ilidir a presunção do registo.

[5] Aliás, a própria Requerida, afirma, mais do que uma vez que “o facto gerador do imposto é aferido pela matrícula ou pelo registo”, o que implica, necessariamente, o reconhecimento do caracter presuntivo do regime em causa. Com efeito, se “o facto gerador do imposto é aferido pela matrícula ou pelo registo”, é porque, naturamente, o “facto gerador do imposto” não é nem a matrícula, nem o registo! Estes serão factos-índice, dos quais se retira aquele, estando-se, perante e de forma inquestionável, perante uma presunção.

[6] Cfr. STJ, Acs. de 23.3.2006 e de 12.10.2006, Procs. 06B722 e 06B2620.