Acórdão Arbitral
I – Relatório
A…, S.A. com o N.I.P.C…, com sede na Rua…, … –…Viseu, e aqui representada pelos seus administradores B… e C…, veio, nos termos do disposto nos artigos 2.º n.º1 a) e artigo 10.º do decreto de Lei n.º10/2011 de 20 de Janeiro - Regime Jurídico da Arbitragem em matéria Tributária, doravante “ RJAT”, " apresentar pedido de constituição de Tribunal Arbitral Colectivo, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 2.º, 5º, 6º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante "RJAT"), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante "AT" ou "Requerida").
A Requerente vem pedir a pronúncia arbitral sobre a ilegalidade e consequente anulação das liquidações adicionais de Iva e juros compensatórios emitidas pela Autoridade Tributária e Aduaneira e que se discriminam:
Ano de 2011
Liquidação Adicional de IVA n.º … (período 1101), no valor de €10.002,60 (dez mil e dois euros e sessenta cêntimos): Doc. n.º 1;
Liquidação Adicional de IVA n.º … (período 1102), no valor de €9.868,59 (nove mil oitocentos e sessenta e oito euros e cinquenta e nova cêntimos): Doc. n.º 2;
Liquidação Adicional de IVA n.º … (período 1103), no valor de €13.133,07 (treze mil cento e trinta e três euros e sete cêntimos: Doc. n.º 3;
Liquidação Adicional de IVA n.º … (período 1104), no valor de €5.523,81 (cinco mil quinhentos e vinte e três euros e oitenta e um cêntimos): Doc. n.º 4;
Liquidação Adicional de IVA n.º… (período 1105), no valor de €:11.935,02 (onze mil novecentos e trinta e cinco euros e dois cêntimos): Doc. n.º 5;
Liquidação Adicional de IVA n.º … (período 1106), no valor de €:5.869,64 (cinco mil oitocentos e sessenta e nove euros e sessenta e quatro cêntimos): Doc. n.º 6;
Liquidação Adicional de IVA n.º … (período 1107), no valor de €7.275,25 (sete mil duzentos e setenta e cinco euros e vinte e cinco cêntimos): Doc. n.º 7;
Liquidação Adicional de IVA n.º … (período 1108), no valor de €5.040,82 (cinco mil e quarenta euros e oitenta e dois cêntimos): Doc. n.º 8;
Liquidação Adicional de IVA n.º … (período 1109), no valor de €11.095,63 (onze mil e noventa e cinco euros e sessenta e três cêntimos): Doc. n.º 9;
Liquidação Adicional de IVA n.º … (período 1110), no valor de €18.169,02 (dezoito mil cento e sessenta e nove euros e dois cêntimos): Doc. n.º 10;
Liquidação Adicional de IVA n.º 2014 … (período 1111) no valor de €10.186,95 (dez mil cento e oitenta e seis euros e noventa e cinco cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 11;
Liquidação Adicional de IVA n.º 2014 … (período 1112) no valor de €11.136,24 (onze mil cento e trinta e seis euros e vinte e quatro cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 12;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º … (período 1101), no valor de €1.457,91 (mil quatrocentos e cinquenta e sete euros e noventa e um cêntimos). Doc n.º13;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º … (período 1102), no valor de €1.403,77 (mil quatrocentos e três euros e setenta e sete cêntimos). Doc n.º14;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º … (período 1103), no valor de €1.826,40 (mil oitocentos e vinte e seis euros e quarenta cêntimos). Doc n.º15;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º … (período 1104), no valor de €747,61 (setecentos e quarenta e sete euros e sessenta e um cêntimos). Doc n.º16;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º … (período 1105), no valor de €1.578,69 (mil quinhentos e setenta e oito euros e sessenta e nove cêntimos). Doc n.º17;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º … (período 1106), no valor de €757,10 (setecentos e cinquenta e sete euros e dez cêntimos). Doc n.º18;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º … (período 1107), no valor de €912,10 (novecentos e doze euros e dez cêntimos). Doc n.º19;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º … (período 1108), no valor de €616,50 (seiscentos e dezasseis euros e cinquenta cêntimos). Doc n.º20;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º … (período 1109), no valor de €1.319,32 (mil trezentos e dezanove euros e trinta e dois cêntimos). Doc n.º21;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º … (período 1110), no valor de €2.096,66 (dois mil e noventa e seis euros e sessenta e seis cêntimos). Doc n.º22;
Ano de 2012
Liquidação Adicional de IVA n.º 2014 … (período 1201) no valor de €12.576,70 (doze mil quinhentos e setenta e seis euros e setenta cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 23 e 24;
Liquidação Adicional de IVA n.º 2014 … (período 1202) no valor de €10.400,03 (dez mil e quatrocentos euros e três cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 25 e 26;
Liquidação Adicional de IVA n.º 2014 … (período 1203) no valor de €13.198,75 (treze mil cento e noventa e oito euros e setenta e cinco cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 27 e 28;
Liquidação Adicional de IVA n.º 2014 … (período 1204) no valor de €9.323,10 (nove mil trezentos e vinte e três euros e dez cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 29 e 30;
Liquidação Adicional de IVA n.º 2014 … (período 1205) no valor de €14.758,48 (catorze mil setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e oito cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 31 e 32;
Liquidação Adicional de IVA n.º 2014 … (período 1206) no valor de €14.548,94 (catorze mil quinhentos e quarenta e oito euros e noventa e quatro cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 33 e 34;
Liquidação Adicional de IVA n.º 2014 … (período 1207) no valor de €11.653,44 (onze mil seiscentos e cinquenta e três euros e quarenta e quatro cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 35 e 36;
Liquidação Adicional de IVA n.º 2014 …(período 1208) no valor de €9.121,47 (nove mil cento e vinte e um euros e quarenta e sete cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 37 e 38;
Liquidação Adicional de IVA n.º 2014 … (período 1209) no valor de €10.491,60 (dez mil quatrocentos e noventa e um euros e sessenta cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 39 e 40;
Liquidação Adicional de IVA n.º 2014 … (período 1210) no valor de €14.543,40 (catorze mil quinhentos e quarenta e três mil e quarenta cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 41 e 42;
Liquidação Adicional de IVA n.º 2014 … (período 1211) no valor de €12.542,93 (doze mil quinhentos e quarenta e dois euros e noventa e três cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 43 e 44;
Liquidação Adicional de IVA n.º 2014 … (período 1212) no valor de €13.104,82 (treze mil cento e quatro euros e oitenta e dois cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 45 e 46;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º 2014 … (período 1201), no valor de 1.325,88€ (mil trezentos e vinte e cinco euros e oitenta e oito cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 47 e 48;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º 2014 … (período 1202), no valor de 1.063,30€ (mil e sessenta e três euros e trinta cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 49 e 50;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º 2014 … (período 1203), no valor de 1.306,08€ (mil trezentos e seis euros e oito cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 51 e 52;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º 2014 … (período 1204), no valor de 889,90€ (oitocentos e oitenta e nove euros e noventa cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 53 e 54;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º 2014… (período 1205), no valor de 1.361,82€ (mil trezentos e sessenta e um euros e oitenta e dois cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 55 e 56;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º 2014 … (período 1206), no valor de 1.293,06€ (mil duzentos e noventa e três euros e seis cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 57 e 58;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º 2014 … (período 1207), no valor de 996,04€ (novecentos e noventa e seis euros e quatro cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 59 e 60;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º 2014 … (período 1208), no valor de 749,70€ (setecentos e quarenta e nove euros e setenta cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 61 e 62;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º 2014 … (período 1209), no valor de 824,28€ (oitocentos e vinte e quatro euros e vinte e oito cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 63 e 64;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º 2014 … (período 1210), no valor de € 1.098,11 (mil e noventa e oito euros e onze cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 65 e 66;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º 2014 … (período 1211), no valor de 904,45€ (novecentos e quatro euros e quarenta e cinco cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 67 e 68;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º 2014 … (período 1212), no valor de 898,99€ (oitocentos e noventa e oito euros e noventa e nove cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 69 e 70;
Ano de 2013
Liquidação Adicional de IVA n.º 2014 … (período 1301) no valor de €12.867,91 (doze mil oitocentos e sessenta e sete euros e noventa e um cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 71;
Liquidação Adicional de IVA n.º 2014 … (período 1302) no valor de €12.826,05 (doze mil oitocentos e vinte e seis euros e cinco cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 72;
Liquidação Adicional de IVA n.º 2014 … (período 1303) no valor de €17.624,33 (dezassete mil seiscentos e vinte e quatro euros e trinta e três cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 73;
Liquidação Adicional de IVA n.º 2014 … (período 1304) no valor de €23.946,68 (vinte e três mil novecentos e quarenta e seis euros e sessenta e oito cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 74;
Liquidação Adicional de IVA n.º 2014 … (período 1305) no valor de €19.295,06 (dezanove mil duzentos e noventa e cinco euros e seis cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 75;
Liquidação Adicional de IVA n.º 2014 … (período 1306) no valor de €16.880,81 (dezasseis mil oitocentos e oitenta euros e oitenta e um cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 76;
Liquidação Adicional de IVA n.º 2014 … (período 1307) no valor de €14.661,18 (catorze mil seiscentos e sessenta e um euros e dezoito cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 77;
Liquidação Adicional de IVA n.º 2014 … (período 1308) no valor de €13.156,21 (treze mil cento e cinquenta e seis euros e vinte e um cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 78;
Liquidação Adicional de IVA n.º 2014 … (período 1309) no valor de €11.026,95 (onze mil e vinte e seis euros e noventa e cinco cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 79;
Liquidação Adicional de IVA n.º 2014 … (período 1310) no valor de €21.992,52 (vinte e um mil novecentos e noventa e dois euros e cinquenta e dois cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 80;
Liquidação Adicional de IVA n.º 2014 … (período 1311) no valor de €11.470,40 (onze mil quatrocentos e setenta euros e quarenta cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 81;
Liquidação Adicional de IVA n.º 2014 … (período 1312) no valor de €16.153,99 (dezasseis mil cento e cinquenta e três euros e noventa e nove cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 82;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º 2014 … (período 1301), no valor de 843,28€ (oitocentos e quarenta e três euros e vinte e oito cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 83 e 84;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º 2014 … (período 1302), no valor de 798,37€ (setecentos e noventa e oito euros e trinta e sete cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 85 e 86;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º 2014 … (período 1303), no valor de 1.039,03€ (mil e trinta e nove euros e três cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 87 e 88;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º 2014 … (período 1304), no valor de 1.327,89€ (mil trezentos e vinte e sete euros e oitenta e nove cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 89 e 90;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º 2014 … (período 1305), no valor de 1.008,62€ (mil e oito euros e sessenta e dois cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 91 e 92;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º 2014 … (período 1306), no valor de 821,37€ (oitocentos e vinte e um euros e trinta e sete cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 93 e 94;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º 2014 … (período 1307), no valor de 666,72€ (seiscentos e sessenta e seis euros e setenta e dois cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 95 e 96;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º 2014 … (período 1308), no valor de 555,08€ (quinhentos e cinquenta e cinco euros e oito cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 97 e 98 ;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º 2014 … (período 1309), no valor de 426,57€ (quatrocentos e vinte e seis euros e cinquenta e sete cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 99 e 100;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º 2014 … (período 1310), no valor de 780,88€ (setecentos e oitenta euros e oitenta e oito cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 101 e 102;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º 2014… (período 1311), no valor de 368,30€ (trezentos e sessenta e oito euros e trinta cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 103 e 104;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º 2014… (período 1312), no valor de 463,80€ (quatrocentos e sessenta e três euros e oitenta cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 105 e 106;
Ano de 2014
Liquidação Adicional de IVA n.º 2014 … (período 1401) no valor de €18.825,63 (dezoito mil oitocentos e vinte e cinco euros e sessenta e três cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 107;
Liquidação Adicional de IVA n.º 2014 … (período 1402) no valor de €13.033,79 (treze mil e trinta e três euros e setenta e nove cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 108;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º 2014 … (período 1401), no valor de 482,76€ (quatrocentos e oitenta e dois euros e setenta e seis cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 109 e 110;
Liquidação adicional de juros compensatórios n.º 2014… (período 1402), no valor de 289,95€ (duzentos e oitenta e nove euros e noventa e cinco cêntimos) e respetiva demostração de acerto de contas: Doc. n.º 111 e 112.
Fundamentação do pedido
Fundamenta o seu pedido, alegando no essencial:
a) Conforme resulta do relatório de inspeção junto, constata-se que não foi notificado à requerente o verso da folha onde consta a continuação dos despachos emitidos superiormente pela AT, assim como as suas as assinaturas e na qualidade em que foram proferidas.
b) E aqui sob esta epígrafe, tendo em conta a folha de rosto do RFIT, não totalmente notificada como anexo ao ofício, “N/REFERÊNCIA 2014 … de 07.11.201 ” e as demais 35 folhas, todas numeradas e o índice de matérias da folha 5/35, parece-nos claro que tal documento padece da seguinte falta ou grave irregularidade que inquinou irreversivelmente o resultado final com o vício de nulidade, para todos os legais efeitos (Cf. RCPIT, 62º, 6 e CPPT, 36º, 2, 39º, 12, 102º, 3 e 124º, 1):
“De falta de indicação do autor do ato e, no caso de este o ter praticado no uso de delegação ou subdelegação de competências, da qualidade em que decidiu.” Pelo que teve a requerente através da sua mandatária tido necessidade deconsultar o processo junto da Direção de Finanças de…, e solicitado certidão da folha omitida na notificação. (cfr. Doc. que ao deante se junta e aqui se dá por reproduzido).
c) Da certidão emitida em 16.03.2015 pelo Serviço de Finanças de … do RFIT do ano de 2011 a 2014, relativo à OI2014…, consta o parecer do chefe de equipa “ À Consideração Superior ” exarado e assinado em 04 de novembro de 2014 pela “ A Chefe de Equipa, D…– IT2 ” e bem assim o “ DESPACHO ” exarado e assinado em 06.11.2014 pela “ A Diretora de Finanças Adjunta, Por subdelegação, E…– Chefe de Divisão em regime de Substituição ” .
d) Com tal pedido de certidão à omissão da notificação efetuada, constatou-se que não consta qualquer referência à legal publicação em DR da “subdelegação” invocada. [“ O relatório de inspeção será assinado pelo funcionário ou funcionários intervenientes no procedimento e conterá o parecer do chefe de equipa que intervenha ou coordene, bem como o sancionamento superior das suas conclusões.” (RCPIT, 62º, 6), sendo certo que,“ As notificações conterão sempre a decisão, os seus fundamentos e meios de defesa e prazo para reagir contra o ato notificado, bem como a indicação da entidade que o praticou e se o fez no uso de delegação ou subdelegação de competências.” (CPPT, 36º, 2). (sublinhados nossos)
e) Ou não existe de todo ou é claramente ilegal o sancionamento superior do RFIT sob análise, já que o mesmo está despachado “pela Diretora de Finanças Adjunta Por subdelegação E…– Chefe de Divisão em regime de Substituição”.
f)Assim sendo, A Chefe de Divisão, E…, ao usar, neste caso (ou em qualquer outro), um poder recebido por subdelegação, nunca bastará à perfeição jurídica da sua decisão, a simples invocação de que o faz ao abrigo duma subdelegação de competências. Se isso é condição necessária, não é porém, condição suficiente. Esta está na concreta indicação do Diário da República em que tal subdelegação de competências foi publicada, para geral conhecimento e, de modo particular, para o conhecimento do concreto destinatário do seu ato em matéria tributária.
g) Ou seja: não tem o RFIT a decisão de sancionamento superior do Sr. Diretor de Finanças de…, enquanto órgão regional da AT, com competência própria para a inspeção tributária das empresas com sede no distrito de Viseu e para a sancionar, por decisão a exarar na versão final dos seus relatórios, nos termos do artº 16º, 1 b) do RCPIT.
h) A Srª. Chefe de Divisão, E…, enquanto Chefe de Divisão em regime de substituição, não é o titular máximo do órgão regional da AT. Este é o Sr. Diretor de Finanças de … e, por isso, a Srª. Chefe de Divisão, tendo assinado na qualidade de subdelegada da “. . . Diretora de Finanças Adjunta, Por subdelegação,E…– Chefe de Divisão em regime de Substituição”, para que a sua decisão não se esgotasse num mero parecer de concordância com a proposta do Srª. Inspetora F…, I.T. nº…, (uma vez que a Srª Chefe de Equipe, não se comprometendo, apenas deixou a matéria à consideração superior) teria de consignar, a seguir à sua assinatura, os elementos formais da subdelegação invocada: Data da subdelegação e data da sua publicação em Diário da República, com indicação do seu nº e série.
i) Assim, o que foi notificado ao SP A…SA, não foi um RFIT (aqui generosamente qualificado como tal neste parecer), mas apenas e só uma “proposta-parecer” que, enquanto tal, não tinha que ser notificado. Sê-lo-ia, integrado (fundamentação por integração, nos termos da LGT, artº 77º, 1,) na decisão do órgão regional – Diretor de Finanças de…, que se desconhece, de todo em todo. [Vejam-se os efeitos jurídicos, práticos, corporizados na conta do IVA de 2011 a 2014 a pagar – 480.244,86€. Atente-se, pois, nos efeitos deste procedimento inspetivo na esfera jurídica da empresa inspecionada, A…SA, e tenha-se presente o que dispõe a lei aplicável e acima transcrita e citada, e não se poderá retirar outra conclusão que não seja a de que este procedimento carrega formais irregularidades que o inquinam elementarmente com o vício de nulidade].
j)A falta de qualquer um dos 5 elementos expressamente exigidos pelo transcrito nº 2 do artº 36º do CPPT, nem sempre inquina o resultado com o vício de nulidade. Porém, foi entendimento do legislador, em nome do princípio da legalidade e da segurança jurídica, que a falta da indicação do autor do ato ou da qualidade em que decidiu ou decide, provocasse o vício de nulidade da notificação efetuada.
k) Este diploma (CPPT) é bem claro, no nº 12 do artº 39º, quando preceitua que “o acto de notificação será nulo no caso de falta de indicação do autor do acto e, no caso de este o ter praticado no uso de delegação ou subdelegação de competências, a qualidade em que decidiu, do seu sentido e da sua data”
l) Isto dá bem a medida da irregularidade e da ilegalidade assim praticada, neste procedimento inspetivo e do vício, insanável, que lhe está associado. Ou seja: mesmo que a Srª. Chefe de Divisão, em regime de substituição, “E…“ estivesse a usar materialmente (como invoca, mas não prova . . .) uma competência subdelegada pela Srª. Diretora de Finanças Adjunta, competência que por sua vez esta teria recebido por delegação da entidade originariamente competente – Diretor de Finanças de …- mesmo nesta hipótese, dizíamos, (que aqui se admite apenas por exigência de raciocínio), estaria a violar ostensivamente o regime jurídico aplicável em matéria de delegação de poderes ou competências. [Aqui se deixa consignado e se dá por reproduzido tal regime jurídico:Vide: Artº 62º da LGT; Artº 9.º, da Lei n.º 2/2004, de 15/1; Artº 27.º do DL n.º 135/99, de 22/4 e Artºs 29.º n.º 1 e 35.º a 37.º do CPA].
m) Em resumo: o que formalmente foi notificado à A…SA, não foi um verdadeiro RFIT, mas apenas e só, in limite, um seu ato preparatório que, se superiormente sancionado - e não se prova que o tenha sido - constituiria a sua fundamentação. Não pode, assim, valer como RFIT, porque inquinado com o vício, insanável, de nulidade nos precisos termos da lei aplicável (Cf. CPPT, 39º, 12).A admitir-se a notificação dum RFIT, verdadeiro e próprio, teria de existir e ser conhecida do público e particularmente da destinatária A…SA, com publicação em Diário da República, perfeitamente identificado, uma decisão de subdelegação de poderes e competências, quanto às “CORRECÇÔES ARITMETICAS” que se verificaram in casu (artigo 39º-12, CPPT – vício de violação de Lei).
Sem prescindir:
n) As correções preconizadas pela Autoridade Tributária vertidas no relatório fundamentador invocado, com as quais não pode a ora requerente concordar por violação ostensiva do Direito Constitucional e dos Princípios Orientadores do Direito fiscal bem como das relações que devem nortear os relacionamentos entre a Autoridade Tributária e o Contribuinte, que se deverão pautar pelo Princípio da Boa-fé e da Segurança Jurídica.
o) A causa do procedimento tributário inspetivo, donde emergem os atos tributários de IVA de 2011, 2012, 2013 e 2014 no valor de 480 244,86€, que decorreu de 02.06.2014 a 03.10.2014, tendo por base a Ordem de Inspeção externa nº OI2014…, de 02.06.2014, ação inspetiva essa cujo quadro jurídico objetivo (artºs 13º e 14º do RCPIT) é/foi o seguinte:
MOTIVO: “Reenquadramento de IVA”,
ÂMBITO: “Ação parcial ”, IVA e,
INCIDÊNCIA TEMPORAL: ”2011, 2012, 2013, 2014-01; 2014-02”.
Ou seja, tudo conforme o conteúdo de pags. 3/35 do RFIT (Relatório Final de inspeção Tributária).
p) Por este quadro jurídico objetivo, ficámos a saber que o Sr. Diretor de Finanças de…, ou alguém por ele com ou sem competência, quando em 02.06.2014 emitiu a sua formal ordem de inspeção ao SP A… -OI2014…- não teve outra razão, fundamento ou motivo, que não fosse o “Reenquadramento de IVA
q) Concluíram assim em sede de relatório, pag. 16/35 o seguinte:
“Com efeito, o s.p., ao realizar operações que consistem na prática de serviços isentos de imposto, enquadráveis nas alíneas 2) e 29) do Código do IVA, encontra-se no direito de poder renunciar à isenção, nos termos da alínea b) do nº 1 do artº 12º, do nº 4 do mesmo Diploma, conjugado este último com o decreto-lei 21/2007, de 29.01, por remissão do nº 6, desde que reúna os requisitos aí previstos:“1- Podem renunciar à isenção, optando pela aplicação do imposto às suas operações: (…) b) Os estabelecimentos hospitalares… não pertencentes a pessoas coletivas de direito público ou a Instituições privadas integradas no sistema nacional de Saúde, que efetuem prestações de serviços médicos e sanitários e operações com elas estritamente conexas;(…)”. Ou seja, são excecionados os casos em que as Instituições privadas estão integradas no sistema nacional de saúde.” Acrescentando “(...)Sucede que, o s.p. não fez qualquer opção de renúncia na declaração de alterações, entregue em 01-03-2010 ou noutra ulterior a esta. A opção teria de ser efetuada no quadro 13 da declaração de alterações, assinalando o s.p. o campo 1 daquele quadro.” “se pretende exercer o direito de opção, reunindo as necessárias condições , indique o regime pelo qual opta (artigos 12º, 55º e 63º do CIVA), bem como no quadro 12 da mesma declaração de alterações, campo 1, relativamente à prática de operações imobiliárias. Daí decorre que o s.p. estava e permanece no regime de isenção, nas operações de prestação de cuidados de saúde em estabelecimento com internamento, bem como nas operações/locação de imóveis, que é o seu regime próprio (...).E continua a pág. 17/35: “Conclui-se assim que, o s.p. não renunciou à isenção relativamente às operações isentas da alínea 2) do artigo 9º do CIVA, nem podia, por falta dos requisitos previstos alínea b) do nº1 do artigo 12º do mesmo Diploma. Também não podia relativamente às operações isentas da alínea 29) do artigo 12º, uma vez que não cumpria as condições objetivas previstas nº nº 1 do artigo 2º anexo ao decreto-lei 21/2007 de 29.01.”
r) Ora, não concorda a requerente com nenhuma das situações invocadas, porquanto para além de se verificarem os requisitos para a renúncia á isenção o facto é que a mesma foi exercida e assumida pela Autoridade Tributária.
s) Com efeito, a Requerente desenvolve a sua atividade fundamentalmente na área de “Estabelecimento de saúde com internamento” desde 21-02-1961 – conforme Declaração de Registo para efeitos de IVA – Anexo 1. Onde se constata que ficou desde logo enquadrado em “ Transmissões de bens e/ou prestações de serviços isentos que não conferem direito à dedução – conforme quadro 10 campo 2. E assim decorreu a sua atividade comercial no regime de isenção de acordo com o n.º 2 do artigo 9º do CIVA.
t) Até que em 1 de Março de 2010, apresentou no Serviço de Finanças competente uma “Declaração de Alterações de Atividade” para suportar a renuncia á isenção prevista no n.º 2 do artigo 9º do CIVA e conforme prescreve a alínea b) do n.º 1 do artigo 12º do CIVA – Anexo 1. E da análise à referida “Declaração de Alterações de Atividade” o Serviço de Finanças anotou que os quadros alterados eram o 09 e 11 com o quadro 10 reservado aos serviços. No quadro 09 foi preenchido o campo 6 – “ Aquisições intracomunitárias … passou a efetuar” E no quadro 11 – IVA – Tipo de operações, o campo 2 – “Transmissões de bens e/ou prestações de serviços isentas que não conferem direito à dedução”, foi mantido em branco. Alterando em conformidade o quadro referente ao “TIPO DE OPERAÇÕES” que na “Declaração de Registo” quadro 10 no campo 2 havia sido preenchido, e ao alterar-se – não preenchendo, passou à situação de sujeito passivo que não efetua “Transmissões de bens e/ou prestações de serviços isentos que não conferem direito à dedução”
u) É esta a alteração que se encontra consubstanciada no quadro 10 – IVA – Tipo de Operações da Declaração de Registo, preenchida e submetida a 26-02-1985 comparativamente à “Declaração de Alterações de Atividade” preenchida e submetida a 01 de Março de 2010 que agora quadro 11 – IVA – “TIPO DE OPERAÇÕES”
v) Só que nesta, o campo 2 foi mantido expressamente em branco.
x) Materializava-se assim a alteração do TIPO de OPERAÇÕES que em sede de IVA o sujeito passivo pretendia – RENUNCIAR à isenção de IVA prevista nº 2 do artigo 9º do CIVA, a partir de 1 de Março de 2010.
z) Não restam quaisquer dúvidas que a renúncia ao regime de isenção previsto no n.º 2 do artigo 9º do CIVA estava em plena aceitação, pois no quadro “TIPO DE OPERAÇÕES” - á questão – Isentas que não conferem o direito à dedução – está escrito – Não – Anexo 1 do RFIT.
aa) E para firme convencimento da opção pelo TIPO de OPERAÇÕES feita pelo sujeito passivo e ora requerente, o Serviço de Finanças de…, no quadro 10 da “Declaração de Alterações de Atividade” USO EXCLUSIVO DOS SERVIÇOS – no campo 5 à questão – Exercício exclusivo de transmissões de bens e/ou prestações de serviços isentas que não conferem o direito à dedução (artº 9º) expressamente NÃO PREENCHEU, assumindo inequivocamente a renuncia à isenção preconizada no referido articulado, ou dito de outra forma – o sujeito passivo e ora requerente deixava de exercer a partir daquela data 1 de março de 2010 o “Exercício exclusivo de transmissões de bens e/ou prestações de serviços isentas que não conferem o direito à dedução (artº 9º)”
bb) Refere-se no RFIT, que o sujeito passivo ora requerente deveria ter preenchido os campos dos quadros 12 e 13 da “Declaração de Alterações de Atividade”
cc) Da leitura das instruções de preenchimento da referida “Declaração de Alterações de Atividade” só o quadro 13 campo 1 releva para a opção por regime de tributação e nunca o quadro 12. Que efetivamente não foi preenchido aquando da entrega da referida “Declaração de Alterações de Atividade” que configura claramente erro imputável aos serviços.
dd) Com efeito, quando o sujeito passivo e ora requerente no dia 1 de março de 2010 dirigiu-se ao Serviço de Finanças competente, à data…, para preencher e submeter a “Declaração de Alterações de Atividade”, o Serviço de Finanças vinculado como está ao DEVER de colaboração – artº 59º da LGT - deveria ter prestado toda a assistência necessária ao cumprimento dos deveres acessórios – c) do n.º 3 do artº 59º da LGT, ou seja ao correto preenchimento da referida “Declaração de Alterações de Atividade” .
ee) Na sequência da entrega da referida “Declaração de Alterações de Atividade” desde logo iniciou o ora requerente a aplicação do regime geral (normal) em sede de iva procedendo á dedução do IVA nos inputs em conformidade e liquidando IVA nos outputs de acordo com a Lista 1 – Bens e serviços sujeitos à taxa de reduzida – item 2.7. Preenchendo em conformidade e de boa-fé as declarações periódicas de IVA de acordo com as instruções e orientações genéricas da AT. E tanto era o firme convencimento da renúncia à isenção de IVA que, de boa-fé, na primeira declaração periódica de IVA que submeteu após a apresentação da referida “Declaração de Alterações de Atividade” e relativa ao primeiro trimestre de 2010 solicitou um reembolso de IVA no montante de 307.334,29 €.
ff) De imediato a AT de acordo com o princípio do inquisitório e na descoberta da verdade material – artº 58º da LGT, desencadeou por ordem de serviço, uma ação de inspeção ao pedido de reembolso, tendo inclusive comunicado ao Sujeito Passivo que o mesmo se encontrava no regime de renúncia à Isenção. (cfr. Doc. que ao deante se junta e aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais).
gg) E, sem nunca pôr em causa, o tipo de operações nem a opção pelo regime de tributação, analisou todo o enquadramento do Sujeito Passivo e toda a Documentação junta. Documentos que comprovam, à exaustão, que a dedução de IVA liquidado naqueles documentos, seria de aceitar, se e só se, o sujeito passivo e ora requerente se encontrasse na situação de renúncia à isenção preconizado no n.º 2 do artº 9º do CIVA e de acordo com a b) do n.º1 do artº 12º do mesmo diploma.
hh) Constata-se assim, que o contribuinte foi sujeito a uma inspeção externa, onde foi analisado o reembolso do IVA do 1º trimestre de 2010, tendo essa análise produzido os seus efeitos jurídicos. Tais efeitos pela comunicação efetuada ao contribuinte produziram efeitos naturalmente nos anos seguintes. Não restando dúvida sobre o seu enquadramento para efeitos de IVA. A inspeção externa produziu os seus efeitos jurídicos e fiscais, e, a manter-se a correção preconizada pela AT, viola-se ostensivamente o Princípio da Segurança Jurídica que deve nortear as relações entre os contribuintes e a AT. Aliás caso a Autoridade ao invés de confirmar a renúncia à Isenção tivesse constatado a não renúncia e consequente não direito ao reembolso do IVA, “hoje”, em 2015, não se estaria a discutir tão severa correção aos anos de 2011, 2012, 2013 e 2014. Na verdade, analisando os documentos do anexo 4, mencionado no relatório de inspeção, o descritivo refere aquisições de medicamentos à taxa reduzida ao tempo de 5%.Tendo sido efetuada a respetiva dedução, e aceite pela AT. Ora a AT só poderia aceitar a dedução de IVA num documento de que se estava a solicitar o respetivo reembolso, só e só se, perante a referida “Declaração de Alterações de Atividade” o sujeito passivo e ora requerente, estava enquadrado sem margem para dúvidas no regime NORMAL de dedução/liquidação previsto na a) do n.º1 do artº 20º do CIVA
ii) De acordo com o referido artº 20º n.º 1 a) - que se transcreve “ (...)só pode deduzir-se o imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados pelo sujeito passivo para a realização das operações seguintes: a) Transmissões de bens e prestações de serviços sujeitas a imposto e dele não isentas (...)”.
jj) Ora o pedido de reembolso solicitado e desencadeado com a Declaração Periódica de IVA do 1º Trimestre de 2010, com a consequente análise à escrita efetuada, mormente com a análise documental de todos os documentos (exaustiva) que continham IVA dedutível, e com a aceitação de todas essas deduções de IVA e que culminou com o deferimento do pedido de reembolso, acaba por fundamentar um ato tributário praticado pela AT, definidor da situação jurídica-tributária do sujeito passivo e ora requerente, perante a AT no que ao IVA importa.
kk) Ou seja: a aceitação da renúncia à isenção do n.º 2 do artº 9º do CIVA o que não é nem mais nem menos do que se encontra digitado na Confirmação de Dados de Atividade – Alteração de Atividade – Tipo de Operações – Isentas que não conferem o direito à dedução – NÃO – anexo 1. Deste modo os factos relatados relativos ao ano de 2010, terão de produzir os seus efeitos para os anos seguintes. Não restam dúvidas que as liquidações adicionais em sede IVA a manterem-se padecem de vários e decisivos vícios porque estribadas em erro imputável aos serviços – AT no que concerne à dedução indevida de IVA.
ll)Tendo em atenção os dados cadastrais do contribuinte – enquadramento no regime normal por opção, a tomada de posição expressa da AT sobre o pedido de reembolso do IVA, no ano de 2010, onde expressamente aceitou e comunicou a Renúncia à Isenção do Iva em que estava enquadrado o contribuinte,
mm) Estes Factos, terão de ter a devida atenção e leitura, sob pena de a própria AT “VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM”, com as legais consequências.
nn) Dispõe o artº 55º da L.G.T.: “A administração tributária exerce as suas atribuições na prossecução do interesse público, de acordo com os princípios da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da celeridade, no respeito pelas garantias dos contribuintes e demais obrigados tributários.”
oo) Pelo que nos termos do citado normativo, a atuação da AT para ser legal, terá de estar em sintonia com os princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé que, tendo um conteúdo próprio, não deixam de fazer parte do bloco de legalidade que tal atuação deve respeitar.
pp) “(...) A Administração Tributária deverá abster-se de concretizar os comandos legais quando, em face das particularidades do caso, não se verifiquem as razões de interesse público que justificam a sua actuação ou quando se produza um resultado manifestamente injusto, devendo, em qualquer caso, limitar-se, na restrição dos direitos individuais, ao estritamente necessário para assegurar os fins que visa, não tratar discriminatoriamente os administrados nem frustrar as expectativas que a sua actuação nestes tenha gerado. A violação do princípio da legalidade, entendido globalmente com as limitações decorrentes dos referidos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa fé, constituirá vício de violação de lei.” Cfr Diogo Leite Campos, Benjamim Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, LGT Anotada, anotação ao artigo 55º).
E continuam em anotação: “Os referidos princípios, embora tenham um campo de aplicação privilegiado no domínio do poder discricionário, deverão ser aplicados também, pelo menos, em todos os casos em que há alguma margem de livre apreciação da administração, pois tratar-se-á também de casos em que os parâmetros a considerar na actuação administrativa não estão integralmente determinados na lei. De qualquer forma, o que é essencial para resolução desta questão é ter presente na aplicação da legalidade, pela administração como pelos tribunais, não pode ser encarada isoladamente cada norma que enquadra uma determinada actuação da administração, antes terá de se atender à globalidade do sistema jurídico, com primazia para o direito constitucional”.
qq) Por tudo o aduzido até aqui, facilmente se conclui, pela ilegalidade das correções preconizadas pela Autoridade Tributária, não estando a mesma a atuar de acordo com o Princípio da Boa-fé e da Justiça, ao pretender arrecadar um imposto, que sabe que não tem direito nem corresponde à realidade. Não fosse a expressa referência à incidência temporal 2011, 2012, 2013 e 2014, só podíamos razoavelmente admitir que tal “reenquadramento” tivesse efeitos desde agora, ex nunc, para o futuro, legalmente possível. Jamais com efeitos ex tunc, desde então. Desde o início do 1º trimestre de 2010 e daí em diante ao longo de 5 anos. Tudo isto, sem mais, nos parece bizarro, à luz dos factos ocorridos em 2010, sobretudo a alteração ocorrida e a subsequente ação de inspeção, que tudo validou, autorizando o efetivo pagamento do reembolso solicitado-recebido e as reiteradas DP´s (declarações periódicas, mais de 40), posteriormente apresentadas de conformidade pelo SP A… .
rr) Ou seja, em mais de 40 DP´s posteriormente entregues de 3 em 3 meses em 2010 e daí em diante, todos os meses ao longo de 5 anos, o SP A… fez constar no respetivo campo 20, IVA a deduzir, de conformidade com a renúncia à isenção operada em 01.03.2010 e então validada pela mesma inspeção tributária.
ss) Com efeito, não se entende por bizarro e irrazoável, o reenquadramento para o passado, porque isso foi matéria tratada há mais de 4 anos, nesse já longínquo ano de 2010, reenquadramento então confirmado em procedimento inspetivo realizado de 06.07.2010 a 31.08.2010, pelos Serviços de Inspeção Tributária da DF de…, que decorreu, pois, ao longo de quase 2 meses, por via do pedido de reembolso de IVA de € 323.025,33, de 2010-03T, apresentado em 17.05.2010 pelo SP, A…SA. Mas isso foi feito e validado pela própria Autoridade Tributária. Logo, sendo, como era, renunciável tal isenção incompleta e tendo acontecido a efetiva renúncia à mesma, então validada pela mesma inspeção tributária, passa naturalmente a haver lugar à dedução do IVA suportado a montante (Cf. 19º e 20º do CIVA) e à liquidação do IVA a jusante sobre o valor das transmissões de bens e das prestações de serviços (Cf. 3º, 4º e 16º do CIVA). Nem se concebe de outra forma face à Constituição da República Portuguesa e à Douta Doutrina e Jurisprudência vigente em Portugal. Desde logo veja-se os extratos do texto preambular, de grande densidade ética-normativa, do Dec. Lei nº 398/98, 17/12 que aprovou e pôs em vigor a LGT em 01.01.1999. As normas e princípios jurídicos conformadores da atitude, comportamento e ação da administração tributária e, em concreto, da inspeção tributária.
tt) De resto e coerentemente com o NÃO, tem o Sujeito Passivo em sua mão a seguinte prova da confirmação dos dados da alteração operada naquele dia 01.03.2010, saídos imediatamente do sistema informático, nos termos do artº 35º, 2 do CIVA.
Conforme fls 5 do anexo 02 ao RFIT.
E, coerentemente e de conformidade com as alterações operadas em 01.03.2010, o SP A…, pediu o citado reembolso, que deu causa a um procedimento inspetivo em função do qual tal reembolso foi autorizado e pago e, claro, coerentemente e de conformidade com essas mesmas alterações, desde então e ao longo de 5 anos, foram entregues mais de 40 DP´s (declarações periódicas) de IVA, entregues de 3 em 3 meses em 2010 e todos os meses daí em diante, nos termos do artº 41º do CIVA, em cujo campo 20, foi inscrito IVA a deduzir.
uu) Pelo supra exposto, facilmente se conclui que não é devido o valor de 480.244,86 €, liquidado adicionalmente pela Autoridade Tributária.
Entre as referidas datas 06.07.2010 e 31.08.2010, conforme as 4 folhas da certidão solicitada em 23.07.2014 pelo SP A… e emitida em 30.07.2014, pelos Serviços de Inspeção da Direção de Finanças de…, cujos emolumentos foram pagos pela guia nº…, no valor de 7,88€, portanto, ao longo de quase 2 meses, decorreu o seguinte procedimento inspetivo:
O despacho que ordenou tal “ PROCEDIMENTO DE INSPECÇÃO “, tem data de 05.07.2010 e tomou o nº DI 2010…, nos termos das normas jurídicas indicadas.
O contribuinte inspecionado foi o Sujeito Passivo ora em análise.
E, quanto aos objetivos, temos o seguinte:
E Quanto ao âmbito e extensão,
Pelo SP, tomou conhecimento o respetivo TOC,
Todos estes extratos constam da fls.3/4 da referida certidão.
vv) É por demais evidente que este procedimento observou uma bateria de normas do RCPIT e desde logo o seu artº 2º, 1 e 2 a), normas nos termos das quais “- O procedimento de inspecção tributária visa a observação das realidades tributárias, a verificação do cumprimento das obrigações tributárias e a prevenção das infracções tributárias” sendo que a inspeção tributária compreende “A confirmação dos elementos declarados pelos sujeitos passivos e demais obrigados tributários”
Nos termos do artº 12º, quanto aos fins, o procedimento de inspeção classifica-se em procedimento de comprovação e “procedimento de informação visando o cumprimento dos deveres legais de informação ou de parecer dos quais a inspecção tributária seja legalmente incumbida.” E vemos como neste caso tal procedimento teve como fins a “Consulta, recolha e cruzamento de elementos”, conforme consta no quadro 4, campo 4.1 acima transcrito
Quanto ao âmbito e extensão do procedimento inspetivo em causa, o RCPIT, nos termos do artº 14º o mesmo pode ser:
a) Geral ou polivalente, quando tiver por objecto a situação tributária global ou conjunto dos deveres tributários dos sujeitos passivos ou dos demais obrigados tributários;
b) Parcial ou univalente, quando abranja apenas algum ou alguns tributos ou algum ou alguns deveres dos sujeitos passivos ou dos demais obrigados tributários.
2 - Considera-se ainda procedimento parcial o que se limite à consulta, recolha de documentos ou elementos determinados e à verificação de sistemas informáticos dos sujeitos passivos e demais obrigados tributários, ou ao controlo de bens em circulação.
3 - Quanto à extensão, o procedimento pode englobar um ou mais períodos de tributação. [Veja-se que, in casu, e conforme o quadro 5 acima transcrito, o âmbito do procedimento foi o ano de 2010 e, a extensão, o 1º T desse ano].
Quanto à equipa de inspetores constituída e alocada para a sua realização, em estrita observação do artº 45º do RCPIT, consta como chefe de equipa o Inspetor Tributário Assessor, com o nº…, G… e como IT nível 2, com o nº…, H…, conforme quadro 6 acima transcrito.
xx) Este procedimento inspetivo, assim enquadrado e executado, observando o respetivo regime jurídico do RCPIT, teve como causa próxima um pedido de reembolso de IVA, relativo ao período 03T de 2010, como se pode ver pelo extrato infra:
E, o parecer da referida equipa de inspetores, suportado nas referências do pedido de reembolso em causa e, sobretudo, nos “Fundamentos ” para o seu “DEFERIMENTO TOTAL”, consta ipsis verbis da seguinte transcrição:
zz) Da fundamentação transcrita, ainda que pareça redundante, importará sublinhar os seguintes aspetos, absolutamente fundamentais:
Convalidou evidentemente a alteração efetuada pelo SP A…, quando se conclui:
“Ora, o sujeito passivo em 2010-03-01 renunciou à isenção de IVA em que estava enquadrado ( artº 9º nº 2). Nessa data procedeu à regularização do IVA estabelecida no artº 25º do CIVA referente . . . . ascendeu a € 331.575,05. Este valor foi inscrito no campo 20 da DP do período 10-03T e . . . “
E acrescentam: “Conferimos o cálculo e detectámos que. . . .foram deduzidos € 15.691,04 a mais e informámos o sujeito passivo na pessoa do seu TOC. O TOC informou a administração da Empresa daquelas incorrecções, a qual concordou com as mesmas e mandou-o entregar declaração periódica de substituição a relevar aquelas correcções.” Como ali consta, o valor de 15 691,04€ foi adicionalmente liquidado e entregue na DP de substituição submetida em 27.08.2010 e, por não terem sido “detectadas outras irregularidades, propondo-se o seu deferimento na totalidade ”.
aaa) Ou seja, foi aqui escrupulosamente observado o princípio da cooperação consagrado no artº 48º do RCPIT que aqui damos por reproduzido e cumprido o artº 58º do mesmo regime.
bbb) Por fim, o artº 62º do RCPIT, dispõe sobre o conteúdo dos relatórios finais da Inspeção tributária, e dizemos “relatórios”, porque ali estão explícitas as diferenças de conteúdo, em função dos fins de comprovação ou de informação.
Nesta última hipótese, aqui verificada, dispõe esta norma, nos seus nºs 5 e 6, do seguinte modo:
“Poderão ser elaborados outros tipos de relatórios em caso de procedimentos de inspecção com objectivos específicos, os quais, no entanto, incluirão sempre a identidade das entidades inspeccionadas, os fins dos actos, as conclusões obtidas e a sua fundamentação. O relatório de inspecção será assinado pelo funcionário ou funcionários intervenientes no procedimento e conterá o parecer do chefe de equipa que intervenha ou coordene, bem como o sancionamento superior das suas conclusões. “
ccc) Atentámos, com todo este detalhe, nos termos legais em que foi ordenado, executado e avaliado o resultado final deste procedimento inspetivo, ocorrido entre as datas 06.07.2010 e 31.08.2010, por via do pedido de reembolso. Com efeito, a fls 32/35 do mesmo RFIT, consta o seguinte:
Obviamente que não se compreende o que é um “procedimento atípico” mencionado.
À luz da LGT sabemos que, seguindo a forma escrita, “o procedimento tributário compreende toda a sucessão de atos dirigidos à declaração de direitos tributários, designadamente: a) As ações preparatórias ou complementares de informação e fiscalização tributária” (Cf. artº 54º 1 a) e 4 da LGT) que, depois, tem tradução e desenvolvimento concreto nas normas jurídicas do RCPIT, supra referidas e que foram observadas neste procedimento inspetivo.
Procedimento atípico!? Lê-se e não se acredita. E como é possível que isto tenha passado no “crivo” da apreciação dos seus superiores, responsáveis pela IT na Direção de Finanças de…, com as irregularidades já vistas?
E conclui o mesmo RFIT:
Mais uma vez lê-se e não se acredita. “sem caráter investigatório”. Mas o caráter investigatório não está ele reservado aos atos de investigação criminal fiscal? Nunca a normais ações de inspeção, sejam elas ditadas por via de pedidos de reembolso, sejam elas ditadas pelo exclusivo motivo de reenquadramento em IVA!
Não haverá aqui ostensiva má vontade e sacrifício de elementares garantias dos administrados e, em concreto, da situação em análise da ora requerente.
ddd) Aqui e desde 01.03.2010, data da entrega em papel da Declaração de Alterações, em que o Sujeito Passivo renunciou à isenção do IVA, nos termos em que o fez, renúncia absolutamente validada em sede de inspeção aqui escrutinada; desde então (01.03.2010), coerentemente e de conformidade que todas as suas mais de 40 DP´s (declarações periódicas), no quadro 20 incluem (e bem) IVA a deduzir, nos termos do artº 20º do CIVA, em vista da renúncia à isenção efetuada e validada pela inspeção tributária de… .
eee) É nosso entendimento, pelas razões aduzidas, que não é devido o valor de IVA – 480.244,86€, por causa da alegada “Dedução indevida“, desdobrada em 38 valores imputados diretamente a cada um dos 36 meses dos 4 anos em correção.
O formalismo omitido, por lapso do sujeito passivo, limita-se ao preenchimento de uma quadrícula no campo 1 do quadro 13 do formulário de declaração de alteração de atividade (i.e. não assinalou com uma “cruzinha” essa opção);
A A… adotou um comportamento declarativo inequívoco de cumprimento da opção pela tributação - comportando-se como sujeito passivo integral - no preenchimento das suas declarações periódicas de IVA desde a entrega da referida declaração de alterações, consequentemente, do conteúdo da obrigação declarativa que cumprira defeituosamente, visto que liquidou IVA em todas as suas operações ativas e fazendo-o o constar das suas faturas.
Que a A…, no âmbito da sua atividade, agiu materialmente de acordo com esse comportamento no que respeita à obrigação de liquidar IVA em todas as suas operações ativas de modo contínuo, tendo efetivamente liquidado, repercutido o imposto e procedido à respetiva entrega nos cofres do Estado.
A citada opção da A…, consagrada na Sexta Diretiva, designadamente no seu artigo 28.º n.º 3, alínea c) quanto à isenção de certas operações de interesse geral, conforme transposta para o artigo 12.º do Código do IVA não pode ser restringida ou subordinada a um formalismo declarativo em termos tais que ignorem os demais factos que inequivocamente atestam aquela opção, o seu comportamento efetivo - como sujeito passivo integral - maxime traduzido na liquidação e dedução de IVA durante vários anos, sem que o Fisco tenha corrigido essa situação (de 2010 a 2014).
Razão pela qual o seu direito à dedução não pode ser posto em causa exclusivamente pelo deficiente formalismo declarativo dessa opção, o que implica a anulação das liquidações de IVA em crise no presente recurso, por ofensa das normas e princípios que consagram o direito à dedução do IVA
fff) Nas circunstâncias dos presentes autos, deve prevalecer a substância sobre a forma, não se podendo pôr em causa o direito à dedução do IVA suportado para realização de operações efetivamente tributadas, exclusivamente por deficiente formalismo declarativo da opção pela tributação, contrariamente à lógica de funcionamento do imposto e às normas e princípios estruturantes do sistema comum do IVA.
ggg) Tendo ficado demonstrado o pedido de renúncia à isenção por parte da A… através da declaração de alterações, importa agora debruçarmo-nos sobre a questão levantada pela AT no que concerne à impossibilidade dessa mesma renúncia por parte do SP por não cumprir os requisitos previstos na alínea b) do nº1 do art. 12.º do CIVA.
hhh) Refere a AT no seu relatório de inspeção (DOC. que se anexa), ponto III-1.3.2. (pág. 17/35):
“Conclui-se assim que, o s.p. não renunciou à isenção relativamente às operações isentas da alínea 2) do artigo 9.º do CIVA, nem podia, por falta dos requisitos previstos alínea b) do nº 1 do artigo 12.º do mesmo Diploma.” (sublinhado nosso).
Ora, a alínea b) do nº 1 do art. 12.º do Código do IVA explicita que podem renunciar à isenção, optando pela aplicação do imposto às suas operações: “(...) b) Os estabelecimentos hospitalares, clínicas, dispensários e similares, não pertencentes a pessoas colectivas de direito público ou a instituições privadas integradas no sistema nacional de saúde, que efectuem prestações de serviços médicos e sanitários e operações com elas estreitamente conexas;”
Embora a AT não concretize explicitamente de que forma, na sua opinião, a A… não cumpre os requisitos para renunciar à isenção, cumpre-nos analisar a referida norma de forma a repor a objetividade e veracidade na análise do caso concreto.
iii) Ora, como facilmente se constata, a A…é uma instituição privada, poderá ser considerada como integrada no sistema nacional de saúde? Não nos parece. Senão veremos pela análise ao art. 132.º, nº1, alínea b) da Diretiva 2006/112/CE, relativa ao sistema comum de imposto sobre o valor acrescentado (“Diretiva”) e os arts. 9.º, nº1 e 2 e 12.º, nº 1, alínea b) do CIVA.
jjj) As limitações da renúncia à isenção previstas no art. 12.º, nº1, alínea b) do CIVA visam impedir que os organismos que se enquadrem nas situações previstas no art. 132.º, nº1, b) da Diretiva, ou seja, os organismos de direito público ou os organismos que operem em condições sociais análogas renunciem à isenção, uma vez que tal renúncia não é admitida pela Diretiva, o que não é o caso da A… .
Daqui se retira que o legislador português assimilou o conceito de “condições sociais análogas” ao conceito de “instituições privadas integradas no Sistema Nacional de Saúde”.
kkk) O TJUE tem exigido que para ser um indício atendível de equiparação ao setor público (condições análogas), os custos das prestações de serviços sejam assumidos em grande parte pelo setor público (através das caixas de seguro de doença ou outros organismos de segurança social).
lll) Ora, a faturação global da empresa ora requerente foi de:
Faturação:
2011………………… 2.247,250€
2012 ……………….. 2.469,952€
2013 ……………….. 2.408,866€
2014 ………………. 3.138,384 €
mmm) A percentagem de operações realizadas pela Requerente ao abrigo das convenções, nos anos de 2011 a 2014, no cômputo global das suas operações são as que constam do quadro seguinte:
Ano de 2011
I… ………………….32.278€
J… ……………………42.317€
K… …………….………42.016€
L… ……………...…...1.321€
M… ..…….….…1.630€
N… ..……….……. 146€
SOMA: 119.708€
Peso no volume de negócios da sociedade é o seguinte:
5.32% sobre o V/Faturação
Ano de 2012
I… ………………….22.591€
J… ……………………52.277€
K… …………….………41.746€
O… ..………….……. 3.080€
L… ……………...…… ..188€
M… .…………31.954€
SOMA: 152.618€
Peso no volume de negócios da sociedade é o seguinte:
6.17% sobre o V/Faturação
Ano de 2013
I… ………………….20.678€
J… ……………………51.969€
K… …………….………32.543€
O… ..…………..…. 28.412€
L… ……………...…… ..207€
P… ..………….. 75€
M… …………31.699€
SOMA: 165.583€
Peso no volume de negócios da sociedade é o seguinte:
6.87% sobre o V/Faturação
Ano de 2014
I… ………………….21.398€
J… ……………………39.244€
K… …………….………19.156€
O… ..…………..…. 36.182€
P… ..………….. 75€
SOMA: 116.055€
Peso no volume de negócios da sociedade é o seguinte:
3.69% sobre o V/Faturação
(cfr. Doc que ao deante se junta e aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais)
nnn) Tendo em conta que a percentagem de operações realizadas pela Requerente ao abrigo das referidas convenções nunca ultrapassou os 7% nos anos de 2011, 2012, 2013 e 2014, podemos concluir que os custos das prestações de serviços da A… só em pequena parte são assumidos pelos organismos de Segurança Social.
ooo) A A… não pode, nestas circunstâncias ser considerada como estando a atuar em condições sociais análogas às dos estabelecimentos hospitalares públicos. E, por conseguinte, não pode ser qualificada como instituição privada integrada no sistema nacional de saúde, e não lhe pode ser vedado o seu direito à renúncia à isenção de IVA.
ppp) Concluindo: Atento o que ficou exposto, e fazendo uso da terminologia da Diretiva IVA, para efeitos deste artigo 12.º, n.º 1, alínea b) do Código do IVA, apenas podem ser consideradas como “instituições privadas não integradas no sistema nacional de saúde” com direito à renúncia, os estabelecimentos hospitalares privados que não prossigam a sua atividade em condições sociais análogas às que vigoram para os estabelecimentos hospitalares públicos. O que equivale a dizer que a Requerente é abrangida pela opção de renúncia à isenção aqui em causa pois não realiza a sua atividade em condições sociais análogas aos mencionados estabelecimentos públicos.
qqq) Isto refuta os argumentos da AT no seu relatório de Inspeção Tributária, nomeadamente no seu ponto III-1.3.2.2-Iva liquidado indevidamente, no que concerne ao incorreto enquadramento das operações da A…, por esta ter aplicado “àquelas operações, a taxa reduzida prevista na alínea a) do nº1 do artigo 18.º do CIVA, a qual remete para a lista I, anexa ao referido código, e por exclusão, na verba 2.7 daquela lista I anexa.”
rrr) O exercício do direito à dedução por parte da recorrente não é, assim, passível de qualquer censura, não emana de qualquer prática ilegal ou abusiva mas antes de um exercício legítimo e tutelado, seja pela ordem jurídica interna, seja pela comunitária.
Juntou 140 documentos.
Aceitação do pedido e constituição do Tribunal Arbitral
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Sr Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT
Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou os árbitros do Tribunal Arbitral Colectivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável, e notificou as partes dessa designação em 2 de julho de 2015.
O Tribunal Arbitral Coletivo ficou constituído em 20 de julho de 2015
Resposta da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT)
Determinada a notificação nos termos do artigo 17º, do RJAT, a AT apresentou atempadamente resposta.
Alegou em síntese:
a) A Requerente vem exercendo, para além da actividade enquadrada na alínea 2) do artigo 9.º do CIVA, de forma secundária, operações imobiliárias, nomeadamente, a locação de bens imóveis, actividade isenta nos termos da alínea 29) do artigo 9.º do CIVA e, bem ainda, actividade sujeita e não isenta de prestação de serviços enquadrada no n.º 1 do artigo 4.º do CIVA (nomeadamente, utilização de espaços por parte de diversas entidades e ainda de bens e serviços da A…).
b) A fim de dar abrangência a um maior número de doentes, a Requerente estabeleceu acordos/convenções com subsistemas públicos, integrados no Sistema Nacional de Saúde [SNS]. Designadamente, com os seguintes:
(i) Direcção Geral de Protecção Social dos I…
(ii) Serviços Sociais do Q…;
(iii) Serviços de Assistência na Doença da J…
(iv) Serviços de Assistência na Doença da K… .
c) Em 26-02-1985, perante o Decreto-Lei n.º 393-B/84 de 26 de Dezembro, que aprovou o Código do IVA e cuja entrada em vigor ocorreu em 01-01-1986, a Requerente apresentou declaração de registo onde declarou exercer a actividade principal de estabelecimentos de saúde com internamento, não tipificando as restantes actividades exercidas, ainda que de forma secundária (cfr. declaração de registo constante do anexo 1 ao RIT que se junta com o processo administrativo).
d) Relativamente ao tipo de operações praticadas, indicou no quadro 10 da referida declaração, que iria praticar, no exercício da sua actividade:
i. Transmissões de bens e/ou prestações de serviços que conferem o direito à dedução (campo 1 do quadro 10);
ii. Transmissões de bens e/ou prestações de serviços isentas que não conferem o direito à dedução (campo 2 do quadro 10).
d) Configurando-se como um sujeito passivo misto, a Requerente indicou, ainda, no referido quadro 10, que não iria efectuar a dedução do imposto segundo a afectação real mas, antes, que passaria a efectuar a dedução do imposto suportado segundo o método de dedução do pro rata, conforme previsto no n.º 4 do artigo 23.º do CIVA.
e) Na referida declaração, a Requerente não preencheu o quadro 11 relativo à “opção por regimes de tributação”, onde se assinala, designadamente, a opção pelos regimes de renúncia à isenção previstos no artigo 12.º do CIVA
f) A 01-03-2010, a Requerente procedeu à entrega de declaração de alterações de actividade, conforme previsto no artigo 32.º do CIVA, alterando apenas os quadros 9 e 11 da referida declaração, que respeitam a dados relativos à actividade e dados relativos ao tipo de operações (cfr. declaração de alterações de actividade constante do anexo 2 ao RIT que se junta com o processo administrativo).
g) Concretizando:
i. No quadro 09 declarou que, no exercício da sua actividade, passou a efectuar aquisições intracomunitárias de bens, assinalando, para o efeito, o campo 6.
ii. No quadro 11 declarou que, no exercício da sua actividade, passou a efectuar a dedução do imposto suportado segundo o método da afectação real, assinalando, para o efeito, os campos 3 e 5.
h) Na declaração de alterações de actividade, a Requerente não assinalou qualquer campo do quadro 12 ou 13, os quais são relativos a regimes de renúncia à isenção, embora referentes a operações distintas.
i) Sendo que, e para o que ora importa, a Requerente não assinalou no quadro 13 «se pretende exercer o direito à opção, reunindo para tal as necessárias condições, indique o regime pelo qual opta (arts. 12.º. 55.º. e 63.º do CIVA)”, conforme consta expressamente do primeiro item do referido quadro – o quadro 12 destina-se, exclusivamente, à renúncia atinente à “prática de operações imobiliárias”.
j) A epígrafe do quadro 13 é a seguinte: «OPÇÃO POR REGIME DE TRIBUTAÇÃO (se não pretende exercer qualquer opção, passe ao quadro seguinte)».
k) No quadro 30, a que corresponde a epígrafe «A PRESENTE DECLARAÇÃO CORRESPONDE À VERDADE E NÃO OMITE QUALQUER INFORMAÇÃO PEDIDA», constam as assinaturas do sujeito passivo ou representante legal bem como do técnico oficial de contas.
l) No âmbito do procedimento de inspecção tributária realizado pela Direcção de Finanças de…, ao abrigo da Ordem de Serviço n.º OI2014…, aos anos de 2011, 2012, 2013 e 2014, cujo relatório se junta como processo administrativo e para onde se remete, dando-se o seu teor por integralmente reproduzido, constatou-se que a Requerente:
i. Liquidou imposto, à taxa reduzida, relativamente às operações previstas na alínea 2) do artigo 9.º do CIVA, ou seja, sobre as prestações de serviços médicos efectuadas pela Requerente, enquanto estabelecimento hospitalar, com internamento;
ii. Relativamente às operações imobiliárias previstas na alínea 29) do referido normativo, não procedeu à liquidação do imposto (cfr. fls. 15 e 16 do RIT).
m) Por outro lado, constatou-se que a Requerente procedeu à dedução do imposto sobre a totalidade dos bens e serviços adquiridos, incluindo os relacionados com a prática de operações isentas atrás referidas (cfr. fl. 16 do RIT).
n) Verificou-se, assim, em sede inspectiva, que, apesar de a Requerente ter declarado, em 01-03-2010, a intenção de deduzir o imposto segundo o método da afectação real, na prática, não o fez.
o) Sendo que a Requerente não permitiu à Administração Fiscal a utilização de tal método porquanto não apresentou elementos contabilísticos ou extracontabilísticos [nomeadamente centro de custos] capazes de facultarem a correcta identificação e controlo das deduções respeitantes a cada uma das actividades (cfr. fl. 18 do RIT).
p) Termos em que, em face da factualidade constatada, concluíram os Serviços de Inspecção Tributária que (cfr. fls. 16 e 17 do RIT):
«[…] Estabelece a alínea a) do n.º1 do artigo 20.º do CIVA que, só pode ser deduzido imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos pelo s.p. para a realização de transmissões de bens e prestação de serviços sujeitas a imposto e dele não isentas.
Ora, as operações a jusante em questão, são operações isentas nos termos das alíneas 2) e 29), ambas do artigo 9.º do CIVA. Esta isenção de imposto, é considerada simples ou incompleta, já que, o operador económico, não está obrigada a liquidar imposto nas transmissões de bens ou prestação de serviços que efectuar, mas, não pode, em contrapartida, deduzir o imposto suportado nas aquisições.
Com efeito, o s.p, ao realizar operações que consistem na prática de serviços isentos de imposto, enquadráveis nas alíneas 2) e 29) do artigo 9.º do Código do IVA, encontra-se no direito de poder renunciar à isenção, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 12.º, no n.º 4 do mesmo Diploma, conjugado este último com o decreto-lei 21/2007, de 29.01, por remissão do n.º 6, desde que reúna os requisitos aí previstos:
“1 - Podem renunciar à isenção, optando pela aplicação do imposto às suas operações: […] b) Os estabelecimentos hospitalares… não pertencentes a pessoas colectivas de direito público ou a instituições privadas integradas no sistema nacional de saúde, que efectuem prestações de serviços médicos e sanitários e operações com elas estreitamente conexas […]” Ou seja, são excepcionados os casos em que as instituições privadas estão integradas no Sistema Nacional de Saúde.”
“4-Os sujeitos passivos que procedam à locação de prédios urbanos ou fracções autónomas deste a outros sujeitos passivos, que os utilizem, total ou predominantemente, em actividades que conferem o direito à dedução, podem renunciar à isenção prevista no n.º 29 do artigo 9.º”.
Estabelece ainda o artigo 12.º do CIVA, no seu n.º 2 que, o direito de opção é exercido mediante a entrega em qualquer serviço de finanças ou noutro local legalmente autorizado de declaração de alterações, produzindo efeitos a partir da data da sua apresentação.
E o n.º 3 do mesmo artigo diz-nos que, efectuada tal opção, o s.p tem que permanecer em tal regime por cinco anos.
Sucede, porém, que o s.p, não fez qualquer opção de renúncia na declaração de alterações, entregue em 01-03-2010 ou noutra ulterior a esta. A opção teria que ser efectuada no quadro 13 da declaração de alterações, assinalando o s.p o campo 1 daquele quadro “Se pretende exercer o direito à opção, reunindo as necessárias condições, indique o regime pelo qual opta [artigos 12.º, 55.º e 63.º do CIVA], bem como no quadro 12 da mesma declaração de alterações, campo 1, relativamente à prática de operações imobiliárias.
Daí decorre que o s.p estava e permanece no regime de isenção, nas operações de prestação de cuidados de Saúde em estabelecimentos com internamento, bem como nas operações imobiliárias/locação de imóveis, que é o seu regime próprio.
De facto, a renúncia à isenção, possibilitada, tanto pelo n.º 1 como pelo n.º 4, ambos do artigo 12.º, tem que ser expressa, em declaração prevista no artigo 32.º do CIVA, através do preenchimento dos quadros 12 e 13 da declaração de alterações, os quais têm por epígrafe “PRÁTICA DE OPERAÇÕES IMOBILIÁRIAS” e “OPÇÃO POR REGIME DE TRIBUTAÇÃO”, respectivamente, pois trata-se de uma derrogação à isenção e tem carácter excepcional. Em circunstância alguma, a renúncia à isenção é susceptível de ser presumida.
Conclui-se assim que, o s.p não renunciou à isenção relativamente às operações isentas da alínea 2) do artigo 9.º do CIVA, nem podia, por falta dos requisitos previstos na alínea b) do n.º 1 do artigo 12.º, uma vez que não cumpria as condições objectivas previstas no n.º 1 do artigo 2.º anexo ao decreto-lei 21/2007, de 29.01 […]».
q) Neste contexto, e no que concerne aos bens e serviços relacionados com a prática de operações isentas da alínea 2) do artigo 9.º do CIVA, a Inspecção Tributária apurou que foi deduzido indevidamente imposto, nos montantes globais de € 60.379,30, € 56.930,74, € 65.711,67 e € 18.490,14, respectivamente, para cada um dos períodos anuais de 2011, 2012, 2013, e Janeiro e Fevereiro de 2014 (cfr. fl. 18 do RIT).
r) Ademais, foram ainda propostas correcções derivadas do facto de os SIT terem constatado que, «relativamente aos bens e/ou serviços de utilização mista, e em face das insuficiências dos elementos contabilísticos e extra contabilísticos, não é exequível a aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 23.º do CIVA, isto é, não é possível realizar a afectação real dos bens e serviços utilizados com base em critérios objectivos que permitam determinar o grau de utilização desses bens ou serviços nessas e nas restantes operações» (cfr. fl. 21 do RIT).
s) Termos em que, considerando que a dedução do imposto deveria ter sido feita não na totalidade mas antes nas percentagens de 8%, 4%, 6% e 4%, em cada período de tributação de 2011, 2012, 2013 e 2014, consideraram-se devidas as correcções no valor de € 55.141,83, € 93.820,36, € 129.389,53 e € 13.615,50 (cfr. fls. 22 e 23 do RIT).
t) Assim, no final, e uma vez consideradas as regularizações que a Requerente fez a favor do Estado, foram propostas correcções aritméticas no valor total de € 489.253,90 para os anos de 2011, 2012, 2013 e 2014, correspondendo:
i. € 480.244,86 à dedução indevida de imposto, nos termos referidos supra; e
ii. € 9.009,04, à falta de liquidação de IVA, no âmbito do débito de despesas de electricidade, atendendo à obrigação de aplicar taxa de 23% e não de 6%, conforme melhor descrito nas fls. 10 a 13 do RIT.
u) Consequentemente, a Requerente exerceu o seu direito de audição, o qual foi, todavia, insusceptível de alterar as correcções propostas, conforme fundamentação exarada nas fls. 28 a 34 do RIT, pelo que as correcções propostas tornaram-se definitivas.
POR EXCEPÇÃO
v) A Requerente, entre outras, vem impugnar as liquidações adicionais de IVA relativas a 2011 num montante total de € 119.236,44 bem como as respectivas liquidações de juros compensatórios.
x) Todavia, sucede que, relativamente ao ano de 2011, do procedimento inspectivo resultaram, além das correcções por dedução indevida que ora se discutem, correcções no montante de € 9.009,04, relativas à falta de liquidação de IVA no período 2011-10 (cfr. fls. 4 e 10 a 13 do RIT).
z) Com efeito, em sede inspectiva «foi ainda constatado que o s.p aplicou a taxa reduzida de 6% ao valor tributável de € 52.994,35, que corresponde ao débito de despesas ao seu cliente R…, em 31-10-2011, suportadas com electricidade em períodos anteriores. Estando a electicidade sujeita a partir de 01-10-2011, à taxa normal de IVA de 23% e uma vez que o s.p aplicou indevidamente a taxa reduzida de 6%, em vigor à data da operação, existe falta de liquidação de IVA, no montante de € 9.009,04 em face do disposto no artigo 18.º do CIVA» (cfr. fl. 4 do RIT).
aa) Assim, a liquidação adicional de IVA n.º…, no valor de € 18.169,02 e a liquidação de juros compensatórios n.º…, no montante de € 2.096,66, ambas relativas a Outubro de 2011 (período 2011-10), respeitam, parcialmente, à correcção com os fundamentos supracitados no artigo anterior.
bb) Ou seja, na presente instância não são rebatidas as correcções que estão parcialmente na origem das liquidações supra identificadas.
cc) Consequentemente, não poderá o douto Tribunal apreciar a legalidade das liquidações na parte proporcional à correcção em questão visto que não foi apresentado qualquer argumento tendente a assacar-lhe-lhe qualquer vício.
dd) Pelo que, nesta parte, não é dado cumprimento ao disposto no artigo 552.º, n.º 1, alínea d) do CPC, normativo de onde decorre que, na petição com que se propõe a acção, deve o autor expôr os factos essenciais que constituem a causa de pedir e as razões de direito que servem de fundamento à acção.
ee) Verifica-se, portanto, uma falta absoluta da indicação da causa de pedir e da indicação das razões de direito que sustentam o pedido formulado.
ff) Tal ininteligibilidade tem como consequência a ineptidão parcial da petição inicial, o que, por sua vez, determina a nulidade do processado nessa parte, nos termos do artigo 186., n.º 1 do CPC.
gg) Assim, verificando-se, uma excepção dilatória insuprível, neste segmento do pedido, deverá a Requerida ser absolvida da instância conforme discorre dos artigos 576.º, n.º 2 e 577.º, alínea b) do CPC, ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.
DO DIREITO
hh) Segundo a Requerente:
- verifica-se a omissão da referência legal ao abrigo da qual foi realizada a subdelegação de competências nos termos da qual foi sancionado superiormente o relatório de inspecção tributária mediante despacho da Chefe de Divisão E…– o que consubstanciaria vício insanável de nulidade, nos termos do artigo 39.º, n.º 12, do CPPT;
- exerceu validamente a opção pela renúncia à isenção, conforme artigo 12.º, n.º 1, alínea b) do CIVA mediante a declaração de alterações de actividade entregue no competente Serviço de Finanças a 1 de Março de 2010;
- O enquadramento no regime de renúncia à isenção foi aceite pela AT em 2010, na medida em que foi deferido um pedido de reembolso realizado pela Requerente relativamente ao 1.º trimestre de 2010, termos em que existe violação do princípio da confiança, da segurança e da justiça e
- Reúne os requisitos substantivos necessários para exercer validamente o direito de renúncia nos termos do artigo 12.º, n.º 1, alínea b), do CIVA, mormente, por não configurar uma instituição privada integrada no sistema nacional de saúde.
ii) À Requerente não assiste qualquer razão, pelo que os seus argumentos são manifestamente improcedentes.
A) Da legalidade do despacho que sanciona superiormente as conclusões vertidas no relatório de inspecção tributária
jj) Contrariamente ao que sugere a Requerente, não se coloca qualquer problema de omissão de notificação do verso da folha onde constam os despachos que sancionam o relatório de inspecção visto que, como a Requerente igualmente refere no seu pedido de pronúncia arbitral, tendo detectado tal falta, dirigiu-se ao Serviço de Finanças e obteve certidão da folha omitida na notificação.
Termos em que, ainda que existisse um vício decorrente de tal omissão, o que não se concebe e apenas se admite à cautela e por dever de patrocínio, teria que concluir-se, em face dos factos, que o mesmo teria sido sanado.
kk) Com efeito, dispõe o artigo 37.º, n.º 1 do CPPT que «Se a comunicação da decisão em matéria tributária não contiver a fundamentação legalmente exigida, a indicação dos meios de reacção contra o acto notificado ou outros requisitos exigidos pelas leis tributárias, pode o interessado, dentro de 30 dias ou dentro do prazo para reclamação, recurso ou impugnação ou outro meio judicial que desta decisão caiba, se inferior, requerer a notificação dos requisitos que tenham sido omitidos ou a passagem de certidão que os contenha, isenta de qualquer pagamento» (destaques nossos).
ll) Do artigo 39.º, n.º 12 do CPPT consta que «O acto de notificação será nulo no caso de falta de indicação do autor do acto e, no caso de este o ter praticado no uso de delegação ou subdelegação de competências, da qualidade em que decidiu, do seu sentido e da sua data».
mm) Assim, a norma disciplina apenas que, em matéria de perfeição das notificações, é cominada com a nulidade a situação de falta de indicação do autor do acto e, no caso de este o ter praticado no uso de delegação ou subdelegação de competências, da qualidade em que decidiu, do seu sentido e da sua data.
nn) Ora, no caso em apreço, tais requisitos encontram-se plenamente cumpridos, designadamente, indicação do autor do acto, prática do mesmo no uso de subdelegação de competências, sentido e data.
oo) Termos em que, contrariamente ao que alega a Requerente, não existe a obrigação legal de indicar a data da subdelegação e a data da publicação em Diário da República, com indicação do seu n.º de série (cfr. artigo 17.º do pedido de pronúncia arbitral), e muito menos existe a cominação para tal omissão com o vício de nulidade.
pp) A este propósito, refere Jorge Lopes de Sousa que «É requisito do acto a menção da delegação ou subdelegação de poderes e não também a indicação do Diário da República em que foi publicado o despacho de delgação ou subdelegação»[1].
qq) Neste mesmo sentido, chamem-se à colação as conclusões vertidas no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 30/04/2014 (processo: 06580/13):
«I. A previsão das menções obrigatórias que devem sempre constar do acto, encontra-se consagrada no artigo 123º, nº1 do CPA. Em concreto, a alínea a) de tal norma refere a indicação da autoridade que o praticou e a menção da delegação ou subdelegação de poderes, quando exista. Trata-se de uma menção obrigatória que está em consonância com o disposto no artigo 38º do mesmo diploma, nos termos do qual o órgão delegado ou subdelegado deve mencionar essa qualidade no uso da delegação ou subdelegação.
II. Assim, é requisito do acto a menção da delegação ou subdelegação de poderes e não também a indicação do Diário da República em que foi publicado o despacho de delegação ou subdelegação» (destaques nossos).
rr) Sendo certo que, caso a menção ao diploma normativo que concretiza a subdelegação de competâncias fosse obrigatória, que não é, a insuficiência da notificação, ainda assim, não conduziria à nulidade do acto, facultando apenas ao notificando o direito de requerer a notificação dos elementos omitidos ou a passagem de certidão que os contenha, dentro do prazo fixado no n.º 1 do citado artigo 37.º do CPPT, e, usando dessa faculdade, o prazo para reagir (graciosa ou contenciosamente) contra o acto tributário conta-se a partir da notificação dos requisitos que haviam sido omitidos ou da passagem de certidão que os contenha.
ss) Termos em que, como constitui jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Administrativo, «Não sendo exercida a faculdade prevista no art. 37º nº 1 do CPPT, a aludida omissão irreleva para afastar os efeitos normais da notificação já efectuada» (neste sentido, entre muitos outros, cfr. Acórdão do STA de 07/08/2015, Processo 0389/15).
tt) Por fim, note-se ainda que, ainda que o autor do acto não tivesse mencionado, sequer, que actuou no âmbito da subdelegação de competências (o que, como vimos, não sucedeu), facto é que, mesmo em tal circunstância, a doutrina e a jurisprudência pátrias têm entendido que tal omissão constitui apenas uma mera irregularidade formal que deverá considera-se sanada se se demonstrar ter sido atingida a finalidade que era visada pela exigência legal de tal menção, máxime, a impugnação administrativa ou contenciosa do acto.
uu) Afinal, como é consabido, a exigência legal de determinados requisitos nas notificações realizadas pela Administração Fiscal tem como objectivo primacial a salvaguarda dos direitos de defesa do contribuinte. Neste sentido, por esclarecedor, transcreve-se um excerto do sumário do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 01/12/2012 (processo: 01138/09.4BEPRT): «5. A falta de menção da delegação ou da subdelegação de competências não gera, necessariamente, a invalidade do acto praticado no exercício de tais competências, antes implica uma irregularidade meramente formal que deverá considerar-se sanada se se demonstra ter sido atingida a finalidade que era visada pela exigência legal de tal menção. 6. As deficiências da notificação que afectem a validade desta apenas conduzem a que o acto notificado não seja eficaz em relação ao notificado mas de modo algum afectam a validade daquele acto» (destaques nossos).
B) Da obrigação declarativa em sede de renúncia à isenção de IVA
vv) Invoca a Requerente que exerceu validamente o direito de renúncia à isenção mediante a declaração que entregou no dia 1 de Março de 2010. Todavia, e conforme resulta, desde logo, da factualidade supra elencada, a verdade é que tal não ocorreu, nem da declaração de alteração de actividade entregue no dia 1 de Março de 2010, nem noutra qualquer.
xx) Com efeito, nos termos do n.º 2 do artigo 12.º do Código do IVA, caso o sujeito passivo reúna as condições para beneficiar do regime de isenção de IVA: «O direito de opção é exercido mediante a entrega, em qualquer serviço de finanças ou noutro local legalmente autorizado, da declaração de início ou de alterações, consoante os casos, produzindo efeitos a partir da data da sua apresentação».
zz) Ora, na declaração de alteração de actividades apresentada a 1 de Março de 2010, a Requerente apenas alterou os quadros 9 e 11 da referida declaração, indicando, respectivamente, ao proceder desta forma, que passaria a realizar aquisições intracomunitárias de bens e a efectuar a dedução do imposto suportado segundo a afectação real de todos os bens e serviços utilizados.
aaa) A renúncia à isenção, possibilitada tanto pelo n.º 1 como pelo n.º 4, ambos do artigo 12.º do CIVA, tem que ser expressa na declaração de alterações de actividade, conforme previsto no artigo 32.º do CIVA, através do preenchimento dos quadros 12 e 13, os quais têm por epígrafe “PRÁTICA DE OPERAÇÕES IMOBILIÁRIAS” e “OPÇÃO POR REGIME DE TRIBUTAÇÃO”, respectivamente, pois trata-se de uma derrogação à isenção e tem carácter excepional.
Ademais, da declaração de alteração de actividades constam instruções que têm o mérito de elucidar o contribuinte sobre o preenchimento dos respectivos quadros, não sendo excepção os quadros 12 e 13 a que nos referimos.
Cumprindo relembrar que, como é consabido, é entendimento pacífico que a renúncia à isenção é insusceptível de ser presumida.
Neste sentido, veja-se o entendimento vertido no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 30/06/1999 (processo: 020940):
«II - A renúncia à isenção, prevista no art. 12 do mesmo Código pressupõe a entrega na repartição de finanças competente da declaração de início ou de alterações, como se prescreve neste normativo.
III - A renúncia não se presume» (destaques nossos).
bbb) E, de igual forma, também não há dúvidas que a opção pelo regime de renúncia à isenção tem que ser expressa. A este respeito, veja-se o entendimento constante do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 22/05/2012 (processo: 05235/11):
«[...] Face à extrema importância, delicadeza, que o direito à dedução do IVA encerra, traduzindo, mesmo, uma das principais características do mecanismo essencial de funcionamento do tributo, assente, no supra identificado, método subtrativo indireto, somos obrigados a reputar a imposição de ser comunicada a opção, expressa, do sujeito passivo, de serem tributadas as suas operações, em princípio, isentas, como condicionante para que a renúncia possa ser conhecida e reconhecida pelos competentes serviços da AT. Ademais, só tratando-se de uma condição, a exigida entrega de declaração comprova que foi exercido o direito de opção e permite estabelecer o período de permanência obrigatória no regime de tributação escolhido – art. 12.º n.º 3 CIVA.
Concluindo, na esteira do Ac. STA de 30.6.1999, rec. 20.940, entendemos que a renúncia à isenção, possibilitada pelo art. 12.º n.º 1 CIVA, em circunstância alguma é susceptível de ser presumida, pelo que, se o sujeito passivo não apresenta pedido/declaração de renúncia, tem de ser considerado submetido ao regime de isenção, por, originariamente, o seu próprio [...]» (destaques nossos).
Ademais, cumpre ainda referir que o alegado pela Requerente contraria o declarado no campo 5 do quadro 11 (intenção de deduzir o imposto pelo método da afectação real) preenchido pela própria, pois aí refere que pretende proceder à afectação real de todos os bens.
ccc) Ora, só será de aplicar tal método de dedução quando, no exercício da sua actividade, o sujeito passivo realiza transmissões de bens e/ou prestações de serviços que não conferem direito à dedução e transmissões de bens e/ou prestações de serviços que conferem direito à dedução.
Pelo que, além de a Requerente, seguramente, não ter cumprido o estatuído no artigo 12.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2 CIVA, condição para que pudesse não ficar sujeita ao regime de isenção, quanto a parte da sua actuação, a impugnante assumiu igualmente comportamento inadequado, incapaz de possibilitar a afirmação, conscienciosa, de ter agido como “sujeito passivo integral” e não misto.
ddd) Por outro lado, nos termos do artigo 75.º, n.º 1, da LGT, presumem-se verdadeiras e de boa-fé as declarações dos contribuintes, apresentadas nos termos previstos na lei, pelo que à Administração Fiscal caberá aceitar as declarações apresentadas pelos contribuintes como verdadeira.
eee) Sendo que, como dispõe o artigo 35.º, n.º 1, do CIVA, a declaração de alterações de actividade pode, inclusive, ser apresentada por transmissão electrónica de dados, tendo sido opção da Requerente entregá-la junto do serviços. Circunstância que, naturalmente, não isenta a Requerente de responsabilidades, tanto mais que, nos termos do artigo 35.º, n.º 2, do CIVA, «O documento comprovativo referente às declarações mencionadas no número anterior, apresentadas nos serviços de finanças ou noutros locais autorizados, é entregue ao sujeito passivo, após autenticação pelo funcionário receptor e aposição da vinheta do técnico oficial de contas, se for o caso, que assume a responsabilidade fiscal do sujeito passivo a que respeitam as declarações» (destaques nossos).
fff) Tendo sucedido, no caso em apreço, e conforme referido supra, que a Requerente, conjuntamente com o seu Técnico Oficial de Contas, certamente experiente nestas temáticas, assinou a referida declaração confirmando que a mesma «corresponde à verdade e não omite qualquer informação pedida».
ggg) Sendo manifestamente improcedente a argumentação, infundada, de que a Administração Fiscal não havia dado cumprimento ao dever de colaboração a que se encontra adstrita, tanto mais que o preenchimento da declaração não é da responsabilidade da Administração Fiscal mas sim do contribuinte, como decorre do artigo 32.º, n.º 1, do CIVA [«Sempre que se verifiquem alterações de qualquer dos elementos constantes da declaração relativa ao início de actividade, deve o sujeito passivo entregar a respectiva declaração de alterações»]
hhh) Dúvidas não há de que a Requerente esteve e permanece no regime de isenção (incompleta), quer no que concerne às actividades de prestação de cuidados de saúde com internamento, quer no que respeita às operações imobiliárias/locação de imóveis.
iii) Termos em que as correcções realizadas pela Inspecção Tributária são legais e devidas, pois que, sendo a actividade da Requerente abrangida por isenções incompletas, designadamente, nos termos das alíneas 2) e 29) do artigo 9.º do CIVA, aquela não pode deduzir a totalidade do imposto suportado nas suas aquisições, conforme decorre dos artigos 19.º e 20.º do CIVA.
jjj) Por outro lado, argumenta ainda a Requerente, sem razão, que o enquadramento no regime de renúncia à isenção teria sido aceite pela Administração Fiscal em 2010, na medida em que foi deferido um pedido de reembolso realizado pela Requerente relativamente ao 1.º trimestre de 2010.
kkk) A Requerente não declarou qualquer valor no campo 9 das declarações periódicas, o qual respeita a «operações que não conferem direito à dedução», pelo que forneceu à Administração Fiscal uma informação errada que serviu de pressuposto ao deferimento do pedido de reembolso (cfr. fl. 10 do RIT).
lll) o que sucedeu, apenas, foi que, de forma a instruir o procedimento de reembolso relativo a período 03T de 2010, foram praticados actos de consulta, recolha e cruzamento de elementos, verificando-se a conformidade dos valores constantes de documentos. Procedimento com âmbito e escopo distinto do procedimento de inspecção externa que incidiu sobre os anos de 2011, 2012, 2013 e 2014.
mmm) Para que algum enquadramento tivesse sido aceite pela Administração Fiscal, a Requerente teria que ter solicitado, previamente, um pedido de informação vinculativa, nos termos do artigo 68.º da LGT, o que não fez. Efectivamente, a forma como é concluído o procedimento de reembolso não preclude, obviamente, a prerrogativa que cabe à AT de fiscalizar as declarações dos contribuintes.
nnn) Na verdade, à AT, no exercício da sua competência de fiscalização da conformidade da actuação dos contribuintes com a lei, actuando no uso de poderes estritamente vinculados, e uma vez submetida ao princípio da legalidade, caberá verificar a veracidade dos elementos declarados pela Requerente face à factualidade constatada em sede inspectiva. Como não poderia deixar de ser, a inspecção tributária compreende, desde logo, «a confirmação dos elementos declarados pelos sujeitos passivos e demais obrigados tributários», conforme discorre expressamente do artigo 2.º, n.º 2, alínea a) do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (RCPIT).
ooo) ainda que a Requerente tivesse exercido o seu direito de renúncia à isenção com base nos formalismos previstos na lei, o que não fez, facto é que, ainda assim, a Administração Fiscal teria sempre a prerrogativa de fiscalizar tal declaração, aferindo se, materialmente, a Requerente reúne os requisitos legalmente exigidos para poder renunciar à isenção e efectuar as respectivas correcções, se necessárias.
C) Da impossibilidade de renúncia
ppp) Por fim, cumpre sublinhar que, o relatório de inspecção tributária, embora refira lateralmente que, de todo o modo, a Requerente não poderia beneficiar do regime de renúncia à isenção, facto é que tal questão fica prejudicada dado o enquadramento conferido aos factos verificados. Dada a conclusão de que a Requerente não assinalou expressamente a sua opção pela renúncia à isenção, conforme se encontra previsto legalmente, os SIT concluíram que a dedução do IVA suportado na sua totalidade foi indevida pois que a renúncia é insusceptível de se presumir.
qqq) Com efeito, quanto a esta questão, diz-se no RIT o seguinte: «Conclui-se assim que o s.p não renunciou à isenção relativamente às operações isentas da alínea 2) do artigo 9.º do CIVA, nem podia, por falta dos requisitos previstos na alínea b) do n.º 1 do artigo 12.º do mesmo diploma. Também não podia relativamente às operações isentas da alínea 29) do artigo 12.º, uma vez que não cumpria as condições objectivas previstas no n.º 1 do artigo 2.º anexo ao decreto n.º 21/2007, de 29.01» (cfr. fl. 17 do RIT).
rrr) Quanto às operações isentas na alínea 29) do artigo 9.º, note-se que, embora se diga que a Requerente não reúne as condições objectivas para optar pelo regime de renúncia, a questão acaba por não ser premente visto que a Requerente não liquidou IVA nas respectivas operações. Pelo que, assumidamente, não poderia ter renunciado, sendo que, declarativamente, sempre teria mais requisitos e formalidades a cumprir.
sss) Diferentemente, no que concerne à actividade enquadrada na alínea 2) do artigo 9.º do CIVA, a Requerente liquidou imposto nas operações praticadas à taxa de 6%, pelo que caberá explanar a razão pela qual, ainda que se considerasse a opção de renúncia como validamente exercida, o que apenas se admite à cautela e por dever de patrocínio, a Requerente não poderia beneficiar do respectivo regime por não reunir as condições substanciais para o efeito.
ttt) De todo o modo, sempre se diga que, efectivamente, e tal como referido, facto é que a Requerente não reúne as condições para renunciar à isenção nos termos do artigo 12.º, n.º 1, alínea b), do Código do IVA, de modo a ficar enquadrada no regime normal de IVA.
uuu) Na verdade, ainda que a Requerente tivesse declarado correctamente a opção pelo regime de renúncia à isenção, cumprindo as formalidades que constam da respectiva declaração de alterações de actividade, o que não fez, ainda assim, importaria aferir se, de mérito, a Requerente reunia os requisitos legais, na sua esfera jurídica, para poder usufruir de tal regime.
vvv) Quanto à renúncia à isenção, prevista no artigo 12.º do Código do IVA, é consabido que esta abrange o conjunto de todas as operações efectuadas pelo sujeito passivo, implicando que este passe a ter de liquidar IVA nas suas operações, ficando com a possibilidade de deduzir o IVA que tenha suportado nas suas aquisições.
xxx) Dispõe o referido artigo 12.º do Código do IVA:
«Podem renunciar à isenção, optando pela aplicação do imposto às suas operações:
[…]
b) Os estabelecimentos hospitalares, clínicas, dispensários e similares, não pertencentes a pessoas colectivas de direito público ou a instituições privadas integradas no sistema nacional de saúde, que efectuem prestações de serviços médicos e sanitários e operações com elas estreitamente conexas».
zzz) A possibilidade de renúncia à isenção encontra-se limitada aos sujeitos passivos cuja actividade se enquadre no n.º 2 do artigo 9.º do Código do IVA, ou seja, «os estabelecimentos hospitalares, clínicas, dispensários e similares».
aaaa) Sobre a questão de saber se uma entidade privada que convenciona com o Estado Português a prestação de serviços médicos e sanitários elencados no n.º 2 do artigo 9.º do CIVA passa a integrar o “Sistema Nacional de Saúde” para efeitos do artigo 12.º, n.º 1, alínea b) do Código do IVA, vejam-se as conclusões alcançadas pelo douto acórdão arbitral proferido no âmbito do processo n.º 629/2014-T que se transcrevem e acompanham:
«V.1. Da interpretação conforme com o direito nacional
Resulta evidente que a questão decidenda é, desde logo, saber se, por força do contrato celebrado com a Administração Regional de Saúde do Norte, l.P., e com o Instituto de Segurança Social, I.P., o Requerente deve considerar-se como uma instituição privada integrada no “sistema nacional de saúde”, nos termos e para os efeitos do artigo 12º, nº 1, alínea b), do CIVA. E da análise dos vários diplomas resultam evidentes indícios de que estamos perante uma instituição privada integrada no "sistema nacional de saúde”.
a) A Lei de Bases de Saúde (Lei n.° 48/90, de 24 de agosto), veio esclarecer o conceito de "sistema de saúde”, constando do seu capitulo II, base XII, que:
“1 - O sistema de saúde é constituído pelo Serviço Nacional de Saúde e por todas as entidades públicas que desenvolvam actividades de promoção, prevenção e tratamento na área da saúde, bem como por todas as entidades privadas e por todos os profissionais livres que acordem com a primeira a prestação de todas ou de algumas daquelas actividades.
2 - O Serviço Nacional de Saúde abrange todas as instituições e serviços oficiais prestadores de cuidados de saúde dependentes do Ministério da Saúde e dispõe de estatuto próprio.
3 - O Ministério da Saúde e as administrações regionais de saúde podem contratar com entidades privadas a prestação de cuidados de saúde aos beneficiários do Serviço Nacional de Saúde sempre que tal se afigure vantajoso, nomeadamente face à consideração do binómio qualidade-custos, e desde que esteja garantido o direito de acesso.
4 - A rede nacional de prestação de cuidados de saúde abrange os estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde e os estabelecimentos privados e os profissionais em regime liberal com quem sejam celebrados contratos nos termos do número anterior.
5 - Tendencialmente, devem ser adoptadas as mesmas regras no pagamento de cuidados e no financiamento de unidades de saúde da rede nacional da prestação de cuidados de saúde.
6 - O controlo de qualidade de toda a prestação de cuidados de saúde está sujeito ao mesmo nível de exigência.”
b) Relativamente à integração de entidades privadas no “sistema nacional de saúde”, já naquela lei de 1979 se reconhecia a incapacidade de implementação completa e imediata do Serviço Nacional de Saúde universal e geral, como resulta do artigo 15º, que se transcreve:
«1 - O acesso às prestações enunciadas no artigo anterior é assegurado, em princípio, pelos estabelecimentos e serviços da rede oficial do SNS.
2 - Enquanto não for possível garantir a totalidade das prestações pela rede oficial, o acesso será assegurado por entidades não integradas no SNS em base contratual, ou, excepcionalmente, mediante reembolso directo dos utentes».
E, por isso, se previa concretamente nos artigos 52º e 53º, a articulação e a possibilidade de estabelecimento de convénios entre o SNS e entidades privadas, designadamente, no campo da hospitalização e meios de diagnóstico nos casos em que a rede de serviços oficial não assegure os serviços de saúde.
c) Entretanto, o Decreto-Lei nº 254/82, de 29/06, que criou as ARS (Administrações Regionais de Saúde), manteve em vigor o art. 15º da Lei nº 56/79, de 15/119 e revogou os artigos 52º e 53º da mesma Lei, passando a mencionar no seu artigo 5", integrado no capítulo II “Da coordenação com outros serviços”, e sob o título “Coordenação com o sector privado”, que: «As ARS articulam-se com as associações e as instituições de solidariedade social e com as entidades privadas que desenvolvem actividades empresariais no âmbito da saúde, quer em nome individual, quer sob a forma de sociedade, convencionadas ou não, tendo em vista a protecção eficaz da saúde dos indivíduos, das famílias e da comunidade, em termos a regulamentar».
d) Ora, estes diplomas, anteriores à entrada cm vigor do CIVA, materializam a criação de um “sistema de saúde”, conceito que foi acolhido, conforme referido, pela Lei de Bases da Saúde, nº 48/90), de 24/08, concretamente na Base XII, onde se determina:
«1 - O sistema de saúde é constituído pelo Serviço Nacional de Saúde e por todas as entidades públicas que desenvolvam actividades de promoção, prevenção e tratamento na área da saúde, bem como por todas as entidades privadas e por todos os profissionais livres que acordem com a primeira a prestação de todas ou de algumas daquelas actividades» (destaques nossos).
Desenvolvendo-se na Base XII, sob o título Convenções, as seguintes disposições:
«1 - No quadro estabelecido pelo n.º 3 da base XII, podem ser celebradas convenções com médicos e outros profissionais de saúde ou casas de saúde, clínicas ou hospitais privados, quer a nível de cuidados de saúde primários quer a nível de cuidados diferenciados.
2 - A lei estabelece as condições de celebração de convenções e, em particular, as garantias das entidades convencionadas».
A regulamentação desta Base apenas teve lugar em 1998, com o Decreto-Lei nº 97/98, de 18/04, sendo certo que, entretanto, os n.os 3, 4 e 5 do artigo 37° do Decreto-Lei nº 11/93, de 15/01, normativo que se destinava a regular o nº 2 da Base XII, definindo o novo estatuto do Serviço Nacional de Saúde, também continuava a prever a contratação/convenção com estabelecimentos privados.
Resulta ainda da sucessão destes normativos que as entidades privadas convencionadas nunca pertenceram ao Serviço Nacional de Saúde (entidades não integradas no SNS, como resulta do nº 2 do art. 15º da Lei 56/79, de 15/09), mas sempre integraram um mais vasto, subsumindo-se a um conjunto de elementos interconectados, de modo a formar um todo organizado quando conjugado com o Serviço Nacional de Saúde, com o intuito de garantir o acesso aos cuidados de saúde.
Pelo que facilmente se conclui que, mesmo antes da Lei de Bases da Saúde (de 1990) acolher a locução “sistema de saúde”, consagrando-a legalmente, já o destinatário normal do artigo 12º, nº 1, alínea b), do CIVA, norma vigente desde 01/01/1986, mas aprovado por um Decreto-Lei de 26 de dezembro 1984, compreendia o seu alcance: as entidades privadas que convencionam com o Estado Português a prestação de serviços médicos e sanitários elencados no 2) do art. 9ºdo CIVA passam a integrar o “sistema nacional de saúde”, o que obsta à opção por aquela renúncia.
Sendo também certo que, actualmente, não pode deixar de concretizar-se o conceito de “sistema nacional de saúde”, constante do Código do IVA, face ao disposto na Lei de Bases a propósito do conceito de “sistema de saúde”» (destaques nossos).
bbbb) Afinal, a Requerente é uma entidade que presta serviços em “condições análogas” às que vigoram para os organismos de direito público, encontrando-se vedada a possibilidade de renúncia à isenção conforme disposto nos artigos 377.º a 391.º da Directiva IVA.
cccc) Na verdade, a assunção pelo Estado, ainda que de forma parcial, dos custos com a prestação de determinados cuidados de saúde prestados por estas entidades privadas, implica, necessariamente, o seu reconhecimento para efeitos da aplicação da isenção, tal como delimitado na alínea b) do nº 1 do artigo 132° da Directiva IVA.
dddd) Não sendo dessa forma, seria frustrado o princípio da neutralidade, do qual decorre dever existir a igualdade de tratamento de todos os operadores económicos que efectuem as mesmas operações.
eeee) Neste sentido, o TJUE já pugnou no sentido de que, por um lado, estas isenções têm por objectivo comum a redução do custo dos cuidados de saúde, e por outro, que uma interpretação conforme com o princípio da neutralidade opõe-se a que “prestações de serviços semelhantes, que se encontram portanto, em concorrência entre si, sejam tratadas de maneira diferente do ponto de vista do IVA” (cfr. Acórdão L.U.P., processo C-106/05, de 8 de Junho de 2006, §25 e §32).
ffff) De acordo com a jurisprudência do TJUE, o conceito de “condições sociais análogas” deverá aferir-se, portanto, tendo em atenção se «tal implica ou não uma violação do princípio da igualdade de tratamento relativamente aos outros operadores que efectuam as mesmas operações em situações comparáveis» (cfr. Acórdão Dornier, de 6 de Novembro de 2003, processo C-45/01).
gggg) É de concluir que, atentos os acordos e convenções realizados pela Requerente com diversos subsistemas públicos, a mesma não poderia, em circunstância alguma, beneficiar do regime de opção pela renúncia à isenção relativamente à prestação de serviços enquadrada na alínea 2) do artigo 9.º do CIVA.
Instrução do processo e alegações finais
Por despacho de 28-12-2015 e sem discordância das partes, foram consideradas desnecessárias e inúteis quaisquer outras provas para além das apresentadas, de base documental e, encerrada a fase instrutória, foram ambas as partes notificadas para apresentar as respetivas alegações finais, por escrito, o que fizeram com remissão para os respetivos articulados.
Ampliação do pedido
A Requerente, com as suas alegações, promoveu a ampliação pedido, nos termos dos artigos 24º e 29º-1/e), do RJAT e 265º-2, do CPC, alegando que na pendência deste processo e em consequência de ter sido instaurada pela AT a ação executiva, pagou a importância global das liquidações objeto destes autos e acrescido.
A Requerida foi notificada deste pedido para se pronunciar, mas nada disse ou requereu no prazo concedido (Cfr despacho de 17-3-2016)
II – Fundamentação
Factos provados
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Em 26 de fevereiro de 1985, a Requerente apresentou Declaração de Registo para efeitos de Imposto sobre o Valor Acrescentado da qual resulta ter iniciado atividade em 21 de fevereiro de 1961 e o exercício de atividade de estabelecimentos de saúde com internamento (cf. Anexo 1, ao Relatório de Inspeção, junto com o processo administrativo);
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Relativamente ao tipo de operações praticadas, indicou no quadro 10 da referida declaração, que iria praticar, no exercício da sua atividade (cf. Anexo 1 ao Relatório de Inspeção junto com o processo administrativo):
· Transmissões de bens e/ou prestações de serviços que conferem o direito à dedução (campo 1 do quadro 10);
· Transmissões de bens e/ou prestações de serviços isentas que não conferem o direito à dedução (campo 2 do quadro 10).
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Da referida declaração resulta ainda a indicação da utilização de 67% como percentagem estimada (pro rata) para efetuar a dedução de imposto suportado (campo 7 do quadro 10 - cf. Anexo 1 ao Relatório de Inspeção junto com o processo administrativo);
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Em 01 de março de 2010, a Requerente procedeu à entrega de declaração de alterações de atividade, da qual resulta a alteração dos quadros 9 e 11 da referida declaração, que respeitam a dados relativos à atividade e dados relativos ao tipo de operações (cf. Anexo 2 ao Relatório de Inspeção, junto com o processo administrativo);
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Relativamente à alteração dos dados relativos à atividade, a Requerente declarou no quadro 09 que passou a efetuar aquisições intracomunitárias de bens, assinalando, para o efeito, o campo 6 (cf. Anexo 2 ao Relatório de Inspeção, junto com o processo administrativo);
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Relativamente ao tipo de operações, a Requerente declarou no quadro 11 que passou a efetuar a dedução do imposto suportado segundo o método da afetação real, de todos os bens e serviços utilizados assinalando, para o efeito, os campos 3 e 5 (cf. Anexo 2, ao Relatório de Inspeção, junto com o processo administrativo);
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A Requerente não assinalou no quadro 13 «se pretende exercer o direito à opção, reunindo para tal as necessárias condições, indique o regime pelo qual opta (arts. 12.º. 55.º. e 63.º do CIVA)” (cf. Anexo 2, ao Relatório de Inspeção, junto com o processo administrativo);
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Em 20 de agosto de 2010, foi deferido o pedido de reembolso de IVA apresentado pela Requerente no montante de € 323.025,33, conforme “Detalhe de Pedido de Reembolso de IVA”, junto com o pedido de pronúncia arbitral;
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Das Observações do referido Detalhe de Pedido de Reembolso de IVA resulta que “Ora, o sujeito passivo em 2010-03-01 renunciou à isenção de IVA em que estava enquadrado (art.º 9.º, n.º 2)”, conforme Detalhe de Pedido de Reembolso de IVA, junto com o pedido de pronúncia arbitral;
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Ao abrigo da Ordem de Serviço n.º OI2014…, a Requerente foi sujeita a uma ação de inspeção externa, de âmbito parcial, aos períodos de 2011, 2012, 2013 e 2014-01 e 2014-02, sendo o motivo da ação o “Reenquadramento de IVA” (cf. pág. 5/35 do Relatório de Inspeção junto com o processo administrativo);
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Por Ofício n.º 2014…, emitido pelos Serviços de Inspeção da Direção de Finanças de…, em 7 de novembro de 2014, a Requerente foi notificada das Conclusões do Relatório de Inspeção (cf. Relatório de Inspeção junto com o processo administrativo);
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No que respeita ao “Ponto III – 1.3.2. – I.V.A. Análise ao enquadramento e respetivo comportamento fiscal relativamente à prestação de cuidados de saúde e operações imobiliárias/locação de imóveis”, os Serviços de Inspeção concluem que “(…) o s.p. não fez qualquer opção de renúncia na declaração de alterações, entregue em 01-03-2010 ou noutra ulterior a esta. A opção teria que ser efetuada no quadro 13 da declaração de alterações, assinalando o s.p. o campo 1 daquele quadro “Se pretende exercer o direito à opção, reunindo as necessárias condições, indique o regime pelo qual opta [artigos 12.º, 55.º e 63.º do CIVA], bem como no quadro 12 da mesma declaração de alterações, campo 1, relativamente à prática de operações imobiliárias.
[Daí decorre que o s.p. estava e permanece no regime de isenção, nas operações de prestação de cuidados de Saúde em estabelecimentos com internamento, bem como nas operações imobiliárias/locação de imóveis, que é o seu regime próprio”. (cf. pág. 16/35 do Relatório de Inspeção junto com o processo administrativo)];
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Resulta do “Ponto III – 1.3.2.1 – Dedução Indevida de Iva” do referido Relatório de Inspeção que a Requerente:
· “Deduziu imposto que incidiu sobre bens e serviços adquiridos, utilizados pelo sp para a realização de transmissões de bens e prestações de serviços isentas, que não conferem direito à dedução;
· Deduziu imposto na totalidade, que incidiu sobre bens e serviços adquiridos, que são de utilização mista” (cf. pág. 20/35 do Relatório de Inspeção junto com o processo administrativo);
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Quanto à “imputação direta do imposto indevidamente deduzido” conclui-se no Relatório que “foi deduzido indevidamente imposto, que incidiu sobre bens e serviços adquiridos, utilizados pelo s.p. para a realização de transmissões de bens e prestações de serviços isentas, que não conferem direito à dedução, nos montantes globais de €60.379,30, €56.930,74, €65.711,67 e €18.490,14, respetivamente para cada um dos períodos anuais de 2011, 2012, 2013, Jan. e Fev. 2014” (cf. pág. 18/35 do Relatório de Inspeção junto com o processo administrativo);
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Quanto à “aplicação da percentagem de dedução artigo 23.º CIVA – correcção parcial IVA indevidamente deduzido conclui-se no Relatório que ”(…) o s.p. relativamente aos bens de utilização mista, deduziu indevidamente IVA, na percentagem que excede os 8%, 4%, 5% e 4%, respetivamente, legalmente aceites, por aplicação do artigo 23.º do CIVA. [Conforme mencionado, ao restante imposto deduzido pelo s.p., que incidiu sobre bens e serviços adquiridos, e que são de utilização mista, aplicam-se as percentagens de dedução calculadas e constantes do quadro anterior, sendo o restante imposto corrigido por dedução indevida].
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As correções devidas são, assim, de € 55.141,83, € 93.820,36, € 129.389,53 e € 13.615,50, (…)” (cf. pág. 22 e 23/35 do Relatório de Inspeção junto com o processo administrativo);
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Do Mapa Resumo das correções resultantes da ação de inspeção resulta o seguinte imposto (IVA) em falta (cf. Relatório de Inspeção junto com o processo administrativo):
· 2011 - € 19.236,26;
· 2012 – € 146.259,41;
· 2013 – € 191.898,85;
· 2014 – € 31.859,38.
-
A percentagem de operações realizadas pela Requerente ao abrigo das convenções celebradas com o Estado foi de 5,32% em 2011, 6,17% em 2012, 6,87% sobre 2013, 3,69% em 2014 (cf. Declaração emitida por S… na qualidade de Técnico Oficial de Contas da sociedade “A…” – junta com o pedido de pronúncia arbitral).
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Na pendência dos presentes autos a Requerente procedeu ao pagamento à Administração Tributária e Aduaneira do valor (e legais acréscimos) a que se reportam as liquidações ora impugnadas objeto de execuções [Proc. nº …2015… e Proc. nº …2015…], tendo a Requerente pago a quantia exequenda e legais acréscimos – exercícios de 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014 – no valor global (que inclui outras liquidações) de € 1.014.840,15 (um milhão catorze mil oitocentos e quarenta euros e quinze cêntimos) (cf. Doc. 1, junto com as Alegações da Requerente).
Factos não provados
Não há, com relevo para a decisão à luz das várias perspetivas de análise das questões de direito, quaisquer outros factos provados e/ou não provados.
Motivação
A convicção do Tribunal ao fixar o sobredito quadro factual fundou-se nos elementos documentais integrados nos autos e não impugnados e, designadamente, na cópia do processo administrativo instrutor junta pela AT, em conjugação com a posição das partes espelhada nos respetivos articulados, reveladora de inexistência de controvérsia real quanto à materialidade dos factos mas tão somente quanto à forma de os interpretar e enquadrar.
Questões decidendas
São, no essencial, as seguintes, sem prejuízo da exceção suscitada pela AT e que abaixo, se decidirá, as questões que o Tribunal terá de equacionar e decidir:
1ª Se consubstancia nulidade insanável a omissão da referência da norma ao abrigo da qual emerge a subdelegação de competências da Chefe de Divisão que sanciona o relatório de inspeção tributaria (artigo 39º-12, do CPPT);
2ª Se foi ou deve considerar-se validamente exercida pela Requerente, mediante a declaração de alterações de atividade apresentada em 1-3-2010, a opção pela renúncia à isenção prevista no artigo 12º-1/b), do CIVA;
3ª Se o deferimento do pedido de reembolso de IVA relativo ao 1º trimestre de 2010 implicou a aceitação pela AT do enquadramento da Requerente no regime de renúncia à isenção de IVA prevista no artigo 12º-1/b), do CIVA;
4ª Se a não aceitação de tal enquadramento viola, no caso, os princípios constitucionais da confiança, justiça e segurança jurídica;
5ª Se a Requerente reúne (ou reunia em 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014) os requisitos substantivos necessários para o exercício do direito de renúncia nos termos do artigo 12º-1/b), do CIVA e, designadamente, se não era uma instituição privada integrada no sistema nacional de saúde e
6ª Se são devidos e exigíveis à Requerida juros indemnizatórios decorrentes do pagamento das liquidações objeto do presente pedido de pronúncia arbitral. [Cfr ampliação do pedido, apreciada e decidida infra].
Saneamento
O Tribunal é competente.
O processo é o próprio e as partes legítimas, capazes e regularmente representadas.
Não há nulidades alegadas ou de conhecimento oficioso a apreciar e decidir.
A exceção suscitada
A Autoridade Tributária e Aduaneira invoca nos artigos 28.º a 37.º da sua Resposta não ser contestada no presente processo a legalidade da correção no valor de € 9.009,04, relativa à aplicação da taxa normal de 23% ao valor tributável de € 52.994,35, correspondente ao débito de despesas a um cliente da Requerente (R…).
Todavia, a referida correção integra a liquidação de IVA n.º…, no valor de € 18.169,02 e a correspondente liquidação de Juros Compensatórios nº…, no valor de € 2.096,66, ambas relativas ao período 2011-10.
A Requerente na sua petição não contesta diretamente a legalidade da correção relativa ao IVA incidente sobre o débito de despesas à R… .
Porém, é invocada uma nulidade no procedimento de inspeção que poderia pôr em causa a validade dos atos de liquidação que lhe são consequentes: no pedido foi requerida a anulação da liquidação de IVA n.º … e da liquidação de Juros Compensatórios nº … e no valor da ação foi considerado o valor integral das mencionadas liquidações de IVA e de Juros Compensatórios.
É certo que na resposta, a Requerente parece reduzir o pedido, no que às liquidações em apreciação respeita, mas da análise da petição não se conclui que não se tenha pretendido abranger todas as liquidações identificadas.
Razão porque se julga improcedente a exceção.
Da ampliação do pedido
Nas suas alegações escritas vem a Requerente requerer a ampliação do pedido alegando que na pendência dos presentes autos procedeu ao pagamento à AT do valor (e legais acréscimos) a que se reportam as liquidações que ora se impugnam e que foram objeto de execuções [Proc. nº …2015… e Proc. nº …2015…], tendo a requerente pago a quantia exequenda e legais acréscimos – exercícios de 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014 – no valor global (que inclui outras liquidações) de € 1.014.840,15 (um milhão catorze mil oitocentos e quarenta €uros e quinze cêntimos), pagamento que comprova pela cópia do documento que anexa e dá por reproduzido (Doc. nº 1).
Deste modo, na hipótese da procedência do pedido de pronúncia e declarando-se a anulação das liquidações impugnadas, amplia o pedido no sentido de a AT ser condenada a restituir à Requerente, o valor de € 524.584,23 (quinhentos e vinte e quatro mil quinhentos e oitenta e quatro €uros e vinte e três cêntimos) e legais acréscimos que esta pagou nos termos preditos, acrescido dos juros indemnizatórios contados desde a data do pagamento indevido, até ao efetivo e integral reembolso, como decorre da interpretação conjugada dos artº. 43º, nº 1, da L.G.T., artº. 61º do C.P.P.T. e artº 24º, nº 5, do R.J.A.T.
Notificada para se pronunciar sobre esta ampliação do pedido, a Requerente nada disse.
Tudo visto.
A ampliação do pedido formulada é obviamente uma consequência do pedido primitivo, e, como tal, admissível atento o estabelecido no artº. 24º do R.J.A.T. e no artº. 265º, nº 2, do C.P.C., aplicável ex-vi artº. 29º, nº 1, al. e), do RJ.A.T.].
Admite-se assim a requerida ampliação do pedido nos termos formulados pela Requerente sem prejuízo da apreciação dos fundamentos (ou ausência deles) relativamente ao pedido de juros indemnizatórios, matéria que se analisará e decidirá infra.
II – Fundamentação (cont)
O Direito
Perfunctoriamente deverá deixar-se assinalado que atenta a natureza impugnatória do processo arbitral tributário (cfr. artigo 2.º do RJAT e 99.º e 124.º do CPPT, aplicáveis ex vi do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea a), daquele), deve o Tribunal Arbitral socorrer-se do artigo 124.º do CPPT, com base na idêntica natureza dos meios impugnatórios.
Assim, por indicação legal, conhecer-se-á em primeiro lugar dos vícios aos quais a Requerente imputa a nulidade e, seguidamente, daqueles a que esta faz corresponder uma mera anulabilidade. Para definir quais os vícios de que se conhece prioritariamente na decisão, deve “(…) o tribunal atender à qualificação dos vícios feita pelo impugnante, isto é, dar prioridade à apreciação dos vícios que este qualifica como geradores de inexistência ou nulidade, pelo menos para apreciar se deve ou não ser lhes dada esta qualificação” - cfr. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, Vislis, Lisboa, vol. II, 2011, 6.ª edição, p. 327.
Por outro lado, sempre convirá deixar igualmente assinalado que os Tribunais (incluindo os arbitrais, naturalmente) não têm que apreciar todos os argumentos formulados pelas partes – é o que tem sido repetidamente afirmado pela Jurisprudência desde há muito (Cfr., inter alia, Ac do Pleno da 2ª Secção do STA, de 7 Jun 95, rec 5239, in DR – Apêndice de 31 de Março de 97, pgs. 36-40 e Ac STA – 2ª Séc – de 23 Abr 97, DR/AP de 9 Out 97, p. 1094.
Passemos então à análise das questões elencadas, seguindo a sobredita ordem ou metodologia, ou seja:
1ª Se consubstancia nulidade insanável a omissão da referência da norma ao abrigo da qual emerge a subdelegação de competências da Chefe de Divisão que sanciona o relatório de inspeção tributária (artigo 39º-12, do CPPT);
2ª Se foi ou deve considerar-se validamente exercida pela Requerente, mediante a declaração de alterações de atividade apresentada em 1-3-2010, a opção pela renúncia à isenção prevista no artigo 12º-1/b), do CIVA;
3ª Se o deferimento do pedido de reembolso de IVA relativo ao 1º trimestre de 2010 implicou a aceitação pela AT do enquadramento da Requerente no regime de renúncia à isenção de IVA prevista no artigo 12º-1/b), do CIVA;
4ª Se a não aceitação de tal enquadramento viola, no caso, os princípios constitucionais da confiança, justiça e segurança jurídica;
5ª Se a Requerente reúne (ou reunia em 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014) os requisitos substantivos necessários para o exercício do direito de renúncia nos termos do artigo 12º-1/b), do CIVA e, designadamente, se não era uma instituição privada integrada no sistema nacional de saúde e
6ª Se são devidos pela AT juros indemnizatórios
Vejamos então
1ª Se consubstancia nulidade insanável a omissão da referência da norma ao abrigo da qual emerge a subdelegação de competências da Chefe de Divisão que sanciona o relatório de inspeção tributária (artigo 39º-12, do CPPT)
A petição arbitral não explicita em termos totalmente claros qual o ato que deve ser considerado ferido de nulidade insanável, ou seja, se é a notificação ou se é o relatório de inspeção, e que consequências é que tal nulidade teria provocado na legalidade das liquidações impugnadas.
Com efeito, enquanto que nalguns artigos da petição a nulidade é atribuída quer à notificação quer ao relatório de inspeção, no artigo 25.º a requerente termina a arguir o “vício da nulidade”, por violação da lei, parecendo que atribui esse vício à notificação ao invocar o n.º 12 do artigo 39.º do CPPT.
Por outro lado, a requerente nas conclusões da petição e no pedido final não torna a referir o dito vício nem indica em que medida o mesmo afeta as liquidações impugnadas e em que norma se apoiaria para que tal omissão determinasse a anulação dessas liquidações.
É certo que a norma invocada (n.º 12 do artigo 39.º do CPPT) prevê a nulidade da notificação quando a mesma omite a indicação do autor do ato e, “no caso de este o ter praticado no uso de delegação ou subdelegação de competências, da qualidade em que decidiu, do seu sentido e da sua data”.
Ora, esta nulidade afeta efetivamente o ato da notificação a qual se deverá ter por inexistente e destituída da produção de efeitos. Esses efeitos poderiam, por exemplo, situar-se ao nível da data do termo da inspeção, com repercussão na caducidade do imposto, ou até na fundamentação das liquidações se persistisse a omissão dos dados que a lei obriga a comunicar.
Porém, uma vez que a destinatária teve acesso aos dados omitidos, deixa de haver fundamento para invocar a nulidade ou inexistência da notificação, do relatório de inspeção e muito menos das liquidações lançadas com base no mesmo relatório.
Isto sem deixar de considerar que, ao contrário do invocado pela requerente, a citada norma do CPPT não faz depender a validade da notificação da indicação do Diário da República em que foi publicado o despacho de delegação ou subdelegação de competências.
Por outro lado, como a própria requerente afirma, o relatório de inspeção é um ato preparatório das liquidações e, ainda que a lei determine a sua comunicação aos contribuintes destinatários das ações de inspeção, passando a constituir a fundamentação das liquidações lançadas com base no dito relatório, a verdade é que o relatório só por si e no sentido referido não afeta diretamente os legítimos interesses desses mesmos contribuintes (não é ato lesivo) e por isso não é impugnável. Vista a situação nesta perspetiva, constatando-se que as omissões praticadas na notificação foram sanadas com a certidão emitida pelos serviços competentes da AT e não tendo sido invocado qualquer vício quanto à fundamentação das liquidações ou quanto à defesa da requerente, improcederia a nulidade invocada.
Mas a improcedência do invocado vício decorrente da não identificação da referência à legal publicação em Diário da República da subdelegação de poderes ao abrigo da qual a Diretora de Finanças Adjunta é a entidade competente para sancionar o Relatório de Inspeção resulta igualmente numa outra perspetiva de análise.
Com efeito, o número 12, do artigo 39.º do Código do Procedimento e Processo Tributário exige a menção, no caso do ato ter sido praticado no uso de delegação ou subdelegação de competência, “da qualidade em que decidiu, do seu sentido e da sua data”.
Não obstante se considerar que devia ser legalmente exigida a menção à identificação da publicação em Diário da República para que o contribuinte pudesse verificar e arguir uma eventual incompetência do autor do ato não parece que esta concreta exigência possa ser retirada da norma.
A redação do número 12, do artigo 39.º do Código do Procedimento e Processo Tributário não é feliz e tem sido interpretada como exigindo apenas a menção do ato ter sido praticado ao abrigo de uma delegação de poderes.
Neste pressuposto não será de exigir nem a menção da data da delegação, nem a identificação do Diário da República em que foi publicado o despacho de delegação ou subdelegação, conforme sustenta Jorge Lopes de Sousa no seu Código de Procedimento e Processo Tributário, Anotado e Comentado, III Volume, Áreas Editora, 6ª edição, 2011, pág. 344 (607).
Ou seja e em conclusão nesta parte: analisada a questão em qualquer destas perspetivas a improcedência do vício invocado é evidente.
2ª Se foi ou deve considerar-se validamente exercida pela Requerente, mediante a declaração de alterações de atividade apresentada em 1-3-2010, a opção pela renúncia à isenção prevista no artigo 12º-1/b), do CIVA
Decorre dos elementos do processo que a Requerente, vista na perspetiva geral do seu enquadramento em sede de IVA, exerce (ou exercia nos sobreditos anos) mais do que uma atividade económica sendo que algumas das suas operações estavam sujeitas às regras gerais de tributação do IVA, conferindo assim direito à dedução do imposto suportado a montante, em conjunto com outras com maior peso na sua estrutura produtiva que, estando isentas, para que o direito à dedução fosse reconhecido implicavam a renúncia à isenção e a efetiva liquidação do imposto a jusante.
Esta diversidade de operações e regimes coloca, desde logo, problemas quanto à liquidação do imposto pelas operações a jusante, mormente quanto à questão de saber quais as operações sobre as quais o IVA deve incidir, independentemente de qualquer outro requisito ou formalidade, e quais as operações que à partida estão isentas de imposto e que só deixarão de o estar por opção do próprio sujeito passivo, que para exercer essa opção está sujeito a determinadas exigências de natureza material e formal.
Quanto ao IVA suportado a montante, haverá que determinar se e em que medida esse imposto é dedutível e não sendo totalmente dedutível qual o método para calcular esse imposto, entre o método da afetação real e o denominado método do pro rata de dedução.
Por outro lado, a situação em apreço coloca ainda outra questão qual seja a de nem sempre as atividades isentas poderem ser objeto de renúncia à isenção, nuns casos por razões conexas com a natureza do sujeito passivo e noutros porque a própria atividade não reúne as condições para a renúncia, obrigando assim o operador em causa a manter a isenção impedindo-o de deduzir o imposto suportado na aquisição de bens e serviços utilizados nessa atividade.
Quer o enquadramento dos sujeitos passivos de IVA quer o apuramento do imposto dedutível, mormente dos sujeitos passivos mistos, passa por requisitos de natureza declarativa e contabilística que terão que ser cumpridos sob pena de se limitar ou mesmo impedir o referido direito.
Ou seja, a terminar esta abordagem geral inicial, poderemos dizer que estamos perante questões centrais da estrutura tributária do imposto sobre o valor acrescentado, mormente as que têm a ver com a incidência e com o direito à dedução cujas normas estão previstas nos artigos 19.º e 20.º do CIVA.
Trata-se de normas de âmbito muito preciso, regra geral conexas com elementos essenciais do imposto, não sendo possível ao intérprete resolver as questões que se lhe colocam através da invocação de princípios, de doutrinas e de teorias que podem ser muito bem construídas e pertinentes mas que, só por si, não são aptos para encontrar o resultado interpretativo conforme com a lei que em concreto se está a aplicar.
Por outro lado, haverá que ter em conta que, com as normas sobre os elementos essenciais do imposto, andam associadas normas de natureza acessória e instrumental, igualmente da maior relevância, mas que não podem ser erigidas em requisitos absolutos e irreversíveis aos quais devem ceder todas as demais regras da tributação.
A esta luz, a invocada dedução indevida de € 480.244,86 decorre resumidamente das seguintes razões:
Em primeiro lugar, segundo o relatório de inspeção e a resposta da requerida, a Requerente não preenchia os requisitos para renunciar à isenção nas duas atividades originariamente isentas de IVA, a saber, os serviços médicos que prestava e a atividade imobiliária que praticava.
Quanto às operações de natureza imobiliária efetuadas pela Requerente isentas ao abrigo do n.º 29 do artigo 9.º e em relação às quais está prevista a renúncia à isenção no n.º 4 do artigo 12.º do CIVA em conjugação com o Decreto-Lei n.º 21/2007, de 29/1, afirma o relatório de inspeção que a Requerente, além de não ter preenchido os campos adequados na declaração de alterações, também não o poderia fazer dado que não preenchia os requisitos previstos no citado diploma para poder renunciar à isenção, mais acrescentando a requerida que a Requerente não liquidou imposto nessas operações.
Ora os autos não apresentam dados que permitam concluir se a Requerente poderia ou não renunciar à isenção em causa e, por outro lado, uma vez que a Requerente não faz qualquer demonstração que preenchia os requisitos para tal renúncia ou que tivesse cumprido os formalismos previstos no mesmo diploma para esse efeito, o tribunal abstém-se de se pronunciar sobre essa questão que, de resto, não é relevante para a economia da presente decisão arbitral.
O principal fundamento apresentado pela requerida para proceder ao lançamento das liquidações impugnadas é o facto de a Requerente não ter renunciado adequadamente à isenção, quer quanto às operações de serviços médicos, quer quanto às operações de locação de imóveis, em termos de lhe permitir deduzir o IVA suportado a montante.
Sendo diferente a situação referente aos serviços médicos e a referente às operações sobre imóveis, como veremos infra, a verdade é que analisando as ditas declarações (vd. anexos 01 e 02 ao relatório de inspeção) constata-se que a Requerente apresentou em 27-02-85 a declaração de início de atividade declarando aí que praticava operações que conferem direito à dedução e operações isentas que não conferem esse direito, assinalando que iria utilizar o método da percentagem da dedução ou pro rata para calcular o imposto dedutível.
E assim terá feito ao longo dos anos até 2010.
Em 01.03.2010 a Requerente apresentou uma declaração de alterações, em que assinalou no quadro 11 que passaria a “efetuar a dedução do imposto suportado segundo a afetação real [cfr. artigo 23.º, n.º 2, do CIVA” (campo 3)] relativamente a “todos os bens e serviços utilizados” (campo 5).
Porém, a Requerente deixou em branco os quadros 12 e 13 que, na estrutura da declaração de alterações, estão reservados para que os sujeitos passivos assinalem a renúncia à isenção (no caso das operações sobre imóveis a renúncia tem outras exigências que aqui não são analisadas).
Por outro lado, a requerida assinala que a Requerente deduzia a totalidade do IVA que suportava nas aquisições de bens e serviços e que só liquidava imposto, à taxa reduzida de 6%, nas prestações de serviços médicos enquadrados pela isenção prevista no n.º 2 do artigo 9.º do CIVA, não liquidando imposto quanto às operações imobiliárias isentas ao abrigo do citado n.º 29 do mesmo artigo 9.º.
A Requerente invoca na petição inicial que o lapso omitido se limitou a não ter assinalado com uma “cruzinha” o campo 1 do quadro 13 da declaração de alterações (vd. artigo 157.º da p.i) mas que, no demais, adotou um comportamento declarativo inequívoco de cumprimento da opção pela tributação, comportando-se como sujeito passivo integral, no preenchimento das suas declarações periódicas de IVA desde a entrega da referida declaração de alterações, visto que liquidou IVA em todas as suas operações ativas e fazendo-o constar das suas faturas” (vd. artigos 158.º da p.i), entregando o imposto nos cofres do Estado (vd. artigo 159.º da p.i), como sujeito passivo integral (vd. artigo 160.º da p.i.), razão pela qual o seu direito à dedução não pode ser posto em causa exclusivamente pelo deficiente formalismo declarativo dessa opção (vd. artigo 161.º da p.i.).
Ora, não obstante estas afirmações e o reconhecimento do preenchimento defeituoso da declaração de alterações, a verdade é que a Requerente não demonstrou que tivesse renunciado à isenção prevista no n.º 29 do artigo 9.º do CIVA cujo formalismo vai muito para além do preenchimento dos quadros 12 e 13 da declaração de alterações uma vez que o Decreto-Lei N.º 21/2007, de 29 de Janeiro, veio impor diversos condicionalismos, de natureza substantiva e formal, para que essa renúncia se concretizasse.
Além disso, a Requerente também não apresentou qualquer prova de que tivesse liquidado imposto pelas operações dessa natureza que praticou, como infra se vai retomar.
Por seu lado, face ao relatório de inspeção e à resposta da requerida, a Requerente não preenchia os requisitos para renunciar à isenção nas duas atividades originariamente isentas de IVA, a saber, os serviços médicos que prestava e a atividade imobiliária que praticava.
A invocação da requerida de que a Requerente não poderia renunciar à isenção de IVA prevista no n.º 2 do artigo 9.º em conjugação com alínea b) do n.º 1 do artigo 12.º do CIVA, quanto aos serviços médicos, é manifestamente inconsistente pelas razões que passam a apresentar-se.
Com efeito, o relatório de inspeção limita-se a afirmar que a requerida não reunia as condições para renunciar à isenção e, na mesma linha, a resposta da requerida afirma que essa impossibilidade se justifica “atentos os acordos e convenções realizados pela requerente com diversos subsistemas públicos” (vd. artigo 110.º da resposta).
Nem num caso nem noutro se faz alusão ou demonstração sobre o tipo de acordos que foram celebrados, com que entidades, que tipo de serviços foram prestados, quais os montantes envolvidos, nada.
É a própria Requerente que, na sua petição inicial, informa que efetivamente foram celebrados acordos com diversos subsistemas de saúde, mormente com a I…, com os serviços de saúde da J…, da K…, e também com a M… .
A Requerente apresenta os números envolvidos nesses acordos, não contestados pela requerida, cuja faturação, nos anos a que se reportam as liquidações impugnadas, se situa entre 3% e 7% do seu volume total de faturação (vd. artigos 176.º e seguintes da p.i).
Será que estes acordos impedem a Requerente de renunciar à isenção?
A alínea b) do n.º 1 do artigo 12.º do CIVA determina que podem renunciar à isenção, optando pela aplicação do imposto às suas operações, os estabelecimentos hospitalares que não pertençam a pessoas coletivas de direito público ou que não sejam instituições privadas integradas no Sistema Nacional de Saúde. [podem renunciar à isenção “os estabelecimentos hospitalares, clínicas, dispensários e similares, não pertencentes a pessoas coletivas de direito público ou a instituições privadas integradas no sistema nacional de saúde, que efetuem prestações de serviços médicos e sanitários e operações com elas estreitamente conexas” (cf. alínea b), do número 1, do artigo 12º do Código do IVA].
A Administração Tributária entende que as entidades privadas que convencionem com o Estado Português a prestação de serviços médicos e sanitários elencados no número 2, do artigo 9.º do Código do IVA passam a integrar o “sistema nacional de saúde”, estando-lhes assim vedada a opção pela renúncia ao abrigo da já referida alínea b), do número 1, do artigo 12º do Código do IVA.
De acordo com alínea b), do número 1, do artigo 132.º da Diretiva 2006/112/CE do Conselho de 28 de novembro de 2006 relativa ao sistema comum de IVA são isentas as operações relacionadas com “a hospitalização e a assistência médica, e bem assim as operações com elas estreitamente relacionadas, asseguradas por organismos de direito público ou, em condições sociais análogas às que vigoram para estes últimos, por estabelecimentos hospitalares, centros de assistência médica e de diagnóstico e outros estabelecimentos da mesma natureza devidamente reconhecidos”.
São isentas nos termos desta disposição a hospitalização e a assistência médica, e bem assim as operações com elas estreitamente relacionadas, asseguradas em condições sociais análogas às que vigoram para os organismos de direito público por estabelecimentos hospitalares, centros de assistência médica e de diagnóstico e outros estabelecimentos da mesma natureza devidamente reconhecidos.
O Estado português foi no entanto autorizado ao abrigo dos artigo 377.º e 391.º da Diretiva a isentar as operações efetuadas por estabelecimentos hospitalares não abrangidos pela já acima citada isenção e, bem assim, a concederem aos sujeitos passivos a faculdade de optarem pela tributação. Tendo reconhecido o direito de renúncia aos estabelecimentos hospitalares, clínicas, dispensários e similares, pertencentes a instituições privadas não integradas no sistema nacional de saúde, que efetuem prestações de serviços médicos e sanitários e operações com elas estreitamente conexas, conforme resulta da já citada alínea b), do número 1, do artigo 12º do Código do IVA.
Acompanhando a posição adotada no Processo Arbitral n.º 278/2013-T o âmbito subjetivo da renúncia deve ser procurado na Diretiva IVA:
“(…) a renúncia à isenção só pode ter por objecto serviços de hospitalização e assistência médica efectuados por entidades de direito privado que não prestem tais serviços em condições sociais análogas às dos organismos públicos. É este o âmbito de liberdade delimitado pela Directiva IVA (cf. artigos 132.º, n.º 1, alínea b), 377.º e 391.º, em conjugação com o Anexo X).
É evidente que o legislador nacional podia ter aplicado simplesmente o regime de isenção a estas entidades que prestam os seus serviços em condições distintas das dos organismos públicos não lhes dando a possibilidade de optarem pela tributação das suas operações. Chegaríamos desta forma ao resultado materializado nas liquidações adicionais objecto desta acção arbitral e nada haveria a apontar-lhe. Porém, a partir do momento em que o legislador decidiu conceder-lhes (àquelas entidades) essa faculdade (de tributação), o âmbito subjectivo da renúncia não pode ser distinto daquele que está subtraído ao regime obrigatório de isenção, sob pena de violação do parâmetro da neutralidade. Existe uma liberdade de escolha de regime (isenção com ou sem eventual renúncia à isenção), mas não existe a liberdade de conformação do âmbito subjectivo dessa escolha.
Ou seja: todas as entidades que não prestem os seus serviços em condições sociais análogas às dos organismos públicos, e que o legislador português optou por isentar, (pelo regime-regra da Directiva IVA seriam tributadas) devem poder beneficiar da faculdade de tributarem as suas operações, se o legislador em simultâneo decidir instituir a faculdade de renúncia à isenção (como sucedeu no caso português). (Sublinhado nosso).
Neste mesmo sentido Rita de La Feria sustenta que “só não estarão sujeitas a imposto as transações expressamente isentas pela Diretiva do IVA, incluindo aquelas listadas na alínea a) do artigo 132.º Como tal, a não existir o artigo 377.º da mesma Diretiva, todos os serviços médicos que não coubessem na alínea b) do n.º 1 do artigo 132.º - i.e. que não fossem prestados por organismos de direito público ou organismos em condições sociais análogas às que vigoram nos organismos de direito público – estariam em princípio sujeitas a imposto. A possibilidade de renúncia à isenção dada pelo artigo 391.º da Diretiva do IVA, e adotada pelo legislador português no artigo 12.º, n.º 1, alínea b) do Código do IVA, restabelece assim o sistema originariamente concebido pelo legislador europeu – aquele que existiria à partida caso Portugal não tivesse obtido a derrogação que lhe permite estender o âmbito de aplicação da isenção relativa aos serviços médicos. Esta é claramente a ratio legis do artigo 391.º da Diretiva do IVA.” (in O IVA no Setor da Saúde – Análise Crítica – Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal, Ano VIII 1, pág. 54).
Neste pressuposto, a possibilidade da Requerente renunciar no caso vertente à isenção depende da resposta à questão se presta os seus serviços em condições sociais análogas às dos serviços públicos. E a resposta a esta questão parece ser negativa.
Com efeito – e mais uma vez recorrendo à já citada decisão arbitral - “embora não existam decisões jurisprudenciais do TJUE que versem especificamente sobre a questão de saber quando é que um estabelecimento hospitalar privado efectua prestações em condições sociais análogas às que vigoram para os “organismos de direito público” o Tribunal Europeu tem-se pronunciado em diversas ocasiões (8) sobre os requisitos que se devem verificar para que uma entidade privada possa ser considerada como “outro estabelecimento da mesma natureza [a estabelecimentos hospitalares, centros de assistência médica e de diagnóstico] devidamente reconhecido” praticando condições análogas às impostas às pessoas colectivas de direito público, para efeitos do artigo 132.º, n.º 1, alínea b) da Directiva IVA e consequente aplicação do regime de isenção.
O TJUE tem afirmado reiterada e consistentemente:
“A este respeito, para determinar os estabelecimentos que devem ser «reconhecidos» na acepção da referida disposição, cabe às autoridades nacionais, em conformidade com o direito da União e sob a fiscalização dos órgãos jurisdicionais nacionais, tomar em consideração vários elementos, entre os quais figuram o carácter de interesse geral das actividades do sujeito passivo em causa, o facto de outros sujeitos passivos que têm as mesmas actividades beneficiarem já de um reconhecimento semelhante, bem como o facto de os custos das prestações em questão serem eventualmente assumidos em grande parte por caixas de seguro de doença ou por outros organismos de segurança social (v., neste sentido, acórdãos, já referidos, Kügler, n.ºs 57 e 58; Dornier, n.ºs 72 e 73; e L.u.P., n.º 53)” – cf. Acórdão de 10 de Junho de 2010, C-262/08, CopyGene, ponto 65.
O Acórdão Ines Zimmermann (C-174/11) vai mais longe nesta concretização ao confirmar que uma actividade que é em cerca de dois terços assumida por organismos de segurança social constitui “um elemento que pode ser tomado em consideração para determinar os organismos cujo «carácter social», na acepção do artigo 13.°, A, n.° 1, alínea g), da Sexta Directiva [actual 132.º, n.º 1, b da Directiva IVA], deve ser reconhecido para efeitos desta disposição” (cf. ponto 35 do Acórdão).” (cf. Decisão proferida no Processo Arbitral n.º 278/2013-T, in Inforfisco).
Ora, no caso dos autos, a percentagem de operações realizadas pela Requerente ao abrigo das convenções celebradas com o Estado foi de 5,32% em 2011, 6,17% em 2012, 6,87% sobre 2013, 3,69% em 2014 (cf. Declaração emitida por S… na qualidade de Técnico Oficial de Contas da sociedade “A…” – junta com o pedido de pronúncia arbitral).
Em face deste indício conclui-se que a Requerente não exerce a sua atividade em condições sociais análogas às dos organismos públicos, pelo que podia renunciar à isenção nos termos da alínea b), do número 1, do artigo 12º do Código do IVA.
Mas outra argumentação se pode aduzir para chegar a idêntica conclusão
Assim e remetendo diretamente para o processo arbitral n.º 629/2014-T, a requerida conclui que a Requerente tinha celebrado contratos com entidades públicas, e que por isso se deveria considerar integrada no sistema nacional de saúde estando assim legalmente impossibilitada de renunciar à dita isenção.
Uma vez que a Requerente informa que efetivamente foram celebrados alguns acordos, nomeadamente com a I… e com a K… e J…, vejamos se poderia, em qualquer circunstância, ser considerada uma entidade integrada no sistema nacional de saúde (SNS), como pretende a requerida.
A I…, tal como o sistema específico da K… e da J…, são subsistemas de saúde aplicáveis a servidores do Estado com especificidades diversas do Sistema Nacional de Saúde quanto ao regime jurídico, quanto à modalidade e quanto às condições de acesso pelos seus beneficiários.
Atentemos resumidamente nos regimes jurídicos dos dois sistemas de saúde.
A I…, muito anterior ao SNS, foi criada pelo Decreto-Lei n.º 45002, de 27 de Abril de 1963, como sistema de proteção na saúde dos trabalhadores da administração pública, enquanto que o SNS foi criado pela Lei 56/79,de 15 de Setembro, para dar concretização ao objetivo constitucional de prestar cuidados de saúde gratuitos a todos os portugueses em função da sua necessidade.
Sem que se proceda aqui à análise exaustiva da evolução sofrida pela I… ao longo das décadas que já tem, citamos a título de exemplo, o DL 476/80, de 15 de Outubro, que veio transformar a I… na Direcção Geral de Proteção Social dos Funcionários e Agentes da Administração Pública que passou a constituir um serviço dotado de autonomia administrativa na direta dependência do Ministro das Finanças e que se destinava a assegurar a proteção aos seus utentes/beneficiários nos domínios da proteção da saúde e prevenção da doença.
Esta estrutura e objetivos mantiveram-se em reformas posteriores (vd., entre outros, DL 118/83, de 25/2, alterado pelo DL 279/99, de 26 de Julho e DL 90/98, de 14 de Abril).
Em 2015, através do DL 152/2015, de 7/8 e do DL 154/2015, da mesma data, foi determinada uma maior articulação entre vários subsistemas públicos de saúde, entre os quais a I…, entre si e com o SNS.
Entre essas medidas esteve a passagem da dependência da Direção Geral da I… do Ministério das Finanças para o Ministério da Saúde.
Entretanto, o DL 234/2005, de 30/12, veio dar alguns passos no sentido da convergência de diversos subsistemas de saúde públicos, como os subsistemas da área da defesa (Forças Armadas), da administração interna (K…,J…) e da justiça com a I…, alargando o âmbito de intervenção deste serviço de assistência médica.
Assim, cada vez mais a I… assume a natureza de serviço de saúde da generalidade dos funcionários e agentes do Estado central e local e, por outro lado, reforça a sua autonomia administrativa e financeira face ao SNS.
Com efeito, quanto a esta ultima vertente é do conhecimento público o reforço das receitas próprias da I… e a sua não dependência do orçamento do Estado e dos dinheiros públicos (vd. por exemplo Lei n.º 30/2014, de 19 de Maio, que fixou o desconto para a I… em 3,50% da remuneração ou da pensão mensal dos seus beneficiários), enquanto que o SNS está quase totalmente dependente do orçamento de Estado.
Com efeito o SNS é universal e é tendencialmente gratuito (vd. Base XXIV da Lei 48/90, de 24 de Agosto).
Por outro lado, o SNS está organizado em Regiões de Saúde cada uma delas gerida por uma administração regional de saúde (ARS) (vd. artigos 3.º e seguintes dos Estatutos do Serviço Nacional de Saúde aprovado pelo Decreto-Lei n.º 11/93, de 15 de Janeiro).
Ora, são as ARS que podem celebrar contratos ou convenções com pessoas coletivas privadas que sejam titulares de casas de saúde, clínicas, e outras unidades de saúde, as quais passam assim a integrar-se na rede nacional de prestação de cuidados de saúde, ficando sujeitas a determinadas obrigações entre as quais cumprir as orientações das ARS (vd. artigos 35.º e seguintes dos Estatutos do Serviço Nacional de Saúde acima citados).
Os contratos referidos no acórdão do CAAD proferido no processo 629/2014-T, citado na resposta da requerida para sustentar que a Requerente não poderia renunciar à isenção prevista no n.º 2 do artigo 9.º do CIVA, são manifestamente diferentes daqueles que ligam a Requerente com a I… e com os subsistemas de saúde da K… e da J… .
É que, no caso do acórdão do CAAD, os únicos contratos aí referidos foram os celebrados entre uma instituição privada e uma administração regional de saúde (ARS do…).
No caso da Requerente, foram celebrados acordos com entidades que, como demonstrado, não se integram no SNS, e quanto aos que foram celebrados com a ARS…, face aos dados fornecidos pela própria Requerente e que a requerida não contestou, no ano de 2011 esses contratos envolveram a quantia residual de € 1630,00 (numa faturação global superior a dois milhões e duzentos mil euros), em 2012 e 2103 a faturação foi de cerca de 1% da faturação global e em 2014 não foi indicado qualquer valor.
Ora, determinando o n.º 2 do artigo 9.º do CIVA que estão abrangidos pela isenção os “estabelecimentos hospitalares, clinicas, dispensários e similares” haverá que saber quais os estabelecimentos hospitalares qualificados como “instituições privadas integradas no sistema nacional de saúde” que, face à alínea b) do n.º 1 do artigo 12.º do mesmo Código, estão impedidos de renunciar à isenção.
Esta norma, cuja redação se mantém desde o início da publicação do Código do IVA, tem a sua fonte a alínea b) do n.º 1 do artigo 13.º-A da 6.ª Diretiva [atualmente Diretiva 2006/112/CE, alínea b) do n.º 1 do seu artigo 132.º] que prevê que são abrangidos pela isenção “A hospitalização e a assistência médica, e bem assim as operações com elas estreitamente relacionadas, asseguradas por organismos de direito público ou, em condições sociais análogas às que vigoram para estes últimos, por estabelecimentos hospitalares, centros de assistência médica e de diagnóstico e outros estabelecimentos da mesma natureza devidamente reconhecidos”.
Assim, não pode dizer-se que a ora Requerente, face à diminuta prestação de serviços médicos que desenvolve no âmbito do sistema nacional de saúde, esteja a agir no âmbito da assistência médica em condições sociais análogas às que vigoram para os organismos que integram o dito sistema nacional de saúde.
A componente assistencial que caracteriza o serviço nacional de saúde não é compaginável com a I… nem com os demais subsistemas de saúde dos funcionários e agentes da função pública.
Ora, a Requerente nunca poderá ser qualificada como um estabelecimento assistencial por ter um protocolo com o SNS em que menos de 1% dos seus serviços médicos são prestados nessa modalidade.
Nestes termos, sem necessidade de mais considerações, até porque a requerida não apresentou qualquer demonstração para sustentar a sua afirmação de que a Requerente não reunia os requisitos subjetivos para renunciar à isenção, diremos que os contratos celebrados com a I… e com os serviços sociais e de saúde da K… e da J…, que não são sistemas de saúde integrados no SNS, e apenas residualmente celebrou contratos com um serviço do SNS, não permitem considerar que a Requerente integra o Serviço Nacional de Saúde no sentido de estar impedida de renunciar à isenção de IVA prevista no n.º 2 do artigo 9.º em conjugação com a alínea b) do n.º 1 do artigo 12.º do CIVA, improcedendo assim esta limitação invocada pela Requerente.
Quanto às operações de natureza imobiliária a situação já é diferente.
Na verdade, como supra já referido, a renúncia às operações isentas ao abrigo do n.º 29 do artigo 9.º envolve o cumprimento do disposto no n.º 4 do artigo 12.º do CIVA em conjugação com o Decreto-Lei n.º 21/2007, de 29/1.
Ora, a Requerente além de não ter preenchido os campos adequados na declaração de alterações, segundo a requerida também não o poderia fazer dado que não preenchia os requisitos previstos no citado diploma para poder renunciar à isenção, afirmando igualmente que a Requerente não liquidou imposto nessas operações, facto que a Requerente não contrariou demonstrando o contrário.
Os autos não apresentam dados que permitam concluir se a Requerente poderia ou não renunciar à isenção em causa e, por outro lado, uma vez que a Requerente não faz qualquer demonstração que preenchia os requisitos para tal renúncia ou que tivesse cumprido os formalismos previstos no mesmo diploma para esse efeito, o tribunal abstém-se de se pronunciar sobre essa questão que, de resto, não é relevante para a economia da presente decisão arbitral.
Voltando novamente à questão da renúncia à isenção prevista no n.º 2 do artigo 9.º do CIVA a qual não foi adequadamente formalizada na declaração de alterações apresentada em 1 de Março de 2010 cumpre ver se o erro praticado na declaração não poderá ser considerado desculpável e se o mesmo impedirá só por si o reconhecimento do direito à dedução do imposto suportado na aquisição de bens e serviços afetos a operações que, estando isentas ao abrigo da citada disposição, foram ainda assim objeto de tributação no sentido em que a Requerente procedeu à liquidação do imposto e à sua entrega nos termos gerais como se se tratasse de uma atividade tributada.
Com efeito, embora formalmente não tenha preenchido os campos da declaração em causa, a verdade é que, conforme se dá conta no relatório, nos quatro anos abrangidos pela inspeção a Requerente procedeu ao apuramento do imposto (salvo quanto às prestações de serviços referentes à locação de bens imóveis, repete-se) e à entrega das declarações periódicas de IVA conforme previsto na alínea c) do artigo 29.º do CIVA dentro do prazo legal previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 41.º do CIVA.
Assim, no período temporal em causa, a Requerente liquidou e evidenciou nas suas declarações periódicas o imposto à taxa reduzida de 6% relativamente à prática das operações previstas no n.º 2 do artigo 9.º do CIVA, ou seja sobre as prestações de serviços médicos (vd. III.1.3.2 do relatório de inspeção), tendo, pois, liquidado a favor do Estado, à taxa reduzida que aplicou aos ditos serviços médicos, o montante total de IVA de € 474.762,25, decorrente dos seguintes montantes parcelares (vd. III.1.2.2 e anexo 03 do relatório de inspeção):
Ano de 2011 – € 144.621,53
Ano de 2012 – € 152.064,62
Ano de 2013 – € 150.220,06
Ano de 2014 – € 27.856,04
Por outro lado, não obstante se alegar no relatório de inspeção que não foi possível a utilização do método da afetação real, a verdade é que o relatório dá conta que procedeu à “imputação direta dos bens e serviços utilizados exclusivamente na prática das operações isentas da alínea 2 do artigo 9.º do CIVA” (vd. página 18 do relatório e seus anexos 14, 15, 16 e 17),tendo sido apurado o imposto indevidamente deduzido que “incidiu sobre bens e serviços adquiridos, utilizados pelo s.p. para a realização de transmissões de bens e prestações de serviços isentas que não conferem direito à dedução, nos montantes globais de € 60.379,30, € 56.930,74, € 65.711,67 e € 18.490,14, respetivamente para cada um dos períodos anuais de 2011, 2012, 2013, Jan. e Fev.de 2014”.
Temos assim, face aos próprios termos do relatório de inspeção, que Requerente e requerida se comportaram como se a renúncia tivesse sido adequadamente formalizada, uma (a ora Requerente) liquidando e declarando o imposto por operações isentas como se tivesse havido renúncia e deduzindo o imposto a montante, e outra aceitando as declarações periódicas – e certamente as declarações anuais facto de que nem Requerente nem requerida dão conta – e recebendo o respetivo imposto como se se tratasse de um contribuinte enquadrado nas regras gerais do imposto.
E este comportamento mútuo aconteceu pelo menos durante quatro anos (2010 a 2014) os quais a requerida descobre que afinal havia uma declaração que não tinha levado umas “cruzes” e que por isso teria que haver uma correção retroativa da sua situação tributária.
Vai assim este Tribunal conceder provimento parcial ao pedido de anulação do imposto liquidado [no montante de € 201.511, 85, resultante da soma dos quantitativos parciais referentes aos anos de 2011, 2012, 2013 e 2014, respetivamente, de € 60.379,30, € 56.930,74, € 65.711,67 e € 18.490,14] não só pelo exposto como também pelas razões que se seguem.
Em primeiro lugar porque o regime de enquadramento da Requerente anterior à declaração de alterações apresentada em 1 de Março de 2010 levaram o sujeito passivo a agir em relação a estas operações como operações tributáveis.
Em segundo lugar e principalmente porque a Requerente liquidou efetivamente imposto e entregou-o nos cofres do Estado. Ora, ao negar o direito à dedução do imposto suportado a montante, obrigando à sua devolução, quando o sujeito passivo liquidou e entregou nos cofres do Estado o imposto referente às operações a que afetou os referidos bens e serviços, levaria o Estado a locupletar-se com quantias que violam os princípios da legalidade e da capacidade contributiva e a própria neutralidade do imposto sobre o valor acrescentado.
O relatório mostra que a Requerente facultou à inspeção tributária os dados referentes ao imposto liquidado pelos serviços médicos que prestou e também o imposto que suportou a montante para afetar às ditas prestações de serviços.
Só assim se compreende a clareza dos números apresentados no dito relatório.
É certo que a Requerente não preencheu os quadros 12 e 13 da declaração de alterações que formalmente a habilitariam a liquidar o imposto nesses serviços. Porém, não tendo cumprido esta formalidade a verdade é que, como supra se demonstra, procedeu à liquidação do imposto a favor do Estado como se tivesse operado o preenchimento do dito quadrado.
A Requerente invocou o deferimento do reembolso referente ao primeiro trimestre de 2010.
Esse deferimento não poderá ser decisivo até porque se referiu a períodos de imposto anteriores à apresentação da declaração de alterações. Porém esse deferimento não deixa de provar que antes da declaração de alterações a Requerente liquidava imposto pelas referidas prestações de serviços médicos e, por outro lado, a documentação referente à aprovação do reembolso mostra que a AT considerava que a Requerente tinha renunciado à isenção em que estava enquadrada relativamente aos serviços previstos no n.º 2 do artigo 9.º do CIVA (vd. parecer da inspeção tributária datado de 2010-08-30 sobre o pedido de reembolso referente ao período 20103T).
Ora, se a AT considerava que a Requerente tinha de facto renunciado à isenção em relação aos serviços médicos, se independentemente de tal renúncia recebia as declarações que a mesma entregava mensalmente com entrega de IVA ao Estado, não se entende que tenha passado 4 anos com esta atuação e que só depois desse tempo venha averiguar a situação e considerar que afinal a renúncia não estava formalmente declarada, que todo o imposto deduzido teria que ser devolvido e que todo o imposto entregue, ainda que indevidamente entregue, teria que se manter nos cofres do Estado.
A conclusão é a de que o erro declarativo cometido foi desculpabilizado pela própria AT comportando-se quer a AT quer a Requerente como se tal erro não tivesse existido.
3ª Se o deferimento do pedido de reembolso de IVA relativo ao 1º trimestre de 2010 implicou a aceitação pela AT do enquadramento da Requerente no regime de renúncia à isenção de IVA prevista no artigo 12º-1/b), do CIVA
A renúncia à isenção de IVA em apreciação implica a apresentação pelo contribuinte de uma declaração de início de atividade ou de alterações, como resulta do número 2, do citado artigo 12º, do CIVA.
“O facto de no n.º 2, do artigo 12.º do CIVA se impor, explicitamente, um modo declarativo para a renúncia à isenção do IVA, através da declaração de início ou da declaração de alterações, não reveste a natureza de mero “formalismo declarativo”. Efetivamente, com a renúncia à isenção, o sujeito passivo passa a ter o direito à dedução do IVA, que é uma das principais características deste imposto, pelo que para que a renúncia possa, por um lado ser conhecida e reconhecida pela Autoridade Tributária e Aduaneira, e, por outro, para que se possa determinar o período de permanência obrigatório no regime geral do IVA, é condição essencial à renúncia à isenção do IVA a forma prevista na lei, ou seja a opção expressa pelo sujeito passivo de que foi exercido o direito de opção pela tributação, na declaração de início ou de alterações. Em face do que acima se disse, a renúncia à isenção possibilitada pelo n.º 1 do artigo 12.º do CIVA, em circunstâncias alguma é suscetível de ser presumida, pelo que se o sujeito não apresentar o pedido de renúncia na declaração de início ou de alterações, considera-se que está submetido ao regime de isenção de IVA por se este o seu regime originário” (cf. PALMA, Clotilde Celorico e SANTOS, António Carlos dos – Código do IVA e RITI – Notas e Comentários, Almedina, 2014, pág. 164)
A renúncia só produz, assim, efeitos a partir da apresentação da referida declaração e não se presume.
Neste sentido, ainda o Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul de acordo com o qual “a renúncia à isenção, possibilitada pelo art. 12.º n.º 1 CIVA, em circunstância alguma é susceptível de ser presumida, pelo que, se o sujeito passivo não apresenta pedido/declaração de renúncia, tem de ser considerado submetido ao regime de isenção, por, originariamente, o seu próprio.” (cf. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido no Processo n.º 5235/11 e, ainda, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no Processo n.º 020940, de 30-06-1999, in www.dgsi.pt).
No caso vertente, o sujeito passivo apresentou uma declaração de alterações para efetuar a renúncia à isenção do IVA, que preencheu erradamente. Essa intenção não decorre da própria declaração mas do comportamento da Requerente após a apresentação da declaração, consubstanciado na liquidação do IVA.
Como avançado, a renúncia à isenção de IVA não se presume e, efetivamente, no caso vertente, a renúncia não se concretizou com a apresentação da declaração de IVA. Ora, a renúncia não se presume para que possa ser conhecida e reconhecida pela Administração Tributária, e, por outro, para que se possa determinar o período de permanência obrigatório no regime geral do IVA.
A questão que se coloca prende-se, então, em saber se a circunstância de no pedido reembolso surgir, expressamente, a menção que “o sujeito passivo em 2010-03-01 renunciou à isenção de IVA em que estava enquadrado (art.º 9.º, n.º 2)”, conforme “Detalhe de Pedido de Reembolso de IVA”, junto com o pedido de pronúncia arbitral, conduz à alteração do enquadramento da Requerente em sede de IVA ou cria legítimas expetativas suscetíveis de determinarem a anulação dos atos tributários cuja legalidade se contesta.
Exigindo-se nos termos da lei uma ato expresso de renúncia, que não se verificou, não se pode entender que a mera menção no referido Detalhe de Pedido de Reembolso de IVA possa determinar uma alteração no enquadramento da Requerente em IVA.
Resta, portanto, analisar se as expetativas criadas são suscetíveis de determinar a anulação
dos atos contestados, conforme sustentado pela Requerente.
Determina o número 2, do artigo 266.º da Constituição da República Portuguesa que “ Os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei e devem atuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé.”.
Em concretização deste princípio, o artigo 66.º da Lei Geral Tributária impõe que a Administração Tributária exerça as suas atribuições na prossecução do interesse público, de acordo com os princípios da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da celeridade, no respeito pelas garantias dos contribuintes e demais obrigados tributários.
E, o “princípio da boa fé determina que a administração deve relacionar-se com os particulares de acordo com as regras da boa fé, ponderando os valores fundamentais do direito, designadamente, a confiança suscitada pela sua actuação e o objectivo a alcançar (artigo 6.-A do CPA), o qual encontra também reconhecimento na actual LGT nos seus artigos 59.º n.º 1 e 68.º (cf. CAMPOS, Diogo Leite de, RODRIGUES, Benjamin Silva, e SOUSA, Jorge Lopes de - Lei Geral Tributária Anotada e Comentada, Lisboa, 2012, pág. 449).
A violação pela Administração tributária dos deveres procedimentais de colaboração e de atuação segundo as regras da boa fé, pode consistir em vício autónomo de violação de lei. A relevância deste princípio não se esgota nos atos praticados no exercício de poderes discricionários, admitindo-se a sua aplicação em caso de actos praticados no exercício de poderes vinculados (cf. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no Processo n.º 0753/11, de 21-09-2011, in www.dgsi.pt). Desde logo, por se constatar que o texto do artigo 266.º da Constituição da República Portuguesa não deixa entrever qualquer restrição à sua aplicação a qualquer tipo de atividade administrativa. (cf. CAMPOS, Diogo Leite de, RODRIGUES, Benjamin Silva, e SOUSA, Jorge Lopes de - Lei Geral Tributária Anotada e Comentada, Lisboa, 2012, pág. 450).
Sucede, porém, que “no confronto entre os princípios da legalidade e da boa fé deve ser ponderada cada situação em concreto por forma a poder concluir-se se da prevalência do primeiro, em sentido estrito, resulta uma flagrante injustiça para o contribuinte, acarretando-lhe um desproporcionado e intolerável prejuízo. Só neste último caso, a violação do princípio da boa fé, na sua dimensão de proteção da confiança dos particulares e enquanto integrante do bloco de legalidade, em sentido lato, deve revestir efeitos invalidantes do acto tributário praticado.” (cf. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo proferido no Processo n.º 0699/08, em 28-01-2009, in www.dgsi.pt).
A tutela da confiança pressupõe a verificação cinco pressupostos que devem ser encarados de forma global no sentido de que a não verificação de um deles pode ser superada pela maior intensidade de outro ou por outras circunstâncias.
Os pressupostos a atender são, em suma, a atuação de um sujeito de direito que crie a confiança, quer na manutenção de uma situação jurídica, quer na adoção de outra conduta; uma situação de confiança justificada do destinatário da atuação de outrem que se traduz na convicção por parte do destinatário da atuação em causa na determinação do sujeito passivo que a adotou quanto à sua atuação subsequente e na presença de elementos concretos suscetíveis de legitimar essa convicção; a efetivação de um investimento de confiança, isto é, o desenvolvimento de acções ou omissões, que podem não ter tradução patrimonial, na base da situação de confiança; o nexo de causalidade entre a atuação geradora de confiança e a situação de confiança, por um lado e entre a situação de confiança e o investimento de confiança, por outro; e, por último a frustração da confiança por parte do sujeito jurídico que a criou (cf. SOUSA, Marcelo Rebelo de e MATOS, André Salgado de – Direito Administrativo Geral, Actividade Administrativa, Tomo I, 3.ª Edição, D. Quixote, pág. 222 a 224).
No caso vertente, são aparentemente identificáveis os pressupostos identificados: a atuação da Administração Tributária consubstanciada na constatação, expressa, por parte da Direção de Finanças de … de ter havido renúncia à isenção; a presença de elementos concretos que permitiram à Requerente atuar na convicção de ter uma renúncia válida e reconhecida pela Administração Tributária; a atuação continuada da Requerente no pressuposto de ter renunciado validamente ao IVA e a frustração de confiança na medida em que anos depois a mesma Administração tributária invoca a inexistência de uma renúncia válida e mesmo a impossibilidade da Requerente renunciar à isenção.
Porém, o nexo de causalidade não se verifica integralmente na medida em que, em momento anterior à emissão do Detalhe de Pedido de Reembolso de IVA, donde resulta, por parte da Administração Tributária, o reconhecimento expresso de ter havido renúncia (cf. as respetivas Observações), a Requerente atuava já na convicção de ter uma renúncia válida. Porém, toda a atuação posterior terá sido também determinada pelo reconhecimento por parte da Administração Tributária dessa mesma renúncia.
Em suma, a Requerente atuou, desde 2010, na convicção de estar perante uma renúncia válida, convicção esta que assentava na declaração por si apresentada mas também num elemento concreto - Detalhe de Pedido de Reembolso de IVA - que lhe permitia legitimamente pressupor que para os Serviços da Administração Tributária essa renúncia tinha sido, efetivamente, formalizada com a apresentação da declaração de alterações em 1 de março de 2010. Só com a notificação das Conclusões do Relatório de inspeção em finais de 2014 é que a Requerente teve conhecimento que efetivamente não renunciara, nos termos legais.
O regime de renúncia previsto no número 2, do artigo 12.º do Código do IVA ao não assentar na emissão de um certificado de renúncia (ao contrário do previsto para a renúncia relativa às operações de transmissão ou locação de bens imóveis) significa que os sujeitos passivos ficam numa situação de particular incerteza quanto ao seu efetivo enquadramento em IVA, quando se verifique, como no caso sub juditio, erros de preenchimento na declaração ou de interpretação da própria situação cadastral, sendo que no caso vertente o erro de interpretação em que terá incorrido a Requerente, incorreram também os serviços que apreciaram o pedido de reembolso, em 2010.
No caso vertente, o regime de liquidação e dedução de IVA que a Requerente adotou corresponde ao regime regra, regime a que a Requerente tinha acesso nos termos legais, como acima melhor desenvolvido, desde que tivesse renunciado validamente.
Deste modo, reunindo a Requerente os requisitos necessários ao exercício do direito de renúncia e, tendo atuado na convicção de existir uma renúncia formalmente válida, convicção essa confirmada pela atuação dos Serviços da Administração Tributária, as liquidações notificadas resultam numa flagrante injustiça para a Requerente.
Todavia, como até 2010 a Requerente aplicava o método pro rata de dedução de IVA e na declaração que apresentou então preencheu os campos 3 e 5 do quadro 11 declarando que passaria a aplicar o método de afetação real, não tendo no entanto organizado a sua contabilidade de forma a facultar a correta identificação e controlo das deduções respeitantes a cada uma das suas atividades (Cfr ponto III.1.3.2, do Relatório de inspeção) – factos que não foram postos em causa pela Requerente -, resulta daqui que, tal como decorre do relatório da inspeção, pode beneficiar do método pro rata de dedução.
Assim é que, utilizando a fórmula prevista no artigo 23º-4, do CIVA, a AT procedeu – e bem -, ao cálculo das percentagens de dedução referente a cada um os anos de 2011, 2012, 2013 e 2014, fixando-as em 8%, 4%, 6% e 4%, respetivamente (percentagens retiradas da contabilidade da Requerente), para concluir que o imposto (IVA) indevidamente deduzido para cada um dos anos indicados foi de €55.141,83, €93.820,36, €129.389,53 e €13.615,50.
A estes montantes foram abatidos os quantitativos de € 5.293,90, € 4.491,69, € 3.202,36 e € 246,26 de regularizações a favor do Estado levadas ao campo 41 das declarações periódicas do imposto, quantitativos que o relatório de inspeção reconhece que não deverão ser incluídos nas correções, sob pena de haver duplicação de imposto.
A esta correção a AT acresceu o montante de €9.009,04 em resultado da aplicação indevida de taxa reduzida (6%) quando a taxa legal era de 23% (tratava-se de nota de débito emitida em 31-102011 respeitante a custos de água e eletricidade na importância de €60.282,51).
Daqui irá resultar a improcedência parcial do pedido quanto ao montante de €287.742,05
4ª Se a não aceitação de tal enquadramento viola, no caso, os princípios constitucionais da confiança, justiça e segurança jurídica
A resposta a esta questão está prejudicada pela abordagem que foi feita na resposta à questão anterior.
5ª Se a Requerente reúne (ou reunia em 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014) os requisitos substantivos necessários para o exercício do direito de renúncia nos termos do artigo 12º-1/b), do CIVA e, designadamente, se não era uma instituição privada integrada no sistema nacional de saúde.
Relativamente à questão de saber se a Requerente reunia em 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014, os requisitos substantivos necessário para o exercício do direito de renúncia previsto no artigo 12º-1/b), do CIVA, já foi dada resposta expressa, anteriormente quando se concluiu que “(...) a Requerente não exerce (ou exercia naqueles anos) a sua atividade em condições sociais análogas às dos organismos públicos, pelo que podia renunciar à isenção nos termos da alínea b), do número 1, do artigo 12º do Código do IVA (...)”.
6ª A questão dos juros indemnizatórios
A Requerente pede o reembolso da importância de € 524.584,23, paga em 23-7-2015, em sede de execução das liquidações ora objeto desta impugnação arbitral.
De harmonia com o disposto na alínea b) do art. 24.º do RJAT a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exatos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, “restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os atos e operações necessários para o efeito”, o que está em sintonia com o preceituado no art. 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do art. 29.º do RJAT] que estabelece, que “a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do ato ou situação objecto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão”.
Embora o art. 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão “declaração de ilegalidade” para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que em processo de impugnação judicial são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira diretriz, que “o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária”.
O processo de impugnação judicial, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de atos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do art. 43.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que “são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido” e do art. 61.º, n.º 4 do CPPT (na redação dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, a que corresponde o n.º 2 na redação inicial), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».
Assim, o n.º 5 do art. 24.º do RJAT ao dizer que “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário” deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.
No caso, o pedido de juros indemnizatórios terá de improceder.
A razão fundamental da improcedência total do pedido de juros indemnizatórios tem a ver com a não verificação dos pressupostos previstos no invocado n.º 1 do artigo 43.º da LGT.
Com efeito, aí se prevê que os juros indemnizatórios são devidos quando se determine “que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido”.
Ora, no caso em apreço, não se pode concluir que foi por erro imputável aos serviços que se procedeu às liquidações adicionais impugnadas e que a Requerente efetuou o pagamento do respetivo imposto.
Com efeito, o que deu causa às liquidações adicionais impugnadas foi um erro cometido pelo Requerente – não pelos serviços tributários – a qual não preencheu a declaração de alterações em termos de formular adequadamente o direito de renunciar à isenção do IVA referente às atividades que integravam o seu objeto social.
Ora, se em relação ao IVA referente às prestações de serviços de saúde o erro da Requerente foi considerado desculpável para efeitos da presente decisão arbitral, na medida em que procedia à liquidação do imposto, à apresentação das declarações e ao pagamento do imposto devido, tendo-se assim considerado que houve uma renúncia “de facto” a que os serviços tributários deram a sua anuência, já quanto ao IVA deduzido em relação às operações imobiliárias, a Requerente, além de não ter preenchido adequadamente a declaração de alterações, não provou que reunia as condições para renunciar à isenção e não provou que exerceu adequadamente o direito a tal renúncia, tendo até deduzido o imposto suportado a montante sem ter liquidado imposto pelas operações a jusante.
Porém, não é o facto do erro da Requerente ter sido considerado desculpável em relação a uma parte das liquidações impugnadas que torna o erro imputável aos serviços tributários para efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 43.º da LGT.
No texto “juros nas relações tributárias”, da autoria de Jorge Lopes de Sousa (in “Problemas Fundamentais do Direito Tributário”, ano de 1999, Vislis Editores), afirma-se que para haver lugar a juros indemnizatórios o erro de facto ou de direito terá que ser imputável aos serviços.
Segundo o mesmo autor, nos casos de autoliquidação, em que tanto a determinação da matéria coletável como o apuramento do imposto são levados a cabo pelo sujeito passivo, está geralmente afastada a possibilidade de existir erro imputável aos serviços. No caso da liquidação levada a cabo pelos serviços tributários se a errada aplicação da lei tiver por base uma errada informação do sujeito passivo não poderá imputar-se à administração tributária a responsabilidade pelo erro que afete a liquidação.
Ora, no caso em apreço, sendo as liquidações adicionais impugnadas levadas a cabo pelos serviços tributários, na sequência de uma ação de inspeção externa à contabilidade da Requerente, a verdade é que foi o preenchimento errado da declaração de alterações e o comportamento tributário da mesma Requerente em desconformidade com essa declaração, que estiveram na base das ditas liquidações que só não foram mantidas na ordem tributária por se considerar que a sua subsistência representaria um sacrifício injusto e desproporcionado para a Requerente com o inerente locupletamento indevido da autoridade requerida (No mesmo sentido vd. Código de Procedimento e de Processo Tributário, por Jorge Lopes de Sousa, 6.ª edição, 2011, págs. 535/536.).
A situação em apreço tem claras semelhanças com a que foi objeto do acórdão do STA de 22-05-2013, processo 0245/2013, segundo o qual “…não resultando da decisão anulatória a comprovação da existência de um prejuízo, não se presuma o seu valor, fixando juros indemnizatórios, mas apenas se deva restituir aquilo que foi recebido, o que poderá constituir já um benefício para o contribuinte, perante a realidade da sua situação tributária.
Trata-se de uma solução equilibrada, inclusivamente no domínio processual. Na verdade, perante o simples reconhecimento de um vício de forma ou de incompetência, fica-se na dúvida sobre se estavam reunidos os pressupostos de facto e de direito de que a lei faz depender o pagamento de uma prestação tributária; se essa dúvida é um motivo suficiente para não exigir uma deslocação patrimonial do contribuinte para a Fazenda Pública (justificando a restituição da quantia paga) também, por identidade de razão, será suporte bastante para não impor uma deslocação patrimonial efectiva em sentido inverso (pagamento de uma indemnização); verdadeiramente, a regra aplicável, a mesma em ambos os casos, é a de não impor deslocações patrimoniais sem uma prova positiva da existência de uma situação, ao nível da relação tributária, em que elas devem ocorrer.
Assim, compreende-se que a LGT, em sintonia com a doutrina tradicional, nos casos em que há uma anulação de um acto administrativo ou de liquidação por não se verificarem os pressupostos de facto ou de direito em que devia assentar, casos em que há a certeza de que a prestação patrimonial foi indevidamente exigida, atribua uma indemnização baseada em presunção de danos (no caso sob a forma de juros) e não faça idêntica atribuição nos casos em que a decisão judicial não implica a antijuricidade material da exigência daquela prestação» (Vd. Código de Procedimento e de Processo Tributário, por Jorge Lopes de Sousa, 6.ª edição, 2011, págs. 531/532.).
De acordo com a doutrina exposta, é jurisprudência consolidada nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo que, quando o acto de liquidação objecto de impugnação é anulado apenas por vício de forma, não há suporte, ao abrigo do disposto no art. 43.º da LGT, para a atribuição de juros indemnizatórios ao impugnante”.
Ou seja: não se reúnem no caso os pressupostos necessários para o pedido de juros indemnizatórios.
No caso em apreço, é manifesto que, na sequência da ilegalidade, parcial, dos atos de liquidação, há apenas lugar a reembolso do imposto, por força dos referidos arts. 24.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e 100.º da LGT, pois tal é essencial para “restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado.
III. Decisão
Em face de tudo quanto antecede, delibera este Tribunal Arbitral Coletivo:
a) Julgar parcialmente procedente o pedido de declaração de ilegalidade e anulação pelo quantitativo de € 201.511,85 de imposto e dos correspondentes juros compensatórios;
b) Julga-se improcedente tudo o mais peticionado;
Valor do processo
De harmonia com o disposto no art. 306º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 524.554,23 (quinhentos e vinte e quatro mil, quinhentos e cinquenta e quatro euros e vinte e três cêntimos).
Custas
Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 7.956,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo de ambas as partes na proporção de 59% para a Requerente e 41% para a Autoridade Tributária e Aduaneira, considerando os respetivos decaimentos.
Lisboa, 22-4-2016
O Tribunal Arbitral Coletivo
José Poças Falcão
(Presidente)
Joaquim Silvério Dias Mateus
(Árbitro Vogal)
Ana Moutinho do Nascimento
(Árbitro Vogal)
[1] Cfr. SOUSA, JORGE LOPES DE (2011), Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, 6.ª ed., vol. I, p. 344.