Decisão Arbitral
I. Relatório
A..., LDA., sociedade com sede na Rua..., n.º ...- ... esquerdo, Lisboa, matriculada na Conservatória do Registo Comercial sob o número único de matrícula e pessoa coletiva..., com o capital social de €5.000,00 (cinco mil euros) (doravante, a “Requerente”), requereu ao Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), em 11 de dezembro de 2015, a constituição de tribunal arbitral em matéria tributária, nos termos do disposto nos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, doravante designado por “RJAT”), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), com vista à declaração de ilegalidade e consequente anulação dos atos de liquidação de Imposto do Selo ("IS") referentes ao ano de 2014, a que correspondem os documentos n.º:
i. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,44 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e quatro cêntimos);
ii. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,44 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e quatro cêntimos);
iii. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,44 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e quatro cêntimos);
iv. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,44 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e quatro cêntimos);
v. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,44 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e quatro cêntimos);
vi. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,44 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e quatro cêntimos);
vii. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,43 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e três cêntimos);
viii. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,43 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e três cêntimos);
ix. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,43 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e três cêntimos);
x. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,43 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e três cêntimos);
xi. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,43 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e três cêntimos);
xii. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,43 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e três cêntimos);
xiii. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,43 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e três cêntimos);
xiv. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,43 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e três cêntimos);
xv. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,43 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e três cêntimos);
xvi. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,43 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e três cêntimos);
xvii. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,43 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e três cêntimos); e
xviii. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,43 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e três cêntimos);
no valor global de €13.651,80 (treze mil seiscentos e cinquenta e um euros e oitenta cêntimos).
A Requerente optou por não designar árbitro.
O pedido de constituição de tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD em 14 de dezembro de 2015 e automaticamente notificado à AT em 22 de dezembro de 2015.
A Signatária foi designada pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD como árbitro de tribunal arbitral singular, nos termos do disposto no artigo 6.º do RJAT, tendo comunicado a aceitação do encargo, no prazo legal, nos termos do disposto no artigo 4.º do Código Deontológico do CAAD.
As Partes foram notificadas da designação da Signatária, em 15 de fevereiro de 2016, nos termos do artigo 11.º n.º1 alíneas a) e b) do RJAT, não se tendo oposto à mesma.
O tribunal arbitral singular ficou, assim, regularmente constituído em 1 de março de 2016, de acordo com o disposto na alínea c) do n.º1 do artigo 11.º do RJAT.
A AT foi notificada do despacho arbitral de 4 de março de 2016, para apresentar resposta no prazo de 30 (trinta) dias.
A AT apresentou a sua resposta em 9 de março de 2016.
Por despacho arbitral de 19 de março de 2016, o Tribunal Arbitral, considerando que:
a. As liquidações impugnadas tiveram vencimento em abril de 2015 (1.ª prestação), julho de 2015 (2.ª prestação) e novembro de 2015 (3.ª prestação), e que nos termos do disposto no artigo 10.º alínea a) do RJAT, conjugado com o disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 102.º do CPPT, o prazo para apresentação do pedido de pronúncia arbitral é de 90 dias a contar dos factos indicados naquelas normas; e
b. De acordo com os autos, o pedido de pronúncia arbitral deu entrada no CAAD em 11.12.2015, às 14:56, mais de 90 dias após o termo do prazo de pagamento das 1.ª e 2.ª prestações indicadas.
Entendeu poder consubstanciar exceção a conhecer e decidir, pelo que determinou a notificação das Partes para, no prazo de 10 dias, se pronunciarem sobre o exposto, ao abrigo do disposto no artigo 16.º alíneas a), b) e c) do RJAT.
Mais considerou estar apto a decidir, uma vez decorrido o prazo supra referido, dispensando assim a reunião do artigo 18.º do RJAT e fixando a prolação da decisão para 22 de abril de 2016.
A Requerida respondeu ao despacho arbitral supra indicado indicando que, sem prejuízo do facto de a impugnação respeitante às primeira e segunda prestações se ter processado fora do prazo legal para o efeito, o facto é que o objeto da impugnação é a liquidação do imposto e não os atos de cobrança a que dá lugar. Logo, a ser procedente a apreciação da terceira prestação, deduzida em tempo, acabará por refletir-se quanto ao valor total da liquidação. Logo, tal tornará inútil a apreciação da tempestividade relativamente às primeira e segunda prestações.
Também a Requerente respondeu àquele despacho, indicando, sucintamente, que o ato de liquidação impugnado é o ato praticado em março de 2015, cujo prazo de pagamento voluntário terminou a 30 de novembro de 2015. Para efeitos de determinação da tempestividade do pedido deduzido, haverá que considerar como relevante este prazo de pagamento voluntário que terminou a 30 de novembro de 2015.
As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
O processo não enferma de vícios que o invalidem.
II. Pedido da Requerente
A Requerente apresentou pedido de pronúncia arbitral com vista à declaração de ilegalidade e consequente anulação dos atos de liquidação de IS referentes ao ano de 2014, identificados supra, o reembolso dos montantes de imposto pagos ao abrigo de tais atos de liquidação e o pagamento de juros indemnizatórios.
Alega, sucintamente, que:
i. Os atos de liquidação de IS se referem ao prédio urbano de que a Requerente é proprietária, sito na Avenida..., n.ºs ... a ..., em Lisboa, inscrito na matriz predial da freguesia de ... sob o artigo...;
ii. O prédio urbano identificado encontra-se em propriedade total, sendo composto por duas lojas e seis áreas de utilização independente afetas a habitação;
iii. O valor patrimonial tributário do prédio é de €1.722.030,00;
iv. O imposto foi liquidado tomando como referência, para a determinação da incidência, o valor patrimonial tributário total dos andares ou divisões afetos à habitação, a saber, €1.365.180,00;
v. Os documentos de cobrança emitidos pela AT foram todos pagos;
vi. O imposto liquidado é ilegal, por violação da norma de incidência invocada, a verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo ("TGIS"), já que a AT se limitou a somar os valores patrimoniais tributários de todos os andares ou divisões suscetíveis de utilização independente, sendo que nenhum deles tem, por si só, valor patrimonial tributário superior a €1.000.000,00;
vii. De acordo com a letra da lei, haverá lugar a tributação relativamente a prédios habitacionais com valor patrimonial tributário igual ou superior a €1.000.000,00; não obstante, o legislador não fixou o conceito de prédio habitacional;
viii. No entanto, determinou também o legislador, no artigo 67.º n.º2 do Código do Imposto do Selo ("CIS"), que a todas as matérias não reguladas no CIS com referência a esta verba 28.1 seriam subsidiariamente aplicáveis as disposições do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis ("CIMI");
ix. Consequentemente, é necessário conferir a definição de prédio constante do artigo 2.º do CIMI, que estabelece no seu n.º4 que "para efeitos deste imposto, cada fração autónoma, no regime de propriedade horizontal, é havida como constituindo um prédio";
x. Por força desta disposição, seríamos levados a concluir que, para efeitos de IMI, uma fração autónoma de prédio em propriedade horizontal assume a natureza de prédio e uma unidade suscetível de utilização independente não assume tal natureza;
xi. Todavia, numa análise comparativa do regime de IMI aplicável a cada uma destas frações autónomas e unidades suscetíveis de utilização independente, verifica-se que o seu regime tributário é idêntico;
xii. Materialmente não existe qualquer diferença: ambos estão sujeitos às mesmas regras de inscrição na matriz e às mesmas regras e procedimentos de avaliação;
xiii. A liquidação do imposto deve também ser feita de forma individualizada, considerando cada realidade económica e não cada realidade jurídica;
xiv. Assim se concluindo que, para efeitos de IMI, o tratamento tributário conferido a frações autónomas e a unidades suscetíveis de utilização independente é o mesmo;
xv. Adicionalmente, a base de incidência do IMI é determinada da mesma forma em cada caso; a liquidação é feita de forma individualizada e autónoma em função de cada parte independente do prédio, seja ou não fração autónoma;
xvi. No caso de prédios em propriedade total, o IMI é liquidado em função do valor patrimonial individual de cada unidade autónoma que o compõe, e não em função do valor total do prédio, exatamente nos mesmos moldes que os aplicados para frações autónomas de prédio em propriedade horizontal;
xvii. Nos prédios compostos por unidades independentes com destinos e utilizações diferentes, a determinação da afetação só pode ser efetuada em função de cada uma dessas unidades e não em função do prédio como um todo;
xviii. Ao utilizar a expressão "prédio habitacional" o legislador quis referir-se ao prédio enquanto realidade suscetível de afetação, logo às partes independentes que o compõem, tenham ou não a natureza jurídica de frações autónomas;
xix. Conclui-se, assim, que para efeitos de aplicação da verba 28.1 da TGIS, as unidades suscetíveis de utilização independente que integram um prédio em regime de propriedade total e frações autónomas são, em substância, realidades idênticas e que, como tal, estão sujeitas ao mesmo regime de incidência;
xx. Tal entendimento foi já confirmado por jurisprudência vária, tanto do CAAD como do Supremo Tribunal Administrativo;
xxi. Outra interpretação da verba 28.1. da TGIS será ainda inconstitucional, por violação dos princípios da igualdade e da capacidade contributiva, como também foi decidido em vários casos submetidos ao CAAD;
xxii. Só por um aspeto formal - a não constituição de propriedade horizontal - a AT sujeita a Requerente a este imposto;
xxiii. Não sujeitando ao mesmo um proprietário com património imobiliário que ascenda a €5.000.000,00 porque os imóveis que detém são frações autónomas todas com valor inferior a €1.000.000,00;
xxiv. O que torna flagrante e patente a violação dos princípios constitucionais indicados;
xxv. Pelo exposto, são ilegais as liquidações contestadas, que deverão ser anuladas, ordenando-se a restituição dos montantes pagos;
xxvi. Deverá ainda ser a AT condenada ao pagamento de juros indemnizatórios, por se concluir existir erro imputável aos serviços de que resultou o pagamento de imposto em excesso, contados desde o dia de pagamento até à data do reembolso integral do valor pago.
III. Resposta da Requerida
Na sua resposta, a Requerida alega sucintamente que:
i. Foi a riqueza advinda da propriedade imobiliária que a Lei n.º 55-A/2012, veio, de forma inovadora, tributar, sujeitando a IS a propriedade e outros direitos reais sobre prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário (VPT) viesse a revelar-se igual ou superior a 1.000.000€;
ii. A nova arquitetura da verba 28 da TGIS passou a prever a sujeição a IS da: “Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a (euro) 1 000 000 - sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI: (Aditada pelo artigo 3.º da Lei n.º 55-A/2012 de 29 de outubro)
28.1Por prédio com afectação habitacional ou por terreno para construção cuja edificação, autorizada e prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI – 1%”.(Lei 83-C/2013, de 31 de Dezembro).
iii. A situação configurada nos autos é um caso que tem tido ampla discussão e controvérsia, porquanto a Requerente é proprietária de vários prédios em regime de propriedade total ou vertical, pelo que importa determinar se deve, ou não, ser atendido, para efeitos de sujeição ou não sujeição a Imposto do Selo, o VPT total do prédio (da unidade jurídica) ou se, pelo contrário, deve ser atendido o VPT de cada uma das parcelas;
iv. A AT tem reiterado o entendimento que se o edifício for constituído em propriedade total com partes suscetíveis de utilização independente (propriedade dita total), integra o conceito jurídico tributário de “prédio”, ou seja, uma única unidade e o valor patrimonial tributário do mesmo é determinado pela soma das partes com afetação habitacional e, sendo este igual ou superior a € 1.000.000,00, há sujeição a imposto de Selo da verba 28 da Tabela Geral anexa ao CIS;
v. Conclusão que tem tido assento nas seguintes premissas:
- No CIS não há qualquer definição sobre os conceitos de prédio urbano, pelo que terá que se aplicar o disposto no CIMI, para aferir da eventual sujeição a IS (Cfr. artigo 67.° n.°2 do CIS na redação dada pela Lei n.° 55- A/2012);
- O artigo 2.° n.°1 do CIMI define o conceito de prédio;
- O artigo 2° n.°4 do CIMI ressalva as frações autónomas de prédios constituídos em regime de propriedade horizontal, as quais considera, excecionalmente, como prédios;
- Ao contrário, sendo um prédio constituído em propriedade total com partes ou divisões suscetíveis de utilização independente, é o prédio no seu todo, e já não cada uma daquelas partes, que integra o conceito de “prédio”, para efeitos de IMI e de IS, por remissão do artigo 1°, n° 6 do CIS;
- A tal não obsta o facto de cada andar/divisão constar separadamente na inscrição matricial, e com os respetivos valores patrimoniais tributários, pois tal discriminação apenas releva, para efeitos fiscais, face ao conceito de matrizes prediais constante do artigo 12° do CIMI e na matéria regulada neste Código para a organização das matrizes;
- A imposição de organizar desta forma as matrizes deve-se à necessidade de relevar a autonomia que, dentro do mesmo prédio, cabe a cada uma das suas partes, as quais podem ser funcional e economicamente independentes;
- Esta autonomização apenas se justifica porque no mesmo prédio pode ocorrer a utilização para comércio ou habitação, com ou sem arrendamento, o que é determinante nas regras da avaliação fiscal no âmbito do CIMI, face aos diferentes coeficientes de afetação previstos no artigo 41.° desse código.
vi. Preconizar um entendimento contrário é confundir realidades teleologicamente distintas, a propriedade total, por um lado, e a propriedade horizontal, por outro, cuja destrinça encontra desde logo o seu fundamento no direito civil.
vii. O regime de propriedade horizontal não incide sobre um edifício na sua totalidade, tal como sucede na propriedade vertical, mas sim sobre uma fração autónoma, embora seja comproprietário de partes comuns (arts. 1414°, 1415° e 1420.° do Código Civil), mas esta compropriedade é forçada, não pode sair da indivisão enquanto durar a propriedade horizontal.
viii. Trata-se de realidades de facto e de direito distintas, a merecer um tratamento fiscal diferenciado pois só tal caminho é favorecido pelo princípio da tipicidade fechada.
ix. Não se poderá deixar de ter presente que em causa estamos perante uma norma de incidência, pelo que não se pode, através da via interpretativa, levar a um resultado que não está previsto na lei.
x. Tal é o que decorre do princípio da legalidade e dos princípios da tipicidade e determinação em que aquele se desdobra, que confirma que as normas de incidência têm de ser pré-determinadas no seu conteúdo, devendo os elementos integrantes da mesma estar formulados de modo preciso e determinado.
xi. Para dissipar quaisquer dúvidas foi sancionada acerca desta temática a Informação Vinculativa no Processo 2013... - IVE n.º ... com despacho concordante do Sr. Substituto Legal do Diretor-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira de 11.02.2013, cujo teor apenas parcialmente se transcreve: “3. Para efeitos de tributação em sede de imposto do selo, pela verba 28 da respectiva tabela geral, é determinante a distinção entre prédios constituídos em propriedade total e prédios constituídos em regime de propriedade horizontal. No caso de prédio constituído em propriedade horizontal, nos termos previstos nos artigos 1417.º e seguintes do Código Civil, cada fracção autónoma assim constituída é havida como constituindo um prédio, conforme decorre do disposto no artigo 2.º n.º 4 do CIMI, aplicável por força do disposto no artigo 1.º n.º 1 e n.º 6 do Código de Imposto de Selo, na redacção dada pela Lei n.º 55-A/2012 de 29 de Outubro e Verba 28 da Tabela Geral de Imposto de Selo, na sua actual redacção.
Para os devidos e legais efeitos, designadamente para efeitos de tributação em sede de imposto do selo, verba 28 da TGIS, os prédios constituídos em propriedade total, são considerados pela sua totalidade como um único prédio.(…)
Para efeitos de IMI e consequentemente para efeitos de sujeição a imposto de selo, verba 28 da Tabela Geral, anexa ao CIS, por remissão daquele Código, o prédio em propriedade total com partes ou divisões susceptíveis de utilização independente (dita propriedade total) e o prédio em regime de propriedade horizontal, são no que respeita ao conceito de “prédio fiscal” distintos uma vez que no último caso a fracção autónoma, para efeitos de IMI, integra o conceito de prédio. Trata-se de uma excepção à regra geral, dado que cada fracção autónoma de um edifício sujeito ao regime de propriedade horizontal pertence a um titular independente, o qual é proprietário da sua fração autónoma e comproprietário das partes comuns do prédio.
Já relativamente ao primeiro caso (propriedade total) ainda que o prédio tenha partes ou divisões suscetíveis de utilização independente o conceito jurídico tributário é de que este prédio constitui uma única unidade, uma vez que a sua titularidade, sem prejuízo da compropriedade, apenas pertence a um único proprietário”.
xii. Assim, a ora Requerente, para efeitos de IMI e também de IS, por força da redação da referida verba, não é proprietária de frações autónomas, mas sim de um único prédio, considerando a AT que este é o entendimento que melhor se coaduna com o princípio da legalidade ínsito no artigo 8º da LGT, a que está votada toda a sua atividade.
xiii. Em consonância, não se reconhece qualquer erro nos pressupostos de facto ou de direito em que terão incorrido os atos tributários de liquidação do imposto impugnado e, consequentemente, não se reconhece o direito do sujeito passivo ao pagamento dos juros indemnizatórios previstos no artigo 43º da LGT em caso de erro imputável aos serviços.
xiv. A AT se encontra vinculada ao princípio da prossecução do interesse público no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos contribuintes, devendo agir com todos com a mesma adequação e proporcionalidade, até porque num Estado de Direito, o princípio da igualdade fiscal é um elemento constitutivo do direito tributário, que traduz a ideia de que todos os cidadãos se encontram adstritos ao cumprimento do dever de pagar impostos aferido por um mesmo critério – a capacidade contributiva e esta é aferida pelo legislador atendendo a indicadores que averiguam a sua força económica, e consequentemente identificam a sua capacidade para os pagar.
xv. Os atos tributários em causa, em termos de substância, não violaram qualquer preceito legal, devendo, assim, ser mantidos.
xvi. De resto, o recentíssimo Acórdão, prolatado a 11 de novembro de 2015, pelo Tribunal Constitucional, no âmbito do processo 542/2014, já se referindo às alterações introduzidas pela lei nº 83-C/20123 de 31 de Dezembro decidiu não julgar inconstitucional a norma da verba 28. e 28.1 da tabela Geral do Imposto de Selo, aditada pelo artigo 4º da Lei nº 55-A/20121, de 29 de Outubro, na medida em que impõe a tributação igual sobre a propriedade de prédios urbanos com afetação habitacional, cujo valor patrimonial tributário seja igual ou superior a €1.000,000,00.
IV. Questões a decidir
Considerando os factos e a matéria de direito constantes do pedido de pronúncia arbitral apresentado pela Requerente e a resposta da Requerida, as questões a decidir pelo Tribunal Arbitral são:
1. Saber se o valor sobre o qual incide a verba 28.1 da TGIS é (i) o somatório do VPT de cada andar ou divisão suscetível de utilização independente, em caso de prédios em regime de propriedade total ou vertical (valor global), ou (ii) o VPT de cada andar ou divisão suscetível de utilização independente;
2. Saber se a verba 28.1. da TGIS, ao ser interpretada nos termos constante da alínea (i) supra é inconstitucional, por violação dos princípios da igualdade e da capacidade contributiva.
Sobre a eventual intempestividade do pedido da Requerente relativamente às primeira e segunda prestações do imposto, entende o Tribunal, em consonância com o alegado pelas Partes em resposta a despacho, que o que é objeto de impugnação é a liquidação do imposto no seu todo, e não os respetivos atos de cobrança. Sem prejuízo de se tratar de matéria controversa, entende este Tribunal Arbitral, que o prazo para impugnar o ato de liquidação do imposto (liquidado nos termos do artigo 113.º do CIMI, por remissão do n.º7 do artigo 28.º do CIS) se conta a partir do termo do prazo do respetivo pagamento voluntário, ou seja, e na situação em apreço, da última prestação, nos termos do disposto no artigo 120.º n.º1 alínea c) do CIMI. O pedido da Requerente é, consequentemente, tempestivo.
V. Matéria de Facto
Com relevância para a apreciação do pedido da Requerente, são os seguintes os factos que se dão por provados, com base nos documentos juntos ao processo, e não contestados pela Requerida:
1. A Requerente é proprietária do prédio urbano sito na Avenida..., n.ºs ... a ..., em Lisboa, inscrito na matriz predial da freguesia de ... sob o artigo...;
2. O prédio urbano identificado encontra-se em propriedade total, sendo composto por duas lojas e seis áreas de utilização independente afetas a habitação;
3. O valor patrimonial tributário do prédio é de €1.722.030,00;
4. A Requerente foi notificada dos atos de liquidação de Imposto do Selo ("IS") referentes ao ano de 2014, a que correspondem os documentos n.º:
i. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,44 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e quatro cêntimos);
ii. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,44 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e quatro cêntimos);
iii. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,44 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e quatro cêntimos);
iv. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,44 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e quatro cêntimos);
v. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,44 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e quatro cêntimos);
vi. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,44 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e quatro cêntimos);
vii. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,43 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e três cêntimos);
viii. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,43 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e três cêntimos);
ix. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,43 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e três cêntimos);
x. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,43 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e três cêntimos);
xi. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,43 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e três cêntimos);
xii. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,43 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e três cêntimos);
xiii. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,43 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e três cêntimos);
xiv. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,43 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e três cêntimos);
xv. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,43 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e três cêntimos);
xvi. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,43 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e três cêntimos);
xvii. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,43 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e três cêntimos); e
xviii. 2015..., de 20.03.2015, no valor de €758,43 (setecentos e cinquenta e oito euros e quarenta e três cêntimos);
no valor global de €13.651,80 (treze mil seiscentos e cinquenta e um euros e oitenta cêntimos).
5. A Requerente procedeu ao pagamento do imposto liquidado.
6. O imposto foi liquidado tomando como referência, para a determinação da incidência, o valor patrimonial tributário total dos andares ou divisões afetos à habitação, a saber, €1.365.180,00.
A convicção sobre os factos dados como provados fundou-se na prova documental junta pelas Partes, cuja autenticidade e correspondência à realidade não foram questionadas.
Não existem, com relevância para o processo, outros factos que não se considerem provados.
VI. Matéria de Direito
Como resulta da matéria de facto, estão em causa liquidações de IS relativas ao ano de 2014, referentes à verba 28.1. da TGIS, a qual foi aplicada sobre o valor patrimonial tributário total dos andares ou divisões afetos à habitação propriedade da Requerente.
A AT considerou, para efeitos de aplicação daquela verba 28.1 da TGIS, o somatório do VPT de cada um dos respetivos andares ou divisões suscetíveis de utilização independente, somatório esse que determina um VPT superior a €1.000.000,00.
A Requerente considera que a AT não deveria ter considerado esse somatório, na medida em que o tratamento a dar a um prédio em regime de propriedade total não pode ser diferente daquele a dar a um prédio em regime de propriedade horizontal – se, neste último caso, o VPT a considerar é o de cada fração autónoma, no caso de propriedade total deverá ser, também, considerado o VPT de cada andar ou divisão suscetível de utilização independente. E, no caso concreto, cada andar ou divisão suscetível de utilização independente afeto a habitação tem um VPT inferior a €1.000.000,00.
Importa, assim, perceber se a AT agiu com erro nos pressupostos de Direito para aplicação, ao caso, da verba 28.1 da TGIS.
Para a apreciação da questão em causa importa, antes de mais, analisar verba nº 28 e 28.1 da TGIS:
“28. Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a (euro) 1 000 000 - sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:
28.1 Por prédio com afectação habitacional ou por terreno para construção cuja edificação, autorizada e prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI – 1%”
Como referido, a Requerente sustenta que não cabem nesta previsão normativa os prédios urbanos em propriedade total considerados como um todo, quando compostos por partes suscetíveis de utilização independente.
Impõe-se interpretar, para este efeito, o conceito de “prédio” constante daquela verba 28.1 da TGIS. Para compreender o seu conteúdo, deverão ser compulsados os conceitos de prédio constantes do CIMI (artigos 2.º a 6.º) – ao abrigo do disposto no artigo 67.º, n.º 2 do CIS, segundo o qual, às matérias não reguladas no CIS respeitantes à verba n.º 28 da TGIS, se aplica subsidiariamente o disposto no CIMI.
E tal interpretação deverá ser sempre realizada nos termos do disposto nos artigos 11.º da Lei Geral Tributária (LGT) e 9.º do Código Civil, para o qual aquele remete, o que se fará.
O artigo 2.º do CIMI define o conceito de prédio, e estabelece, especificamente, no respetivo n.º4, que para efeitos deste imposto, cada fração autónoma, no regime da propriedade horizontal, é havida como constituindo um prédio. Este artigo nada refere quanto a prédios em propriedade total ou quanto a partes de prédios (andares ou divisões suscetíveis de utilização independente).
De uma interpretação literal do artigo 2.º do CIMI, dúvidas não restarão de que partes de prédios que não estejam em propriedade horizontal não integram, para efeitos de IMI, o conceito de prédio.
Já quanto à determinação do valor patrimonial tributário de cada prédio, rege o artigo 7.º do CIMI. De acordo com o n.º1 do mesmo, o valor patrimonial tributário dos prédios é determinado nos termos deste Código. Assim, e segundo o n.º2 alínea b) daquele artigo 7.º, o valor patrimonial tributário dos prédios urbanos com partes enquadráveis em mais de uma das classificações atribuídas a prédios urbanos nos termos do artigo 6.º n.º1 do CIMI (a saber, habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços, terrenos para construção e outros) determina-se como se descreve: “caso as diferentes partes sejam economicamente independentes, cada parte é avaliada por aplicação das correspondentes regras, sendo o valor do prédio a soma dos valores das suas partes”.
Consequentemente, também na determinação do valor patrimonial tributário de prédios, não parece existir qualquer referência que especificamente determine que as partes economicamente independentes são consideradas como constituindo, de per si, prédios. Pelo contrário, a interpretação literal da norma permite concluir em sentido oposto: o valor do prédio é a soma dos valores das suas partes.
Reitera-se então: o CIMI não equipara, para determinação do valor patrimonial tributário, partes de prédios suscetíveis de utilização independente a prédios. Pelo contrário, claramente separa os conceitos de “prédio” e de “parte de prédio”. Ora, voltando ao artigo 2.º do CIMI, as “partes de prédio” não são havidas como prédios (precisamente ao inverso do que especificamente se refere relativamente a frações autónomas, essas sim equiparadas a prédios).
No caso concreto, o prédio urbano é composto por partes (independentes) habitacionais e por partes (independentes) comerciais. Logo, o valor do prédio é, de acordo com as regras indicadas, a soma dos valores das suas partes.
Não existe, então, igualdade de tratamento no CIMI entre prédios em propriedade horizontal e prédios em propriedade total com partes enquadráveis em mais de uma das classificações atribuídas a prédios urbanos. Quanto aos primeiros, as respetivas frações autónomas são, inequivocamente, prédios para efeitos de IMI, quanto aos segundos, as suas partes independentes não cabem naquele conceito. As partes compõem, no seu todo, o prédio.
Consequentemente, se as partes de prédios, para efeitos de IMI, não são prédios, então não o serão também para efeitos de IS. Logo, o facto tributário é a propriedade do prédio, no seu todo, conforme decorre do conceito constante do artigo 2.º do CIMI.
Não colhem, igualmente, no entendimento do Tribunal Arbitral, os argumentos da Requerente em torno dos artigos 12.º n.º3 e 119.º do CIMI, respeitantes, respetivamente, ao conceito de matriz predial e à liquidação do imposto.
Na verdade, não é pela mera autonomização matricial determinada pelo artigo 12.º n.º3 que os andares ou divisões suscetíveis de utilização independente adquirem a qualidade de prédio que não lhe é conferida pelo artigo 2.º do mesmo CIMI.
As matrizes prediais são registos de que constam, designadamente, a caracterização dos prédios (artigo 12.º n.º1 CIMI). Dessa descrição fazem parte integrante, no caso de prédios em propriedade total, os andares ou partes de prédio suscetíveis de utilização independente, que a lei determina (n.º3 do mesmo artigo) sejam separadamente considerados na mesma inscrição matricial.
Já quanto aos prédios em regime de propriedade horizontal, a lei vai mais longe: o artigo 92.º do CIMI estabelece que a cada edifício em regime de propriedade horizontal corresponde também uma só inscrição, mas cada uma das frações autónomas que o compõe é pormenorizadamente descrita e individualizada pela letra que lhe competir.
E mesmo que se considerasse que, quanto à questão da inscrição matricial, o tratamento entre prédios em regime de propriedade total e prédios em regime de propriedade horizontal é substancialmente semelhante, tal não ultrapassaria, considera-se, o facto de partes de prédios não constarem especificamente do artigo 2.º do CIMI, ao contrário do que acontece com as frações autónomas.
Adicionalmente, por cada “prédio” inscrito na matriz é entregue uma caderneta predial ao respetivo proprietário (artigo 93.º n.º1 do CIMI). Ora, não existe, para cada andar ou divisão suscetível de utilização independente de prédio em propriedade total, uma caderneta predial autónoma, pela razão clara de não se subsumir no conceito de prédio definido em sede deste imposto.
Quanto à liquidação do IMI (artigo 119.º), o documento de cobrança contém, necessariamente, a discriminação dos prédios e suas partes suscetíveis de utilização independente. Tal porque, ao abrigo do disposto no artigo 7.º n.º 2 alínea b) do CIMI, cada parte suscetível de utilização independente tem o valor patrimonial tributário calculado separadamente, como se indicou anteriormente.
Em face do exposto, entende o Tribunal Arbitral – e salvo o devido respeito, que é muito, pelo teor do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo citado pela Requerente – que a interpretação que considere que andares ou partes de prédios suscetíveis de utilização independente de prédios em propriedade total são, para efeitos de IMI, equiparadas a frações autónomas, não tem sustentação legal suficiente e é demasiado afastada da letra da lei.
Consequentemente, não procederá, nesta parte, o pedido de anulação das liquidações em crise fundado em erro nos pressupostos de Direito, apresentado pela Requerente.
Restará, então, apreciar da constitucionalidade desta verba 28 e 28.1. da TGIS, quando interpretada no sentido de o valor que releva para efeitos da sua aplicação é o correspondente ao somatório do VPT de cada andar ou divisão suscetível de utilização independente afeto a habitação, em caso de prédios em regime de propriedade total ou vertical (valor global).
O Tribunal Constitucional apreciou já a questão, no recente Acórdão 620/2015, de 20 de janeiro de 2016. Por se concordar com a fundamentação aí constante, e por facilidade de exposição, citam-se partes do mesmo:
“No presente recurso está precisamente em causa o princípio da igualdade fiscal, sobretudo na sua vertente de uniformidade, ou seja, na medida em que exige que o dever de pagar impostos (neste caso, o imposto do selo) seja aferido por um mesmo critério, traduzido pelo princípio da capacidade contributiva. Impõe-se apreciar se, ao sujeitar a imposto especial os prédios urbanos habitacionais em propriedade total compostos por partes suscetíveis de utilização independente e consideradas separadamente na inscrição matricial, atendendo para tal ao somatório dos valores patrimoniais tributários atribuídos às diversas partes do prédio, contrariamente ao que sucede nos prédios constituídos em propriedade horizontal, a referida norma tratou de modo diferenciado situações reveladoras de idêntica capacidade contributiva e, na afirmativa, se essa desigualdade de tratamento se revela arbitrária, por introduzir discriminações entre contribuintes desprovidas de fundamento racional bastante.
Importa, pois, antes de mais comparar as duas situações em análise, designadamente a situação dos prédios urbanos habitacionais em propriedade total compostos por partes suscetíveis de utilização independente e consideradas separadamente na inscrição matricial e a situação dos prédios em regime de propriedade horizontal, começando, para tal, por fazer uma breve referência dos institutos da propriedade proprio sensu e da propriedade horizontal.
(…)
Assim, sendo inegável que, no plano do direito civil, estamos perante duas situações juridicamente diferentes, importa, no entanto, questionar se tais diferenças justificam um tratamento diferente no plano tributário, ou seja, se tais diferenças jurídicas existem e são relevantes também no plano substancial para efeitos fiscais, a ponto de se poder afirmar que, em termos económicos, estamos perante diferentes manifestações de capacidade contributiva.
(…)
Ora, se num prédio constituído em propriedade horizontal, essa titularidade só pode reportar-se a cada uma das frações autónomas, pois cada uma das diferentes frações pode ser objeto de uma situação jurídica real própria, o mesmo não sucede num prédio em que, apesar de dividido fisicamente em unidades suscetíveis de utilização independente, a sua titularidade reporta-se necessariamente ao todo correspondente à soma das diferentes unidades, não podendo os direitos reais referidos na verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo ter por objeto isolado uma dessas unidades.
Assim, para efeitos do imposto aqui sob fiscalização, enquanto o valor de todo um prédio que não se encontra constituído em propriedade horizontal, apesar de ser composto por diferentes unidades suscetíveis de terem uma utilização independente, revela a capacidade contributiva do seu único titular, já o mesmo não sucede com um prédio idêntico constituído em propriedade horizontal, uma vez que, sendo cada uma das frações suscetíveis de uma situação jurídica real própria, só o valor de cada uma delas é idóneo a revelar a capacidade contributiva do seu titular.
As diferenças decorrentes dos diferentes regimes dominiais constituem fundamento bastante para, no que diz respeito à incidência do imposto de selo no caso de edifícios em propriedade horizontal se tenha em atenção o valor patrimonial tributário individualizado de cada uma das frações, o que já não sucede, no caso dos prédios urbanos habitacionais em propriedade total compostos por partes suscetíveis de utilização independente e consideradas separadamente na inscrição matricial.
Daí que, uma interpretação da norma de incidência constante da verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo, no sentido de nela se incluírem os prédios urbanos habitacionais em propriedade total, compostos por partes suscetíveis de utilização independente e consideradas separadamente na inscrição matricial, procedendo-se para tal ao somatório do valor patrimonial tributário de cada uma das unidades independentes com afetação habitacional, não se revele violadora do princípio da igualdade tributária e do princípio da capacidade contributiva, conforme acima exposto.”
Consequentemente, não procederá também o pedido de anulação das liquidações em crise por inconstitucionalidade da verba 28.1 da TGIS, quando interpretada no sentido de que nela se incluem os prédios urbanos habitacionais em propriedade total compostos por partes suscetíveis de utilização independente e consideradas separadamente na inscrição matricial. A norma em questão não é violadora do princípio da igualdade tributária e do princípio da capacidade contributiva, não sendo, consequentemente, inconstitucional.
Improcedendo a pretensão da Requerente, não procederá, consequentemente, o seu pedido de restituição do imposto pago acrescido de juros indemnizatórios.
VII. Decisão
Nestes termos, e com base nos fundamentos expostos, o Tribunal Arbitral decide julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral, mantendo-se as liquidações impugnadas.
Valor do processo: €13.651,80 (treze mil seiscentos e cinquenta e um euros e oitenta cêntimos)
Custas: Ao abrigo do disposto no artigo 22.º n.º 4 do RJAT, e nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor das custas em €918,00 (novecentos e dezoito euros), a cargo da Requerente.
Lisboa, 8 de abril de 2016
O árbitro
Ana Pedrosa Augusto