DECISÃO ARBITRAL
Os árbitros Dr. José Pedro Carvalho (árbitro-presidente), Dra. Ana Pedrosa Augusto e Dr. Rui Ferreira Rodrigues, árbitros adjuntos, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 04 de Janeiro de 2016, acordam no seguinte:
I. Relatório
A…, residente na Avenida…, n.º…, …º esquerdo, em Lisboa, contribuinte fiscal número…, na qualidade de cabeça- de-casal e herdeira de B… (doravante, a “Requerente”), requereu ao Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), em 20 de Outubro de 2015, a constituição de tribunal arbitral em matéria tributária, nos termos do disposto nos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, doravante designado por “RJAT”), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), com vista à declaração de ilegalidade e consequente anulação do ato de liquidação de Imposto Sucessório liquidado no processo…, instaurado em 16.10.2003 por óbito de B…, no valor de 64.003,44 € (sessenta e quatro mil e três euros e quarenta e quatro cêntimos).
A Requerente optou por não designar árbitro.
O pedido de constituição de tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD em 21 de Outubro de 2015 e automaticamente comunicado à AT na mesma data.
Os Árbitros foram designados pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD como árbitros de tribunal arbitral coletivo, nos termos do disposto no artigo 6.º do RJAT, tendo comunicado a aceitação do encargo, no prazo legal, nos termos do disposto no artigo 4.º do Código Deontológico do CAAD.
As Partes foram notificadas da designação dos Árbitros, em 16 de Dezembro de 2015, nos termos do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT, não se tendo oposto à mesma.
O tribunal arbitral coletivo ficou, assim, regularmente constituído em 4 de Janeiro de 2016, de acordo com o disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT.
Por despacho do Presidente do Conselho Deontológico do CAAD de 7 de Janeiro de 2016, foi comunicada a renúncia do Árbitro que havia sido nomeado como Árbitro Presidente, o qual foi, consequentemente, substituído.
A AT foi notificada do despacho arbitral de 21 de Janeiro de 2016, para apresentar resposta no prazo de 30 (trinta) dias, juntar cópia do processo administrativo no mesmo prazo e, caso quisesse, solicitar a produção de prova adicional.
A AT apresentou a sua resposta em 22 de Fevereiro de 2016.
Por despacho arbitral de 23 de Fevereiro de 2016, o Tribunal Arbitral determinou a notificação da Requerida para se pronunciar, no prazo de 10 (dez) dias, sobre a matéria de exceção e sobre o incidente de valor contidos na resposta da AT.
A Requerida apresentou a sua pronúncia em 3 de Março de 2016.
Por despacho arbitral de 7 de Março de 2016, o Tribunal Arbitral, ao abrigo do disposto nas alíneas c) e e) do artigo 16.º, e n.º 2 do artigo 29.º do RJAT dispensou a reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT e facultou às Partes a possibilidade de, querendo, apresentarem alegações escritas. Mais determinou que a decisão final seria proferida até 30 (trinta) dias após a apresentação das alegações escritas da Requerida, ou o termo do prazo concedido para o efeito.
A Requerente apresentou alegações escritas em 17 de Março de 2016, não tendo a Requerida apresentado alegações.
As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
O processo não enferma de vícios que o invalidem.
II. Pedido da Requerente
A Requerente apresentou pedido de pronúncia arbitral com vista à declaração de ilegalidade e consequente anulação do ato de liquidação de Imposto Sucessório liquidado no processo…, instaurado em 16.10.2003 por óbito de B…, no valor de 64.003,44 € (sessenta e quatro mil e três euros e quarenta e quatro cêntimos), o reembolso do montante de imposto pago ao abrigo de tal acto de liquidação e o pagamento de juros indemnizatórios.
A Requerente fundamenta o seu pedido nos termos que de seguida se indicam:
i. Em 16.10.2003 faleceu no estado de viúva B…, mãe da Requerente, sem testamento e com duas herdeiras, a saber, a Requerente e C…;
ii. Foi instaurado no Serviço de Finanças de Lisboa … o processo de liquidação de Imposto sobre as Sucessões e Doações n.º…;
iii. Da relação de bens apresentada constava uma quota com o valor nominal de 31.409,84 € (trinta e um mil quatrocentos e nove euros e oitenta e quatro cêntimos) na Sociedade D…, Lda., com sede na Rua dos…, lote…, loja…, …, Odivelas;
iv. Os Serviços de Inspeção da Direção de Finanças de Lisboa fixaram àquela quota o valor de 598.468,76 € (quinhentos e noventa e oito mil quatrocentos e sessenta e oito euros e setenta e seis cêntimos), nos termos do artigo 77.º do Código de Imposto Municipal da Sisa e Imposto sobre as Sucessões e Doações (“CIMSISD”);
v. As herdeiras foram notificadas da liquidação de Imposto Sucessório efetuada pelo Serviço de Finanças de Lisboa … em 24.02.005, em 04.03.2005;
vi. Na qualidade de cabeça-de-casal, a Requerente contestou o valor atribuído à quota supra identificada nos termos do artigo 87.º do CIMSISD;
vii. O Serviço de Finanças de …(territorialmente competente considerando a sede da sociedade) terá avaliado a quota e remetido tal avaliação ao Serviço de Finanças de Lisboa…, em 22.06.2009;
viii. Na sequência da avaliação da quota efetuada pelo Serviço de Finanças de…, o Serviço de Finanças de Lisboa … procedeu à reforma da liquidação de Imposto Sucessório em 10.07.2009, determinando o valor global de imposto a pagar de 64.003,44 € (sessenta e quatro mil e três euros e quarenta e quatro cêntimos);
ix. A Requerente e a sua irmã pagaram o imposto, tendo beneficiado de desconto de 4.800,26 € (quatro mil e oitocentos euros e vinte e seis euros), pagando assim o valor de 54.402,92 € (cinquenta e quatro mil quatrocentos e dois euros e noventa e dois cêntimos);
x. No entanto, a Requerente não chegou a conhecer o resultado da avaliação da quota efetuada pelo Serviço de Finanças de…, pelo que solicitou ao Serviço de Finanças de Lisboa…, em 13.08.2009, que procedesse à notificação daquela avaliação;
xi. O Serviço de Finanças de Lisboa … solicitou à Requerente, por ofício de 24.09.2009, que substituísse aquele requerimento por reclamação graciosa ou impugnação judicial;
xii. A Requerente apresentou assim reclamação graciosa, em 28.12.2009, invocando a invalidade da liquidação do imposto por preterição de formalidades legais, dada a falta de notificação da avaliação e a impossibilidade de a Requerente, querendo, solicitar uma segunda avaliação;
xiii. A Requerente foi notificada do projeto de decisão de indeferimento da reclamação graciosa por ofício de 14.04.2010 o qual, entende a Requerente, não se pronunciou sobre a matéria em apreço, inexistindo assim fundamentação;
xiv. Sobre tal projeto de decisão, a Requerente exerceu direito de audição prévia reiterando a sua argumentação. Por ofício de 14.11.2011, foi indeferida a reclamação graciosa;
xv. Em 14.12.2011, a Requerente interpôs recurso hierárquico daquela decisão, tendo sido notificada por ofício de 06.03.2014 do projeto de decisão de indeferimento do mesmo;
xvi. A Requerente exerceu o seu direito de audição prévia, contestando a argumentação constante do projeto, a qual, aliás, reconhece que deveria ter existido notificação da avaliação mas acaba por concluir que o valor que viesse a resultar de uma segunda avaliação nunca poderia ser outro (não sendo, consequentemente, tal segunda eventual avaliação capaz de alterar o resultado da primeira e, portanto, inútil);
xvii. À Requerente foi notificado em 23.07.2015 o despacho de indeferimento do recurso hierárquico;
xviii. A Requerente considera existir confusão nos serviços da AT relativamente a esta questão, a qual pretende seja definitivamente esclarecida;
xix. De facto, o valor da quota social foi fixado com base no último balanço, nos termos do n.º 2 do §3.º do artigo 20.º e do artigo 77.º do CIMSISD. Não há uma avaliação, mas sim uma fixação de valor, conforme decorre das instruções esclarecedoras do Ofício-Circular n.º D-5/64 de 12 de Agosto;
xx. Não concordando com tal fixação, a Requerente contestou a mesma, requerendo uma avaliação ao abrigo do artigo 87.º do CIMSISD, na medida em que a situação em apreço não se enquadrava em nenhum dos casos que impedem o pedido de avaliação;
xxi. Nos termos do artigo 95.º do CIMSISD a avaliação deve ser reduzida a termo no processo, sendo este assinado por quantos nela intervêm, e será de seguida notificada ao contribuinte;
xxii. No caso de o contribuinte ou o chefe de finanças não concordarem com o resultado da avaliação, pode ser requerida ou promovida, no prazo de 8 (oito) dias a contar da notificação, uma segunda avaliação;
xxiii. Só depois de efetuada a segunda avaliação poderá ser impugnado judicialmente o valor apurado, conforme disposto no artigo 134.º n.º 7 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”);
xxiv. Os atos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados e carecem de fundamentação expressa e acessível quando afetem direitos ou interesses legalmente protegidos, conforme se dispõe no n.º 3 do artigo 268.º da Constituição da República Portuguesa e no artigo 36.º do CPPT;
xxv. A omissão de notificação da avaliação implica a falta de fundamentação da liquidação do imposto, constituindo este um vício que determina a ineficácia do ato, pois o resultado obtido não chegou a exteriorizar-se;
xxvi. Pelo exposto, o pedido deve ser considerado procedente, determinando-se a anulação da liquidação do imposto apurado e pagos juros indemnizatórios sobre o valor pago de 54.402,92 € (cinquenta e quatro mil quatrocentos e dois euros e noventa e dois cêntimos), nos termos dos artigos 43.º da Lei Geral Tributária e 61.º n.º 2 do CPPT.
III. Resposta da Requerida
A Requerida apresentou a sua resposta alegando quanto, de seguida, sucintamente, se indica:
i. A Requerida começa por impugnar o valor da ação, o qual não deve ser de 64.003,44 € na medida em que não segue a regra geral do artigo 297.º n.º 1 do CPC, aplicável ao processo tributário por força do artigo 2.º alínea e) do CPPT, nem o artigo 97.º-A, n.º 1 do CPPT;
ii. O valor da ação deveria assim corresponder ao valor do imposto pago, relativamente ao qual se pede a sua anulação;
iii. Defendendo-se por exceção, a Requerida alega que:
a. A petição de pronúncia arbitral é inepta, porquanto o pedido se relaciona com a liquidação do imposto sucessório, pedindo-se a sua anulação, mas atendendo à causa de pedir, esta situa-se ao nível da falta de notificação do resultado da avaliação de um bem em concreto - a quota na sociedade comercial - pretendendo a Requerente ser notificada do resultado da avaliação que requereu em 28 de Março de 2005, ao abrigo do artigo 87.º do CIMSISSD, para que possa requerer 2.ª avaliação e, esgotados os meios graciosos, se o assim entender, impugnar o valor;
Em momento algum da petição se assaca a ilegalidade da liquidação do imposto sucessório, tão-somente se contesta, nesta sede, o facto de nunca ter sido notificada da avaliação de um bem que entrou na liquidação do imposto.
Havendo contradição entre o pedido e a causa de pedir, como ilustra todo o pedido arbitral, verifica-se a ineptidão da petição de pronúncia arbitral – artigo 186.º n.º 2, alínea b) do CPC, aplicável ao processo tributário por força do artigo 2.º, alínea e) do CPPT.
Consequentemente será nulo todo o processo, nos termos do n.º 1 do artigo 186.º do CPC, constituindo tal uma exceção dilatória - alínea b) do artigo 577.º do CPC, de conhecimento oficioso - artigo 578.º do CPC.
Do seu conhecimento resulta que o tribunal está impedido de conhecer o mérito da causa, impondo-se a absolvição da instância – n.º 2 do artigo 576.º do CPC.
b. O pedido de impugnação da liquidação do imposto é intempestivo, já que este foi liquidado e pago em 2009, logo, e, nos termos do artigo 102.º do CPPT, a impugnação será apresentada no prazo de três meses contados a partir do termo do prazo para pagamento voluntário das prestações tributárias legalmente notificadas ao contribuinte. Assim, é manifestamente extemporâneo o presente pedido de pronúncia arbitral como impugnação do ato de liquidação do imposto sucessório.
iv. Entrando no mérito da causa, a Requerida indica que estaríamos perante uma impugnação que visa a liquidação de imposto sucessório, tendo como fundamento único, a preterição de uma formalidade legal ocorrida no procedimento avaliativo que esteve na sua base, relativamente ao bem – quota social – concretamente a falta de notificação do ato de avaliação;
v. Porém, como é doutrina assente, designadamente o acórdão do STA de 24/1/2002, no processo n.º 26637, entre outros, o ato de notificação de um ato administrativo ou tributário, é um ato exterior e posterior a este e os vícios que afetem a notificação, podendo determinar a ineficácia do ato notificado, são insuscetíveis de produzir sua invalidade por não terem a ver com o próprio ato nem com os seus pressupostos;
vi. O ato de avaliação era um ato destacável, para efeitos de impugnação contenciosa, como resulta do preceituado no art.º 97.º, § único, do CIMSISD. Como tal, a falta de notificação apenas gera diretamente a sua ineficácia, e não a invalidade dos atos subsequentes - só a invalidade do ato destacável geraria a invalidade da liquidação subsequente;
vii. Assim, a avaliação deverá ser notificada com observância das formalidades legais e, caso haja impugnação da avaliação e seja julgada procedente, a liquidação, então, cairá; caso contrário, ou à falta de impugnação, a liquidação tornar-se-á eficaz;
viii. No processo, apesar de não haver formalmente a notificação do ato da 1.ª avaliação levada a cabo pela AT, no entanto as omissões da Requerente conduziram para esta situação;
ix. Verifica-se do probatório e do alegado pela Requerente que em 19 de Janeiro de 2011, o SF Lisboa … enviou à Requerente o oficio n.º…, através do qual a notificava para exercer o direito de audição, nos termos do artigo 60.º da LGT, relativamente ao valor da quota determinado nos termos do artigo 87.º do CIMSISSD, pelo que se não exercesse esse direito, o valor indicado para a quota - 4/6 de 598.468,76 = 398.979,17, conforme fundamentação que se enviou por referência ao artigo 77.º do CIMSISSD, seria considerado definitivo;
x. Esta notificação é formalmente uma notificação da primeira avaliação, mas quanto ao seu conteúdo verifica-se que o ato que se pretendia notificar - o resultado da avaliação pedida nos termos do artigo 87.º do CIMSISS - não consta do anexo;
xi. Pelo que com base nos deveres de cuidado e de zelo e de cooperação que também podem ser assacados à Requerente, deveria esta ter requerido ao abrigo do artigo 37.º do CPPT, a notificação completa do ato;
xii. Mais do que uma possibilidade ao alcance do contribuinte, tratar-se-ia de um ónus para a contribuinte, visto que a reclamação previamente apresentada tinha por função impor à AT a notificação do resultado da avaliação;
xiii. Não tendo a contribuinte feito uso desta possibilidade conferida na lei, o valor tributário da quota consolidou-se na ordem jurídica, como caso decidido, semelhante ao caso julgado, que a posterior liquidação tem de refletir, e cuja impugnação judicial desta, a ser tempestiva, não abrange os erros ou vícios que eventualmente tenham ocorrido nessa avaliação;
xiv. Em conclusão, a apreciar-se a impugnação judicial contra a liquidação do imposto sucessório mas apenas com fundamentos circunscritos à própria liquidação e sem poder ser apreciado o vício respeitante ao ato de fixação do valor, entretanto consolidado na ordem jurídica, por não ter sido requerido os elementos em falta, o presente pedido é improcedente, já que a causa de pedir é exatamente o vicio formal de falta de notificação;
xv. Em abono da falta de diligência da Requerente, conforme consta do PAT, esta tomou conhecimento do valor atribuído à quota em sede de primeira avaliação na qual participou, designadamente através da assinatura do louvado;
xvi. Quanto à questão da apreciação da decisão do recurso hierárquico, que permitiu a apresentação do presente pedido de pronúncia arbitral, denota-se, dando-se razão à Requerente, a existência de várias tomadas de posição errantes, resultantes da “viscosidade” da matéria, que se presta entendimentos diferentes e que a mais alta jurisprudência reflete, como demonstra o acórdão no processo n.º 02766/08-28.04.2009- CT- 2.º Juízo, que é citado;
xvii. Não há lugar à notificação para uma segunda avaliação, uma vez que a avaliação da quota se fez de acordo com a regra 4.ª do § 3.º do artigo 20.º do CIMSISSD, de acordo com o último balanço da sociedade, não havendo fundamento para a sua alteração, a não ser através de um reexame à escrita, pondo em causa o balanço efetuado pela própria empresa;
xviii. Assim, em termos de mérito, há que concluir no sentido, bem sustentado, na informação que analisou o recurso hierárquico, ou seja, no qual se defende que a haver erro no procedimento este consiste no facto dos serviços terem admitido o pedido de contestação formulado pela Requerente nos termos do artigo 87.º do CIMSISSD, porque a quota foi avaliada nos termos do artigo 77.º do CIMSISSD, logo não haveria lugar a notificação pretendida.
IV. Resposta da Requerente às exceções
A Requerente respondeu à matéria de exceção invocada pela Requerida, nos seguintes termos:
i. É manifesto que a falta de notificação do resultado da avaliação da quota social está intrinsecamente associada à liquidação do imposto, porque esta incidiu sobre uma matéria coletável que não passou pelo crivo do princípio da publicidade dos atos;
ii. Não foi dado conhecimento ao destinatário normal do procedimento avaliativo, e enquanto não for levado ao seu conhecimento através do ato de notificação, não está apto a produzir todos os seus efeitos jurídicos - ou seja, não houve uma integração de eficácia. É inexistente;
iii. A própria AT, na sua resposta, reconhece que só passados oito dias sem que tenha sido requerida 2ª avaliação, é que esta avaliação se torna definitiva, conforme o preceituado no artigo 96º do CIMSISSD;
iv. Pelo que nunca poderia a Requerente contestar o valor de algo que não lhe foi notificado;
v. Argumentar-se que a Requerente não podia deixar de conhecer o valor atribuído porque interveio através do seu louvado na avaliação levada a cabo não é suficiente e demonstra, isso sim, a “viscosidade” do procedimento assim qualificado pela AT;
vi. O contribuinte não tem o ónus de pedir para ser notificado, só pode requerer a notificação dos requisitos que tenham sido omitidos na notificação, ao abrigo do artigo 37.º do CPPT;
vii. Mas que no caso vertente, não tem aplicação dado que a notificação nunca existiu, nunca foi sequer “produzida” pela AT, quanto mais chegar ao seu destinatário;
viii. Pelo que só restava à Requerente, primeiro reclamar graciosamente da liquidação, precisamente porque a mesma incidia sobre um valor inexistente, e caso fosse mantido o ato, como aconteceu, então recorrer à via judicial;
ix. Não faz sentido impugnar um ato do qual formalmente não se tem conhecimento, mas já o faz impugnar um ato resultante daquele, como é o caso da liquidação;
x. Também não pode colher o argumento de que em momento algum da petição se contesta o facto de nunca ter sido notificada da avaliação de um bem que entrou na liquidação do imposto, para se vir defender a ineptidão da petição de pronúncia arbitral, já que todo o percurso cognitivo do processo se encontra bem explicado e detalhado;
xi. Nesta esteira o valor tributável da quota nunca se consolidou na ordem jurídica, uma vez que não foi objeto de notificação ao contribuinte, sujeito passivo da relação material controvertida;
xii. Quanto à intempestividade alegada, a Requerente tudo fez para que os serviços corrigissem a preterição de formalidades legais que cometeram: exposição inicial ao Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa –…, Reclamação Graciosa, Recurso Hierárquico e por fim, impugnação judicial;
xiii. O prazo para impugnação judicial é três meses contados a partir da notificação da decisão do Recurso Hierárquico, como o defende a alínea a) do nº 1 do artº10º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, pelo que o pedido é tempestivo;
xiv. Relativamente ao valor da causa, a Requerente pretende a anulação da liquidação efetuada no processo n.º…, cujo valor é de € 64.003,44, sendo esta imutável. No entanto, por força do CIMSISSD, pagou menos por ter optado pelo seu pagamento a pronto – tal não altera o valor da liquidação.
V. Questões a decidir
Considerando os factos e a matéria de direito constantes do pedido de pronúncia arbitral apresentado pela Requerente, a resposta da Requerida, a resposta da Requerente à matéria de exceção e as respetivas alegações escritas, as questões a decidir pelo Tribunal Arbitral são:
1. Saber se, para efeitos de liquidação de imposto sucessório, o ato praticado pela AT de fixação do valor da quota, nos termos do artigo 77.º do CIMSISSD, que serviu de base à liquidação, é suscetível de avaliação, ao abrigo do artigo 87.º do CIMSISSD;
2. Sem prejuízo da questão 1., saber qual é a consequência para a falta de notificação do ato de avaliação de quota social realizado ao abrigo do artigo 87.º do CIMSISSD;
Adicionalmente, o Tribunal Arbitral fixará também o valor da causa, impugnado pela Requerida, nos termos do artigo 29.º n.º 1 alíneas a) e e) do RJAT, 13.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e 306.º do Código de Processo Civil (CPC).
Para além do supra indicado, a Requerida alega verificarem-se exceções que, a serem assim consideradas, determinam a absolvição da instância e/ou a absolvição do pedido. Assim, proceder-se-á, em primeiro lugar, à apreciação, nos termos do disposto no artigo 29.º n.º 1 alíneas a) e e) do RJAT, 13.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e 608.º n.º 1, do CPC:
1. Da ineptidão do pedido apresentado pela Requerente que, a ser assim considerada, determina a nulidade do processo, constituindo exceção dilatória que determina a absolvição da instância, nos termos dos artigos 186.º e 577.º do CPC;
2. Da intempestividade do pedido apresentado pela Requerente que, a ser assim considerada, configura exceção perentória, determinante da absolvição do pedido, nos termos do artigo 576.º n.º 3 do CPC.
VI. Matéria de Facto
Com relevância para a apreciação do pedido da Requerente, são os seguintes os factos que se dão por provados, com base nos documentos juntos ao processo, e não contestados pela Requerida:
1. Em 16.10.2003 faleceu no estado de viúva B…, mãe da Requerente, sem testamento e com duas herdeiras, a saber, a Requerente e C…;
2. Foi instaurado no Serviço de Finanças de Lisboa … o processo de liquidação de Imposto sobre as Sucessões e Doações n.º…;
3. Da relação de bens apresentada constava uma quota com o valor nominal de 31.409,84 € (trinta e um mil quatrocentos e nove euros e oitenta e quatro cêntimos) na Sociedade D…, Lda., com sede na Rua…, lote…, loja…, …, Odivelas;
4. Os Serviços de Inspeção da Direção de Finanças de Lisboa fixaram àquela quota o valor de 598.468,76 € (quinhentos e noventa e oito mil quatrocentos e sessenta e oito euros e setenta e seis cêntimos), nos termos do artigo 77.º do CIMSISD;
5. As herdeiras foram notificadas da liquidação de Imposto Sucessório efetuada pelo Serviço de Finanças de Lisboa … em 24.02.2005, em 04.03.2005;
6. A Requerente contestou o valor atribuído à quota supra identificada nos termos do artigo 87.º do CIMSISD, requerendo a sua avaliação;
7. No Serviço de Finanças de … foi efetuada a avaliação da quota, em 01.09.2005, tendo comparecido os louvados da AT e o louvado da Requerente. Tal avaliação foi remetida ao Serviço de Finanças de Lisboa … em 22.06.2009;
8. A Requerente não foi notificada do resultado da avaliação da quota efetuada pelo Serviço de Finanças de…;
9. O Serviço de Finanças de Lisboa … procedeu à reforma da liquidação de Imposto Sucessório em 10.07.2009, determinando o valor global de imposto a pagar de 64.003,44 € (sessenta e quatro mil e três euros e quarenta e quatro cêntimos);
10. A Requerente e a sua irmã pagaram o imposto, tendo beneficiado de desconto de 4.800,26 € (quatro mil e oitocentos euros e vinte e seis euros), pagando assim o valor de 54.402,92€ (cinquenta e quatro mil quatrocentos e dois euros e noventa e dois cêntimos);
11. A Requerente solicitou ao Serviço de Finanças de Lisboa…, em 13.08.2009, que procedesse à notificação daquela avaliação;
12. O Serviço de Finanças de Lisboa … solicitou à Requerente, por ofício de 24.09.2009, que substituísse aquele requerimento por reclamação graciosa ou impugnação judicial;
13. A Requerente apresentou reclamação graciosa, em 28.12.2009, requerendo a anulação da liquidação do imposto com base em preterição de formalidades legais e a notificação da avaliação;
14. A Requerente foi notificada do projeto de decisão de indeferimento da reclamação graciosa por ofício de 14.04.2010;
15. A Requerente exerceu direito de audição prévia. Por ofício de 14.11.2011, foi indeferida a reclamação graciosa;
16. Em 14.12.2011, a Requerente interpôs recurso hierárquico daquela decisão, tendo sido notificada por ofício de 06.03.2014 do projeto de decisão de indeferimento do mesmo;
17. A Requerente exerceu o seu direito de audição prévia;
18. À Requerente foi notificado em 23.07.2015 o despacho de indeferimento do recurso hierárquico.
A convicção sobre os factos dados como provados fundou-se na prova documental junta pelas Partes, cuja autenticidade e correspondência à realidade não foram questionadas.
Não existem, com relevância para o processo, outros factos que não se considerem provados.
VII. Matéria de Direito
A. Matéria de Exceção
1. Começa a Requerida por alegar que a petição de pronúncia arbitral é inepta, porquanto o pedido se relaciona com a liquidação do imposto sucessório, pedindo-se a sua anulação, mas atendendo à causa de pedir, esta situa-se ao nível da falta de notificação do resultado da avaliação de um bem em concreto - a quota na sociedade comercial - pretendendo a Requerente ser notificada do resultado da avaliação que requereu em 28 de Março de 2005, ao abrigo do artigo 87.º do CIMSISSD, para que possa requerer 2.ª avaliação e, esgotados os meios graciosos, se o assim entender, impugnar o valor e que em momento algum da petição se assaca a ilegalidade da liquidação do imposto sucessório, tão-somente se contesta, nesta sede, o facto de nunca ter sido notificada da avaliação de um bem que entrou na liquidação do imposto.
Assim, na perspectiva da Requerida, havendo contradição entre o pedido e a causa de pedir, como ilustra todo o pedido arbitral, verifica-se a ineptidão da petição de pronúncia arbitral – artigo 186.º n.º 2, alínea b) do CPC, aplicável ao processo tributário por força do artigo 2.º, alínea e) do CPPT e consequentemente será nulo todo o processo, nos termos do n.º 1 do artigo 186.º do CPC, constituindo tal uma exceção dilatória - alínea b) do artigo 577.º do CPC, de conhecimento oficioso - artigo 578.º do Código de Processo Civil, pelo que o tribunal estará impedido de conhecer o mérito da causa, impondo-se a absolvição da instância – n.º 2 do artigo 576.º do CPC.
Ressalvado o respeito devido, entende-se que não assiste qualquer razão à Requerida.
Com efeito, inexiste qualquer contradição entre a arguição da ineficácia decorrente da falta de notificação da avaliação, e a ilegalidade da liquidação que se lhe sucede. De facto, e como adiante se verá, a ineficácia decorrente da falta de notificação da avaliação, pode projetar-se na legalidade da liquidação subsequente, na medida em que da ausência de produção de efeitos da avaliação decorrerá que, para efeitos da liquidação que a pressupõe tudo se tenha de passar como se a avaliação não tivesse ocorrido, com as consequentes repercussões ao nível do juízo de legalidade a operar.
Deste modo, e pelo exposto, improcede a arguida exceção.
2. Mais alega a Requerida que o pedido de impugnação da liquidação do imposto é extemporâneo, já que este foi liquidado e pago em 2009, logo, e, nos termos do artigo 102.º do CPPT, a impugnação será apresentada no prazo de três meses contados a partir do termo do prazo para pagamento voluntário das prestações tributárias legalmente notificadas ao contribuinte.
Mais uma vez, entende-se não assistir aqui razão à Requerente.
Com efeito, e como refere a Requerente, o prazo para impugnação judicial é três meses contados a partir da notificação da decisão do Recurso Hierárquico, como decorre da alínea a) do nº 1 do artº10º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, pelo que o pedido é tempestivo, devendo, também esta exceção improceder.
B. Da (i)legalidade da liquidação impugnada
1. A primeira questão a decidir no processo é a de saber se, para efeitos de liquidação de imposto sucessório, o ato praticado pela AT de fixação do valor da quota, nos termos do artigo 77.º do CIMSISSD, que serviu de base à liquidação, é suscetível de avaliação, ao abrigo do artigo 87.º do CIMSISSD.
· Para efeitos de liquidação do imposto sobre as sucessões e doações, o valor das quotas ou partes em sociedades que não sejam por ações determina-se pelo último balanço, ou pelo valor atribuído em partilha ou liquidação dessas sociedades, ou na relação dos bens, nos termos da regra 2.ª, §3.º do artigo 20.º, salvo se, não continuando as sociedades com o herdeiro, legatário ou donatário do sócio falecido ou doador, o valor das quotas ou partes tiver sido fixado no pacto social (cfr. regra 3.ª, § 3.º do mesmo preceito).
· O chefe do serviço de finanças remeterá, por intermédio da direção de finanças do distrito, aos serviços competentes da AT o duplicado do extrato do balanço, havendo-o, e demais elementos apresentados ou de que dispuser (cfr. artigo 77.º).
· Feita ou reformada a liquidação, os contribuintes, seus representantes legais ou mandatários serão dela notificados, e sê-lo-ão pessoalmente ou pela forma prevista no artigo 114.º se estiverem no continente ou nas regiões autónomas dos Açores e da Madeira e for conhecido o lugar onde se encontrem (cfr. artigo 86.º).
· No prazo de oito dias a contar da notificação, os contribuintes que não se conformarem com os valores sobre que foi liquidado o imposto poderão contestá-los, por si, seus representantes legais ou mandatários, requerendo avaliação dos bens ainda não avaliados no processo, salvo tratando-se de determinados bens onde não se incluem as partes sociais referidas no presente processo (cfr. artigo 87.º).
· Em relação aos bens que forem objecto de pedido de avaliação, suspender-se-ão todas as diligências ulteriores à liquidação, devendo reformar-se esta, de acordo com os valores que lhes vierem a ser atribuídos, e notificar-se de novo aos interessados nos termos do artigo 86.º (cfr. § 1.º do artigo 87.º).
· Quando houver de proceder-se à avaliação de bens, e estes não sejam prédios omissos na matriz, nela inscritos sem valor patrimonial ou terrenos considerados para construção, o chefe do serviço de finanças notificará o contribuinte para comparecer perante ele dentro de oito dias, a fim de nomear louvado, sob pena de este ser nomeado à revelia (cfr. artigo 93.º).
· A avaliação será reduzida a termo no processo, e o termo assinado por todos os que nela intervieram, e será em seguida notificada ao contribuinte (cfr. artigo 95.º).
· Se o contribuinte ou o chefe do serviço de finanças não concordarem com o resultado da avaliação, poderá ser requerida ou promovida, no prazo de oito dias contados da data da notificação, uma segunda avaliação, a efetuar por louvados diferentes, em número de três, sendo dois nomeados pela AT, um dos quais só terá voto de desempate, e o terceiro pelo contribuinte, seguindo-se, quanto ao mais, o estabelecido para a primeira avaliação (cfr. artigo 96.º).
· Assim, sendo o valor das quotas sociais determinado pelo último balanço, não pode dizer-se que as mesmas foram avaliadas, pelo que, tratando-se de bens não excecionados no artigo 87.º do CIMSISD, o ato praticado pela AT de fixação do valor da quota, nos termos do artigo 77.º do CIMSISSD, que serviu de base à liquidação, é suscetível de avaliação ao abrigo do artigo 87.º, a realizar nos termos do artigo 93.º do CIMSISSD.
Este o entendimento da jurisprudência do STA, conforme, entre outros, o Acórdão de 13-04-2011 (Processo n.º 0926/10), no sumário do qual pode ler-se:
“ I – Para efeitos de liquidação de imposto sucessório, os actos praticados pela Administração Tributária de fixação dos valores que serviram de base à liquidação são susceptíveis de avaliação, com excepção dos casos expressamente indicados no n.ºs 1.º a 3.º do art. 87.º do CIMSISD.
II – Os casos em que o imposto sucessório é liquidado com base no valor de quotas de sociedades fixado pela Administração Tributária, nos termos do art. 77.º do CIMSISD, estão abrangidos pelo regime do corpo daquele art. 87.º, desde que não tenha ainda havido avaliação no processo administrativo de liquidação.
III – Assim, os contribuintes que discordem do acto de fixação do valor das quotas, subjacente ao acto de liquidação de imposto sucessório que lhes for notificado, devem contestá-lo, no prazo de oito dias, sendo a consequência de não o fazerem a caducidade do direito de contestarem a referida fixação “.
2. Quanto à segunda questão, ou seja, a de saber qual a consequência para a falta de notificação do ato de avaliação de quota social realizado ao abrigo do artigo 87.º do CIMSISSD
· Como supra referido, se o contribuinte ou o chefe do serviço de finanças não concordarem com o resultado da avaliação, poderá ser requerida ou promovida, no prazo de oito dias contados da data da notificação, uma segunda avaliação, a realizar nos termos do artigo 96.º do CIMSISD, seguindo-se, quanto ao mais, o estabelecido para a primeira avaliação.
· A falta de notificação do resultado da avaliação, realizada ao abrigo do artigo 87.º, é impeditiva da sua definitividade horizontal por não haver chegado a exteriorizar-se, sendo determinante da sua ineficácia.
· Com efeito, a eficácia da decisão depende da sua notificação, cfr. n.º 6 do artigo 77.º da Lei Geral Tributária, pelo que deverá entender-se, relativamente a qualquer decisão procedimental, que só com a notificação se produzirão os efeitos do acto.
· No mesmo sentido o n.º 1 do artigo 36.º do CPPT : «Os actos em matéria tributária que afectem os direitos e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados ».
· Como referem Diogo Leite Campos e outros[1], « (…) perante o preceituado do n.º 6 do art. 77.º da LGT, tratando-se de uma decisão de um procedimento tributário (…), parece dever concluir-se que não poderá proceder-se à prática do subsequente acto de liquidação do tributo sem prévia notificação, pois, antes desta, aquela decisão será ineficaz ».
· Também no processo 694/2014-T do CAAD[2], se escreveu que :
«entende-se que a falta de (ou a ilegalidade invalidante da) notificação de um acto de tributário, não contende com a validade daquele, mas, unicamente, com a sua eficácia.
Não quer isto dizer, contudo, que a falta de (ou a ilegalidade invalidante da) notificação de um acto não possa repercutir-se na legalidade de um acto subsequente, que o pressuponha. Assim, por exemplo e no caso, admite-se que falta de (ou a ilegalidade invalidante da) notificação de um acto destacável de fixação da matéria colectável, gere, por vício de procedimento, a invalidade do acto de liquidação subsequente.
Continuando com o Exm.º Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, “o interessado poderá atacar o acto de liquidação com fundamento na ineficácia do acto de avaliação em que aquela assenta, que impede que ele possa produzir, mesmo indirectamente, efeitos em relação ao destinatário.”[5].
Em conclusão, e transpondo o quanto se vem de dizer para o caso concreto, considera-se que a falta de (ou a ilegalidade invalidante da) notificação do acto de avaliação indirecta que ocorreu a montante do acto de liquidação objecto da presente acção arbitral, gerando a ineficácia daquele em relação ao Requerente, será susceptível de invalidar a referida liquidação, já que esta pressupõe legalmente a existência de um acto de avaliação prévio, válido e eficaz
[5] “CPPT – Anotado e Comentado”, Áreas Editora, 2006, Vol. I, p. 426.».
· Além do mais sempre se dirá que, de harmonia com o disposto no do § 1.º do n.º 3 do artigo 87.º, as diligências ulteriores à liquidação de 24-02-2005 deveriam ter sido suspensas até à preclusão do direito a ser requerida 2.ª avaliação, nos termos do artigo 96.º, pelo que a reforma da liquidação, realizada em 10-07-2009, é ilegal por vício de violação de lei.
VIII – Reembolso das quantias pagas e juros indemnizatórios
A Requerente pede reembolso das quantias pagas e juros indemnizatórios, tendo-se provado que pagou a quantia liquidada de 54 402,92 €.
O artigo 43.º, n.º 1, da LGT estabelece que «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido».
No caso em apreço, o erro que afeta a liquidação é imputável à Autoridade Tributária e Aduaneira que praticou o ato de liquidação (reforma), apesar de o mesmo ser ilegal.
Por isso, a Requerente tem direito a ser reembolsada da quantia que pagou (artigos 100.º da LGT e 24.º, n.º 1, do RJAT) e a juros indemnizatórios desde a data do pagamento da quantia, 31-08-2009, até reembolso, à taxa legal supletiva, nos termos dos artigos 43.º, n.ºs 1 e 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, artigo 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril.
IX - Decisão
Nestes termos, acordam neste Tribunal Arbitral em:
a) Julgar improcedentes as exceções suscitadas pela Requerida (ineptidão da petição de pronúncia arbitral por contradição entre o pedido e a causa de pedir e intempestividade do pedido);
b) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;
c) Anular a liquidação (reforma) efetuada no Processo do imposto sucessório n.º…, em 10-07-2009, no valor de 64 003,44 €;
d) Julgar procedente o pedido de condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira a reembolsar a quantia paga pela Requerente, no montante de 54 402,92 €, acrescida de juros, à taxa legal, desde a data do pagamento até o reembolso da quantia paga.
Valor do processo
De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.º 2, do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT e artigo 13.º do CPTA, fixa-se ao processo o valor de 64 003,44 €, por ser esse o valor da liquidação cuja anulação se pretende. Embora a Requerida entenda que o valor da acção deveria corresponder ao valor do imposto efectivamente pago, o certo é que a posição sustentada carece de fundamento legal que, de resto, não é sequer sugerido.
Custas
Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em 2 448,00 €, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.
Notifique.
Lisboa, 26-04-2016.
O Árbitro Presidente,
(José Pedro Carvalho)
O Árbitro Adjunto
(Ana Pedrosa Augusto)
O Árbitro Adjunto
(Rui Ferreira Rodrigues - Relator)
Texto elaborado em computador, nos termos do disposto no artigo 131.º, n.º 5, do CPC, aplicável por remissão do artigo 29.º, n.º 1, al. e), do RJAT.
[1] “Lei Geral Tributária”, Anotada e comentada, 4.ª Edição,2012, Editora Encontro da Escrita, pág. 68”