DECISÃO ARBITRAL
I – RELATÓRIO
A. – PARTES
A…, a seguir designado por Requerente, com o número de contribuinte…, com morada na Avenida … Lote…, nº…, …, …-… Amora, veio requerer em 28 de Setembro de 2015 a constituição do tribunal arbitral em matéria tributária, ao abrigo do prescrito nos art. 2º, nº 1, alínea a) do Decreto – Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico de Arbitragem Tributária - RJAT) e nos arts. 1º, alínea a) e 2º da Portaria nº 112 – A/2011, de 22 de Março, com a finalidade de ser dirimido o litígio que a opõe à Autoridade Tributária e Aduaneira, que doravante será designada por Requerida.
B. – CONSTITUIÇÃO DO TRIBUNAL
1. O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Presidente do CAAD em 30/09/2015 e automaticamente notificado ao Requerente e à Autoridade Tributária e Aduaneira em 30/09/2015, tendo o Presidente do respectivo Conselho Deontológico designado o signatário como árbitro do Tribunal Arbitral Singular, ao abrigo do disposto no art. 6º, nº 1, do RJAT, encargo este que foi aceite, nos termos legalmente estabelecidos.
2. Em 23/11/2015, as Partes foram notificadas dessas designações, nos termos das disposições combinadas do art. 11º, nº 1, alínea b) do RJAT, nos artigos 6º e 7º do Código Deontológico, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros.
3. Nestas circunstâncias, o Tribunal foi constituído em 11/12/2015, nos termos do preceituado na alínea c), do nº 1, do art. 11º do Decreto – Lei nº 10/2011, o que foi notificado às Partes nessa data.
C. – PRETENSÃO
Constitui objecto do pedido de constituição de Tribunal Arbitral a liquidação do Imposto do Selo, referente ao ano de 2012, no montante de 11.118,00 euros, com fundamento na verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo, relativamente ao prédio urbano inscrito sob o actual artigo matricial…, da União das Freguesias de…, … e…, pretendendo a Requerente que o Tribunal Arbitral declare a ilegalidade dessa liquidação, e em consequência, determine a restituição do imposto pago referente à 1ª e 2ª prestações, acrescido dos juros indemnizatórios, nos termos e para os efeitos previstos nas disposições conjugadas dos arts. 43º e 100º da L.G.T. e ainda do art. 61º do CPTT.
D. – TRAMITAÇÃO DO PROCESSO
Após a comunicação da data da constituição do Tribunal Arbitral, em 11/12/2015, seguiram-se os posteriores termos processuais na forma seguinte:
- Em 14/12/2015 – Foi notificada a Requerida para, nos termos dos nºs 1 e 2 do art. 17º do RJAT, apresentar resposta no prazo de 30 dias e, querendo, solicitar produção de prova adicional e remeter ao Tribunal Arbitral cópia do processo administrativo;
- Em 26/01/2016 – A Requerida apresentou Resposta ao Pedido de Pronúncia Arbitral, tendo inserido na “Plataforma” on line do CAAD o processo administrativo;
- Em 05/02/2016 – O Tribunal concedeu à Requerente o prazo de 10 dias para se pronunciar, querendo, quanto à matéria da excepção constante da Resposta;
- Em 16/02/2016 – A Requerente pronunciou-se quanto à matéria da excepção constante da Resposta oferecida pela Requerida;
- Em 20/02/2016 – O Tribunal dispensou a realização da reunião prevista no art. 18º do RJAT, por já ter sido exercido o contraditório quanto à excepção, e fixou o prazo de 10 dias para a Requerente poder produzir alegações escritas, podendo a Requerida produzi-las com carácter sucessivo relativamente às produzidas pelo sujeito passivo a contar da data da notificação das alegações da Requerente, ou da falta da apresentação das mesmas, e fixou a data de 22 de Abril de 2016 para a prolação da decisão final.
- Em 15/03/2016 – A Requerente apresentou alegações escritas.
- A Requerida não apresentou alegações escritas.
- Em 22/04/2016 – O Tribunal proferiu a decisão arbitral.
E. – PRETENSÃO DA REQUERENTE E SEUS FUNDAMENTOS
A fundamentar o Pedido de Pronúncia Arbitral, a Requerente alegou, em síntese, o seguinte:
— Constitui objecto do pedido de constituição de Tribunal Arbitral a liquidação de Imposto do Selo, referente ao ano de 2012, no montante de € 11.118,00 (onze mil, cento e dezoito euros), com fundamento na verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo, relativamente ao prédio urbano inscrito sob o (actual) artigo matricial…, da União das freguesias…, … e…, concelho do ..., distrito de Setúbal.
— O pedido de constituição de Tribunal arbitral foi deduzido na sequência do despacho proferido em 26 de Junho de 2015, pelo Chefe do Serviço de Finanças do…, através do qual indeferiu o pedido de revisão oficiosa deduzido pelo Requerente.
— O Requerente é dono e legitimo possuidor do prédio urbano supra identificado.
— Trata-se de um prédio urbano para construção.
— Em 2012, o terreno tinha, de acordo com o projecto de viabilidade de construção fornecido pela Câmara Municipal do…, aprovação para diferentes afectações.
— O projecto de viabilidade de construção prévia, em 2012, a afectação do terreno a comércio e a habitação.
— Em 27 de Dezembro de 2012, o VPT atribuído pela AT àquele imóvel era, em virtude de avaliação geral, de € 555.650,00 (quinhentos e cinquenta mil, seiscentos e cinquenta euros).
— O prédio sub judice tem, actualmente, o valor patrimonial tributário de € 1.111.800,00 (um milhão, cento e onze mil e oitocentos euros), do qual:
a) € 534.357,62 (quinhentos e trinta e quatro mil, trezentos e cinquenta e sete euros e sessenta e dois cêntimos), apurados por referência a comércio e
b) € 577.436,06 (quinhentos e setenta e sete mil, quatrocentos e trinta e seis euros e seis cêntimos), apurados por referência a habitação.
— O valor patrimonial tributário (VPT) supra identificado foi apurado pela Requerida em 15 de Fevereiro de 2013.
— O Requerente foi notificado pela Requerida para efectuar o pagamento de € 11.118,00 (onze mil, cento e dezoito euros), a título de Imposto do Selo do ano de 2012, apurado em sede da liquidação.
— O Requerente efectuou o pagamento quer da 1.ª prestação, quer da 2.ª prestação, nos valores indicados pela Requerida e dentro dos prazos que lhe foram concedidos para o efeito.
— Em 10 de Fevereiro de 2015, o Requerente deduziu pedido de revisão oficiosa da referida liquidação.
— Tendo sido nessa sequência proferido, em 26 de Junho de 2015, pelo Chefe do Serviço de Finanças do…, o despacho de indeferimento do referido pedido.
— Em 17 de Agosto de 2015, pelo Vereador do Pelouro, no uso de competência delegada pelo Senhor Presidente da Câmara Municipal do…, foi deferido o projecto de arquitectura, que prevê a construção de um edifício de serviços no terreno para construção em causa.
— Na opinião do Requerente, a liquidação sub judice não se encontra fundamentada, nos termos do disposto nos artigos 77.º, e seguintes, da Lei Geral Tributária (LGT), devendo por conseguinte, no seu entender, ser anulada nos termos dos artigos 135.º, do CPA, aplicável por remissão da alínea d), do artigo 2.º, do CPPT.
— A Requerida não invocou os factos que nos termos da posição por si assumida, legitimavam a tributação ali implícita.
— A referida liquidação não remete para qualquer parecer ou informação do qual conste a fundamentação de facto e de Direito que levou à emissão da mesma.
— Embora o acto de liquidação notificado seja omisso quanto à sua fundamentação, aparentemente tal tributação ocorreu por incidência da verba 28.1 da TGIS.
— Por outro lado, a verba 28.1 da TGIS foi introduzida pelo artigo 4.º, da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro, com a seguinte redacção:
“28 - Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a (euro) 1 000 000 - sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:
28.1 - Por prédio com afetação habitacional - 1 %”
— Na óptica do Requerente, para o ano de 2012, o legislador não determinou a incidência dos terrenos para construção, mas tão-somente os prédios (urbanos), dado que apenas estes podem ter uma afectação habitacional, uma vez que os terrenos para construção não são susceptíveis de ter essa afectação.
— Pois que apenas há neles a expectativa jurídica de vir a ser (futuramente) edificada tal realidade habitacional.
— E apenas uma vez concluída, poderá haver potencial ou real afectação, ou alocação concreta ao fim habitacional.
— Apenas com a redacção dada pela Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro, a verba 28.1 passou a abranger também os terrenos para construção, sendo que a distinção entre prédios e terrenos para construção decorre do estabelecido no artigo 6.º, do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI).
— Norma essa através da qual o legislador dispôs para o futuro, atenta a proibição da retroactividade no direito tributário.
— Em face desta alteração sobre a incidência objectiva dos prédios urbanos - incluindo agora os terrenos para construção – para efeitos do Imposto do Selo (IS), entende o Requerente que em 2012, ano do imposto a que se refere a presente liquidação, não há incidência daqueles.
— Pelo que conclui o Requerente que não ocorreu o facto tributário, sendo a liquidação ilegal.
— Acrescentou o Requerente que a norma, com a redacção em vigor no ano de 2012, não só se reporta a prédios, como exige que aqueles tenham a já referida afectação habitacional.
— O que, no entender do Requerente, não ocorre, pois não há afectação à habitação, mas quando muito, destinação a habitação.
— O legislador fiscal reserva o termo destinação para uma susceptibilidade abstracta ou potencialidade, e o termo afectação para uma alocação concreta, ou utilização funcional efectiva.
— Assim sendo, nunca a afectação habitacional reclamada pela norma de incidência podia ter como objecto o terreno para construção, pois há nele, quando muito, uma potencialidade abstracta de vir futuramente a ter aquele fim ou específica utilização.
— Acresce ainda que, por forca do disposto no artigo 6.°, n.° 1, alínea a), da Lei n.° 55- A/201 2, o facto tributário reporta-se a 31.10.2012.
— Na data do facto tributário, o prédio em questão não tinha ainda um valor patrimonial tributário igual ou superior a €1.000.000,00 (um milhão de euros), pelo que, também por esta via, não se verificam, igualmente, os pressupostos de tributação.
— Pois, tal valor patrimonial apenas foi determinado em 15 de Fevereiro de 2013, através da ficha de avaliação n.º…, na sequência da Mod. 1 do lMl n.°…, entregue em 30 de Novembro de 2012.
— Assim, no entender do Requerente, à data do facto tributário - 30 de Outubro de 2012 - o mencionado prédio urbano não tinha um valor patrimonial tributário igual ou superior ao limiar exigido pelo legislador na norma de incidência, não podendo tal avaliação, realizada em Fevereiro de 2013, ter efeitos retroactivos.
— E ainda que se considerasse esta avaliação, o valor patrimonial do imóvel perfaz o montante global de €1.111.800 apenas se somadas as duas destinações: comércio e habitação.
— À parcela eventualmente afecta à habitação corresponde ao valor de € 577.436,06, não perfazendo o exigível pela norma de incidência, dado ficar aquém de € 1.000.000,00 (um milhão de euros),
— Por outro lado, e ainda que assim não fosse, a liquidação padece de erro na quantificação da obrigação tributária, já que não foi aplicado o regime transitório para o ano de 2012, com a correspondente taxa, mas antes a taxa futura de 1%, nos termos do art. 6º, n.º 1, alínea f), pontos i) e ii), da Lei n.º 55-A/2012).
— Pelo, também por esta via, a liquidação sub iudice se mostra, na sua óptica, ilegal.
— No entender do Requerente, houve erro imputável aos serviços, do qual resultou o pagamento de uma alegada dívida tributária que, na verdade, não existia.
— O que constitui o Estado na obrigação na obrigação de pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 43.º, da Lei Geral Tributária (LGT).
— Pelo que deverá ser reconhecido ao Requerente o direito a juros indemnizatórios, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 43.º, da LGT.
— Juros indemnizatórios, estes cobrem todo o período que vai desde o pagamento indevido até à emissão da nota de crédito.
F. – RESPOSTA DA REQUERIDA E SEUS FUNDAMENTOS
A Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou tempestivamente a sua Resposta, na qual alegou, em síntese, no que à questão em apreço diz respeito, o seguinte:
I – POR EXCEPÇÃO
CADUCIDADE DO DIREITO À ACÇÃO
— O Requerente peticiona unicamente que o tribunal anule o acto de liquidação sub judice.
— Encontra-se ultrapassado o prazo legalmente definido para a impugnação deste acto tributário de liquidação, em sede arbitral.
— O art.º 10.º do RJAT estabelece, quanto a actos de liquidação/autoliquidação, que o prazo para apresentar o pedido de pronúncia arbitral é de 90 (noventa) dias, remetendo, quanto ao momento do início de contagem, para aquilo que se mostra preceituado nos n.ºs 1 e 2 do art.º 102.º, nºs 1 e 2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).
— O prazo de 90 (noventa) dias tem como termo inicial o dia seguinte ao término do prazo de pagamento voluntário da prestação tributária – cf. alínea a) do n.º 1 do art.º 102.º, n.º 1 do CPPT.
— De acordo com o n.º 2 do art.º 85.º do CPPT, temos que a data limite de pagamento do imposto em causa nos autos ocorreu em 30-04-2014.
— O pedido tendente à constituição do tribunal arbitral foi apresentado a 28-09-2015.
— Pelo que o pedido formulado é intempestivo e o tribunal não pode dele conhecer.
— Tendo sido ultrapassado o prazo de impugnação directa (ou seja, do acto primário), a tempestividade do pedido apenas poderia fundar-se na existência de um qualquer meio de impugnação gracioso do acto de liquidação onde tivesse sido prolatada decisão a negar/indeferir, total ou parcialmente, as pretensões aí formuladas pelo sujeito passivo de imposto (naquilo que constituiria um acto de segundo grau).
— O Requerente impugnou administrativamente o acto tributário de liquidação.
— A Requerida indeferiu/negou a revisão do acto na dimensão que lhe havia sido solicitada.
— Não obstante ter feito alusão e identificado essas circunstâncias, o Requerente não formulou/concretizou ao Tribunal qualquer pedido tendente à anulação do que nessa sede foi decidido.
— Os poderes de cognição do Tribunal estão limitados pelo pedido, e não o podendo exceder, fica o Tribunal impedido de apreciar e declarar relativamente ao pedido formulado de anulação do acto de liquidação sub judice, nos termos do disposto nos artigos 608º, n.º 2 e 609, n.º 1 do Código de Processo Civil.
— Em consequência, entende a Requerida que o pedido formulado (conducente à declaração de ilegalidade do acto e, consequentemente à sua anulação) deve ser declarado improcedente, por intempestivo e, consequentemente, ser absolvida da instância – cf. alínea e), do n.º 1, do art.º 278.º do Código de Processo Civil vigente, aplicável ex vi alínea e) do n.º 1 do art.º 29.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro.
Subsidiariamente,
DA (alegada) FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO.
— A fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituirão neste caso, parte integrante do respectivo acto, equivalendo à falta de fundamentação a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto.
— O acto está fundamentado quando, pela motivação aduzida, se mostra apto a revelar a um destinatário normal as razões de facto e de direito que determinam a decisão, habilitando-o a reagir eficazmente pelas vias legais contra a respectiva lesividade.
— O Requerente entendeu perfeitamente o sentido e alcance das liquidações, como resulta do próprio exercício jurídico-argumentativo que fez no pedido de pronúncia arbitral.
— Pelo que conclui a Requerida que não ocorre vício formal de falta de fundamentação.
II POR IMPUGNAÇÃO
— Considera ainda o Requerente que o conceito de terreno para construção, para efeitos fiscais, não integra o conceito de prédio afecto a habitação, ao abrigo do disposto no n.º 1 do art.º 1.º, do CIS e da mesma Verba 28.1.
— O prédio em causa tem natureza de terreno para construção, conforme consta da caderneta predial, onde não existem edificações ou construções, pelo que não possuem, nem podiam possuir, licença de utilização para habitação, entendendo o Requerente que, nestes termos, o entendimento da Requerida padecerá de erro nos pressupostos de facto.
— Aliás, o prédio tem afectação habitacional, conforme consta da ficha de avaliação e da Mod. 1 de IMI.
— A determinação do VPT dos prédios urbanos no CIMI é apurada no âmbito de um procedimento próprio de avaliação, seja por impulso do sujeito passivo, seja pelas avaliações periódicas, seja ainda pela ocorrência de algum facto translativo.
— O resultado da avaliação do prédio é notificado ao sujeito passivo e, no caso de este não concordar com aquela, pode apresentar um pedido de segunda avaliação.
— Por sua vez, não concordando com o resultado da segunda avaliação por si requerida, o sujeito passivo tem à sua disposição a possibilidade de impugnar judicialmente, nos termos do CPPT o resultado daquela, com fundamento em qualquer ilegalidade.
— O Requerente não reclamou, não impugnou, não suscitou novo cálculo ou nova avaliação, pelo que a avaliação e o VPT do prédio em questão tornaram-se definitivos, carecendo o Tribunal totalmente de competência material para apurar a legalidade daquele.
— É entendimento da Requerida que os prédios em apreço, têm natureza jurídica de prédio com afectação habitacional, pelo que os actos de liquidação objecto do presente pedido de pronúncia arbitral devem ser mantidos por consubstanciarem uma correcta interpretação da Verba 28.1 da TGIS, aditada pela Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro.
— A Lei n.º 55-A/2012, de 29/ de Outubro veio alterar o art.º 1º do CIS, e aditar à TGIS a verba 28.1, passando o IS a incidir também sobre a propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI) seja igual ou superior a €1.000.000,00.
— O imposto do selo incidiria assim sobre todos os actos, contratos, documentos, títulos, papéis e outros factos ou situações jurídicas previstos na tabela geral, incluindo as transmissões gratuitas de bens.
— Na ausência de qualquer definição sobre os conceitos de prédio urbano, terreno para construção e afectação habitacional, em sede de IS há que recorrer ao CIMI na procura de uma definição que permita aferir da eventual sujeição a IS, de acordo com o previsto no n.º 2 do art.º 67.º do CIS na redacção dada pela Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro.
— Nos termos da referida disposição legal, às matérias não reguladas no Código, respeitantes à verba 28.1 da TGIS aplica-se subsidiariamente o disposto no CIMI.
— Dispõe o n.º 1 do art.º 2.º do CIMI que
«prédio é toda a fracção de território, abrangendo águas,
plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com carácter de permanência, desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou colectiva e, em circunstâncias normais tenha valor económico, bem como as águas, plantações, edifícios ou construções, nas circunstâncias anteriores, dotados de autonomia económica em relação ao terreno onde se encontrem implantados, embora situados numa fracção de território que constitua parte integrante de um património diverso ou não tenha natureza patrimonial».
— De acordo com o disposto no n.º 1 do art.º 6.º do CIMI, os prédios urbanos dividem-se em prédios habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços, terrenos para construção e outros.
— Por seu turno, a classificação dos prédios habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços, está dependente do respetivo licenciamento, ou na sua falta do destino normal para o fim em causa e não da sua afectação (cf. n.º 2 do art.º 6.º do CIMI).
— A noção de afectação do prédio urbano encontra assento na parte relativa à avaliação dos imóveis, porquanto a avaliação do imóvel (finalidade) incorpora valor ao imóvel, constituindo um facto de distinção determinante (coeficiente) para efeitos de avaliação.
— Conforme resulta da expressão “…valor das edificações autorizadas”, constante do n.º 2 do art. 45.º do CIMI o legislador optou por determinar a aplicação da metodologia de avaliação dos prédios em geral, à avaliação dos terrenos para construção, sendo-lhes por conseguinte aplicável o coeficiente de afectação previsto no art.º 41.º do CIMI.
— Ao contrário do propugnado pelo Requerente, a Requerida entende que o conceito de “prédios com afectação habitacional”, para efeitos do disposto na verba 28.1 da TGIS, compreende quer os prédios edificados quer os terrenos para construção, desde logo atendendo ao elemento literal da norma.
— No que aos terrenos para construção diz respeito, o VPT corresponde, nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 45.º do CIMI, ao
«somatório do valor da área de implantação do edifício a construir, que é a situada dentro do perímetro de fixação do edifício ao solo, medida pela parte exterior, adicionado do valor do terreno adjacente à implantação.».
— Esclarecendo o n.º 2 deste preceito que o valor da área de implantação varia entre 15% e 45 % do valor das edificações autorizadas ou previstas.
— Deste modo, defende a Requerente que na avaliação do terreno para construção, atende-se necessariamente à área a construir autorizada e à utilização a ser dada a essa construção, ou seja, às características do prédio urbano que nele se vai construir.
— Em consonância, resultando clara a aplicação do coeficiente de afetação para efeitos de apuramento do VPT dos terrenos para construção, a sua consideração para efeitos de aplicação da verba 28.1 da TGIS (na redacção anterior) não pode ser ignorada.
— Entende a Requerida que a liquidação em crise consubstancia uma correcta interpretação e aplicação do direito aos factos, não padecendo de vício de violação de lei, devendo, em consequência, julgar-se improcedente a pretensão aduzida e a sua absolvição do pedido.
— Alega ainda o Requerente que, tendo em consideração a aplicação do regime transitório previsto na Lei n.° 55-A/2012, de 29 de Outubro, não estarem preenchidos os pressupostos de facto e de direito para a incidência da Verba 28.1 da TGIS.
— A Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro estabeleceu, no seu art.º 6.º, um conjunto de disposições transitórias, resultando deste quadro normativo que o legislador previu a existência de dois factos tributários no que respeita ao ano 2012:
(1) um primeiro facto em 31-10-2012, que tem por base a situação e o valor patrimonial do prédio em 31-12-2011, com liquidação e pagamento do imposto 20-12-2012, e
(2) um (2) segundo facto em 31-12-2012, que tem por base a situação e o valor patrimonial do prédio em 31-12-2012, com a sua liquidação e pagamento a partir de abril do ano 2013.
— E, consequentemente, no que respeita ao ano 2012 e aos prédios urbanos inscritos na matriz como tendo afetação habitacional foram emitidas duas liquidações:
(1) uma primeira até ao final de Novembro de 2012 com data limite de pagamento em 20-12-2012, que teve por base a situação e o valor do prédio em 31-12-2011, e
(2) uma segunda liquidação, em Fevereiro e Março de 2013, com pagamento em uma, duas ou três prestações, a partir de abril de 2013, que teve por base a situação e o valor do prédio em 31-12-2012.
— O legislador pretendeu, assim, uniformizar o procedimento de liquidação da verba 28.1 da TGIS e de IMI, por forma a que, nas liquidações efetuadas anualmente, fosse considerado como base tributável, o valor patrimonial tributário constante da matriz em 31-12 do ano a que as mesmas respeitam.
— No caso em apreço estamos perante uma liquidação feita em 2013, com base no valor patrimonial do imóvel em 31-12-2013, efetuada ao abrigo do n.º 2 do citado art.º 6.º.
— A entender-se, como vem defendido, que, para o ano 2012, o único facto tributário situa-se em 31-10-2012 e que a única liquidação teria que ser feita até final de Novembro de 2012, ficaria totalmente esvaziado de sentido o n.º 2 da referida norma, porquanto não seria possível liquidar imposto do selo em 2013 tendo como base tributável o valor patrimonial do imóvel utilizado para efeitos da liquidação de IMI do mesmo ano (VPT em 31-12-2012).
— No caso concreto, tendo o prédio sido submetido à avaliação geral dos prédios urbanos, o valor patrimonial que lhe foi atribuído entrou em vigor em 31-12-2012, para efeitos de IMI e da verba 28 da TGIS, conforme previsto no n.º 4 do art.º 15.º-D do DL n.º 287/2003 de 12 de Novembro.
— E verificando-se, como sucede, que à data de 31-12-2012, o Requerente era proprietário de um terreno para construção, ao qual foi atribuída afetação habitacional no âmbito da respetiva avaliação, e que o valor patrimonial do mesmo, relevante para efeitos de liquidação (o mesmo que é utilizado para as liquidações de IMI efetuadas em 2013), era superior a um milhão de euros, têm-se por verificados os pressupostos da incidência do imposto.
— Sendo aplicável a taxa constante da TGIS, no momento em que o imposto é devido, conforme decorre do art.º 22° do CIS, ou seja 1%, tal como foi considerado na liquidação, fenecendo, em consequência, também aqui as pretensões do Requerente
— Refere-se ainda que, não obstante o prédio em apreço ter duas afectações distintas, e tendo a avaliação calculado separadamente o valor de cada uma delas, a verdade é que se trata, tão só e apenas, de somente um prédio.
— Sendo certo que estamos perante um único prédio com duas afectações distintas, constitui entendimento da Direcção de Serviços de Avaliações da Requerida que deve aplicar-se na validação da afectação e correspondente coeficiente de localização o critério da dominância do mercado imobiliário na zona.
— Pelo que, tendo em conta que o prédio objecto do pedido de pronúncia arbitral é maioritariamente afecto a habitação, é essa a afectação relevante para efeitos de avalização e inscrição matricial, pelo que se verificam os pressupostos objectivos e subjectivos da sujeição a imposto de selo, em concreto da verba 28.1 da TGIS.
— Para que a Requerida incorra no dever de pagamento dos juros indemnizatórios é necessário que estejam preenchidos os seguintes requisitos:
a) Que haja um erro num acto de liquidação de um tributo;
b) Que ele seja imputável aos serviços;
c) Que a existência desse erro seja determinada em processo de reclamação graciosa ou de impugnação judicial;
d) Que desse erro tenha resultado o pagamento de uma dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.
— Exige-se, pois, para que a Requerida incorra no dever de pagamento de juros indemnizatórios, que se verifique uma qualquer ilegalidade que denote o carácter indevido da prestação tributária à luz das normas substantivas, ilegalidade essa que terá de ser necessariamente imputável a erro dos serviços.
— Não se verificando erro imputável aos serviços na liquidação do tributo, não deve ser reconhecido à Requerente qualquer direito a juros indemnizatórios.
— A Requerida limitou-se, portanto, a aplicar as consequências jurídicas, que, do ponto de vista fiscal, se impunham face à ocorrência dos pressupostos de facto subjacentes à correcção efectuada, pelo que deverá ser, também, julgada improcedente a impugnação quanto aos juros peticionados.
Conclui a Requerida pela improcedência da pretensão da Requerente, com a consequente absolvição do pedido.
G. – RESPOSTA DA REQUERENTE À EXCEPÇÃO DA INTEMPESTIVIDADE DO PEDIDO
— O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi deduzido pelo Requerente em 28 de Setembro de 2015, na sequência da notificação feita em 03 de Junho de 2015, da decisão proferida sobre o pedido de revisão oficiosa por si deduzido.
— Resulta evidente do teor do pedido de constituição de Tribunal deduzido pelo Requerente que se, por um lado, o mesmo tem por objecto o acto de liquidação de Imposto do Selo, referente ao ano de 2013, no montante de € 11.118,00 (onze mil, cento e dezoito euros), por outro lado, ainda, é expresso no artigo 2.º, daquele articulado que “O presente pedido de constituição de Tribunal arbitral é deduzido na sequência do despacho proferido em 26 de Junho de 2015, pelo Chefe do Serviço de Finanças do…, através do qual indeferiu o pedido de revisão oficiosa deduzido pelo aqui Requerente.”
— Assim, quanto à delimitação do objecto do pedido, o Requerente expressamente referiu a questão material controvertida – o acto de liquidação de imposto contestado – e o acto administrativo de indeferimento do pedido de revisão, dando cumprimento do disposto na alínea b), do n.º 2, do artigo 10.º, do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT).
— Na decisão proferida no processo nº 3/2015-TCAAD – invocada pela Requerida na fundamentação desta excepção –, na delimitação do objecto do pedido nenhuma referência tácita ou expressa havia sido feita ao acto de indeferimento do meio impugnatório, o que manifestamente não é aqui o caso, não podendo portanto transporem-se as conclusões dessa decisão para os presentes autos.
— Por outro lado, na decisão proferida no processo n.º 261/2013 – T – também invocada pela Requerida, apenas se extrai que, se o pedido de constituição arbitral tiver como objecto o acto administrativo de indeferimento, na delimitação do pedido, este tem de ser referido, o que, resulta expresso do pedido de constituição de Tribunal Arbitral, foi feito pelo Requerido.
— A doutrina e a jurisprudência – designadamente, a emanada pelo Supremo Tribunal Administrativo – tem concluído que quando a fase contenciosa precede uma fase administrativa, a acção é composta por dois objectos: o objecto mediato ou real, que é o acto tributário cuja legalidade foi posta em causa, e o objecto imediato ou directo, que se traduz na decisão de indeferimento do meio impugnatório do acto tributário de 1º grau.
— Se o Requerente no artigo 1.º da sua PI, mencionou o seu objecto mediato, a questão materialmente controvertida, o acto de liquidação do imposto, já no artigo 2.º daquele articulado, expressamente, referiu o objecto imediato da acção, o acto administrativo de indeferimento do pedido de revisão tributária.
— Nestes termos, o prazo para deduzir o pedido de constituição do Tribunal Arbitral não teve o seu início no termo do prazo de pagamento voluntário do imposto, mas outrossim, na data de indeferimento do pedido de revisão tributária.
- Conclui, assim, pela improcedência da excepção de caducidade.
H. – QUESTÕES A DECIDIR
Face às posições assumidas pelas Partes conforme os argumentos apresentados, são as seguintes questões que cabe apreciar e decidir:
1.– Questões Principais :
- Caducidade do direito à acção
- Ilegalidade da liquidação do imposto de selo
2 – Juros indemnizatórios – Existência, ou não, do direito a juros indemnizatórios, ao abrigo do art. 43º da LGT, no caso de ser anulada a liquidação e determinado o reembolso da importância peticionada, que teria sido indevidamente paga.
3 – Responsabilidade pelo pagamento das custas arbitrais.
H. – PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
1. O Tribunal Arbitral está regularmente constituído e é material competente, de acordo com o disposto na alínea a), do nº 1, do art. 2º do RJAT (Decreto – Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro).
2. As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se regularmente representadas, nos termos dos arts. 4º e 10º, nº 2 do RJAT e art. 1º da Portaria nº 112/2011, de 22 de Março.
3. O processo não enferma de vícios que afectem a sua validade.
I. – MATÉRIA DE FACTO
1.1 – FACTOS PROVADOS
Com relevância para a apreciação das questões suscitadas, o Tribunal dá como provados os seguintes factos:
1. O Requerente é dono e legitimo possuidor do prédio urbano inscrito sob o (actual) artigo matricial…, da União das freguesias de…, … e…, concelho do ..., distrito de Setúbal.
2. Trata-se de um prédio urbano para construção.
3. Em 2012, o terreno tinha, de acordo com o projecto de viabilidade de construção fornecido pela Câmara Municipal do…, aprovação para diferentes afectações.
4. O projecto de viabilidade de construção prévia, em 2012, a afectação do terreno a comércio e a habitação.
5. Em 27 de Dezembro de 2012, o VPT atribuído pela AT àquele imóvel era, em virtude de avaliação geral, de € 555.650,00 (quinhentos e cinquenta mil, seiscentos e cinquenta euros).
6. O prédio sub judice tem, actualmente, o valor patrimonial tributário de € 1.111.800,00 (um milhão, cento e onze mil e oitocentos euros), do qual:
a) € 534.357,62 (quinhentos e trinta e quatro mil, trezentos e cinquenta e sete euros e sessenta e dois cêntimos), apurados por referência a comércio e
b) € 577.436,06 (quinhentos e setenta e sete mil, quatrocentos e trinta e seis euros e seis cêntimos), apurados por referência a habitação.
7. O valor patrimonial tributário (VPT) supra identificado foi apurado pela Requerida em 15 de Fevereiro de 2013.
8. O Requerente foi notificado pela Requerida para efectuar o pagamento de € 11.118,00 (onze mil, cento e dezoito euros), a título de Imposto do Selo do ano de 2012, apurado em sede da liquidação.
9. O Requerente efectuou o pagamento quer da 1.ª prestação, quer da 2.ª prestação, nos valores indicados pela Requerida e dentro dos prazos que lhe foram concedidos para o efeito.
10. Em 10 de Fevereiro de 2015, o Requerente deduziu pedido de revisão oficiosa da referida liquidação.
11. Tendo sido nessa sequência proferido, em 26 de Junho de 2015, pelo Chefe do Serviço de Finanças do…, o despacho de indeferimento do referido pedido.
12. Em 17 de Agosto de 2015, pelo Vereador do Pelouro, no uso de competência delegada pelo Senhor Presidente da Câmara Municipal do…, foi deferido o projecto de arquitectura, que prevê a construção de um edifício de serviços no terreno para construção em causa.
13. Em 28 de Setembro de 2015, a Requerente solicitou a constituição do tribunal arbitral singular em matéria tributária.
I. 2 – FUNDAMENTAÇÃO DOS FACTOS PROVADOS
Os factos dados como provados estão baseados nos documentos indicados relativamente a cada um deles, e nos elementos factuais carreados para o processo pelas Partes, na medida em que a sua adesão à realidade não foi questionada.
I. 3 – FACTOS NÃO PROVADOS
Não existem factos não provados com relevância para a apreciação das questões a decidir
J. – MATÉRIA DE DIREITO
Fixada a matéria de facto, procede-se, de seguida, à sua subsunção jurídica e à determinação do Direito a aplicar, tendo em conta as questões a decidir que foram enunciadas.
Tendo sido deduzida pela Requerida a excepção da intempestividade do pedido de pronúncia arbitral, iniciar-se-á a apreciação da matéria de direito por esta questão.
No entender da Requerida, este pedido, cuja apresentação teve lugar em 28.09.2015, terá sido apresentado para além do prazo de 90 dias previstos no art. 10º, nº 1, alínea a) do RJAT.
Assim sendo, há que determinar qual o momento do início da contagem do prazo para a dedução do pedido de pronúncia arbitral.
Relativamente a esta questão abrem-se duas hipóteses:
A contagem do prazo deverá ter o seu início a partir do termo do prazo do pagamento voluntário da prestação tributária, como pretende a Requerida, ou, a partir da notificação da decisão de indeferimento da revisão oficiosa deduzida pela Requerente, como esta entende.
Esta fixação do início de contagem do prazo de 90 dias é essencial, uma vez que, como veremos, se for a data do pagamento do tributo, este pedido será extemporâneo, se for o da notificação do indeferimento da revisão oficiosa, a questão da legalidade poderá ser apreciada por este tribunal arbitral.
O art. 10º, nº 1, alínea a) do RJAT, relativamente a actos de liquidação de imposto, remete no que concerne ao início da contagem do prazo de 90 dias para o estabelecido nos nºs 1 e 2 do art. 102 do CPPT.
Quer isto dizer que, com relevância para a situação em apreço, o prazo teria tido o seu início no dia seguinte à data do pagamento voluntário da prestação tributária (art. 102, nº 1, alínea a) do CPPT), que ocorreu em 30.04.2014.
Mas, caso o Requerente tivesse impugnado neste processo o acto de indeferimento da revisão oficiosa, seria aberto um novo prazo, e o tribunal estaria habilitado a apreciar a legalidade do acto de liquidação primário, conforme é pacificamente admitido pela doutrina e pela jurisprudência do CAAD, apesar da referência explicita no art. 2º, nº 1, alínea a) à competência dos tribunais arbitrais para declararem a ilegalidade de actos de liquidação.
Atento o exposto, para se dar resposta a esta questão, é indispensável proceder a uma fixação rigorosa do objecto do pedido de pronúncia arbitral.
Na verdade estando, como estão, os poderes cognitivos deste tribunal delimitados, nesta matéria, pelos factos alegados pelas partes, não poderão ser tomadas decisões sobre questões que não tenham sido suscitadas pelas partes, nem condenar em objecto diferente do pedido, face ao disposto nos arts. 608º e 609º do CPC.
Da análise do processo decorre que o pedido de pronúncia arbitral teve expressamente como objecto o acto de liquidação do Imposto de Selo, referente ao ano de 2012, no montante de 11.118,00 euros, com fundamento na verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto de Selo, relativamente ao prédio urbano inscrito sob o actual artigo matricial…, da União das Freguesias de…, … e…, pretendendo a Requerente que o tribunal arbitral declare a ilegalidade dessa liquidação, e, em consequência, determine a restituição do imposto pago referente à 1ª e 2ª prestações, acrescido de juros indemnizatórios.
A determinação do objecto do pedido resulta clara não só do segmento inicial da petição, mas também da conclusão final, onde de forma expressa formula exclusivamente o pedido de anulação do acto de liquidação.
No artigo 2º da petição inicial, a Requerente afirma que o presente pedido é deduzido “na sequência do despacho proferido em 26 de Junho de 2015 .… que indeferiu o pedido de revisão oficiosa”.
No entanto, em todo o pedido de pronúncia arbitral não se vislumbra, para além desta referência informativa, qualquer outra alusão ao despacho de indeferimento, não havendo qualquer apreciação desse indeferimento, mormente no que aos seus fundamentos diz respeito, nem qualquer manifestação da intenção da sua impugnação.
Na verdade, em parte alguma a Requerente formulou qualquer pedido de anulação da decisão de indeferimento, pelo que a mesma não poderá ser considerada para os efeitos que pretende, estando à margem do pedido de pronúncia.
Ao invés, o que está posto em causa exclusivamente pelo Requerente é a impugnação directa do acto da liquidação, sem que, insiste-se, concretize, ou formule qualquer pedido tendente à anulação do indeferimento da revisão oficiosa.
Assim sendo, o objecto imediato e único do pedido, nos termos em que foi delimitado pelo Requerente, é a ilegalidade do acto da liquidação e não o indeferimento da revisão oficiosa, designadamente, a sua anulação.
Delimitado que foi com precisão o objecto do pedido de pronúncia arbitral, o qual foi pela Requerente circunscrito, como se disse, ao acto de liquidação do imposto, forçoso será concluir que o prazo que conta é o da impugnação deste acto, razão pela qual tendo sido apresentado o pedido em 28/09/2015, foi excedido o prazo de 90 dias estabelecido na alínea a), do nº 1, do art. 10º do RJAT, uma vez que o pagamento voluntário ocorreu em 30.04.2014.
Assim sendo, considera-se procedente a excepção invocada, ficando prejudicada a apreciação das restantes questões suscitadas nos autos.
Quanto à responsabilidade pelas custas arbitrais, a lei é taxativa na imputação da responsabilidade pelo pagamento das custas à parte que lhe der causa, face ao disposto nos nºs 1 e 2, do art. 527 do Código do Processo Civil, aplicável por força do art. 29º, nº 1, alínea e) do RJAT.
Assim sendo, a responsabilidade pelo pagamento das custas arbitrais é da Requerente
L. – DECISÃO
Atento o exposto, o presente Tribunal Arbitral decide:
a) Julgar procedente a excepção de intempestividade do pedido de pronúncia arbitral, e, em consequência
b) Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral, dele se absolvendo a Requerida
c) Condenar a Requerente a pagar as custas do presente processo (art. 527º, nºs. 1 e 2 do Código do Processo Civil, ex vi art. 29º, nº 1, alínea e) do RJAT).
Valor do processo: Em conformidade com o disposto nos artigos 306º, nº 2 do CPC (ex. 315º, nº 2) e 97º - A, nº 1 do CPPT e no artigo 3º, nº 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de 11.180,00 euros.
Custas: De harmonia com o nº 4 do art. 22º do RJAT, fixa-se o montante das custas em 918,00 euros, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
Notifique-se.
Lisboa, 22 de Abril de 2016
O Árbitro
José Nunes Barata
(Redacção pela ortografia antiga)