Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 634/2015-T
Data da decisão: 2016-03-23  IRS  
Valor do pedido: € 259.582,08
Tema: IRS – Venda de participações sociais
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CAAD: Arbitragem Tributária

Processo n.º: 634/2015-T

Tema: IRS – Venda de participações sociais

 

 

 

 

 

 

 

 

Decisão Arbitral

 

Processo n.º 634/2015-T

 

Os árbitros Dr. Jorge Manuel Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Dr.ª Catarina Gonçalves e Dr.ª Maria Isabel Guerreiro, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 23-12-2015, acordam no seguinte:

 

1. Relatório

 

A… e B…, NIF's … e …, respectivamente, doravante designados por “Requerentes”, apresentaram um pedido de constituição do tribunal arbitral, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por RJAT.

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.

Os Requerentes pedem pronúncia arbitral sobre a legalidade do acto de liquidação adicional de IRS relativo ao ano de 2010 (com o n.º 2015…), do acto de liquidação de juros compensatórios (com o n.º 2015…) e da demonstração de acerto de contas (com o n.º 2015…), nos termos dos quais é fixado o dever de pagar a importância de € 259.582,08.

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 23-10-2015.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral colectivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 07-12-2015 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, o Tribunal Arbitral ficou constituído em 23-12-2015.

A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta em que defendeu a improcedência dos pedidos.

Em 15-04-2016, realizou-se uma reunião em que as Partes produziram alegações orais.

O Tribunal Arbitral é competente e foi regularmente constituído.

As partes estão devidamente representadas, gozam de personalidade e capacidade judiciárias e os Requerentes têm legitimidade (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de nulidades e não foram suscitadas excepções.

 

 

2. Matéria de facto

 

2.1. Factos provados

 

Consideram-se provados os seguintes factos:

 

a)      Em Outubro do ano de 2010, os Requerentes (conjuntamente) alienaram algumas partes sociais, sendo aqui de destacar as relativas às sociedades «C…, Lda.» (doravante somente «C… »), «D…, Lda.» (doravante somente «D… ») e a «E…, Lda.» (doravante somente «E… »), conforme se discrimina no quadro seguinte:

 

 

 

Valor de Realização

Valor de Aquisição

Mais- Valia

C…

€ 1.188.000,00

€ 123.750,00

€ 1.066.750,00

D…

€ 1.287.000,00

€ 99.000,00

€ 1.188.000,00

E…

€ 98.000,00

€ 98.000,00

€ 0,00

Total

€ 2.573.000,00

€ 320.750,00

€ 2.254.750,00

 

b)      Qualquer uma das três sociedades — a C…, a D… e a E… — apresentava, no ano de 2010, um volume de negócios inferior a € 10.000.000, o seu balanço total ficava aquém deste montante e empregavam, cada uma, menos de 50 pessoas;

c)      Na sequência da alienação no ano de 2010 das partes sociais das três sociedades em referência, os ora Requerentes relevaram na sua Declaração Mod. 3 de IRS essa alienação, designadamente no respectivo Anexo G (Quadro 8) e sinalizaram a aludida circunstância de estarem em causa pequenas empresas (Quadro 8A do Anexo G);

d)     A liquidação gerada por via da submissão da Declaração Mod. 3 teve por base a declaração da alienação das partes sociais nas sociedades C…, D… e E…, tal como os Requerentes as reportaram;

e)      A sociedade D… explora um restaurante F… situado na …, em Viana do Castelo;

f)       A sociedade C… explora um restaurante F… situado na Rua …, em Barcelos;

g)      Os concelhos de Viana do Castelo e Barcelos são adjacentes;

h)      A distância entre os estabelecimentos da D… e da C… é superior a 30 km;

i)         Na … Viana … há outros restaurantes;

j)         O estabelecimento da D… nos anos de 2008 a 2011 teve a seguinte facturação:

 

Anos

2008

2009

2010

2011

Facturação anual da D… (em €)

 

2.229.751,99

 

2.444.801,17

 

2.492.316,30

 

1.841.357,46

 

k)      O estabelecimento detido e explorado pela C… (Barcelos) abriu ao público em 22-09-2009 (Documento n.º 6 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido), tendo tido os seguintes valores de facturação anual, nos seus dois primeiros anos integrais de funcionamento:

Anos

2010

2011

 

Facturação anual da C… (em €)

 

2.085.692,87

 

2.225.912,55

 

 

 

 

l)         A sociedade E…, também detida e alienada pelos Requerentes no ano de 2010, abriu um restaurante F… em Viana, na …, n.º…, no dia 31 de Dezembro de 2010, a uma distância de 1,7 km do restaurante da … Viana …;

m)    A facturação anual da E… foi a seguinte:

 

Anos

2010

2011

 

Facturação anual da E… (em €)

 

1.260,38

 

2.115.523,78

 

 

 

 

n)      A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma inspecção aos Requerentes, relativa ao IRS do ano de 2010, em execução da Ordem de Serviço OI2014…;

o)      Nessa Inspecção, foi elaborado o Relatório da Inspecção Tributária que consta do documento n.º 2 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais, o seguinte:

 3.2. Rendimentos

Em sede de IRS, os sujeitos passivos apresentaram a respetiva declaração de rendimentos de IRS, relativa ao ano de 2010, na qual A… declarou os seguintes rendimentos:

(...)

 Rendimentos de mais-valias - Categoria G

Incluídos neste tipo de rendimentos foram alienadas partes sociais, de que resultou uma mais-valia de €2.252.250,00, resultante das operações de alienação conforme consta do quadro seguinte:

III - DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES DE NATUREZA MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA COLETAVEL

A.Incrementos patrimoniais - alínea a) do n.º 1 do art. 9º e alínea b) do n.º 1 do art. 10º do CIRS

A declaração de rendimentos de IRS entregue pelos sujeitos passivos, reportada ao ano de 2010, evidencia a obtenção de rendimentos (incrementos patrimoniais) relativos a mais-valias [alínea a) do n.º 1 do artigo 9C do Código de IRS], consideradas como tal nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 10º do Código do IRS, a qual dispõe que, "Constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem da alienação onerosa de partes sociais, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital, e de outros valores mobiliários e, bem assim, o valor atribuído aos associados em resultado da partilha que, nos termos do artigo 75º do Código do IRC, seja considerado como mais-valia:".

Foram incluídos no anexo G daquela declaração, nomeadamente, nos quadros 8 e 8A, os elementos com relevância fiscal para a respetiva tributação: titularidade, datas e valores de realização, datas e valores de aquisição e identificação da sociedade a que pertencem as partes sociais, com o estatuto de micro e pequenas empresas.

B. Tributação

O n.º 1 do artigo 43º do Código do IRS refere que "O valor dos rendimentos qualificados como mais-valias é o correspondente ao saído apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano.". De acordo com a informação que se reproduziu (quadro 5) traduz-se na obtenção de um rendimento (mais-valia) no valor de €2.252.250.00.

No entanto, o n.º 3 do artigo 43º do Código do IRS, prevê que "O saldo referido no n.º 1, respeitante às transmissões previstas na alínea b) do n.º 1 do artigo 10º, relativo a micro e pequenas empresas não cotadas nos mercados regulamentado ou não regulamentado na bolsa de valores, quando positivo, é igualmente considerado em 50 % do seu valor", tal como previsto no n.º 2 daquela norma, relativamente às transmissões efetuadas por residentes, previstas nas alíneas a), c) e d) do n.º 1 do artigo 10º do Código do IRS, o que se traduz no apuramento de um rendimento líquido da categoria G de IRS, no valor de €1.126.125,00 (€2.252.250,00 * 50%).

Na sequência da identificação, pelo sujeito passivo, de que as partes sociais alienadas são de micro e pequenas empresas, definidas como tal nos termos do anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007 de 6 de novembro, o rendimento apurado (saldo positivo entre mais-valias e menos-valias) está sujeito a uma tributação autónoma á taxa de 20%, de acordo com o n.º 4 do artigo 72º do Código do IRS.

Assim e conforme consta da liquidação de IRS, associado à declaração de rendimentos entregue pelos sujeitos passivos, o Imposto apurado resultante desta tributação autónoma ascendeu ao valor de €225.225,00 (€1.126.125,00 * 20%).

C. Enquadramento

Aquela redução da taxa, via tributação autónoma, encontra-se condicionada ao facto das participações sociais, objeto de alienação, estarem associadas a empresas que têm o estatuto de micro ou pequenas empresas, nos termos do Decreto-Lei n.º 372/2007 de 6 de novembro (alterado pelo Decreto-Lei n.º 143/2009 de 16 de Julho), conforme determina o n.º 4 do artigo 43º do Código do IRS que se transcreve, "Para efeitos do número anterior entende-se por micros e pequenas empresas as entidades definidas, nos termos do anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007, de 6 de Novembro.".

O Decreto-Lei n.º 372/2007 de 06 de novembro veio legislar a certificação de PME online, sendo a obtenção desta certificação destinada às empresas que necessitem de comprovar a sua qualidade de PME, estando incumbido o Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e à Inovação (IAPMEI) de proceder à certificação de PME por via electrónica, através da criação de um formulário para esse efeito.

Conforme refere no n.º 3 do artigo 3.º daquele diploma (Decreto-Lei), "a utilização da certificação de PME prevista no presente decreto-lei é obrigatória para todas as entidades envolvidas em procedimentos que exijam o estatuto de PME".

Assim, através do sítio www.iapmei.pt, as empresas, após o preenchimento do formulário electrónico, obtêm o respetivo certificado onde consta o enquadramento das entidades como micro, pequenas ou médias.

No artigo 2º do Anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007 de 08 de novembro, encontram-se definidos os critérios de enquadramento das empresas, os quais tem como elementos de referência, o número de pessoas que empregam (efetivos), o volume de negócios e o balanço (limiares financeiros), conforma se descreve:

» N.º 1 - A categoria das micros, pequenas e médias empresas (PME) é constituída por empresas que empregam menos de 250 pessoas e cujo volume de negócios anual não excede 50 milhões de euros ou cujo balanço total anual não excede 43 milhões de euros;

• N º 2 - Na categoria das PME, uma pequena empresa é definida como uma empresa que emprega menos de 50 pessoas e cujo volume de negócios anual ou balanço total anual não excede 10 milhões de euros;

• N.º 3 - Na categoria das PME, uma micro empresa é definida como uma empresa que emprega menos de 10 pessoas e cujo volume de negócios anual ou balanço total anual não excede 2 milhões de euros,

O n.º 1 do artigo 4º daquele Decreto-Lei refere que, "os dados considerados para o cálculo dos efetivos e dos montantes financeiros são os do último exercício contabilístico encerrado, calculados numa base anual"

No caso especifico em análise, relativamente às partes sociais alienadas pelo sujeito passivo, constataram-se os seguintes factos:

» A entidade C…- NIPC:... de acordo com a certificação emitida pelo IAPMEl, à data da alienação (outubro de 2010), encontrava-se qualificada com o estatuto de Média entidade.

» A entidade E…- NIPC: …. de acordo com a certificação emitida pelo IAPMEl, encontra-se qualificada com o estatuto de Média entidade desde outubro de 2012, posterior à data da alienação (outubro de 2010).

» A entidade D…- NIPC: ... de acordo com a certificação emitida pelo IAPMEl, à data de alienação encontrava-se qualificada com o estatuto de Média entidade.

D. Notificação

Atendendo aos certificados emitidos pelo IAPMEl, nas condições descritas, e para comprovação do enquadramento dos rendimentos declarados, relevados no quadro BA da declaração de rendimentos de IRS de 2010, e no cumprimento da alínea b) do n.º 6 da Circular n.º 7/2014 da Direção dos Serviços de IRS, foi notificado o sujeito passivo para apresentar fotocópia dos contratos de aquisição e alienação das partes sociais e documentos comprovativos de que as entidades associadas às partes sociais, alienadas em outubro de 2010, cumprem com os requisitos previstos no artigo 2º do Anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007 de 6 de novembro, na data da alienação.

(...)

F. Análise efetuada

Salienta-se que o diploma correspondente ao Decreto-lei n.º 372/2007 de 06 de novembro, decorre da Recomendação da Comissão das Comunidades Europeias de 6 de maio de 2003, relativa à definição de micro, pequenas e médias empresas.

Na sequência da análise aos elementos e dados apresentados pelo sujeito passivo, verifica-se que este incidiu a sua análise nos valores individuais de cada uma das entidades, não tendo em consideração o disposto no artigo 3º do Anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007 de 06 de novembro.

Importa relevar que de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 3º do Anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007 de 06 de novembro, "Entende-se por «empresa autónoma» qualquer empresa que não é qualificada como empresa parceira na acepção do n.º 2 ou como empresa associada na acepção do n.º 3 e o n.º 3 daquela norma, define a noção de "empresas associadas", como sendo aquelas que mantém entre si uma das seguintes relações:

a) Uma empresa detém a maioria dos direitos de voto dos accionistas ou sócios de outra empresa;

b) Uma empresa tem o direito de nomear ou exonerar a maioria dos membros do órgão de administração, de direcção ou de controlo de outra empresa;

c) Uma empresa tem o direito de exercer influência dominante sobre outra empresa por força de um contrato com ela celebrado ou por força de uma cláusula dos estatutos desta última empresa;

d) Uma empresa accionista ou associada de outra empresa controla sozinha, por força de um acordo celebrado com outros accionistas ou sócios dessa outra empresa, a maioria dos direitos de voto dos accionistas ou sócios desta última.

Aquela norma (n.º 3 do artigo 3.º) no seu 4º parágrafo ainda refere (alarga a definição) que, "As empresas que mantenham uma das relações acima descritas por intermédio de uma pessoa singular ou de um de pessoas singulares que actuem concertadamente são igualmente consideradas empresas associadas desde que essas empresas exerçam as suas actividades, ou parte delas, no mesmo mercado ou em mercados contíguos.".

F.1 - Relações societárias

Ora, no presente caso, e na sequência das participações de capital, direta e indiretamente detidas, pelo sujeito passivo A…, nas diversas sociedades, estamos perante entidades associadas, nos temos do 4º parágrafo do n.º 3 do artigo 3.º do Anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007 de 06 de novembro, com relacionamentos relevantes, decorrente do facto de, por intermédio de uma pessoa singular (A…), estabelecerem uma das relações previstas no 1º parágrafo daquela norma, conforme se demonstra nos quadros seguintes, que releva as participações antes e após a alienação efetuada em outubro de 2010.

 

Antes alienação:

Retângulo arredondado: A…
NIF:…
                                                                                

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Retângulo arredondado: A…
NIF:…
Após alienação:

 

 

 

                                                                             

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Conforme se constata pelos esquemas apresentados, as empresas são consideradas associadas, antes e depois da alienação das participações sociais, atendendo a que diretamente (antes da alienação) e indiretamente (após alienação), as participações detidas por A…, permitem estabelecer relações que cumprem as condições necessárias àquela classificação (relacionamento relevante).

F.2 - Mercado

Finalmente, as entidades identificadas têm o mesmo objeto social, que consiste na exploração, operação e gestão de restaurantes da cadeia internacional "F…", sob o regime de franchising, pelo que exercem a sua atividade no mesmo mercado (definido no 5º parágrafo do artigo 3º), cumprindo o outro requisito previsto no 4.º parágrafo do n.º 3 do artigo 3º do Anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007 de 6 de novembro.

F.3 - Certificados emitidos pelo IAPMEI

Também não atendeu, o sujeito passivo, aos certificados emitidos pelo IAPMEI, relativos às empresas cujas participações de capital foram alienadas que, pelos motivos referidos, atribuíram os seguintes estatutos:

» C…, - NIPC:…, à data da alienação (outubro de 2010), encontrava-se qualificada com o estatuto de Média entidade, conforme documento que se junta e que constitui o anexo 1.

» D…. - NIPC:…, encontrava-se qualificada com o estatuto de Média entidade desde maio de 2010, conforme documento que se junta e que constitui o anexo 2.

» E…- NIPC: …, encontrava-se qualificada com o estatuto de Média entidade desde outubro de 2012, posterior à data da alienação (outubro de 2010), conforme documento que se junta e que constitui o anexo 3.

Com fundamento na legislação indicada, as empresas C… e D…, são empresas associadas, pelo que nos termos do n.º 2 do artigo 6.º do Anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007 de 06 de novembro, a determinação dos dados considerados para o cálculo dos efetivos (funcionários) e dos montantes financeiros (volume de negócios e balanço), faz-se por agregação dos valores de cada uma das empresas associadas:

 

Quadro 6

Entidade

Relação

UTA

V. negócios

Balanço

C…

Associada

35

1.801.192,83

1.384.728,96

D…

Associada

37

2.444.801,17

1.160.356,05

Soma

 

72

4.245.994,00

2.545.085,01

 

 

Numa análise conjunta, verifica-se que, pelo número de efetivos (72), as entidades acima indicadas têm o estatuto de médias entidades, conforme os relatórios dos certificados emitidos pelo IAPMEI evidenciam, no cumprimento dos critérios definidos no artigo 2º do Anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007 de 06 de novembro.

F.4 - Conclusão

Na sequência dos elementos apreciados e dos factos descritos, conclui-se que, para efeitos de atribuição de estatuto às entidades ("C…", "D..." e "E…"), cujas participações sociais foram objeto de alienação pelos sujeitos passivos, aquelas são consideradas médias empresas, na medida em que:

1º - São consideradas empresas associadas, pelo cumprimento cumulativo dos requisitos - relacionamento relevante e mercado - previstos no n.º 3 do artigo 3º do Anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007 de 06 de novembro.

2º - A determinação dos dados considerados para o cálculo dos efetivos e dos montantes financeiros, faz-se por agregação dos valores de cada uma das empresas associadas, conforme estipula o n.º 2 do artigo 6º do Anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007 de 06 de novembro.

 

Quadro 7

Entidade

Relação

UTA

V. negócios

Balanço

C…

Associada

35

1.801.192,83

1.384.728,96

D…

Associada

37

2.444.801,17

1.160.356,05

E…

Associada

0

0,00

0,00

Soma

 

72

4.245.994,00

2.545.085,01

 

Valores relativos a 2009. A entidade E… apenas foi constituída em 2010.

 

Conclui-se que as entidades acima indicadas têm o estatuto de médias entidades.

G. Correção

Face ao exposto, conclui-se que a mais-valia obtida pelos sujeitos passivos não pode beneficiar do disposto no n.º 3 do artigo 43º do Código do IRS.

Dos valores declarados resulta uma mais-valia, cujo montante do imposto ascende a €450.450,00 (€2.252.250,00 x 20%), pela aplicação da taxa de 20%, conforme determina o n.º 4 do artigo 72º do Código do IRS, onde refere que "O saldo positivo entre as mais-valias e menos-valias, resultante das operações previstas nas alíneas b), e), f) e g) do n,º 1 do artigo 10.º, é tributado à taxa de 20%.".

De acordo com a liquidação de IRS da declaração de rendimentos, do exercício de 2010, o montante de imposto apurado por via daquela tributação autónoma ascendeu a €225.225,00, pelo que o valor da correção será de €225.225,00 (€450.450,00 - €225,225,00).

 

p)      Os Requerentes exerceram o direito de audição antes da elaboração do Relatório da Inspecção Tributária;

q)       A Autoridade Tributária e Aduaneira pronunciou-se sobre o que os Requerentes alegaram no exercício do direito de audição, dizendo, além do mais, o seguinte:

B.2. Exposição da AT

Conforme consta do projeto de relatório de inspeção tributária, as três entidades, C…- NIPC:... E…- NIPC: … e D…- NIPC: … encontram-se qualificadas como Médias entidades. Concluindo-se que a mais-valia obtida pelos sujeitos passivos não pode beneficiar do disposto no n.º 3 do artigo 43º do Código do IRS.

Tal conclusão decorre da análise detalhada aos factos verificados, elementos obtidos e esclarecimentos apresentados pelo sujeito passivo e da respetiva legislação aplicável.

 

r)       O IAPMEI emitiu as certificações que constam de fls. 20 e seguintes do documento n.º 2 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;

s)       Na sequência da Inspecção, em 05-06-2015, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a liquidação de IRS n.º 2015…, a liquidação de juros compensatórios n.º 2015 … e efectuou a compensação n.º 2015…, de que resultou um valor a pagar de € 259.572,08 (documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

t)       Em 12-10-2015, a Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral que deu origem ao presente processo.

 

2.2. Factos não provados

 

Não há factos relevantes para a decisão da causa que se considerem não provados.

 

2.3. Fundamentação da fixação da matéria de facto

 

Os factos provados baseiam-se nos documentos juntos pela Requerente.

A Autoridade Tributária e Aduaneira não apresentou processo administrativo.

 

4. Matéria de direito

 

O processo arbitral tributário, como meio alternativo ao processo de impugnação judicial (n.º 2 do artigo 124.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril), é, como este, um meio processual de mera legalidade, em que se visa declarar a ilegalidade de actos dos tipos indicados no artigo 2.º do RJAT e eliminar os efeitos jurídicos por eles produzidos, anulando-os ou declarando a sua nulidade ou inexistência [artigos 99.º e 124.º do CPPT, aplicáveis por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea a), daquele].

Por isso, sendo o acto de liquidação praticado pela Administração Tributária o objecto do processo, tem de se apreciar a sua legalidade à face dos seus precisos termos, tal como ocorreu, com a fundamentação que nele foi utilizada, não sendo relevantes outras possíveis fundamentações que poderiam servir de suporte a outros actos, de conteúdo decisório total ou parcialmente coincidente com o acto praticado. São, assim, irrelevantes fundamentações invocadas a posteriori, após o termo do procedimento tributário em que foi praticado o acto cuja declaração de ilegalidade é pedida ( [1] ).

            No caso em apreço, constata-se que no Relatório da Inspecção Tributária que está subjacente à liquidação impugnada não se faz depender o juízo sobre a identidade de mercado de actuação das empresas em causa da alegada actuação concertada dos sócios, ou da criação de uma SGPS, nem da existência de uma posição de controlo, nem de as sociedades terem a mesma morada, que a Autoridade Tributária e Aduaneira invocou na sua Resposta.

            Na verdade, a fundamentação da posição assumida pela Autoridade Tributária e Aduaneira sobre a identidade de mercado de actuação das sociedades em causa, que entendeu justificar que elas sejam consideradas como associadas, está sintetizada nos pontos «F.1 – Relações societárias» e «F.2 – Mercado» do Relatório da Inspecção Tributária em que se refere que, «no presente caso, e na sequência das participações de capital, direta e indiretamente detidas, pelo sujeito passivo A…, nas diversas sociedades, estamos perante entidades associadas, nos temos do 4º parágrafo do n.º 3 do artigo 3.º do Anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007 de 06 de novembro, com relacionamentos relevantes, decorrente do facto de, por intermédio de uma pessoa singular (A…), estabelecerem uma das relações previstas no 1º parágrafo daquela norma, conforme se demonstra nos quadros seguintes, que releva as participações antes e após a alienação efetuada em outubro de 2010» e que «as entidades identificadas têm o mesmo objeto social, que consiste na exploração, operação e gestão de restaurantes da cadeia internacional "F…", sob o regime de franchising, pelo que exercem a sua atividade no mesmo mercado (definido no 5º parágrafo do artigo 3º), cumprindo o outro requisito previsto no 4.º parágrafo do n.º 3 do artigo 3º do Anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007 de 6 de novembro».

            Assim, pelo que se disse sobre o objecto do processo, é a face desta fundamentação que há que apreciar a legalidade do acto de liquidação.

 

4.1. Questão controvertida

 

O artigo 9.º, n.º 1, do CIRS estabelece que «constituem incrementos patrimoniais, desde que não considerados rendimentos de outras categorias (...) as mais-valias, tal como definidas no artigo seguinte».

O artigo 10.º do CIRS estabelece que, além do mais, «constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de (...) alienação onerosa de partes sociais».

O artigo 43.º do CIRS, na redacção resultante da Lei n.º 15/2010, de 26 de Julho, estabelece o seguinte, no que aqui interessa:

 

Artigo 43.º

Mais-valias

 

1 - O valor dos rendimentos qualificados como mais-valias é o correspondente ao saldo apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano, determinadas nos termos dos artigos seguintes.

(...)

3 - O saldo referido no n.º 1, respeitante às transmissões previstas na alínea b) do n.º 1 do artigo 10.º, relativo a micro e pequenas empresas não cotadas nos mercados regulamentado ou não regulamentado da bolsa de valores, quando positivo, é igualmente considerado em 50 % do seu valor.

4 - Para efeitos do número anterior entende-se por micro e pequenas empresas as entidades definidas, nos termos do anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007, de 6 de Novembro.

 

Os Requerentes apresentaram declaração Modelo 3 de IRS relativa ao ano de 2010, em que declararam alienação de partes sociais relativas a três sociedades, referindo que todas elas eram pequenas empresas.

Os Requerentes obtiveram mais-valias sujeitas a IRS com a transmissão onerosa de participações nas sociedades C… e D…, o que não é objecto de controvérsia.

A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que as partes sociais alienadas não respeitavam a micro ou pequenas empresas, à face do anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007, por as empresas deverem considerar-se «empresas associadas».

O referido anexo estabelece o seguinte, nos seus artigos 2.º e 3.º, e no que aqui interessa:

 

Artigo 2.º

Efectivos e limiares financeiros que definem as categorias de empresas

1 - A categoria das micro, pequenas e médias empresas (PME) é constituída por empresas que empregam menos de 250 pessoas e cujo volume de negócios anual não excede 50 milhões de euros ou cujo balanço total anual não excede 43 milhões de euros.

2 - Na categoria das PME, uma pequena empresa é definida como uma empresa que emprega menos de 50 pessoas e cujo volume de negócios anual ou balanço total anual não excede 10 milhões de euros.

3 - Na categoria das PME, uma micro empresa é definida como uma empresa que emprega menos de 10 pessoas e cujo volume de negócios anual ou balanço total anual não excede 2 milhões de euros.

 

Artigo 3.º

Tipos de empresas tomadas em consideração no que se refere ao

 cálculo dos efectivos e dos montantes financeiros

 

(...)

3 - Entende-se por «empresas associadas» as empresas que mantêm entre si uma das seguintes relações:

a) Uma empresa detém a maioria dos direitos de voto dos accionistas ou sócios de outra empresa;

b) Uma empresa tem o direito de nomear ou exonerar a maioria dos membros do órgão de administração, de direcção ou de controlo de outra empresa;

c) Uma empresa tem o direito de exercer influência dominante sobre outra empresa por força de um contrato com ela celebrado ou por força de uma cláusula dos estatutos desta última empresa;

d) Uma empresa accionista ou associada de outra empresa controla sozinha, por força de um acordo celebrado com outros accionistas ou sócios dessa outra empresa, a maioria dos direitos de voto dos accionistas ou sócios desta última.

Presume-se que não há influência dominante no caso de os investidores indicados no segundo parágrafo do n.º 2 não se imiscuírem directa ou indirectamente na gestão da empresa em causa, sem prejuízo dos direitos que detêm na qualidade de accionistas ou sócios.

As empresas que mantenham uma das relações referidas no primeiro parágrafo por intermédio de uma ou várias outras empresas, ou com os investidores visados no n.º 2, são igualmente consideradas associadas.

As empresas que mantenham uma das relações acima descritas por intermédio de uma pessoa singular ou de um grupo de pessoas singulares que actuem concertadamente são igualmente consideradas empresas associadas desde que essas empresas exerçam as suas actividades, ou parte delas, no mesmo mercado ou em mercados contíguos.

Entende-se por mercado contíguo o mercado de um produto ou serviço situado directamente a montante ou a jusante do mercado relevante.

 

As Partes estão de acordo quanto à verificação em relação a cada uma das empresas referidas das características que permitiriam qualificá-las como pequenas empresas, a nível de volume de negócios anual e número de trabalhadores, pois nenhuma delas apresentava, no ano de 2010, volume de negócios superior a € 10.000.000,00 e empregava, cada uma, menos de 50 trabalhadores.

A controvérsia limita-se à possibilidade de serem qualificadas como «empresas associadas», o que, a suceder, implicará que os dados relativos ao volume de negócios e número de trabalhadores sejam considerados em conjunto, nos termos dos n.ºs 2 e 3 do artigo 6.º do mesmo anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007, o que, a ocorrer, implica a não atribuição de qualificação de pequenas empresas, pois o número de trabalhadores supera 50.

No que concerne à qualificação das empresas, não é questionado que o Sujeito Passivo A… detinha participações nas três empresas referidas, gerando situação enquadrável em hipóteses previstas nas alíneas do n.º 3 do artigo 3.º do anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007.

Também é ponto assente que todas as empresas estavam qualificadas pelo IAPMEI como «médias empresas».

A Autoridade Tributária e Aduaneira defende, em primeira linha, que a certificação pelo IAPMEI é relevante para atribuir às empresas a qualificação de micro, pequenas e médias empresas (PME).

Para além disso, a controvérsia limita-se ao preenchimento da condição prevista no penúltimo parágrafo daquele n.º 3, que é essas empresas exercerem as suas actividades, ou parte delas, no mesmo mercado. ( [2] )

Sobre este ponto relativo ao «Mercado», a Autoridade Tributária e Aduaneira referiu no Relatório da Inspecção Tributária que «as entidades identificadas têm o mesmo objeto social, que consiste na exploração, operação e gestão de restaurantes da cadeia internacional "F…", sob o regime de franchising, pelo que exercem a sua atividade no mesmo mercado (definido no 5º parágrafo do artigo 3º), cumprindo o outro requisito previsto no 4.º parágrafo do n.º 3 do artigo 3º do Anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007 de 6 de novembro.

A Requerente discorda desta conclusão da Autoridade Tributária e Aduaneira sobre a identidade de mercado das actividades das empresas referidas, quanto à D… e à C…, que eram as que tinham trabalhadores em 2010 e aquelas cujas transmissões de partes sociais geraram mais-valias.

No entender da Requerente, em suma,

– enquanto a sociedade D… explora um restaurante F… situado no centro comercial …, em Viana do Castelo (…), a C… explora um estabelecimento análogo localizado em Barcelos, na Rua…;

– cada um dos estabelecimentos F… localiza-se numa cidade distinta, a uma distância assinalável e cujas manchas urbanas não são contíguas;

– o percurso entre os dois estabelecimentos é sempre de mais de 30 Km (impondo, de qualquer forma uma deslocação em automóvel ou similar), incluindo obrigatoriamente um trecho em auto-estrada, sujeita a portagem, com um tempo estimado de deslocação sempre superior a 30 minutos para a ida e outro tanto para o regresso;

– a estes dados geográficos acresce a circunstância de ambos os concelhos disporem de opções de oferta de «restaurantes informais» bastante distintos, pois no próprio centro comercial … existem vários, o mesmo não sucedendo em Barcelos;

– o estabelecimento do … não sofreu qualquer decréscimo de facturação com a abertura do estabelecimento de Barcelos, pois apesar deste último ter tido uma facturação em 2010 - primeiro ano completo de actividade - de mais de 2 milhões de euros, o restaurante do …, apesar disso, aumentou, de 2009 para 2010, a sua facturação em 2% (aliás já durante o ano de 2009 aquele havia aumentado a sua facturação em cerca de 7% apesar da abertura em Barcelos em 22 de Setembro);

– pelo contrário, quando, em 31 de Dezembro de 2010, abriu o restaurante localizado na …, igualmente em Viana do Castelo, o volume de negócios da D… ressentiu-se imediatamente, tendo contraído em cerca de 26% (de € 2.492.316,30 para € 1.841.357,46);

– por isso, é de concluir que «os estabelecimentos do … Viana e de Barcelos não pertencem ao mesmo mercado geográfico», «os estabelecimentos de Viana do Castelo (Rua…) e de Barcelos não pertencem ao mesmo mercado geográfico» e «os dois estabelecimentos de Viana do Castelo (…e Estrada …) pertencem ao mesmo mercado geográfico»;

– o Decreto-Lei n.º 372/2007 e o seu anexo adoptam os conceitos e critérios que correspondem aos previstos na Recomendação n.º 2003/361/, da Comissão Europeia, de 6 de Maio, publicada no Jornal Oficial de 20 de Maio de 2003, série L, n.º 124, p. 36 e seguintes, doravante «Recomendação CE»;

– não obstante, a nível europeu, uma «recomendação» não tenha efeitos vinculativos, o legislador português conferiu força obrigatória geral ao conteúdo do anexo da Recomendação CE, pois que o publicou no Diário da República, como parte integrante do Decreto-Lei, de acordo com o seu art.º 2.º;

– por conseguinte, será como direito nacional que o conteúdo do anexo da Recomendação CE, agora recebido e transformado em direito nacional pelo Decreto-Lei, com força obrigatória geral, deverá ser interpretado e aplicado;

– a utilidade prática do conceito «mesmo mercado» prende-se com a necessidade sentida pela Comissão Europeia de restringir a noção de PME, evitando que a mesma abrangesse outro tipo de realidades económicas, designadamente as empresas juridicamente independentes mas pertencentes a um mesmo grupo económico mais vasto, dotado de dimensão e capacidade sensivelmente superiores aos das várias unidades que o constituem;

– o preâmbulo da Recomendação manda recorrer «sempre que necessário, à definição da Comissão de mercado relevante, objecto da Comunicação da Comissão sobre a definição de mercado relevante para efeitos do direito comunitário da concorrência», Comunicação n.º 97/C 372/03, publicada no Jornal oficial C 372 de 09.12.1997;

– um mercado relevante resulta sempre da intersecção de duas realidades: (i) a análise dos produtos e serviços que podem ser inter-substituíveis e (ii) a análise do âmbito geográfico em que essa substituição pode ocorrer;

– um mercado de produto relevante compreende todos os produtos e/ou serviços consideradas permutáveis ou substituíveis pelo consumidor devido às suas características, preços e utilização pretendida;

– o mercado geográfico relevante compreende a área em que as empresas em causa fornecem produtos ou serviços, em que as condições da concorrência são suficientemente homogéneas e que podem distinguir-se de áreas geográficas vizinhas devido ao facto, em especial, das condições da concorrência serem consideravelmente diferentes nessas áreas;

– a determinação do mercado geográfico pelo lado da oferta, prende-se com a possibilidade de um mesmo fornecedor passar a abastecer clientes ou vender os seus bens ou serviços num outro espaço geográfico sem incorrer em custos ou riscos suplementares significativos;

– do ponto de vista do produto, os 3 estabelecimentos sobre os quais o pedido de pronúncia arbitral versa, sempre integrarão um mesmo mercado, seja ele o mercado mais vasto dos restaurantes informais seja o mercado mais estreito dos restaurantes informais integrantes de uma cadeia;

– o factor tempo tem uma relevância fundamental nas escolhas dos consumidores quando escolhem a que estabelecimento acorrer para comer ou levantar a refeição (take-away) e, bem assim, a que empresas de home-delivery;

– no caso dos estabelecimentos de retalho alimentar moderno a procura é constituída pelo consumidor final (pelas famílias) que se desloca ao estabelecimento para satisfazer as suas necessidades;

– a Autoridade da Concorrência, para efeitos de autorização de operações de concentração, optou por definir geograficamente o mercado como um mercado local (e não nacional), baseado numa área de influência ou de atracção de cada um dos estabelecimentos sobre os consumidores que habitam em seu redor;

– tem sido prática situar o perímetro dessa área em função de um tempo de deslocação em automóvel (que é tanto maior quanto maior for a dimensão do estabelecimento em causa) ou, por facilidade, em função de circunscrições administrativas como os concelhos ou, quando justificável, subdividindo estes;

– a Autoridade da Concorrência, para actividades em que o consumidor tem que se deslocar para adquirir um determinado bem ou usufruir de um certo serviço, mas em que, pelas características dos bens a adquirir ou do serviço a ser prestado (designadamente o seu valor económico), não está disposto a deslocar-se (a pé ou em automóvel) senão num raio de acção muito curto, entende que os mercados são de natureza local, correspondentes a uma área de influência do estabelecimento e que, por facilidade de análise, se reconduzem, as mais das vezes, ao concelho;

– mesmo quando se tratou de adquirir vários estabelecimentos localizados em concelhos adjacentes, a Autoridade da Concorrência entendeu que era mais adequado considerar um mercado local por cada concelho e não um só mercado para os vários concelhos contíguos;

– a determinação correcta do mercado geográfico relevante deverá ser feita considerando a área de influência de cada estabelecimento, isto é, estimando a área geográfica em que se podem situar os seus potenciais clientes, e verificando quais os constrangimentos competitivos aí existentes (leia-se operadores concorrentes);

– no caso dos mercados de restauração informal ou de fast-food, existem duas características essenciais a considerar, desde logo, por definição, o consumidor não pretende despender muito tempo com a refeição, logo, também o não quererá fazer com a deslocação para o estabelecimento e para o seu regresso e, por outro lado, o valor económico reduzido da refeição é incompatível com um gasto desproporcionado na deslocação (designadamente, em termos de consumo de combustível e portagens);

– estaremos, por isso, a considerar tendencialmente deslocações a pé ou de automóvel ou meio de transporte colectivo muito curtas, com um tempo de deslocação de 10 minutos;

– o teste substantivo a fazer para este efeito sempre seria o seguinte: se um dos estabelecimentos em causa aumentasse os preços de forma significativa e não transitória (entre 5% a 10%), quais as alternativas que o consumidor preferirá? O consumidor não passará a frequentar um estabelecimento situado a mais de 5-10 minutos de distância (de automóvel) ou a mais do que 30 minutos de deslocação a pé (aproximadamente 3 Kms);

– o mercado relevante para os restaurantes informais deverá ser local e corresponder a uma área de influência que diste não mais de 5-10 mins. (de automóvel) do local do estabelecimento;

– cada um dos estabelecimentos de cada uma das sociedades localiza-se numa cidade distinta cujas manchas urbanas, aliás, nem sequer são contíguas;

– sendo, todavia, dois concelhos adjacentes, a distância entre os estabelecimentos é sempre de mais de 30 Km (impondo, de qualquer forma uma deslocação em automóvel ou similar), incluindo obrigatoriamente um trecho em auto-estrada, sujeita a portagem, e com um tempo estimado de deslocação sempre superior a 60 minutos (considerando ida e volta);

– é, pois, inelutável concluir que os estabelecimentos se situam em mercados relevantes distintos do ponto de vista geográfico;

– esta conclusão é especialmente reforçada pela circunstância de que o estabelecimento do … Viana (da D…) não sofre qualquer influência competitiva do estabelecimento de Barcelos (da C…), pois que, comprovadamente, não conheceu qualquer decréscimo de facturação com a abertura deste último.

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira defende, em suma, o seguinte:

 – no n.º 3 do artigo 3.º o Decreto-Lei n.º 372/2007 refere-se que “a utilização da certificação de PME prevista no presente decreto-lei é obrigatória para todas as entidades envolvidas em procedimentos que exijam o estatuto de PME”;

– no caso em apreço, conforme atesta a própria certificação do IAPMEI, as empresas aqui em causa não são entidades autónomas, mas sim associadas;

– a existência de certificação emitida pelo IAPMEI, válida à data da alienação das partes sociais não pode deixar de pressupor, ou pelo menos indiciar, a verificação dos requisitos materiais constantes no Anexo, pelo que terá de relevar, como prova idónea do estatuto de micro, pequena ou média empresa;

– certificação essa, que face ao seu teor e carácter oficial, porquanto emitida por quem tem legitimidade para o fazer, nos termos do Decreto-lei supra citado, terá um carácter reforçado, concomitantemente o seu valor probatório deverá ser aferido enquanto tal;

– à data da alienação das participações sociais, e no que concerne às duas empresas alienadas, ambas as empresas se encontravam certificadas com o estatuto de “Média”;

– é da competência legal do IAPMEI a verificação dos requisitos legais para as empresas serem classificadas quanto à sua dimensão (micro, pequena, média ou grande);

– é desta verificação que resulta a Certificação, a qual resulta nos critérios plasmados no art.º 6.º do DL, o qual dispõe que cabe ao interessado fornecer todos os dados necessários e aí solicitados, mormente o tipo de empresa;

– deste modo, não tendo o IAPMEI considerado que as empresas C… e D… eram pequenas ou micro empresas, não pode quer a Requerida e, bem assim, os seus Serviços Inspectivos, considerar de forma diversa em sede de procedimento tributário, substituindo-se, deste modo, à informação prestada pela única entidade com competência legalmente atribuída para o fazer;

– não se vislumbra qual a relevância de trazer à colação o conceito de mercado do direito comunitário da concorrência, tanto mais que tais alegações são totalmente desmentidas pelos factos que decorrem com clareza destes autos;

– com efeito, os factos demonstram que a C… e D… são controladas por uma pessoa singular (1º Requerente) ou por um grupo de pessoas singulares que actuam concertadamente (1º e 2º Requerente) e exercem as suas actividades no âmbito de um mesmo mercado ambas as empresas são restaurantes, comercializando os exactíssimos mesmos serviços e produtos, no mercado do fast food e em regime de franchising (F…);

– acresce que no âmbito do regime de franchising, se pode afirmar, sem margem para dúvidas, que as empresas e os seus sócios actuam de forma concertada e associada;

– aliás, resulta do Relatório da Inspecção Tributária que os Requerentes criaram eles próprios uma SGPS, por força do carácter intuiu personae dos contratos de franquia, do teor e, sobretudo, do facto de ter que ser o próprio franqueador a consentir a organização/associação/ agregação das sociedades numa SGPS;

– resulta ainda dos factos que as sociedades têm a sede na mesma morada, carácter per si revelador da interdependência das empresas e dos seus sócios;

– o facto de existirem relações societárias especiais entre as entidades, implica, sem margem para dúvida, uma posição de controlo por parte dos sócios, quer antes da alienação, quer depois da alienação, afastando a sua natureza de entidades alegadamente autónomas e reforçando o seu carácter de empresas associadas, sendo ainda de salientar o poder económico que decorre dessas mesmas relações societárias especiais;

– face aos factos constantes dos autos é inequívoco que as empresas em causa, dado o objecto social que prosseguem, actuam no mesmo mercado, pelo que, estando esse pressuposto verificado, é prescindível por desnecessária qualquer incursão (ou divagação) pelos conceitos interpretativos de mercado, plasmados no direito europeu da concorrência, até porque, neste âmbito, tal como os próprios Requerentes afirmam no seu pedido de pronúncia arbitral, não há qualquer decisão que se pronuncie sobre caso análogo ao dos presentes autos arbitrais;

– nas suas alegações, os Requerentes mencionam vários processos a nível europeu e a nível nacional, no âmbito da definição de mercado geográfico concluindo, a final, que não existe nenhuma decisão que incida sobre estabelecimentos autónomos ou grupos de pequenos estabelecimentos (artigos 104.º a 106.º da PI);

– em sintonia com o decidido no processo arbitral n.º 510/2014-T, «os produtos que ambas comercializam, ao serem os mesmos, não podem deixar de ser qualificados como “permutáveis ou substituíveis pelo consumidor devido às suas características, preços e utilização pretendida”, por referência à definição de “mercado do produto relevante” contida na Recomendação da Comissão, de 6 de Maio de 2003»; «também a grande proximidade geográfica entre os restaurantes explorados por ambas as empresas permite sustentar, na ausência de estudos circunstanciados que provem o contrário, que ambas actuam no mesmo mercado geográfico relevante».

 

4.2. Relevância da certificação efectuada pelo IAPMEI

 

O n.º 3 do artigo 43.º do CIRS estabelece que «o saldo referido no n.º 1, respeitante às transmissões previstas na alínea b) do n.º 1 do artigo 10.º, relativo a micro e pequenas empresas não cotadas nos mercados regulamentado ou não regulamentado da bolsa de valores, quando positivo, é igualmente considerado em 50 % do seu valor».

O n.º 4 do mesmo artigo estabelece que «para efeitos do número anterior entende-se por micro e pequenas empresas as entidades definidas, nos termos do anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007, de 6 de Novembro».

A Autoridade Tributária e Aduaneira defende, em primeira linha, que a certificação da qualidade de pequena ou micro empresa pelo IAPMEI é relevante para aplicação daquele n.º 3 do artigo 43.º.

No entanto, esta interpretação não tem suporte no texto do n.º 4, pois a expressão «entidades definidas, nos termos do anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007, de 6 de Novembro» remete manifestamente para as definições que constam deste diploma (artigo 2.º do anexo) e não para o conteúdo de qualquer acto administrativo prévio de atribuição da qualificação de empresas como micro ou pequenas empresas, designadamente a decisão prevista no artigo 7.º daquele diploma.

Assim, no pressuposto de que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados, como tem de se presumir por força do n.º 3 do artigo 9.º do Código Civil, a referências às «entidades definidas» e não às «entidades certificadas» que consta do n.º 3 do artigo 43.º do CIRS deve ser entendida como reportando-se às definições que constam do Decreto-Lei n.º 372/2007.

Aliás, é a esta conclusão que conduz também a aplicação da regra interpretativa especial do artigo 11.º, n.º 3, da LGT que impõe que se entenda preferencialmente à «substância económica dos factos tributários».

Nesta linha decidiu já o Supremo Tribunal Administrativo, no acórdão de 16-12-2015, proferido no processo n.º 0196/14:

     I - O n.º 3 do art. 43.º do CIRS, na redacção dada pela Lei n.º 15/2010, de 26 de Julho, prevê que o saldo apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano, respeitante às transmissões onerosas de partes sociais de micro e pequenas empresas não cotadas nos mercados regulamentado ou não regulamentado da bolsa de valores, quando positivo, seja considerado apenas em 50% do seu valor.

II - O n.º 4 do mesmo artigo, para efeitos de aplicação do supra referido regime de exclusão de tributação, remete a definição de micro e pequenas empresas para os termos do anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007, de 6 de Novembro, diploma que regula a certificação das PME pelo IAPMEI, sendo que os requisitos materiais para essa qualificação se encontram fixados no respectivo anexo.

III - Nem a letra da lei nem a sua ratio permitem concluir que a aplicação daquele regime de tributação fica dependente da certificação da qualidade de PME pelo IAPMEI.

 

Consequentemente, é irrelevante a certificação emitida pelo IAPMEI, sendo à face das definições que constam do DL n.º 372/2007 que há que apreciar se é aplicável aos Requerentes o regime do artigo 43.º, n.º 3, do CIRS.

 

4.3. Conceito de mercado relevante

 

Há acordo das Partes quanto a cada uma das empresas de que foram transmitidas participações sociais no ano de 2010 dever ser qualificada como pequena empresa: cada uma delas apresentava, nesse ano, volume de negócios inferior a € 10.000.000,00 e empregava, cada uma, menos de 50 trabalhadores.

A considerar-se que as empresas referidas deviam ser qualificadas como «empresas associadas», à face da definição do artigo 3.º do anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007, os dados relativos ao volume de negócios e número de trabalhadores devem ser considerados em conjunto, nos termos dos n.ºs 2 e 3 do artigo 6.º do mesmo anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007, o que, neste caso, a ocorrer, implicará a não atribuição de qualificação de pequenas empresas, pois o número de trabalhadores supera 50.

Para efeitos de possível enquadramento da situação das empresas no conceito de «empresas associadas», está assente que o Sujeito Passivo A… detinha participações nas três empresas referidas, gerando situação enquadrável em hipóteses previstas nas alíneas do n.º 3 do artigo 3.º do anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007.

Assim, para enquadramento da situação neste conceito apenas fica por esclarecer se, no ano de 2010, essas empresas exerciam «as suas actividades, ou parte delas, no mesmo mercado ou em mercados contíguos».

O conceito de mercado contíguo é fornecido pelo mesmo n.º 3 do artigo 3.º, como sendo «o mercado de um produto ou serviço situado directamente a montante ou a jusante do mercado relevante».

No caso em apreço, os produtos comercializados pelas empresas em causa são idênticos, pelo que está afastada a qualificação de empresas associadas derivada do funcionamento em mercado contíguo.

Por isso, está em causa apenas saber se as empresas exercem «as suas actividades ou parte delas no mesmo mercado».

No caso em apreço, a Autoridade Tributária e Aduaneira concluiu, no Relatório da Inspecção Tributária, que as empresas referidas actuavam no mesmo mercado porque «as entidades identificadas têm o mesmo objeto social, que consiste na exploração, operação e gestão de restaurantes da cadeia internacional "F…", sob o regime de franchising, pelo que exercem a sua atividade no mesmo mercado (definido no 5º parágrafo do artigo 3º), cumprindo o outro requisito previsto no 4.º parágrafo do n.º 3 do artigo 3º do Anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007 de 6 de novembro» (ponto «F.2 – Mercado» do Relatório da Inspecção Tributária).

De harmonia com o artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 372/2007, os conceitos e critérios a utilizar para aferir o respectivo estatuto de pequena empresa correspondem aos previstos na Recomendação n.º 2003/361/CE, da Comissão Europeia, de 6 de Maio.

No Considerando 12 desta Recomendação refere-se que, «a fim de reservar as vantagens decorrentes de várias regulamentações ou medidas a favor das PME para empresas que delas necessitem realmente, é igualmente desejável que se atenda, eventualmente, às relações existentes entre as empresas por intermédio das pessoas singulares. A fim de limitar ao estritamente necessário a análise destas situações, é conveniente restringir a tomada em consideração destas relações aos casos de sociedades que exerçam actividades no mesmo mercado relevante ou em mercados contíguos, referindo-se, sempre que necessário, à definição da Comissão de mercado relevante, objecto da Comunicação da Comissão sobre a definição de mercado relevante para efeitos do direito comunitário da concorrência».

Esta Comunicação está publicada no JO C 372/03 de 09-12-1997, página 5, referindo-se nela, além do mais, o seguinte:

– o objectivo de definir um mercado tanto em função do seu produto como em função da sua dimensão geográfica é o de identificar os concorrentes efectivos das empresas em causa susceptíveis de restringir o seu comportamento e de impedi-las de actuar independentemente de uma pressão concorrencial efectiva (ponto 2);

– «um mercado de produto relevante compreende todos os produtos e /ou serviços consideradas permutáveis ou substituíveis pelo consumidor devido às suas características, preços e utilização pretendida» (ponto 7);

– «o mercado geográfico relevante compreende a área em que as empresas em causa fornecem produtos ou serviços, em que as condições da concorrência são suficientemente homogéneas e que podem distinguir-se de áreas geográficas vizinhas devido ao facto, em especial, das condições da concorrência serem consideravelmente diferentes nessas áreas» (ponto 8);

– «o mercado relevante no âmbito do qual se deve apreciar uma determinada questão do ponto de vista da concorrência é, por conseguinte, determinado pela conjugação dos mercados do produto e geográfico» (ponto 9);

– «basicamente, o exercício da definição de mercado consiste na identificação das verdadeiras fontes alternativas de fornecimento para os clientes da empresa em causa, tanto em termos de produtos/serviços como em termos da localização geográfica dos fornecedores» (parte final do ponto 13).

 

Como se refere expressamente no transcrito ponto 9, para a definição do conceito de mercado relevante deverá atender-se à «conjugação dos mercados do produto e geográfico».

Comparando este conceito com o utilizado pela Autoridade Tributária e Aduaneira no RIT para concluir se as empresas em causa actuam no «mesmo mercado», constata-se que este conceito foi mal interpretado no Relatório da Inspecção Tributária subjacente ao acto impugnado, pois, para que se considere que as empresas actuam no mesmo mercado não basta a identidade dos produtos comercializados, que, no caso, a Autoridade Tributária e Aduaneira considerou demonstrada dizendo que as empresas em causa «têm o mesmo objeto social, que consiste na exploração, operação e gestão de restaurantes da cadeia internacional "F…", sob o regime de franchising, pelo que exercem a sua atividade no mesmo mercado».

Na verdade, como resulta da referida Comunicação, a identidade de mercado deve ser definida através da conjugação dos mercados do produto e geográfico, sendo claro que este elemento geográfico assume manifestamente relevância em situações em que o produto comercializado é, pelas suas características, destinado a consumidores localizados na área onde se situa a empresa comercializadora, como é evidente em relação a produtos de fast food, que são servidos no estado de prontos para consumo imediato, como é facto notório suceder nos restaurantes daquela cadeia internacional.

Por isso, desde logo, tem de se concluir que a liquidação impugnada enferma de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, consubstanciado em errada interpretação da lei aplicável.

De qualquer forma, os poucos elementos fáticos disponíveis no processo com relevância para análise do elemento geográfico necessário para apurar se há identidade de mercado conduzem também à conclusão de que é errada a conclusão em que a Autoridade Tributária e Aduaneira baseou a liquidação impugnada.

Na verdade, para se poder concluir que as empresas actuam no mesmo mercado geográfico é necessário, de harmonia com o citado ponto 13, que se apure que os estabelecimentos são entre si alternativa de fornecimento de produtos para os respectivos clientes.

O facto de se tratar de comercialização de produtos de restauração rápida e de baixo custo, totalmente idênticos, leva a concluir que a distância de cerca de 30 Km entre o estabelecimento de Barcelos e os de Viana do Castelo será, normalmente, à face das regras de experiência comum, um obstáculo a que os clientes residentes na área de Barcelos optem por utilizar os estabelecimentos de Viana do Castelo e que os residentes nesta área optem por utilizar o estabelecimento de Barcelos, pois o custo do transporte onerará consideravelmente o custo global a suportar, para além da incomodidade e tempo inerentes à deslocação e não haverá qualquer vantagem a nível dos produtos a consumir, pois serão idênticos e com o mesmo custo.

De resto, a evolução dos valores da facturação dos estabelecimentos aponta manifestamente no sentido da tese dos Requerentes, pois não se notam consequências negativas para o estabelecimento de Barcelos derivadas da criação de um novo estabelecimento do mesmo tipo em Viana do Castelo nem para o inicialmente existente em Viana do Castelo, na sequência do funcionamento do de Barcelos.

Assim, os elementos disponíveis no processo apontam no sentido de ser correcta a tese defendida pelos Requerentes.

Mas, mesmo que não se considere provado que os estabelecimentos de Viana do Castelo e de Barcelos não são reciprocamente alternativas de fornecimento de produtos para os respectivos clientes, é inquestionável que não se fez a prova dessa alternatividade, pelo que se estará perante uma situação de non liquet, a resolver à face das regras do ónus da prova.

 Estas regras, no caso em apreço, em que está em causa a prova de factos necessários para o preenchimento do conceito de «mesmo mercado» invocado pela Autoridade Tributária e Aduaneira como pressuposto do acto de liquidação, impõem que as dúvidas tenham de ser valoradas contra a Autoridade Tributária e Aduaneira e não a seu favor (artigos 74.º, n.º 1, da LGT e 100.º, n.º 1, do CPPT), o que equivale processualmente a considerar-se que não se verifica aquele pressuposto de facto.

Por isso, conclui-se que, além do referido erro sobre os pressupostos de direito, o acto de liquidação enferma também de erro sobre os pressupostos de facto, erros esses que constituem vício de violação de lei, que justifica a anulação do acto de liquidação (artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo de 2015).

 

4.4. Juros compensatórios e demonstração de acerto de contas-compensação

Os Requerentes pedem a anulação da liquidação de juros compensatórios n.º 2015 … e da demonstração de acerto de contas (compensação n.º 2015…).

Os juros compensatórios integram-se na própria dívida do imposto, com a qual são conjuntamente liquidados (artigo 35.º, n.º 8, da LGT).

Tanto a liquidação de juros compensatórios como a compensação têm, como pressuposto a liquidação de IRS, pelo que enfermam dos mesmos vícios que afectam esta.

Por isso, justifica-se a anulação da liquidação de juros compensatórios e da compensação.

 

5. Decisão

De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral em:

a) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;

b)Anular a liquidação de IRS n.º 2015…, a liquidação de juros compensatórios n.º 2015 … e a demonstração de acerto de contas (compensação n.º 2015…), de que resultou um valor a pagar de € 259.582,08.

 

6. Valor do processo

 De harmonia com o disposto no art. 305.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 259.582,08.

 

7. Custas

 Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 4.896,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

Lisboa, 23 de Março de 2016

Os Árbitros

 

(Jorge Manuel Lopes de Sousa)

 

 

(Catarina Gonçalves)

 

 

(Maria Isabel Guerreiro)

 

 

 

 



[1]              Essencialmente neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, a propósito de situação paralela que se coloca nos processos de recurso contencioso:

– de 10-11-98, do Pleno, proferido no recurso n.º 32702, publicado em AP-DR de 12-4-2001, página 1207.

– de 19/06/2002, processo n.º 47787, publicado em AP-DR de 10-2-2004, página 4289.

– de 09/10/2002, processo n.º 600/02.

– de 12/03/2003, processo n.º 1661/02.

Em sentido idêntico, podem ver-se:

– MARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, volume I, 10.ª edição, página 479 em que refere que é "irrelevante que a Administração venha, já na pendência do recurso contencioso, invocar como motivos determinantes outros motivos, não exarados no acto", e volume II, 9.ª edição, página 1329, em que escreve que "não pode (...) a autoridade recorrida, na resposta ao recurso, justificar a prática do acto recorrido por razões diferentes daquelas que constam da sua motivação expressa".

– MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, Direito Administrativo, Volume I, página 472, onde escreve que "as razões objectivamente existentes mas que não forem expressamente aduzidas, como fundamentos do acto, não podem ser tomadas em conta na aferição da sua legalidade".

[2]              No caso em apreço, não se coloca a questão de saber se a qualificação de «empresas associadas» pode resultar de as empresas actuarem em «mercados contíguos», à face da definição fornecida pelo último parágrafo daquele n.º 3, pois nem sequer é aventada a hipótese de as empresas actuarem em «mercado de um produto ou serviço situado directamente a montante ou a jusante do mercado relevante».