Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 628/2015-T
Data da decisão: 2016-03-21  ISP  
Valor do pedido: € 1.877,12
Tema: ISP - Gasóleo colorido e marcado; cartão electrónico de abastecimento; intransmissibilidade do benefício fiscal.
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Decisão Arbitral[1]

 

 

O Árbitro, Dra. Sílvia Oliveira, designado pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formar o Tribunal Arbitral, constituído em 10 de Dezembro de 2015, com respeito ao processo acima identificado, decidiu o seguinte:

 

1.             RELATÓRIO

 

1.1.       Cabeça de Casal da Herança de A… (doravante designada por “Requerente”), NIF nº…, com residência fiscal na Rua…, nº…, em…, Valpaços, apresentou um pedido de pronúncia arbitral e de constituição de Tribunal Arbitral singular, no dia 5 de Outubro de 2015, ao abrigo do disposto no artigo 4º e do nº 2 do artigo 10º do Decreto-lei nº 10/2011, de 20 Janeiro [Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT)], em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada por “Requerida”).

 

1.2.       A Requerente pretende, no referido pedido de pronúncia arbitral, que o Tribunal Arbitral declare “(…) a decisão de cobrança (…) n.º …/2015 (…) revogada (...)” e seja “(…) anulado o (…) imposto, por o mesmo ser ilegal e injusto, não sendo devido pela Herança aqui requerente.”.

 

1.3.    O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD em 5 de Outubro de 2015 e notificado, na mesma data, à Requerida.

 

1.4.    Dado que a Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, ao abrigo do disposto no artigo 6º, nº 2, alínea a) do RJAT, a signatária foi designada como árbitro, em 23 de Novembro de 2015, pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, tendo a nomeação sido aceite, no prazo e termos legalmente previstos.

 

1.5.    Na mesma data, foram as Partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do artigo 11º, nº 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6º e 7º do Código Deontológico.

 

1.6.    Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c), do nº 1, do artigo 11º do RJAT, o Tribunal Arbitral foi constituído em 10 de Dezembro de 2015, tendo sido proferido despacho arbitral em 17 de Dezembro de 2015, no sentido de notificar a Requerida para, nos termos do disposto no artigo 17º, nº 1 do RJAT, apresentar resposta, no prazo máximo de 30 dias e, caso quisesse, solicitar a produção de prova adicional.

 

1.7.       Adicionalmente, foi ainda referido naquele despacho arbitral que a Requerida deveria remeter ao Tribunal Arbitral, dentro do prazo da resposta, cópia do processo administrativo.

 

1.8.       Em 29 de Janeiro de 2016, a Requerida apresentou a sua Resposta, tendo-se defendido por impugnação no sentido que “(…) deve o acto de liquidação impugnado ser mantido na ordem jurídica nos termos em que foi proferido” e, em consequência, deverá ser “(…) o pedido de pronúncia arbitral julgado totalmente improcedente”.

 

1.9.       Com a Resposta, a Requerida anexou também o respectivo processo administrativo.

 

1.10.  Em 4 de Fevereiro de 2016, foi emitido despacho arbitral no sentido das Partes se pronunciaram, no prazo de cinco dias, sobre a possibilidade:

 

1.10.1.   De dispensa da realização da reunião a que alude o artigo 18º do RJAT, incluindo a possibilidade de dispensa da inquirição da prova testemunhal apresentada pelo Requerente e,

1.10.2.   De dispensa da apresentação de alegações.

 

1.11.      As Partes não se pronunciaram, dentro do prazo concedido para o efeito, sobre o teor do despacho arbitral referido no ponto anterior.

 

1.12.      Nestes termos, foi decidido pelo Tribunal Arbitral, em despacho datado de 2 de Março de 2016, em consonância com os princípios processuais consignados no artigo 16º do RJAT, da autonomia do tribunal arbitral na condução do processo e na determinação das regras a observar [alínea c)], da cooperação e da boa-fé processual [alínea f)] e da livre condução do processo consignado no artigo 19º e 29º, nº 2 do RJAT, tendo ainda em conta o princípio da limitação de actos inúteis previsto no artigo 130º do Código de Processo Civil (CPC) [aplicável por força do disposto no artigo 29º, nº 1, alínea e) do RJAT]:

 

1.12.1.       Prescindir da realização da reunião a que alude o artigo 18º do RJAT, incluindo prescindir da inquirição da prova testemunhal apresentada pela Requerente;

1.12.2.       Prescindir da apresentação de alegações;

1.12.3.       Designar o dia 21 de Março de 2016 para efeitos de prolação da decisão arbitral.

 

1.13.       No mesmo despacho, foi a Requerente ainda advertida que “até à data da prolação da decisão arbitral deveria proceder ao pagamento da taxa arbitral subsequente, nos termos do disposto no nº 3 do artigo 4º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e comunicar esse pagamento ao CAAD”.

 

2.             CAUSA DE PEDIR

 

2.1.    A Requerente, enquanto Cabeça de Casal da Herança de A… foi notificada “(…) da Decisão de cobrança (…) n.º …/2015 (…)”, entende que aquela “(…) notificação reveste-se de total injustiça”, porquanto “com a mera análise de números, através de tabelas de utilização, é aplicado o ISP sobre o combustível agrícola utilizado na atividade agrícola logo após o decesso de A…”.

 

2.2.    Mais refere que “(…) já esclareceu que procedeu da forma como procedeu, por indicação técnica dos serviços agrícolas de Valpaços”, “local onde se deslocou aquando do decesso de seu marido, sendo-lhe afirmado que deveria continuar como anteriormente, nada havendo a alterar”.

 

2.3.    Assim, não compreende a Requerente a “razão pela qual (…) nada seja relevado desta situação, pois quem procede em conformidade com o que lhe é transmitido pelos organismos legais, não comete nenhuma ilegalidade”.

 

2.4.    Na verdade, alega a Requerente que “(…) os combustíveis foram adquiridos e foram utilizados pelas mesmíssimas máquinas agrícolas”, “porquanto, todo o combustível foi utilizado para os mesmos fins, nas mesmas máquinas, pelos herdeiros do sr. A…”.

 

2.5.    No caso em análise, entende a Requerente que “(…) a simples análise das tabelas de fornecimento de combustível, não é suficiente para aplicar retroativamente o ISP”, não concordando também com o “argumento aventado da intransmissibilidade do cartão (…)” pois “(…) a norma não se encontra prevista para este tipo de circunstâncias”.

 

2.6.    Com efeito, segundo a Requerente “a intransmissibilidade do cartão está prevista para a circunstância de empréstimos entre vivos” mas a situação em análise (transmissão mortis causa) “(…) é de uma especificidade que não é a regulada no diploma legal invocado” “pela simples circunstância de se tratar de uma circunstância sem qualquer intervenção de vontade humana (…)”.

 

2.7.    Para a Requerente “a lei, sobre essa circunstância é de aplicação imediata, isto é, dá-se a sucessão, no momento da morte”, sendo “tudo (…) transmitido nesse momento, incluindo esta posição”, concluindo que “não é de aplicar o normativo invocado no relatório comunicado à Herança (n.º 6 da Portaria 117-A/2008), pois o mesmo não foi previsto com essa finalidade”.

 

2.8.    Nestes termos, finaliza a Requerente o pedido arbitral entendendo que “(…) a presente decisão deverá ser revogada e anulado o invocado imposto, por o mesmo ser ilegal e injusto, não sendo devido pela Herança aqui requerente”.

 

3.       RESPOSTA DA REQUERIDA

 

3.1.    A Requerida na resposta apresentada começa por arguir uma questão prévia relativa ao valor da causa, porquanto embora no pedido inicial a Requerente não tenha indicado o valor da causa, “no presente caso, com base no teor da notificação efectuada para pagamento do imposto e demais elementos constantes do processo administrativo, é possível atribuir um valor à causa que (…) deverá corresponder ao valor do montante de ISP a pagar pela introdução no consumo do gasóleo colorido e marcado em causa, o qual (…) consta da ficha do CAAD, relativa ao pedido inicial, como valor económico da causa”.

 

3.2.    Em seguida, a Requerida defendeu-se por impugnação tendo, em síntese, apresentado os seguintes argumentos:

 

3.3.       Começa por referir que “em 10.04.2015, por despacho do Director da Alfândega de…, foi determinada uma Acção de Inspecção Aduaneira à entidade A…, Cabeça de Casal da herança indivisa (…)”, sendo que “esta Acção (Processo OI2015…) teve como fim apurar a legalidade na utilização de cartões electrónicos após o falecimento do titular e beneficiário do regime, A…, no âmbito do ISP - Gasóleo Colorido e Marcado (GCM), no período de tempo de 06.10.2011 a 25.05.2015 (…)”, tendo a mesma sido concluída em 18.06.2015 e “na mesma data (…) através do ofício n.º…, a Alfândega de … notificou a entidade inspeccionada do projecto de conclusões do relatório, para efeitos de Audição Prévia (…)” (sublinhado nosso).

 

3.4.       Neste âmbito, entende a Requerida que não obstante a Requerente ter exercido o seu direito de resposta, em sede de Audição Prévia, “(…) não logrou alterar o conteúdo do Relatório Final (…), que concluiu (…) o seguinte” (sublinhado nosso):

 

3.4.1.           “A… foi titular dos cartões de microcircuito/electrónico n.ºs …  e …”;

3.4.2.           “O equipamento habilitado à utilização do gasóleo colorido e marcado era o tractor, matrícula …-…-…, marca … e modelo …”;

3.4.3.           “O beneficiário A… faleceu no dia 23.11.2010, constatando-se que, após essa data e no período compreendido entre 06.10.2011 e 25.05.2015, e em seu nome, foram adquiridos e utilizados 5.825,40 litros de gasóleo colorido e marcado, com recurso à utilização dos cartões electrónicos supracitados, sempre em proveito da herança indivisa (…)”;

3.4.4.           “À data do início do processo de inspecção, a herança indivisa (…) não era detentora de qualquer cartão de microcircuito que lhe permitisse aceder ao gasóleo colorido e marcado”.

3.4.5.           “O gasóleo colorido e marcado era utilizado pelos herdeiros nos tractores agrícolas propriedade do autor da herança” mas “(…) o tractor matrícula …-…-…, marca … e modelo … (…) até à data de 08.06.2015, não constava da relação de bens da herança indivisa”.

3.4.6.           “A referência à utilização de GCM em mais de um tractor pelos herdeiros legais, presume a utilização de GCM em equipamento não autorizado, dado que o tractor matrícula …-…-…, apenas se encontra habilitado à utilização deste produto desde 2015.06.23, o que significa que antes desta data se encontrava legalmente interdito da sua utilização”.

 

3.5.       Prossegue a Requerida referindo que “(…) por consubstanciarem uma violação ao regime legal aplicável, designadamente ao disposto no n.º 6 da Portaria n.º
117-A/2008, de 8 de Fevereiro, e aos artigos 14.º e 15.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, as irregularidades constatadas deram origem ao apuramento de um montante de ISP de acordo com o estabelecido no Código dos Impostos Especiais de Consumo
” e fosse “(…) instruído o Processo de Cobrança a Posteriori n.º … – Ano 2015 (…), no âmbito do qual o Chefe da Delegação Aduaneira de … determinou que se procedesse à liquidação do valor em dívida relativo a ISP, CSR, e juros compensatórios devidos, no montante total de 1.875,32 € (…)” (sublinhado nosso).

 

3.6.       Fundamenta a Requerida que “encontrando-se (…) o regime do benefício fiscal de taxa reduzida para a utilização do gasóleo colorido e marcado em equipamentos agrícolas e florestais previsto no (…) artigo 93.º (…) da Parte II (…) do CIEC, na Portaria n.º 117-A/2008, de 8 de Fevereiro, e na Portaria n.º 361-A/2008, de 12 de Maio, aplicando-se, ainda, o estabelecido noutros dispositivos legais quanto aos benefícios fiscais, de natureza geral, constantes de outros diplomas”, e “tratando-se de um benefício fiscal dependente de reconhecimento consistente na aplicação de uma taxa reduzida de ISP ao gasóleo colorido e marcado (…)”, o “benefício (…) se concretiza através da atribuição de cartão electrónico ao beneficiário (…)”.

 

3.7.       Prossegue a Requerida referindo que “os cartões (…) são pessoais e intransmissíveis, sendo os respectivos titulares responsáveis pela sua regular utilização”, “(…) ficam sujeitos, sob pena de incorrerem em infracção tributária, às seguintes obrigações” (sublinhado nosso):

 

3.7.1.           “Comunicar às autoridades competentes qualquer alteração dos pressupostos do benefício fiscal”;

3.7.2.           “Comunicar outras alterações relevantes, designadamente (…) transferência de propriedade dos equipamentos (…)”;

3.7.3.           “Colaborar com as autoridades competentes na realização dos controlos que vierem a ser determinados, com vista a comprovar a efectiva afectação dos produtos aos destinos ou utilizações com benefício fiscal e fornecer todos os elementos de informação solicitados”.

 

3.8.       Neste âmbito, continua a Requerida, citando o disposto no artigo 15º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), quanto à sua transmissibilidade, referindo que:

 

3.8.1.           “O direito aos benefícios fiscais, sem prejuízo do disposto nos números seguintes, é intransmissível inter vivos, sendo, porém, transmissível mortis causa se se verificarem no transmissário os pressupostos do benefício, salvo se este for de natureza estritamente pessoal”.

3.8.2.           “(…)”.

3.8.3.           “É igualmente transmissível inter vivos, mediante autorização do Ministro das Finanças, o direito aos benefícios fiscais concedidos, por acto ou contrato fiscal, a pessoas singulares ou colectivas, desde que no transmissário se verifiquem os pressupostos do benefício e fique assegurada a tutela dos interesses públicos com ele prosseguidos”.

 

3.9.       Assim, defende a Requerida que “(…) de acordo com o artigo 14. do EBF, a extinção dos benefícios fiscais tem por consequência a reposição automática da tributação-regra”, pelo que “(…) o benefício fiscal em causa, para além de depender sempre de um acto de reconhecimento por parte da administração fiscal, após solicitação do interessado, é também um benefício condicionado, isto é, que pressupõe que se mantenham obrigatoriamente os pressupostos em que assentou o reconhecimento do benefício”.

 

3.10.   Assim, para a Requerida, “a morte do titular do benefício coloca em causa todos os pressupostos em que assentou a concessão daquele benefício” “em virtude de o benefício ser concedido intuiti personae” sendo assim, segundo a Requerida “intransmissível quer inter vivos, quer mortis causa, o que se deve à própria natureza do benefício” (sublinhado nosso).

 

3.11.   Assim, segundo a Requerida, “em face da natureza pessoal deste benefício fiscal (…) ocorrendo a morte do beneficiário, o cartão em causa deveria ter sido devolvido após a cessação dos pressupostos do benefício, o que não se verificou, continuando o mesmo a ser utilizado”.

 

3.12.   Ora, “tendo-se constatado (…) que a candidatura ao benefício de aquisição e utilização de GCM, em nome de Cabeça de Casal da Herança de A…, só deu entrada no Ministério da Agricultura (…) no dia 17.06.2015 (…)”, “esses cartões de microcircuito, foram ilegalmente utilizados por um operador/utilizador não detentor de benefício fiscal”.

 

3.13.   Reitera a Requerida que “a violação dos pressupostos do benefício fiscal em causa, não se consubstancia tão-só na utilização de gasóleo colorido e marcado em fim diferente do declarado, mas também na utilização do gasóleo colorido marcado em equipamentos não autorizados e na utilização de gasóleo colorido e marcado sem reconhecimento prévio do benefício fiscal”, pelo querevestindo a qualidade de sujeito passivo da obrigação tributária todo aquele que está adstrito à satisfação da respectiva prestação tributária, tratando-se de uma herança indivisa, serão responsáveis pela dívida de ISP todos os herdeiros que aceitaram a herança, devendo (…) a dívida, ser assumida pela ora Requerente (…)” (sublinhado nosso).

 

3.14.   Nestes termos, conclui a Requerida que “por força do mencionado n.º 1 do artigo 14.º do EBF quanto à reposição automática da tributação-regra no caso de ocorrer a extinção dos benefícios fiscais, deve o acto de liquidação impugnado ser mantido na ordem jurídica (…)”, pelo que deverá ser “(…) o pedido de pronúncia arbitral julgado totalmente improcedente”.

 

4.             SANEADOR

 

4.1.    O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado no prazo previsto na alínea a), do nº 1, do artigo 10º do RJAT.

 

4.2.       As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária, são legítimas quanto ao pedido de pronúncia arbitral e estão devidamente representadas, nos termos do disposto nos artigos 4º e 10º do RJAT e do artigo 1º da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de Março.

 

4.3.       O Tribunal encontra-se regularmente constituído, nos termos do artigo 2º, nº 1, alínea a), artigos 5º e 6º, todos do RJAT e é competente quanto à apreciação do pedido de pronúncia arbitral formulado pela Requerente.

 

4.4.       No que diz respeito ao valor do pedido de pronúncia arbitral (questão prévia suscitada pela Requerida), apesar de o mesmo não ter sido quantificado e indicado no pedido apresentado, o valor de EUR 1.877,12, relativo à liquidação de ISP em crise, foi considerado para efeitos de cálculo do valor da taxa de arbitragem inicial paga pela Requerente.

 

4.5.       Com efeito, tendo em consideração:

 

4.5.1.           O pedido formulado pela Requerente [que o Tribunal declare “(…) a decisão de cobrança (…) n.º…/2015 (…) revogada (...)” e seja “(…) anulado o (…) imposto, por o mesmo ser ilegal e injusto (…)”], conforme identificado no ponto 1.2., supra;

4.5.2.           O disposto no artigo 296º do CPC de que “a toda a causa deve ser atribuído um valor certo, expresso em moeda legal, o qual representa a utilidade económica imediata do pedido” o qual, no caso em análise, de acordo com o previsto no artigo 297, nº 1 do CPC, deverá corresponder à quantia que se pretende obter (sublinhado nosso);

 

Concorda este Tribunal, de acordo com o disposto no artigo 306º, nº 2 do CPC, com o valor atribuído ao processo de EUR 1.877,12, [com as normais implicações no montante de custas finais do processo (cujo montante e responsabilidade pelas mesmas, de acordo com o disposto no artigo 4º, nº 4 do Regulamento de Custas nos Processo de Arbitragem, serão fixados no capítulo da Decisão)].

 

4.6.       Não foram identificadas nulidades no processo.

 

4.7.    Não existem excepções nem outras questões prévias de que cumpra conhecer, pelo que nada obsta ao conhecimento do mérito da causa.

 

5.             MATÉRIA DE FACTO

 

Dos factos provados

 

5.1.       A Requerente foi objecto de uma acção de inspecção inserida no Programa Local da Alfândega de …com o nº OI2015…, com o obectivo de averiguar o cumprimento das disposições legais relativas à utilização de gasóleo colorido e marcado (conforme cópia do relatório que faz parte integrante do processo administrativo junto aos autos pela Requerida).

 

5.2.       O âmbito da referida acção de inspeção, que teve início em 25 de Maio de 2015, é o ISP – GCM, cujos abastecimentos foram registados nos cartões nº … e…, no período desde 6 de Outubro de 2011 a 25 de Maio de 2015 (conforme cópia do relatório que faz parte integrante do processo administrativo junto aos autos pela Requerida).

 

5.3.       Os cartões identificados no ponto anterior, titulados pelo contribuinte A… (falecido a 23 de Novembro de 2010), concretizam o benefício fiscal da redução da taxa do Imposto sobre os Produtos Petrolíferos e Energéticos (ISPPE), aplicado ao GCM, habilitando o seu titular, no âmbito da sua actividade agrícola, a adquirir e a consumir GCM no equipamento para o qual tenha sido reconhecido esse benefício (conforme cópia do relatório que faz parte integrante do processo administrativo junto aos autos pela Requerida).

 

5.4.       O equipamento habilitado à utilização desse produto foi identificado como sendo um tractor marca …, modelo …, matrícula …-…-… (conforme cópia do relatório que faz parte integrante do processo administrativo junto aos autos pela Requerida).

 

5.5.       O tractor referido no ponto anterior não fazia parte da herança indivisa que resultou do falecimento de A…, tendo esta situação sido regularizada em 8 de Junho de 2015 (conforme cópia do relatório que faz parte integrante do processo administrativo junto aos autos pela Requerida).

 

5.6.       No âmbito da referida acção de inspecção, verificou-se que no período desde 6 de Outubro de 2011 a 25 de Maio de 2015 (ou seja, em datas após o falecimento do titular dos cartões acima identificados no ponto 5.2.) os mesmos foram utilizados em abastecimento do tractor matrícula …-…-…, o qual apenas se encontra habilitado à utilização deste produto desde 23 de Junho de 2015 (conforme cópia do relatório que faz parte integrante do processo administrativo junto aos autos pela Requerida e não contestado pela Requerente).

 

5.7.       Em resultado da acção de inspecção acima referida, a Requerente foi notificada, através do Ofício nº…, de 18 de Junho de 2015 (enviado, em 22 de Junho de 2015, por carta registada com aviso de recepção nº RF … PT), do projecto de conclusões do relatório de inspecção, nos termos do qual a Requerida entendeu que “com o falecimento do beneficiário (…) deixam de se encontrar satisfeitas as condições subjectivas da isenção que os cartões (…) materializam, pelo que o GCM, adquirido após a sua morte, não satisfaz os pressupostos do reconhecimento prévio do benefício fiscal (…)”, concluindo-se que a Requerente “(…) é responsável pela liquidação de imposto calculado de acordo com a diferença entre o nível de tributação aplicável ao gasóleo e a taxa reduzida aplicável ao gasóleo colorido e marcado”, no montante de EUR 1.682,42, correspondente ao ISP (EUR 1.170,32) e ao CSR (EUR 512,10) em dívida (conforme cópia do relatório que faz parte integrante do processo administrativo junto aos autos pela Requerida) (sublinhado nosso).

 

5.8.       Adicionalmente, a Requerente foi também notificada para exercer o seu direito de audição, oralmente ou por escrito, no prazo de 15 dias (conforme cópia do relatório que faz parte integrante do processo administrativo junto aos autos pela Requerida).

 

5.9.       A Requerente veio exercer, em 1 de Julho de 2015, o direito de audição prévia, por escrito, reiterando a argumentação já apresentada (conforme cópia do direito de audição que faz parte integrante do processo administrativo junto aos autos pela Requerida).[2]

 

5.10.   A Requerente foi notificada através do Ofício nº…, de 12 de Agosto de 2015, do teor do relatório final respeitante à acção inspectiva identificada no ponto 5.1., supra, tendo o mesmo reiterado os argumentos apresentados pela Requerida no projecto de relatório e, assim, concluído que houve “(…) uma introdução irregular no consumo (…)”, pelo que se manteve o montante de imposto liquidado e acima indicado (vide ponto 5.7.) (conforme cópia do relatório que faz parte integrante do processo administrativo junto aos autos pela Requerida).

 

5.11.   Assim, a Requerente foi notificada, através do Ofício nº…, de 21 de Agosto de 2015 (enviado, em 27 de Agosto de 2015, por carta registada com o aviso de recepção nº RF … PT), para proceder ao pagamento, no prazo de 15 dias, da quantia de EUR 1.877,12, apurada no “Processo de Cobrança à Posteriori nº …/2015” (conforme cópia do ofício que faz parte integrante do processo administrativo junto aos autos pela Requerida) e cuja desagregação de valores é a seguinte:

 

5.11.1.       ISP - EUR 1.170,32;

5.11.2.       CSR (total) - EUR 512,10;

5.11.3.       Juros compensatórios - EUR 192,90;

5.11.4.       Impresso aduaneiro - EUR 1,80.

 

5.12.   Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito do pedido.

 

Dos factos não provados

 

5.13.   Não foi obtida evidência quanto ao pagamento, pela Requerente, da quantia de
EUR 1.877,12, relativa ao valor da liquidação controvertida, objecto deste pedido de pronúncia arbitral.

 

5.14.   Não foi obtida prova de que a Requerente efectuou, após o falecimento de A…, em 23 de Novembro de 2010, a comunicação da alteração dos pressupostos do benefício fiscal subjacente aos cartões de abastecimento de GCM (cartões nº … e …), conforme alegado no pedido (pontos 6, 7 e 12).

 

5.15.   Não se verificaram quaisquer outros factos como não provados com relevância para a decisão arbitral.

 

6.       FUNDAMENTOS DE DIREITO

 

6.1.    No âmbito do processo arbitral em análise, a questão central relativamente à qual existem entendimentos absolutamente opostos entre a Requerente e a Requerida consiste em saber se há ou não uma (i)legalidade material do acto de liquidação praticado pela Alfândega de … (Delegação Aduaneira de…), respeitante à quantia de EUR 1.877,12, tendo, particularmente, em conta as respostas a dar às seguintes questões a decidir:

 

6.1.1.     A utilização de GCM é um benefício fiscal dependente de reconhecimento que por ser de natureza estritamente pessoal, é intransmissível mortis causa?

6.1.2.     A utilização de GCM sem reconhecimento prévio do benefício fiscal configura uma violação dos pressupostos do benefício fiscal, constituindo fundamento para a revogação da sua autorização, implicando a liquidação do imposto que se mostre devido?

6.1.3.     A aquisição e consumo de GCM por não titulares de cartão electrónico configura uma violação da lei, consubstanciando uma introdução irregular no consumo, estando sujeita às sanções previstas no Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT)?

 

6.2.    Com efeito, se por um lado a Requerente entende que o benefício fiscal associado aos cartões electrónicos para abastecimento de GCM é transmissível mortis causa, porquanto esta transmissão “(…) é de uma especificidade que não é regulada no diploma legal invocado”, por outro lado, a Requerente entende que, sendo tais cartões pessoais e intransmissíveis, os benefícios a eles associados são intransmissíveis mortis causa, pelo que, ocorrendo a morte do beneficiário, os cartões em causa deveriam ter sido devolvidos.

 

Do enquadramento geral

 

6.3.    Nos termos do disposto no Código dos Imposto Especiais sobre o Consumo (IEC) é estabelecido “o regime dos impostos especiais de consumo harmonizados pelo Direito Comunitário, considerando-se como tais (…)”, nomeadamente, “o imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos (ISP)”, sendo tais disposições aplicadas “no território nacional (…)”.[3]

 

6.4.    De acordo com o disposto no artigo 2º do Código dos IEC (em vigor à data dos factos e na actualidade), “os impostos especiais de consumo obedecem ao princípio da equivalência, procurando onerar os contribuintes na medida dos custos que estes provocam nos domínios do ambiente e da saúde pública, em concretização de uma regra geral de igualdade tributária”.

 

6.5.    Assim, de acordo com o previsto no artigo 88º, nº 1, alínea a) do Código dos IEC (em vigor à data dos factos e na actualidade), “estão sujeitos ao imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos (…)nomeadamente, “os produtos petrolíferos e energéticos” sendo que, nos termos da alínea a), do nº 2 do mesmo artigo, se dispõe que “(…) são qualificados como produtos petrolíferos e energéticos”, designadamente, “os produtos abrangidos pelos códigos 2701, 2702 e 2704 a 2715”.

 

6.6.    No que diz respeito a quem está abrangido, de acordo com o previsto no Código acima referido, “são (…) sujeitos passivos (…) as pessoas singulares (…) que introduzam no consumo (...) ou utilizem produtos sujeitos a imposto (…)”.

 

Do benefício fiscal associado ao GCM

 

6.7.    De acordo com o disposto no artigo 93º, nº 1 do Código dos IEC (em vigor à data dos factos e na actualidade) “são tributados com taxas reduzidas o (…) gasóleo (…) e o petróleo coloridos e marcados com os aditivos definidos por portaria (…)”, sendo que o gasóleo colorido e marcado só pode ser consumido pelas máquinas agrícolas elencadas no nº 3 daquele artigo, nomeadamente, por “(…) tratores agrícolas” (sublinhado nosso).

 

6.8.    Não obstante o regime previsto, em matéria de ISP, no Código dos IEC, estas normas são complementadas por outras constantes, designadamente, da Portaria nº
117-A/2008, de 8 de Fevereiro e Portaria nº 361-A/2008, de 12 de Maio [ambas aprovadas ainda na vigência do anterior Código dos IEC mas mantidas em vigor aquando da aprovação do novo Código, por força do artigo 5º do Decreto-Lei
n.º 73/2010, de 21 de Junho (diploma que aprovou este último Código)].

 

6.9.    Nesta conformidade, de acordo com o disposto na Portaria nº 117-A/2008, de 8 de Fevereiro [que “regulamenta as formalidades e os procedimentos aplicáveis ao reconhecimento e controlo das isenções e das taxas reduzidas do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos (ISP) previstas (…) no (…)” Código dos IEC], podem “beneficiar de isenção ou da aplicação de uma taxa reduzida do imposto as pessoas singulares (…) que, comprovadamente, utilizem produtos petrolíferos e energéticos sujeitos a ISP nas actividades ou nos equipamentos (…)” previstos no nº 1 daquela Portaria, “desde que cumpram as seguintes condições” (sublinhado nosso):

 

6.9.1.     “Essa actividade esteja devidamente declarada, nos termos da legislação tributária aplicável, excepto quando dispensada por lei ou pela natureza da isenção”;

6.9.2.     “Tenham a sua situação tributária e contributiva regularizada”;

6.9.3.     “Tenham cumprido as suas obrigações declarativas em sede de impostos sobre o rendimento e do imposto sobre o valor acrescentado”.

 

6.10.  Neste âmbito, “os pedidos de isenção ou de redução de taxa do imposto devem ser acompanhados de fotocópia (…)” do cartão de identificação fiscal e do documento de licenciamento da actividade exercida (quando exigível), “sem prejuízo de outra documentação considerada necessária”.

 

6.11.  De acordo com o disposto no artigo 55º da Portaria nº 117-A/2008 (na redacção dada pela Portaria nº 206/2014, de 8 de Outubro), a aplicação de uma taxa reduzida de ISP aos equipamentos previstos nas alíneas a) e c) do nº 3 do artigo 93º do Código dos IEC abrange as utilizações que se designam, nomeadamente, por equipamentos agrícolas.

 

6.12.  Assim, de acordo com o disposto no artigo 5º da Portaria nº 117-A/2008, de 8 de Fevereiro, “os benefícios fiscais concretizados através da utilização de gasóleo colorido e marcado são efectuados, obrigatoriamente, através da utilização de um cartão de microcircuito” ([4]), “o qual é emitido pela Direcção-Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural (DGADR) e remetido aos requerentes pela entidade competente para o reconhecimento do benefício fiscal em causa” (sublinhado nosso).[5]

 

6.13.  Sendo os cartões referidos no número anterior pessoais e intransmissíveis, os respectivos titulares serão responsáveis pela sua regular utilização, ficando ainda sujeitos (sob pena de incorrerem em infracção tributária), às seguintes obrigações (sublinhado nosso):

 

a)    Comunicar às autoridades competentes qualquer alteração dos pressupostos do benefício fiscal;

b)    Comunicar outras alterações relevantes, designadamente alteração de localização das instalações ou dos equipamentos autorizados, transferência de propriedade dos equipamentos bem como a cedência ou substituição destes;

c)    Colaborar com as autoridades competentes na realização dos controlos que vierem a ser determinados, com vista a comprovar a efectiva afectação dos produtos aos destinos ou utilizações com benefício fiscal e fornecer todos os elementos de informação solicitados”.

 

6.14.  Adicionalmente, de acordo com o disposto no artigo 8º da Portaria nº 117-A/2008, “estão ainda obrigados a devolver o cartão de microcircuito no caso de cessação dos pressupostos do benefício, no prazo máximo de cinco dias úteis” e a “comunicar qualquer situação de extravio ou de anomalia no cartão de microcircuito atribuído” (sublinhado nosso).[6]

 

6.15.  As comunicações referidas nos pontos anteriores “(…) devem ser efectuadas por escrito, preferencialmente por correio eletrónico, no prazo máximo de cinco dias úteis”.

 

6.16.  Por outro lado, “os benefícios fiscais referidos na portaria acima identificada estão sujeitos a reavaliação periódica pelas autoridades competentes, tendo em vista aferir da manutenção dos respectivos pressupostos e do cumprimento das demais condições exigíveis nos termos da legislação aplicável” (sublinhado nosso).

 

6.17.  Nestes termos, tendo em consideração que “o gasóleo colorido e marcado só pode ser adquirido pelos titulares do cartão eletrónico instituído para efeitos de controlo da sua afetação aos destinos referidos (…)”, a aquisição de GCM com violação das regras previstas no artigo 93º do Código dos IEC está sujeita às sanções previstas no RGIT e em legislação especial.

 

6.18.  Neste âmbito, constituem fundamento para a revogação da autorização do benefício fiscal (sem prejuízo de instauração de processo por infracção tributária nos termos previstos no RGIT), a violação dos pressupostos do benefício bem como a inobservância imputável ao beneficiário das condições exigidas no artigo 2º da Portaria nº 117-A/2008, sendo que, em caso de violação dos pressupostos do benefício fiscal, é ainda liquidado o imposto que se mostre devido.

 

6.19.  Para efeitos do disposto no ponto anterior, considera-se que há violação dos pressupostos do benefício fiscal, designadamente, em caso de (sublinhado nosso)

 

a)    Utilização de produtos, sem reconhecimento prévio do benefício fiscal;

b)    Utilização dos produtos autorizados em fim diferente do declarado;

c)    Utilização de produtos em equipamentos não autorizados”.

 

Do regime dos benefícios fiscais em geral

 

6.20.  O sistema fiscal português dispõe de um conjunto de benefícios fiscais, com vista a promover ou incentivar determinadas operações, setores económicos, actividades, regiões ou agentes económicos, desempenhando, por isso, um papel relevante no desenvolvimento do nosso país, sendo que algumas dessas alternativas constam do EBF, publicado pelo Decreto-Lei nº 215/89 de 1 de Julho, diploma que já sofreu diversas actualizações.

 

6.21.  Assim, no que diz respeito ao regime dos benefícios fiscais propriamente ditos, há desde logo que ter em consideração a definição de benefício fiscal (o qual se traduz num incentivo de natureza económica, social ou cultural), representando todas as vantagens atribuídas aos sujeitos passivos, tendo em vista a realização de um determinado comportamento.

 

6.22.  Com efeito, a concessão de um benefício fiscal opõe-se à aplicação do sistema normativo, porquanto se traduz num facto impeditivo do nascimento da obrigação tributária.

 

6.23.  Por se poder tratar de um incentivo económico, social ou cultural, prosseguindo finalidades diversas das que presidem ao sistema de tributação regra, devem os benefícios fiscais caracterizar-se pela sua natureza excepcional e pelo fundamento extrafiscal:

 

6.23.1.   Pela sua natureza excepcional, porque obstam à tributação normal;

6.23.2.   Pelo fundamento extrafiscal, na medida em que, a existir um fundamento fiscal, ele deveria ser incorporado no próprio sistema de tributação regra.

 

6.24.  Constituindo o acto de tributar um acto de interesse público haverá que reconhecer que a criação de um benefício fiscal irá alterar o equilíbrio na distribuição da carga fiscal ao tratar de modo desigual os cidadãos, à luz do critério da capacidade contributiva, inviabilizando a aplicação do princípio da igualdade.[7] [8]

 

6.25.  Nestes termos, poder afirmar-se que os benefícios fiscais encerram três requisitos:[9]

 

a)             Desde logo, constituem uma derrogação às regras gerais de tributação;

b)             Em segundo lugar, prosseguem um objectivo social e económico relevante que determina a derrogação da regra geral referida no ponto anterior;

c)             E, por último, atribuem, em consequência, uma vantagem aos contribuintes que deles beneficiam.

 

6.26.  Ora, de acordo com o disposto no artigo 2º do EBF, “consideram-se benefícios fiscais as medidas de carácter excepcional instituídas para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes que sejam superiores aos da própria tributação que impedem”, sendo consideradas como benefícios fiscais, nomeadamente, “(…) as reduções de taxas (…)” (sublinhado nosso).

 

6.27.  Neste sentido, o artigo 2º, nº1 do EBF considera o conceito de benefício fiscal como sendo um facto impeditivo da constituição da relação tributária, pelo que as normas que presidem à sua criação, e que legitimam a sua concessão, são:

 

6.27.1.   Juridicamente especiais e,

6.27.2.   Factualmente excepcionais, porquanto encontram-se fundamentadas em interesses públicos, extrafiscais, mas constitucionalmente relevantes.

 

6.28.  Assim, a quebra do núcleo essencial da tributação passa, primordialmente, por uma derrogação ao princípio da capacidade contributiva ([10]) porquanto, de acordo com este princípio, a tributação seria praticada de acordo com a situação subjectiva da cada contribuinte, ou seja, o imposto justo é aquele que garante a igualdade material na repartição dos encargos tributários.

 

6.29.  No entanto, a capacidade contributiva reporta-se ao critério da repartição das receitas destinadas ao financiamento das despesas públicas directas (e não àquelas destinadas à prossecução de fins sociais extrafiscais concretos), o que significará que a repartição das receitas não seria possível se não fosse a possibilidade de modelação do conteúdo do princípio da capacidade contributiva.

 

6.30. A capacidade contributiva, tal como foi definida, reclama não só a personalização da tributação mas também que o legislador dirija o imposto às três manifestações de riqueza relevantes que indiciem a capacidade económica do contribuinte e que constituem a base tributável, ou seja, a riqueza que angaria (o rendimento), a riqueza que possui (o património) e a riqueza que despende (o consumo).[11]

 

6.31.  Embora o princípio da capacidade contributiva não consuma o princípio da igualdade fiscal, ele constitui, todavia, umas das suas expressões ou manifestações mais fortes, bem como a de um elemento conformador da ideia de Estado de Direito Material.

 

6.32.  Nestes termos, o princípio da capacidade contributiva compreende duas dimensões, que são a de pressuposto e a de limite da tributação: como pressuposto ou fonte da tributação, o princípio da capacidade contributiva baseia-se na força económica do contribuinte expressa na titularidade ou utilização da riqueza; já como limite ou medida valor do imposto, veda que o legislador adopte elementos de ordenação incidentes sobre os elementos constitutivos do imposto, contrários às exigências de justiça fiscal enunciadas pelo mesmo princípio.[12]

 

6.33.  Por outro lado, os benefícios fiscais podem ser distinguidos como benefícios condicionados, benefícios temporários e benefícios permanentes.

 

6.34.  Os benefícios fiscais condicionados são aqueles cuja eficácia fica dependente da verificação de certos pressupostos acessórios secundários (que são a sua “conditio juris”), distinguindo-se deste modo, dos benefícios ditos puros cuja eficácia não está dependente da verificação de nenhum pressuposto acessório.[13]

 

6.35.  Nos benefícios condicionados, a condição pode revestir uma de duas formas, ou suspensiva ou resolutiva:

 

6.35.1.   A condição diz-se suspensiva quando o benefício é concedido depois de verificados determinados pressupostos acessórios e,

6.35.2.   Considera-se resolutiva quando o benefício é concedido mas a sua eficácia fica dependente da verificação dos pressupostos do benefício, cuja não verificação determina a caducidade do mesmo.

 

6.36.  Relativamente aos benefícios temporários, como o nome indica, são concedidos por um período limitado fixado na lei, por contraposição aos benefícios permanentes concedidos para o futuro sem pré determinação da respectiva duração.[14] [15]

 

6.37.  Sendo os benefícios temporários criados com o objectivo de produzirem certos resultados de interesse público relevante, os benefícios de carácter permanente, dada a sua longa duração, têm por inconveniente, a possibilidade de ultrapassado o interesse público prosseguido com a sua concessão, se virem a transformar em favores ou privilégios fiscais.

 

6.38.  Ainda neste âmbito, importa também proceder à distinção pela qual os benefícios fiscais podem ser considerados estáticos ou dinâmicos:

 

6.38.1.   Os primeiros são norteados para situações que já se verificaram (ou que ainda não se verificando totalmente), não visando (pelo menos de um modo directo), incentivar ou estimular, mas tão só beneficiar (por razões de ordem superior e de natureza de política geral de defesa, económica, religiosa, social, cultural, etc);

6.38.2.   Pelo contrário, os incentivos dinâmicos visam incentivar ou estimular determinadas actividades, procedendo ao estabelecimento de uma relação entre as vantagens atribuídas e as actividades estimuladas em termos de causa-efeito.

 

6.39.  Assim, enquanto nos benefícios fiscais estáticos a causa do benefício é a situação ou actividade em si mesma, nos benefícios fiscais dinâmicos a causa prende-se com a adopção futura do comportamento beneficiado ou exercício futuro da actividade que se pretende fomentar.

 

6.40.  Conforme estabelece o artigo 12º do EBF, “o direito aos benefícios fiscais deve reportar-se à data da verificação dos respectivos pressupostos, ainda que esteja dependente de reconhecimento (…)” (sublinhado nosso).

 

6.41.  Depreende-se, desta transcrição, que, por via de regra, o direito aos benefícios fiscais se constitui com a verificação dos respectivos pressupostos.

 

6.42.  Contudo, tal como a obrigação tributária não se vence no exacto momento em que se verifica, é compreensível que se um benefício fiscal não for devida e atempadamente requerido, não produza os seus efeitos no exacto momento da verificação dos factos.[16]

 

6.43.  Nesta matéria, de acordo com o disposto no artigo 5º do EBF, os benefícios fiscais podem ser “automáticos e dependentes de reconhecimento”, sendo que “os primeiros resultam directa e imediatamente da lei, os segundos pressupõem um ou mais actos posteriores de reconhecimento” (sublinhado nosso).

 

6.44.  Na verdade, no que diz respeito à concessão dos benefícios fiscais, a lei distingue dois tipos de reconhecimento:

 

6.44.1.   Nos benefícios fiscais automáticos, o reconhecimento resulta directa e imediatamente da lei, operando pela simples verificação dos respectivos pressupostos de facto, não carecendo de qualquer acto da administração tributária;

6.44.2.   Nos benefícios fiscais dependentes de reconhecimento, este pode ser efectuado por acto administrativo (caso em que temos benefícios fiscais dependentes de reconhecimento unilateral) ou através de contrato (caso em que temos benefícios fiscais dependentes de reconhecimento bilateral).

 

6.45.  Para efeitos do acima descrito, dispõe o artigo 65º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) que “o reconhecimento dos benefícios fiscais depende da iniciativa dos interessados, mediante requerimento dirigido especificamente a esse fim, o cálculo, quando obrigatório, do benefício requerido e a prova da verificação dos pressupostos do reconhecimento nos termos da lei” (sublinhado nosso).

 

6.46.  De acordo com o disposto no artigo 7º do EBF, “todas as pessoas, singulares ou coletivas, de direito público ou de direito privado, a quem sejam concedidos benefícios fiscais, automáticos ou dependentes de reconhecimento, ficam sujeitas a fiscalização da Autoridade Tributária e Aduaneira (…) para controlo da verificação dos pressupostos dos benefícios fiscais respetivos e do cumprimento das obrigações impostas aos titulares do direito aos benefícios” (sublinhado nosso).[17]

 

6.47.  Quanto à forma de extinção dos benefícios fiscais, em termos gerais, de acordo com o disposto no artigo 14º do EBF, a mesma pode ser provocada pela caducidade, pela alienação de bens para fins diferentes daqueles para que foi concedido o benefício, pela revogação do acto administrativo de concessão e pela renúncia aos benefícios.

 

6.48.  Em qualquer dos casos, de acordo com o disposto no artigo referido no ponto anterior, “a extinção dos benefícios fiscais tem por consequência a reposição automática da tributação regra” (sublinhado nosso).

 

6.49.  Assim, nos termos do disposto no artigo 9º do EBF, “as pessoas titulares do direito aos benefícios fiscais são obrigadas a declarar, no prazo de 30 dias, que cessou a situação de facto ou de direito em que se baseava o benefício, salvo quando essa cessação for de conhecimento oficioso” (sublinhado nosso).

 

6.50.  Por outro lado, nos termos do disposto no artigo 15º do EBF, “o direito aos benefícios fiscais (…) é intransmissível inter vivos, sendo, porém, transmissível mortis causa se se verificarem no transmissário os pressupostos do benefício, salvo se este for de natureza estritamente pessoal” (sublinhado nosso).

 

6.51.  Com efeito, o nº 1 do artigo 15º do EBF estabelece dois princípios:

 

6.51.1.   Por um lado, o princípio da intransmissibilidade do direito aos benefícios fiscais “inter vivos” e,

6.51.2.   Por outro, o princípio da transmissibilidade do mesmo direito “mortis causa”, com a condição de que no transmissário se verifiquem os pressupostos do benefício e este não seja de natureza estritamente pessoal.[18]

 

6.52.  Na verdade, pelo facto do benefício fiscal ser concedido “intuitu personae” deverá ser considerado intransmissível, quer “inter vivos”, quer “mortis causa”.

 

6.53.  Contudo, esta regra da intransmissibilidade comporta duas excepções, previstas no artigo 15º, nº 2 e nº 3 do EBF, a primeira de aplicação automática e a segunda dependente de autorização do Ministro das Finanças.[19]

 

6.54.  De acordo com o previsto no artigo 14º do EBF, conforme acima já referido, “a extinção dos benefícios fiscais tem por consequência a reposição automática da tributação-regra”.

 

Do enquadramento do caso em análise

 

6.55.  Conforme acima exposto, a aplicação de uma taxa reduzida de ISP às pessoas singulares que, comprovadamente, utilizem o GMC na actividade agrícola e nos equipamentos previstos, depende da verificação de um pressuposto e está associada a duas condições.

 

6.56.  Quanto ao pressuposto (que enquadra o real e profundo sentido da aplicação de uma taxa reduzida prevista no artigo 55º da Portaria nº 117-A/2008 e no artigo 93º, nº 1 do Código dos IEC), qual seja o de incentivar e estimular a actividade agrícola, dir-se-á que o mesmo ao visar que os produtos petrolíferos e energéticos (neste caso, o GCM) seja utilizado apenas em algumas actividades e equipamentos, assume uma essencialidade absoluta e incontornável, ou seja, trata-se de um pressuposto de verificação indispensável para que a redução de taxa se concretize.

 

6.57.  Por outro lado, as referidas condições, ao contrário do carácter objectivo do aludido pressuposto, têm um pendor de carácter subjectivo.

 

6.58.  Com efeito, a redução de taxa em causa depende, desde logo, conforme previsto no artigo 56º da Portaria nº 117-A/2008, de pedido de reconhecimento do benefício fiscal apresentado junto das direcções regionais de agricultura e pescas.

 

6.59.  Nestes termos, trata-se de um reconhecimento que, reportando-se à redução de taxa de ISP aplicável, não pode deixar de ter em conta o estatuto do adquirente e as suas condições legais para poder beneficiar dessa redução de taxa.

 

6.60.  Assim, tal reconhecimento tem de ter em conta não só a pessoas (singulares ou colectiva) às quais o benefício fiscal irá ser concedido, mas também, a identificação dos equipamentos a serem abastecidos com o GCM, bem como a prova da respectiva titularidade ou legítima detenção.

 

6.61.  As mencionadas condições são, em larga medida, destinadas a facilitar a fiscalização e assegurar o eficiente controlo da utilização dos cartões electrónicos acima identificados (no ponto 5.2.) inscrevendo-se, assim, no leque de instrumentos orientados para a prevenção da fraude fiscal-aduaneira, ao dispor da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

6.62.  Na verdade, as referidas condições tem subjacentes especiais preocupações no sentido de evitar que os produtos petrolíferos e energéticos, objecto de redução de taxa, sejam encaminhados para finalidades diversas daquelas que as sustentam.

 

6.63.  Ou seja, o que se visa garantir é que a utilização desses produtos se concretize nas actividades legalmente elencadas, através dos equipamentos identificados porque se assim não acontecer, será devido o respectivo imposto (em resultado da diferença entre o nível de tributação em ISP e CSR, aplicável ao gasóleo rodoviário e a taxa de ISP aplicável ao GCM), calculado de acordo com as taxas normais de ISP correspondentes.

 

6.64.  Em suma, a intenção legislativa subjacente às normas relativas às mencionadas condições é a de assegurar uma eficiente fiscalização da utilização dos cartões eletrónicos, evitando-se assim um aproveitamento abusivo e privilegiado de um benefício fiscal, à margem das profundas razões e finalidades de interesse económico-social que se encontram por trás da concessão desse mesmo benefício.

 

6.65.  Ainda a propósito da primeira das condições acima referidas no ponto 6.57. e seguintes (ou seja, a respeitante ao reconhecimento do benefício fiscal da taxa reduzida aplicável ao GCM), prevista no artigo 56º da Portaria nº 117-A/2008, caberá lembrar o disposto no artigo 5º do EBF (referente aos benefícios fiscais automáticos e dependentes de reconhecimento), nos termos do qual se estabelece no seu nº 2 que “o reconhecimento dos benefícios fiscais pode ter lugar por acto administrativo ou por acordo entre a Administração e os interessados, tendo, em ambos os casos, efeito meramente declarativo, salvo quando a lei dispuser em contrário” (sublinhado nosso).

 

6.66.  Por outro lado, de acordo com o disposto no artigo 12º do EBF (relativo à constituição do direito aos benefícios fiscais), “o direito aos benefícios fiscais deve reportar-se à data da verificação dos respectivos pressupostos, ainda que esteja dependente de reconhecimento declarativo pela administração fiscal ou de acordo entre esta e a pessoa beneficiada (…)pelo que, porque também aqui a lei não dispõe de outro modo, o benefício fiscal em causa, no caso em análise (a redução de taxa de ISP aplicável na actividade e nos equipamentos agrícolas identificados nos autos), nasce no momento em que se verifiquem os respectivos pressupostos, os quais se concretizaram com a apresentação do pedido de reconhecimento, reportando-se os efeitos desse acto a essa mesma data.

 

6.67.  Ora, tendo sido atribuído o benefício fiscal ao contribuinte A…, dado que o referido benefício tem natureza “intuitu personae”, com a sua morte o mesmo não se transmitirá “mortis causa” aos seus herdeiros.[20]

 

6.68.  Neste âmbito, de acordo com o disposto no artigo 2025º do Código Civil, “não constituem objecto de sucessão as relações jurídicas que devam extinguir-se por morte do respectivo titular, em razão da sua natureza ou por força da lei”.

 

6.69.  Assim, face ao acima exposto, será afirmativa a resposta dar à questão acima formulada no ponto 6.1.1., de que a utilização de GCM é um benefício fiscal dependente de reconhecimento que, por ser de natureza estritamente pessoal, é intransmissível mortis causa.

 

6.70.  Em consequência, a utilização dos cartões electrónicos de abastecimento nº … e nº…, anteriormente pertencentes a A… e utilizados, após o seu falecimento (em 23 de Novembro de 2010), sem reconhecimento prévio de novo beneficio fiscal configura uma violação dos pressupostos do benefício fiscal associado ao GCM, constituindo fundamento para a caducidade da anterior autorização concedida, implicando assim a liquidação do ISP devido em resultado da diferença entre o nível de tributação (ISP e CSR) aplicável ao gasóleo rodoviário e a taxa de ISP aplicável ao GCM (porquanto a extinção do benefício fiscal tem por consequência a reposição automática da tributação regra), sendo afirmativa a resposta a dar à questão acima formulada no ponto 6.1.2.

 

6.71.  Tendo em consideração que a candidatura ao benefício de aquisição e utilização de GCM em nome de Cabeça de Casal da Herança de A… só deu entrada, no Ministério da Agricultura – Direção Regional de Agricultura e Pescas do Norte, no dia 17 de Junho de 2015, ou seja, após decorrido o período abrangido pela acção de inspecção realizada (de 06 de Outubro de 2011 a 25 de Maio de 2015), a aquisição e consumo de GCM efectuada durante este período foi praticada por pessoa singular não titular de cartão elctrónico válido, o que configura uma violação da lei, consubstanciada na introdução irregular de GCM no consumo estando sujeita às sanções previstas no RGIT, sendo por isso afirmativa a resposta a dar à questão formulada no ponto 6.1.3., supra.

 

6.72.  Nestes termos, entende estende-se que não há qualquer ilegalidade no acto de liquidação de ISP, praticado pela Alfândega de…, objecto do presente pedido de pronúncia arbitral.

 

Da responsabilidade pelo pagamento das custas arbitrais

 

6.73.  Em termos gerais, de acordo com o disposto no artigo 527º, nº 1 do CPC (ex vi 29º, nº 1, alínea e) do RJAT), deve ser condenada em custas a Parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito.

 

6.74.  Neste âmbito, o nº 2 do referido artigo concretiza a expressão “houver dado causa”, segundo o princípio do decaimento, entendendo que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.[21]

 

6.75.  Nestes termos, em consonância com a análise acima efectuada e as conclusões acima obtidas nos pontos 6.69. a 6.72., a responsabilidade em matéria de custas arbitrais deverá ser totalmente imputada à Requerente.

 

7.       DECISÃO

 

7.1.    De harmonia com o disposto no artigo 22º, nº 4, do RJAT, “da decisão arbitral proferida pelo tribunal arbitral consta a fixação do montante e a repartição pelas partes das custas directamente resultantes do processo arbitral”.

 

7.2.    No caso em análise, tendo em consideração o acima exposto, o princípio da proporcionalidade impõe que seja atribuída a totalidade da responsabilidade por custas à Requerente, de acordo com o disposto no artigo 12º, nº 2 do RJAT e artigo 4º, nº 4 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem.

 

7.3.    Nestes termos, tendo em consideração as conclusões definidas no Capítulo anterior, decidiu este Tribunal Arbitral:

 

7.3.1.     Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral apresentado pela Requerente, mantendo-se na ordem jurídica o acto de liquidação de ISP objecto do pedido, com as consequências daí decorrentes;

7.3.2.     Condenar a Requerente no pagamento das custas do presente processo.

 

Valor do processo: Em conformidade com o disposto nos artigos 306º, nº 2 do CPC, artigo 97º-A, nº 1 do CPPT e no artigo 3º, nº 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de EUR 1.877,12.

 

Nos termos do disposto na Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor das custas do Processo Arbitral em EUR 306,00, a cargo da Requerente, de acordo com o artigo 22º, nº 4 do RJAT.

 

*****

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 21 de Março de 2016

 

O Árbitro

 

 

Sílvia Oliveira

 



[1] A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990, excepto transcrições efectuadas.

[2] Enviado, em 30 de Junho de 2015, por carta registada (nº RD…PT).

[3] Código aprovado pelo Decreto-Lei nº 73/2010, de 21 de Junho e alterado, sucessivamente, pelos seguintes diplomas: Lei nº 55-A/2010, de 31 de Dezembro, Lei nº 64-B/2011, de 30 de Dezembro, Lei nº 14-A/2012, de 30 de Março, Lei nº 20/2012, de 14 de Maio, Lei nº 66-B/2012, de 31 de dezembro, Lei nº 51/2013, de 24 de Julho, Lei nº 83-C/2013, de 31 de Dezembro, Lei nº 75-A/2014, de 30 de Setembro, Lei nº 82-B/2014, de 31 de Dezembro e Lei nº 82-D/2014, de 31 de Dezembro.

 

[4] Pela Portaria n.º 206/2014, de 8 de Outubro, as referências constantes da Portaria nº 117-A/2008 de 8 de Fevereiro (alterada pela Portaria nº 762/2010, de 20 de Agosto), ao “cartão de microcircuito” consideram-se efectuadas ao “cartão eletrónico” (designação também contante do nº 5 do artigo 93º do Código dos IEC).

[5] Numa breve resenha histórica, refira-se que, no início dos anos noventa do século passado, o Estado decidiu conceder ao sector agrícola um benefício fiscal traduzido numa menor taxa do ISP a aplicar ao combustível consumido pelos equipamentos agrícolas. Como então só existia no mercado um gasóleo (que é o que hoje se designa por gasóleo rodoviário) as quantidades a consumir por cada agricultor com benefício fiscal eram calculadas, para cada ano, por uma Direcção-Geral (ou equivalente) do Ministério da Agricultura (actualmente designada por DGADR) com base em elementos objectivos, tendo um tecto (“plafond”) que, anualmente, não podia ser ultrapassado. Assim, em termos práticos, o benefício fiscal era concedido aos respectivos titulares (normalmente agricultores) no momento da aquisição do gasóleo, pagando estes um preço por litro inferior ao que pagariam se não existisse tal benefício fiscal.

A candidatura ao benefício fiscal, instruída no Ministério da Agricultura, quando concretizada com sucesso dava origem a emissão de um “cartão electrónico do tipo Multibanco” no qual estava registada a quantidade máxima de gasóleo a adquirir por cada agricultor com benefício fiscal. Assim, o conceito de sistema electrónico de controlo do gasóleo vendido com benefício fiscal ao sector agrícola (actualmente GCM) tem por base os cartões electrónicos (que, de início, eram designados por cartões com microcircuito) e respectivos códigos secretos (emitidos pela DGADR aos operadores económicos beneficiários) que permitiram, até 30 de Setembro de 1997, que o titular adquirisse gasóleo com benefício fiscal, até à quantidade inscrita no cartão, num qualquer Posto de Abastecimento.

Contudo, em cumprimento de determinações comunitárias (cfr. Directiva 95/60/CE, do Conselho, de 27/11), tornou-se permitido aos agricultores adquirir com benefício fiscal todas as quantidades de produto de que necessitam (eliminação dos “plafonds” inibitórios) e melhorar o sistema de controlo das utilizações isentas dadas ao produto, fazendo reverter para o sector agrícola os ganhos de eficiência conseguidos, desde 1 de Outubro de 1997. Assim, a atribuição do benefício fiscal ao gasóleo usado na agricultura passou a ser feita através da utilização de um produto próprio, designado por GCM, que tem as mesmas propriedades motoras do gasóleo rodoviário tendo, contudo, uma cor diferente (colorido) e uma substância química que nele permanece e o identifica (marcador) com o intuito de evitar a fraude (neste âmbito, vide COSTA, Maria Manuela, in “O papel da marcação e da coloração dos produtos petrolíferos no combate à evasão fiscal”, Alfândega – Revista Aduaneira, n.º 41/42, Dezembro de 1996, página 31/34).

Dado que, em termos fiscais, o GCM se trata de um produto próprio, aquando da sua declaração para consumo é tributado com a taxa do ISP que lhe é própria e os beneficiários podem adquirir nos Postos de Abastecimento autorizados, ao respectivo preço (que é muito inferior ao do gasóleo rodoviário) todas as quantidades que necessitarem, continuando a ser anual o período de referência dos plafonds indicativos inscritos nos cartões electrónicos (neste âmbito, vide FREITAS, Carlos Luís Sabino de Sousa e outros, in obra citada, Alfândega – Revista Aduaneira, n.º 41/42, Dezembro de 1996, páginas 22/26).

Contudo, face à sensibilidade à fraude fiscal do novo produto (GCM), foi mantido o anterior sistema de controlo baseado em cartões electrónicos (com código secreto só conhecido pelo seu titular) e terminais tipo TPA/POS para registo das vendas.

[6] Pela Portaria nº 206/2014, de 8 de Outubro, as referências constantes da Portaria nº 117-A/2008 de 8 de Fevereiro, alterada pela Portaria nº 762/2010, de 20 de Agosto ao “cartão de microcircuito” consideram-se efectuadas ao “cartão eletrónico”.

[7] De acordo com Costa A., Rainha J. e Pereira M. [in “Benefícios Fiscais em Portugal: Objetivos económico-sociais - sistematização por atividades, legislação”, Coimbra, Livraria Almedina (1977)], os benefícios fiscais são instrumentos de política que visam certos objetivos económicos e sociais, sendo referido que o benefício fiscal existe sempre que uma entidade ou actividade abrangida pela incidência dum imposto fica em situação mais favorável relativamente às que se encontram sujeitas ao regime fiscal geral.

[8] O princípio da capacidade contributiva é caracterizado consensualmente pela doutrina e pela jurisprudência do Tribunal Constitucional como um princípio estruturante do sistema fiscal que exprime e concretiza o princípio da igualdade tributária e que tem assento implícito na “Constituição Fiscal”, por força da conjugação do disposto nos artigos nº 103° e 104° da CRP.

[9] Neste sentido, Freitas, M. [in “Os incentivos fiscais e o financiamento do investimento privado, influência da fiscalidade na forma de financiamento das empresas”, Lisboa, Centro de Estudos Fiscais, (1980)], reconhece que existem três requisitos nos benefícios fiscais: (i) serem uma derrogação às regras de tributação, (ii) constituírem uma vantagem para os contribuintes e (iii) terem um objetivo económico ou social relevante.

[10] De acordo com Azevedo, R. (in “Estatuto dos Benefícios Fiscais, III Curso de Pós-Graduação em Direito Fiscal”, Faculdade de Direito da Universidade do Porto), está implícito no conceito de benefício fiscal uma natureza excepcional, sendo que essa excepção constitui, porém, uma vantagem (ou desagravamento) em favor de certa entidade, actividade ou situação.

[11] Neste sentido, vide Acórdão do Tribunal Constitucional proferido no âmbito do Processo nº 1067/06, de 29 de Dezembro.

[12] Nesta matéria, vide Acórdão referido na nota de rodapé anterior.

[13] Citando Alberto Xavier (in “Direito Fiscal, Manuais da FDL”, Lisboa, 1974), “(…) os benefícios condicionados traduzem-se em subordinar o direito ao benefício a contrapartidas de interesse público na forma de deveres ou ónus impostos aos beneficiários (…)”.

[14] Para Alberto Xavier, in “Direito Fiscal, Manuais da FDL”, Lisboa, 1974, “(…) a outorga de uma isenção temporária gera para o sujeito que dela beneficia uma expectativa de manutenção do benefício ao longo do período a que respeita – a qual deve ser  tutelada em nome do princípio da segurança jurídica – mediante o reconhecimento do direito a que esse beneficio não seja suprimido ou suspenso durante o tempo de vigência da isenção (…)”. Assim, ainda segundo o mesmo autor, “(…) trata-se de um caso de necessário reconhecimento de direitos adquiridos, que deve conduzir a que eventuais hipóteses de derrogação das normas em que a isenção foi concedida não envolva a perda dos aludidos direitos, que poderão ser invocados contra o estado enquanto durar o período de vigência inicialmente previsto”.

[15] Neste sentido, como afirma Nuno Sá Gomes (in “Teoria Geral dos Benefícios Fiscais”, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal n.º 165, Lisboa, Centro de Estudos Fiscais, 1991, pág. 145) “os benefícios fiscais dizem-se permanentes quando são estabelecidos para o futuro, sem predeterminação da respectiva duração; dizem-se temporários quando a lei fixa um limite temporal à duração do benefício”.

[16] Com efeito, o processo de reconhecimento dos benefícios fiscais depende da análise conexa e contínua de vários parâmetros, entre eles, o tipo de procedimento envolvido, a averiguação das causas que levaram ao impedimento de reconhecimento do benefício, as vicissitudes resultantes da atribuição do benefício fiscal e a verificação da extinção do direito ao benefício.

[17] Redacção dada pela Lei nº 64/2015, de 1 de Julho (na redacção anterior, a referência para a “Autoridade Tributária e Aduaneira” era efectuada para a “Direcção-Geral dos Impostos”).

[18] Como será o caso, nomeadamente, dos benefícios fiscais concedidos a reformados, emigrantes ou a deficientes.

[19] Note-se que, quanto a esta segunda derrogação da regra da intransmissibilidade, esta é meramente aparente, quando não assuma o carácter mortis causa, porque faz depender a transmissibilidade inter vivos da concessão de um novo benefício, mediante um processo de reconhecimento.

[20] E muito menos legitimar o abastecimento, pelos herdeiros, do tractor agrícola matrícula …-…-…, no período de 6 de Outubro de 2011 a 25 de Maio de 2015, com a utilização dos cartões electrónicos já identificados (vide pontos 5.2 e 5.6., supra).

[21] Assim, as Partes devem ser condenadas tendo em consideração o princípio da proporcionalidade, ou seja, sendo-lhes atribuída a responsabilidade por custas, na proporção em que forem parte vencida.