Os árbitros Maria Fernanda Maçãs (árbitro presidente), Filomena Salgado de Oliveira e Ricardo Rodrigues Pereira, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, acordam no seguinte:
I. RELATÓRIO
1. No dia 6 de abril de 2015, a sociedade comercial A..., S. A., NIPC..., com sede na..., Apartado..., ..., … (doravante, Requerente), apresentou pedido de constituição de tribunal arbitral, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.ºs 1, alínea a), e 2, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro (doravante, abreviadamente designado RJAT), visando a declaração de ilegalidade e a anulação dos atos tributários de liquidação adicional de IRC respeitante ao exercício de 2010 – corporizada na nota de liquidação n.º 2013..., nota de compensação n.º 2013 ... e demonstração de liquidação de juros – e de liquidação adicional de IRC relativa ao exercício de 2011 – corporizada na nota de liquidação n.º 2013..., nota de compensação n.º 2013 ... e demonstração de liquidação de juros – e, bem assim, do ato de indeferimento da Reclamação Graciosa que apresentou com vista à declaração de ilegalidade e anulação das referidas liquidações de imposto.
A Requerente juntou 20 (vinte) documentos, não tendo requerido a produção de quaisquer outras provas.
É Requerida a AT – Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante, Requerida ou AT).
1.1. No essencial e em breve síntese, a Requerente alegou o seguinte:
A Requerente foi sujeita a uma ação inspetiva de âmbito parcial – IRC – e incidente sobre os exercícios de 2010 e 2011, da qual resultaram correções à matéria tributável de IRC de € 337.302,20, para o exercício de 2010, e de € 337.867,37, para o exercício de 2011.
Aquelas correções à matéria tributável compreenderam a correção relativa a “omissão de proveitos” referentes a juros de suprimentos – associados ao crédito resultante da cedência à B... SGPS, S. A., pela Requerente, de suprimentos sobre diversas empresas do Grupo C... –, no montante de € 328.415,97, para cada um dos exercícios de 2010 e de 2011, e a correção respeitante a benefícios fiscais indevidos, no âmbito da “Criação Líquida de Postos de Trabalho”, nos montantes de € 8.886,23 para 2010 e de € 9.451,40 em 2011.
Na sequência daquelas correções foram efetuadas a liquidação adicional de IRC n.º 2013..., referente ao exercício de 2010, bem como a dos correspondentes juros compensatórios, num valor total de € 113.747,45, e a liquidação adicional de IRC n.º 2013..., referente ao exercício de 2011, bem como a dos correspondentes juros, num montante total de € 101.595,56.
Por discordar daquelas correções promovidas pelos Serviços de Inspeção Tributária, a Requerente apresentou Reclamação Graciosa com vista à anulação das correções e dos sobreditos atos de liquidação de imposto, a qual foi indeferida.
No entender da Requerente, a situação de facto que originou o montante em dívida da B... SGPS à Requerente, assim como o próprio montante em dívida, não foram postos em causa pelos serviços de Inspeção Tributária.
A Requerente afirma que não tendo a B... SGPS meios financeiros para concretizar o pagamento da dívida à Requerente, ficou devedora daquele montante à Requerente. Nos termos do contrato de cedência de créditos, e atendendo ao facto de, à data, a B... SGPS ser uma sociedade recém-constituída, foi estabelecido um “período de carência” no vencimento dos respetivos juros, de forma a permitir à B... SGPS dotar-se da robustez financeira que lhe permitisse suportar estes encargos. O vencimento dos juros estaria subordinado à ocorrência de um dos seguintes eventos:
a) Distribuição de dividendos pelas participadas da B... SGPS em montante igual ou superior ao valor em dívida à Requerente;
b) O apuramento pela B... SGPS de um rácio de return on equity (ROE) igual ou superior a 7,5%.
Nos termos do contrato em apreço, a taxa de juro aplicável seria definida na data da verificação do facto que originasse o vencimento dos juros, “dentro do intervalo de plena concorrência, considerando financiamentos com nível de risco e período de carência idênticos, com base em informação referente a créditos constante de base de dados financeira internacional”.
A Requerente considera ainda que a correção efetuada pela Inspeção Tributária representa uma clara duplicação de coleta, ilegal nos termos dos artigos 204.º e 205.º do CPPT e inconstitucional, considerando que aquelas as liquidações efetuadas carecem de legitimidade e de fundamentação legal, começando pela duplicação da coleta.
A omissão de proveitos por parte da Requerente nos exercícios de 2010 e 2011 relativamente aos rendimentos correspondentes à remuneração do ativo da Requerente – juros – foram contabilizados no exercício de 2012, para a totalidade do período decorrido entre 01-01-2005 a 30-06-2012, no montante global de Euros 2.463.120,00.
Para determinar o montante dos juros devidos, a Requerente solicitou um estudo independente de preços de transferência, produzido pela consultora D..., S.A..
Tendo por base o relatório da referida consultora, a Requerente utilizou a taxa de 2,8% para o cálculo dos juros de 01-01-2005 a 30-06-2012, registados no período de 2012.
Segundo a Requerente, o registo contabilístico dos juros em apreço foi efetuado na sequência da anulação do saldo em dívida entre a B... SGPS e a Requerente, mediante a aquisição, pela Requerente, da participação detida pela B... SGPS na E..., S.A., realizada no exercício de 2012 no âmbito de um projeto de reestruturação societária. Com o valor da aquisição da participação pela Requerente, a B... SGPS fez a compensação do saldo em dívida.
A Requerente alega ainda que o proveito correspondente aos juros previstos no contrato de cessão de créditos em apreço foi sujeito a tributação em sede de IRC, tendo concorrido para a formação do lucro tributável do exercício de 2012.
No que se refere à criação líquida de emprego, a Requerente considera que os Serviços de Inspeção Tributária sustentaram a correção proposta ao benefício fiscal da criação líquida de postos de trabalho (CLE), nos montantes de Euro 8.886,23 e Euro 9.451,40, respetivamente, para 2010 e 2011, com base na alegada verificação de duas saídas elegíveis de trabalhadores (F... e G...), ocorridas no ano de 2007, que não haviam sido considerados pela Requerente.
A Requerente refere ter comprovado oportunamente, em sede de direito de audição, que as saídas tinham sido consideradas e que a Autoridade Tributária alterou a fundamentação, ao imputar a desconsideração parcial da parte do benefício da CLE apurado pela Requerente às colaboradoras H... e I... e mantendo os montantes das correções propostas.
A Requerente considera não haver lugar a qualquer ajustamento a este título nos exercícios de 2010 e 2011, uma vez que as saídas ocorreram antes de 2010 e como tal já não tinham sido consideradas para efeitos do cálculo do benefício de CLE de 2010 e 2011.
A Requerente discorda da forma como os saldos foram apurados quanto às entradas elegíveis e quanto às saídas igualmente elegíveis, pois, considerando que os trabalhadores em questão já não integravam o quadro de pessoal da Empresa em 2010, aos mesmos não tinham de ser incluídos no mapa de suporte ao apuramento do benefício da CLE utilizado naquele período de tributação.
Quanto ao número de colaboradores considerados elegíveis no ano de 2007 para apuramento da CLE, nos períodos de tributação de 2010 e 2011, alega ainda a Requerente que a AT considerou “duas vezes a saída de 2 dos 18 colaboradores que corresponderam a entradas elegíveis no ano de 2007 para efeitos de apuramento da CLPT.”, referindo ainda que os serviços da AT “… concluem, erradamente, que nos períodos de tributação de 2010 e 2011 a Requerente considerou em excesso 2 dos colaboradores que consubstanciaram entradas em 2007.”, concordando com o valor da criação líquida de emprego calculada pela AT (15).
1.2. A Requerente remata o seu articulado inicial peticionando o seguinte:
«a) a declaração de ilegalidade dos atos de liquidação do IRC, relativos aos exercícios de 2010 e 2011;
b) a declaração de ilegalidade do ato de indeferimento da Reclamação Graciosa relativa aos exercícios de 2010 e 2011;
c) o pagamento por indemnização por garantia indevidamente prestada, nos termos previstos no art. 53.º da LGT.»
2. O pedido de constituição de tribunal arbitral foi aceite e automaticamente notificado à AT em 8 de abril de 2015.
3. A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou como árbitros do Tribunal Arbitral coletivo a Conselheira Maria Fernanda Maçãs, o Prof. Doutor Guilherme d’Oliveira Martins e a Dra. Filomena Salgado de Oliveira, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
4. Em 3 de junho de 2015, as partes foram devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas b) e c), do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.
5. Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral coletivo foi constituído em 19 de junho de 2015.
6. No dia 8 de setembro de 2015, a Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou a sua Resposta na qual impugnou, especificadamente, os argumentos aduzidos pela Requerente e concluiu pela improcedência da presente ação, com a sua consequente absolvição do pedido.
A Requerida juntou um documento, não tendo requerido a produção de quaisquer outras provas.
Na mesma ocasião, a Requerida juntou aos autos o respetivo processo administrativo (doravante, abreviadamente designado PA).
6.1. No essencial e também de forma breve, importa respigar os argumentos mais relevantes em que a Requerida alicerçou a sua Resposta:
No que se refere à correção por omissão de proveitos dos juros dos suprimentos dos exercícios de 2010 e de 2011, a AT começou por referir que no âmbito da operação de reestruturação do Grupo C... indicada pela Requerente, “no dia 30 de Dezembro de 2004, foi celebrado, entre a A... SA e a B... SGPS, um contrato denominado pelos outorgantes de cessão de créditos, pelo qual a primeira transferia para a segunda, os acima referidos suprimentos incorporados no seu património, no montante de €11.729.141,85”.
Referindo que a SGPS detinha, então, uma participação no capital da A... SA de 11,10%.
“Relativamente ao preço a pagar pela cessionária, foi determinado que o mesmo corresponderia ao valor dos suprimentos cedidos (ou seja €11.729.141,85), montante que seria pago numa única prestação, a realizar em 31 de Dezembro de 2005, sendo, porém, tal prazo automaticamente prorrogável por períodos de um ano.”
Assim, a B... SGPS ficou devedora daquele montante à A... SA, acordando as partes que a cedência dos suprimentos tinha carácter oneroso, vencendo-se juros, prevendo-se um “período de carência”, que se traduz em ter sido estipulado no contrato ficar essa remuneração do capital subordinada à verificação de um dos dois seguintes factos (o que ocorresse em primeiro lugar):
a) “Distribuição de dividendos pelas participadas em montante igual ou superior ao valor do financiamento concedido inicialmente pela A... SA” (ou seja em valor superior a €11.729.141,85);
b) “Apuramento pela B... SGPS de um rácio de “return on equity” (doravante designado por “ROE”) igual ou superior a 7.5%.
A Requerida refere ainda que o apuramento dos juros foi aí condicionado a condições de natureza financeira da SGPS e que essas condições apenas eram controláveis pela mesma.
A Requerida evidencia o facto da SGPS ter ficado a gerir o pagamento dos financiamentos concedidos intragrupo.
Considerando estar em causa um contrato de financiamento remunerado, em que, não estando o valor dessa remuneração determinado, era o mesmo, contudo, determinável.
A contabilidade da contribuinte não evidencia, porém, nos anos de 2010 e 2011 ora em apreço, proveitos relacionados com o financiamento em causa.
Nestes anos a ora requerente não apurou os juros correspondentes à remuneração deste financiamento.
São estes juros devidos pela cedência dos suprimentos da ora requerente à SGPS que estão em causa e que motivaram as correções que estão na origem das liquidações impugnadas no presente procedimento arbitral.
E isso por se traduzir em omissão de proveitos, pois, como explicitou a Inspeção Tributária no seu relatório, em razão do princípio da especialização dos exercícios e “devido ao carácter oneroso do contrato, o apuramento destes juros deveria ter ocorrido desde o momento da cedência de suprimentos, no ano de 2004, e até ao pagamento integral desses mesmos créditos à A...”.
No decorrer da ação inspetiva, aos anos de 2010 e 2011, a inspeção tributária teve conhecimento de que a A... SA tinha apresentado reclamação graciosa contra as liquidações adicionais de IRC resultantes de correções por omissão de proveitos respeitantes aos juros referentes aos exercícios de 2008 e 2009 e decorrentes do mesmo contrato de 2004.
“E de que, no requerimento dessa reclamação, a contribuinte – em ordem a fundamentar uma alegação de duplicação da colecta – veio afirmar que, no exercício de 2012, teria procedido ao registo contabilístico dos juros, entre 2005 e 2012, no montante de €2.463.119”
Referindo o que a Requerente alegou para justificar as razões desse registo em 2012, por nesse mesmo ano, teria sido paga, por compensação (do crédito sobre a Requerente resultante da transferência da participação que a B... SGPS detinha na E... para a Requerente), a dívida da B... SGPS para com a A... SA, resultante da cessão de créditos e que esses juros teriam sido declarados na sua declaração rendimentos modelo 22 de 2012.
A AT refere o facto da autoliquidação de IRC referente ao exercício de 2012 ter sido efetuada na sequência da declaração que a Requerente entregou em 31 de Maio de 2013.
No entender da Requerida, a Requerente só entregou a declaração de substituição quando já era conhecedora das correções relativas aos exercícios de 2008 e 2009, bem como das correspondentes liquidações adicionais desses exercícios, respeitantes aos juros devidos pela cessão dos suprimentos de 2004.
Quanto ao valor da taxa de juro utilizada pela Requerente para contabilizar os juros da cessão dos suprimentos em 2012, e analisado o relatório da D... , os pressupostos aí utilizados, bem como o intervalo de taxas apurado, entendeu a Inspeção Tributária que quer o mesmo, quer o valor da taxa utilizada pelo sujeito passivo obedeciam ao regime dos preços de transferência definido no artigo 63º do CIRC e na Portaria nº1446-C/2001, de 21/12.
No entanto, no que respeita à contabilização em 2012 da totalidade dos juros vencidos ao longo do contrato, a Requerida salienta o facto de o contribuinte ter mudado de regime de tributação de IRC, passando do regime geral para o regime especial de tributação dos grupos de sociedades (RGTGS), sendo sociedade dominante a B... SGPS.
“E que, nesse exercício, a A...SA apresenta um lucro tributável de €4.951.303,45, enquanto o grupo (composto por seis sociedades) apresenta um lucro tributável de €2.047.440,83” pelo que, de facto, o reconhecimento dos juros por parte do sujeito passivo no exercício de 2012 foi neutralizado com a opção pelo REGTS.
É ainda referido pela AT que, em Novembro de 2012, foi informado pela Requerente que “face aos constrangimentos da actividade da B... SGPS (associados à conjuntura económica) e à falta de capacidade da empresa gerar cash flow, o contrato de financiamento tem sido renovado automaticamente, sem que nenhum dos eventos previstos se tenha ainda verificado”.
Referindo ainda que a Requerente a informou, por e-mail de Fevereiro de 2013, que:
- “Face à crise financeira instalada, com consequências ao nível da performance económica e financeira da B... SGPS, esta ainda não atingiu o rácio em questão, não lhe permitindo suportar juros”.
- “Desta forma, a B... SGPS apenas teria capacidade para reembolsar os créditos cedidos pela A... SA na eventualidade das entidades devedoras do Grupo a reembolsarem a ela própria, o que não se verificou”.
Sendo esses os factos apurados no decurso da inspeção e que condicionaram as correções ao lucro tributável por omissão de proveitos relativos a juros de suprimentos por incumprimento do n.º 1 do artigo 18.º do Código do IRC e da periodização do lucro tributável aí prevista.
Referindo ainda que, dado o “carácter oneroso do contrato”, além destes juros, deveriam também “ter sido calculados e reconhecidos na contabilidade do sujeito passivo os juros vencidos nos anos de 2005, 2006 e 2007, afirmando que a Requerente o não fez apenas atento o prazo de caducidade e ao facto da Autoridade Tributária já nada podia fazer a esse respeito.
Deste modo, a Inspeção Tributária procedeu, no caso em apreço, a uma periodização dos juros, com cálculo anual dos mesmos, originado as correções em apreço.
Assim, no entender da Requerida, nos anos de 2010 e 2011, deveria ter sido determinada a remuneração dos suprimentos cedidos em 2004, mas sendo, então, determinável, devia ser apurada tendo em consideração os montantes em dívida nesses anos de 2010 e 2011, no valor de €11.729.141,85, e a taxa de juro que foi considerada pela ora requerente como relevante, de 2,8%.
Sintetizando as razões:
1) por estar em causa, no contrato de cessão de créditos um financiamento remunerado a preços de transferência – o que não apenas decorre do teor do contrato de cessão de créditos e resulta das informações transmitidas pela Requerente nos e-mails enviados pela contribuinte no decurso da inspeção;
2) verificando-se a existência de relações especiais – o que, além de resultar também do relatório inspectivo e dos e-mails, é assumido pela contribuinte no aludido artigo 112.º da P.I.;
3) verificando-se que as condições contratadas não seriam acordadas, aceites e praticadas entre entidades independentes – isso porque, como decorre dos termos do contrato e se diz expressamente no relatório inspetivo, no financiamento sub judice o pagamento dos juros pelo devedor está apenas dependente da vontade do mesmo, pois que está subordinado a fatores de ordem financeira apenas, por si, controláveis e apenas a si respeitantes;
4) atendendo às regras que regulam esta matéria deveria ter sido aplicável o método do preço comparável de mercado.
Concluindo que, em razão das regras contabilísticas e fiscais que impõem o respeito pelo princípio da especialização dos exercícios, tinha de registar os proveitos referentes aos juros, relativos à dívida resultante dos suprimentos cedidos, nos exercícios em causa e, que, especificamente, quanto à questão arguida pela Requerente de “duplicação da coleta em 2012”, que a mesma poderá comprovar o alegado e solicitar a revisão da autoliquidação de 2012 nos termos e prazos legais.
Quanto à criação líquida de emprego, a Requerida refere que: “A Requerente procedeu à entrega de três declarações de rendimentos Modelos 22 de IRC relativamente ao ano de 2010, sendo que, na 1ª declaração, entregue em 2011/05/30, no campo 774 do Q07 – Benefícios fiscais, constava o valor de € 3.300,00 a deduzir no apuramento do lucro tributável, enquanto nas 2ª e 3ª declarações entregues em 2012/05/30 e 2013/05/31, respetivamente, consta o valor de € 131.981,31, no referido campo, sendo € 128.382,66 referentes a benefício fiscal da criação líquida de postos de trabalho, de acordo com o estipulado no art.º 19º do EBF (Estatuto dos Benefícios Fiscais).” E que “No ano de 2011, o valor do benefício em causa inscrito pela Requerente é de €122.222,74”.
Nos exercícios em análise, a Requerente apurou benefícios fiscais de trabalhadores admitidos em 2006, 2007 e 2009, assim repartidos:
Ano admissão
|
N.º trab. Majoração
|
Valor majoração (€)
|
2010
|
2011
|
2010
|
2011
|
2006
|
2
|
2
|
13.300,00
|
7.040,65
|
2007
|
13
|
12
|
68.044,48
|
68.187,38
|
2009
|
10
|
10
|
47.038,18
|
46.994,71
|
Total
|
25
|
24
|
128.382,66
|
122.222,74
|
Considerando que a majoração do benefício se aplica durante 5 anos, a contar do início da vigência do contrato de trabalho (nos termos do disposto no n.º 5 do artigo 19º do EBF), foram solicitados à Requerente os mapas de apuramento das admissões e demissões dos exercícios de 2006 a 2011, de forma a verificar se a criação líquida de postos de trabalho apurada nestes exercícios, correspondia efetivamente à diferença positiva entre o número de contratações elegíveis nos termos do n.º 1 do artigo 19º do EBF e o número de saídas de trabalhadores que, à data da respetiva admissão, se encontravam nas mesmas condições.
Referindo a AT que a “Requerente cometeu algumas irregularidades na quantificação por não respeitar na íntegra os requisitos do artigo 19º do EBF, já que classificou como não elegíveis, na saída, trabalhadores que na entrada foram considerados como elegíveis e/ou na data de entrada cumpriam todos os requisitos enunciados no artigo 19º do EBF, conforme disposto na alínea d) do n.º 2 do artigo 19º do EBF.
Com efeito, no mapa remetido pela Requerente relativo às demissões do ano de 2007, verifica-se a existência de dois funcionários que respeitavam os requisitos do artigo 19º do EBF na data da entrada e como tal devem ser classificados como elegíveis nas demissões.”
Os dois funcionários em causa eram F... e G..., entraram na empresa com 27 anos e 20 anos, respetivamente, sendo que a lei à data incluía como elegíveis os trabalhadores até aos 30 anos.
“Contudo, não tendo sido consideradas as saídas relevantes de 2 funcionários em 2007, e uma vez que a criação líquida de postos de trabalho corresponde à diferença entre as entradas elegíveis e as saídas relevantes, o benefício fiscal apurado pela Requerente foi corrigido, considerando-se a majoração referente a 23 (25-2) e 22 (24-2) trabalhadores em 2010 e 2011.”
No entender da Requerida, as correções tiveram por base as funcionárias com menor rendimento, desconsiderando as que tinham efetivamente menor rendimento (J... e K...) por terem estado de baixa vários meses.
Assim, a correção teve por base, no entender da Autoridade Tributária, as que tendo trabalhado o ano completo, apresentam menores rendimentos, a saber, H... e I..., cujo benefício foi de Euros 4.454,59 e Euros 4.431,64, respetivamente.
Quanto ao ano de 2011, o benefício calculado pela Requerente das 2 funcionárias H... e I..., foi de € 4.931,44 e € 4.519,96.
Assim, resultou uma redução à dedução efetuada pela Requerente no campo 774 do Q07 da Modelo 22 de IRC, nos montantes de Euros 8.886,23 em 2010 e Euros 9.451,40 em 2011, correspondente à correção da majoração de 50% dos custos suportados com 2 trabalhadores admitidos em 2007.
7. Por despacho de 23 de setembro de 2015, que recaiu sobre requerimento da Requerente de 11 de junho de 2015, foi concedida procedência ao pedido de junção dos documentos identificados com os n.ºs 3, 4 e 5, bem como a juntar aos autos requerimento de que conste somente tal pedido, ordenando-se o desentranhamento do requerimento quanto ao mais.
8. Em 3 de outubro de 2015, foi proferido despacho a dispensar a realização da reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, tendo-se fixado o dia 15 de Dezembro como data limite para prolação da decisão arbitral.
9. Em 14 de outubro de 2015, notificada para o efeito, a Requerente juntou aos autos as declarações Modelo 22 de IRC respeitantes ao exercício de 2012 e referentes à própria Requerente e ao Grupo Consolidado, bem como as declarações Modelo 22 de IRC respeitantes aos exercícios de 2010 e de 2011 e referentes à B... SGPS, S. A..
10. Por despacho do Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, proferido em 4 de dezembro de 2015, foi determinada a substituição do árbitro adjunto deste Tribunal Arbitral coletivo, Prof. Doutor Guilherme d’Oliveira Martins – por renúncia justificada às respetivas funções –, pelo Dr. Ricardo Rodrigues Pereira.
11. Em 12 de dezembro de 2015, foi proferido despacho a determinar a prorrogação do prazo da arbitragem por dois meses e indicada como data limite para ser proferida a decisão arbitral o dia 19 de fevereiro de 2016.
12. Notificadas para o efeito, ambas as Partes apresentaram alegações escritas, nas quais reiteraram as posições anteriormente assumidas nos respetivos articulados.
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II. SANEAMENTO
O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é competente.
O processo não enferma de nulidades.
As partes gozam de personalidade e de capacidade judiciárias, encontram-se devidamente representadas e são legítimas.
Admite-se a cumulação de pedidos, em virtude de se verificar que a procedência dos pedidos formulados pela Requerente depende essencialmente da apreciação das mesmas circunstâncias de facto e da interpretação e aplicação dos mesmos princípios ou regras de direito (cf. artigo 3.º, n.º 1, do RJAT)[1].
Não há exceções ou questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito e de que cumpra conhecer.
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III. FUNDAMENTAÇÃO
III.1. DE FACTO
§1. FACTOS PROVADOS
Consideram-se provados os seguintes factos:
a) No ano de 2004 teve início o processo de reestruturação do Grupo C..., no âmbito do qual foi constituída a B... SGPS, SA, mediante uma operação de permuta de partes de capital através da qual os sócios da Requerente entregaram parte das participações que detinham no capital social da Requerente, recebendo em troca partes de capital da B... SGPS, SA;
b) No mesmo âmbito e ainda em 2004, foi efetuada a fusão por incorporação na Requerente da L..., SA e da M..., Lda., tendo-se procedido à transferência global do património destas sociedades para a Requerente, com a consequente extinção dessas sociedades;
c) À data da sua fusão por incorporação na Requerente, a L..., SA detinha participações sociais em várias empresas do Grupo C..., bem como suprimentos concedidos às mesmas;
d) Em virtude da fusão da L..., SA na Requerente, passou a ser esta a entidade concedente dos referidos suprimentos, no montante de € 11.729.141,85, os quais foram contabilizados numa conta de suprimentos;
e) A referenciada fusão foi seguida de uma cisão-fusão da Requerente, a qual abrangeu dois ramos de negócio: o ramo de negócio do património imobiliário, que foi destacado e fundido na N..., Lda.; e o ramo de negócio das participações financeiras, que foi destacado e fundido na B..., SGPS, SA;
f) A referida operação visou a reorganização de participações, com a constituição de um grupo estruturado liderado por uma SGPS, responsável pela gestão das participações do Grupo C... e da relação destas com entidades externas, nomeadamente com as instituições financeiras. [cf. PA];
g) No âmbito da aludida transferência do ramo de negócio das participações financeiras para a B..., SGPS, SA, não foi transferido o valor dos suprimentos concedidos a várias sociedades o Grupo C..., no montante de € 11.729.141,85, tendo o mesmo permanecido no balanço da Requerente;
h) No dia 30 de Dezembro de 2004, foi celebrado, entre a Requerente e a B... SGPS, SA, um contrato denominado pelos outorgantes de cessão de créditos, pelo qual a primeira transferia para a segunda, os acima referidos suprimentos sobre diversas empresas do Grupo C... e incorporados no seu património, que lhe haviam sido transferidos na sequência da fusão por incorporação da L..., SA, pelo respetivo valor nominal, no montante de €11.729.141,85;
i) A B... SGPS, SA detinha, então, uma participação de 11,10% no capital da Requerente;
j) Uma vez que a B... SGPS, SA não dispunha de meios financeiros para concretizar o pagamento desse ativo, ficou a mesma devedora daquele montante à Requerente;
k) A Requerente posteriormente comunicou aos Serviços de Inspeção Tributária ser a seguinte a razão da celebração do aludido contrato: «…visto a B... SGPS deter participações maioritárias nas entidades devedoras (equacionando-se já em 2004 a aquisição da totalidade dessas participações da A..., SA – o que veio a verificar-se no ano seguinte, 2005) considerou-se que a B... SGPS seria a entidade mais habilitada a gerir os financiamentos intragrupo, bem como a centralização da gestão de tesouraria das entidades que o compõem. Com efeito, sendo a A..., SA uma entidade operacional não vocacionada para uma atividade de gestão, seria ineficiente de um ponto de vista organizacional que gerisse o pagamento dos financiamentos concedidos (…). A B... SGPS, por sua vez, possuía a estrutura, know-how e a vocação para administrar os financiamentos». [cf. e-mail da Requerente de 8.2.2013, no PA];
l) A esse mesmo propósito, como a Requerente posteriormente comunicou aos Serviços de Inspeção Tributária, foi entendido «que seria mais eficiente que a sociedade SGPS passasse a gerir os créditos», pelo que «a A... cedeu os créditos sobre as participadas à B... SGPS». [cf. e-mail da Requerente de 16.11.2012, no PA];
m) Nesse designado “contrato de cessão de créditos”, foi estipulado que a Requerente cedia à B... SGPS, SA o crédito de €11.729.141,85;
n) Para suportar esta operação, “a A... e a B... SGPS celebraram um contrato de financiamento”, dadas as “carências de tesouraria” da SGPS e “o facto de ter sido constituída recentemente”. [cf. e-mail da Requerente de 16.11.2012, no PA];
o) Contrato cujo clausulado foi determinado pelo “carácter específico da operação e das entidades intervenientes”. [cf. e-mail da Requerente de 8.2.2013, no PA];
p) Relativamente ao preço a pagar pela cessionária, foi estabelecido que o mesmo corresponderia ao valor dos suprimentos cedidos, ou seja € 11.729.141,85, montante que seria pago numa única prestação, a realizar em 31 de dezembro de 2005, sendo, porém, tal prazo automaticamente prorrogável por períodos de um ano;
q) No mesmo contrato, foi estabelecido que a cedência dos suprimentos tinha carácter oneroso, vencendo-se juros;
r) Nos termos do referido contrato de cedência de créditos e atendendo ao facto de, à data, a B... SGPS, SA ser uma sociedade recém-constituída, foi estabelecido um “período de carência” no vencimento dos juros do referido empréstimo, por forma a permitir à B... SGPS, SA dotar-se de robustez financeira que lhe permitisse suportar estes encargos;
s) Aquele “período de carência” traduziu-se em ter sido estabelecido contratualmente que a remuneração do “capital objecto da presente cessão de créditos” ficava subordinada à verificação de um dos dois seguintes eventos (o que ocorresse em primeiro lugar):
- Distribuição de dividendos pelas participadas em montante igual ou superior ao valor do financiamento concedido inicialmente pela Requerente (ou seja em valor superior a € 11.729.141,85).
- Apuramento pela B... SGPS, SA de um rácio de “return on equity” (doravante designado por “ROE”) igual ou superior a 7.5%.
t) O pagamento dos juros foi contratualmente condicionado a condições de natureza financeira da B... SGPS, SA, condições essas apenas controláveis pela mesma;
u) A SGPS é que ficou a gerir o pagamento dos financiamentos concedidos intragrupo;
v) A taxa dos juros que ficou especificada no contrato dependeria da taxa definida na data da verificação das condições anteriormente referidas, “dentro do intervalo de plena concorrência, considerando financiamentos com nível de risco e período de carência idênticos, com base em informação referente a créditos constantes de base de dados financeira internacional”;
w) Como a Requerente posteriormente explicitou aos Serviços de Inspeção Tributária, “a taxa seria determinada nos termos das regras de preços de transferência, por referência a operações similares praticadas por entidades não relacionadas em que tivesse sido concedido um período de carência semelhante”. [cf. e-mail da Requerente de 8.2.2013, no PA];
x) A contabilidade da Requerente não evidencia proveitos relacionados com o financiamento em causa, nos exercícios de 2010 e 2011;
y) Nos exercícios de 2010 e 2011, a Requerente não apurou os juros correspondentes à remuneração daquele financiamento;
z) No exercício de 2012, a Requerente procedeu ao registo contabilístico dos referidos juros, entre 2005 e 2012, no montante total de € 2.463.119,79;
aa) O registo contabilístico dos juros em apreço foi efetuado na sequência da anulação do saldo em dívida entre a B... SGPS, SA e a Requerente, promovida em resultado da aquisição, por parte da Requerente, da participação detida pela B..., SA na E..., SA, realizada no exercício de 2012, no âmbito de um projeto de reestruturação societária que a B... SGPS, SA estava a realizar;
ab) No âmbito da referida operação foi acordado entre as partes que uma parcela do respetivo valor de realização seria paga mediante compensação do saldo em dívida da B... SGPS, SA para com a Requerente, em resultado do contrato de cessão de créditos, permitindo à B... SGPS, SA anular este saldo sem a movimentação de meios financeiros de que não dispunha;
ac) As condições referidas em ab) que originaram a compensação do saldo em dívida não resultaram de qualquer das condições de reembolso previstas no contrato de cessão de créditos;
ad) O proveito correspondente aos juros previstos no contrato de cessão de créditos em apreço, no montante total de € 2.463.119,79, concorreu para a formação do lucro tributável da Requerente no exercício de 2012. [cf. declaração Mod. 22 - Doc. 1 junto com a P. I.];
ae) Para a determinação do montante dos juros devido, a Requerente solicitou à consultora “D..., SA” uma análise de preços de transferência, no sentido de determinar intervalos de taxa de juros considerados de plena concorrência para operações comparáveis ao financiamento em causa;
af) No relatório elaborado pela D..., datado de 10 de fevereiro de 2013, no que respeita à metodologia adotada, é de salientar o seguinte: a opção pelo método do preço comparável de mercado; a utilização da base de dados Bloomberg – preço de operações de financiamentos realizadas entre entidades independentes consideradas comparáveis; e a pesquisa de títulos de dívida comparáveis emitidos em 2004 (entre 1 de janeiro e 31 de dezembro);
ag) Os resultados apresentados no relatório da D... traduzem-se no seguinte: intervalo de plena concorrência de YTM ajustadas (Yeld to Maturity) variando entre o valor mínimo de 2,621% e o máximo de 7,142%; mediana de 3,709%; e intervalo interquartil entre 2,811% e 4,185%;
ah) No mesmo relatório, conclui-se que “a remuneração a adoptar entre a partes deveria, idealmente, situar-se entre 2,811% e 4,185%”;
ai) Para cálculo dos juros de 1.1.2005 a 30.6.2012, a Requerente utilizou a taxa de 2,8%;
aj) Os Serviços de Inspeção Tributária entenderam, posteriormente, que o relatório da D... e o valor da taxa de juro utilizada pela Requerente obedeciam ao regime legal dos preços de transferência (art. 63.º do CIRC e Portaria n.º 1446-C/200, de 21 de dezembro);
ak) Por isso, os Serviços de Inspeção Tributária utilizaram a taxa de 2,8% para cálculo dos juros referentes aos anos de 2010 e 2011;
al) A contabilidade da Requerente, nos anos de 2008 e 2009, evidenciava, na conta de suprimentos “25297 –B... SGPS, SA” (papel comercial), um financiamento obtido pela Requerente junto da sociedade B... SGPS, SA, no montante de € 12.845.000,00;
am) A B... SGPS, SA contratualizou o pagamento de juros nesta operação, sendo que a taxa de juro associada a este financiamento obtido pela Requerente junto da B... SGPS, SA, nos anos de 2008 e 2009, foi, respetivamente, de 4,8% e de 2,5%.;
an) No ano de 2012, a Requerente mudou de regime de tributação de IRC, passando do regime geral para o regime especial de tributação dos grupos de sociedades, sendo sociedade dominante a B... SGPS, SA.;
ao) No exercício de 2012, a Requerente apresentou um lucro tributável de € 4.951.303,45, enquanto o grupo (composto por seis sociedades) apresentou um lucro tributável de € 2.047.440,83;
ap) A Requerente procedeu à entrega de três declarações de rendimentos Modelos 22 de IRC relativamente ao ano de 2010, sendo que, na 1.ª declaração, entregue em 30/05/2011, no campo 774 do Q07 – benefícios Fiscais, constava o valor de € 3.300,00 a deduzir no apuramento do lucro tributável, enquanto nas 2.ª e 3.ª declarações entregues em 30/05/2012 e 31/05/2013, respetivamente, consta o valor de € 131.981,31, no referido campo, sendo € 128.382,66 referentes a benefício fiscal da criação líquida de postos de trabalho (art. 19.º do EBF);
aq) No ano de 2011, o valor do benefício fiscal da criação líquida de postos de trabalho inscrito pela Requerente foi de € 122.222,74;
ar) Nos exercícios de 2010 e de 2011, a Requerente apurou benefícios fiscais de trabalhadores admitidos em 2006, 2007 e 2009, assim repartidos:
Ano
admissão
|
N.º trab. Majoração
|
Valor majoração (€)
|
2010
|
2011
|
2010
|
2011
|
2006
2007
2009
|
2
13
10
|
2
12
10
|
13.300,00
68.044,48
47.038,18
|
7.040,65
68.187,38
46.994,71
|
Total
|
25
|
24
|
128.382,66
|
122.222,74
|
as) Para verificação dos valores apurados pela Requerente, relativos ao benefício fiscal de criação de emprego, posteriormente os Serviços de Inspeção tributária solicitaram à Requerente os seguintes elementos para cada um dos funcionários elegíveis [cf. PA]:
- contratos de trabalho e adendas assinadas pelas duas partes aquando da conversão em contratos sem termo;
- cópias do cartão de cidadão / bilhete de identidade e cartão de contribuinte, cartão da Seguração Social / modelo de inscrição na Segurança Social, habilitações literárias e justificativo de desempregado de longa duração (caso se aplicasse);
- cópias dos recibos de vencimento de 01/01/2010 a 31/12/2011;
- mapas com as primeiras contribuições para a Segurança Social e mapas dos meses de dezembro de 2010 e 2011; e
- rescisões contratuais.
at) Naquela ocasião, os mesmos serviços solicitaram à Requerente os mapas de apuramento das admissões e demissões dos exercícios de 2006 a 2011. [cf. PA];
au) A criação líquida de postos de trabalho calculada pela Requerente, relativamente aos exercícios de 2010 e 2011, respeita ao somatório do valor relativo à majoração, de 50%, dos encargos de 25 e 24 trabalhadores, respetivamente, por ela considerados elegíveis, a saber [cf. PA]:
i) Ano de 2010
N.º
|
NOME
|
Ano Adm. sem termo
|
Idade efetiva
|
Encargos
|
Data de Demissão
|
Dias de trabalho
|
Beneficio considerado 2010
|
...
|
O...
|
2006
|
27
|
14.310,52
|
31-01-2011
|
365
|
6.650,00
|
...
|
P...
|
2006
|
26
|
25.987,50
|
17-12-2011
|
365
|
6.650,00
|
...
|
Q...
|
2007
|
28
|
30.318,50
|
|
365
|
6.650,00
|
...
|
R...
|
2007
|
21
|
14.726,31
|
|
365
|
6.650,00
|
...
|
S...
|
2007
|
29
|
9.281,43
|
|
365
|
4.640,72
|
...
|
T...
|
2007
|
24
|
13.800,60
|
|
365
|
6.650,00
|
...
|
H...
|
2007
|
27
|
8.909,17
|
|
365
|
4.454,59
|
...
|
J...
|
2007
|
23
|
1.537,02
|
01-09-2011
|
365
|
768,51
|
...
|
I...
|
2007
|
24
|
8.863,29
|
|
365
|
4.431,65
|
...
|
U...
|
2007
|
29
|
12.297,75
|
02-04-2012
|
365
|
6.148,88
|
...
|
V...
|
2007
|
25
|
12.993,80
|
|
365
|
6.496,90
|
...
|
W...
|
2007
|
26
|
12.543,32
|
|
365
|
6.271,66
|
...
|
X...
|
2007
|
23
|
15.780,77
|
17-12-2010
|
351
|
6.394,93
|
...
|
Y...
|
2007
|
28
|
46.777,50
|
|
365
|
6.650,00
|
...
|
K...
|
2007
|
27
|
3.673,31
|
|
365
|
1.836,66
|
...
|
Z...
|
2009
|
33
|
20.097,00
|
|
365
|
6.650,00
|
...
|
AA...
|
2009
|
24
|
16.084,29
|
|
365
|
6.650,00
|
...
|
BB...
|
2009
|
34
|
7.491,41
|
|
365
|
3.745,71
|
...
|
CC...
|
2009
|
30
|
8.348,10
|
|
365
|
4.174,05
|
...
|
DD...
|
2009
|
25
|
8.373,69
|
05-04-2012
|
365
|
4.186,85
|
...
|
EE...
|
2009
|
31
|
5.842,20
|
|
365
|
2.921,10
|
...
|
FF...
|
2009
|
27
|
13.383,58
|
02-04-2012
|
365
|
6.650,00
|
...
|
GG...
|
2009
|
26
|
8.332,48
|
|
365
|
4.166,24
|
...
|
HH...
|
2009
|
31
|
8.995,73
|
|
365
|
4.497,87
|
...
|
II...
|
2009
|
35
|
6.792,75
|
|
365
|
3.396,38
|
|
|
|
|
|
|
Total
|
128.382,66
|
ii) Ano de 2011
N.º
|
NOME
|
Ano Adm. sem termo
|
Idade efetiva
|
Encargos
|
Data de Demissão
|
Dias de trabalho
|
Beneficio considerado 2011
|
...
|
O...
|
2006
|
27
|
1.022,18
|
31-01-2011
|
31
|
511,09
|
...
|
P...
|
2006
|
26
|
24.378,75
|
17-12-2011
|
351
|
6.529,56
|
...
|
Q...
|
2007
|
28
|
30.318,81
|
|
365
|
6.790,00
|
...
|
R...
|
2007
|
21
|
15.332,68
|
|
365
|
6.790,00
|
...
|
S...
|
2007
|
29
|
17.325,00
|
|
365
|
6.790,00
|
...
|
T...
|
2007
|
24
|
14.894,55
|
|
365
|
6.790,00
|
...
|
H...
|
2007
|
27
|
9.862,88
|
|
365
|
4.931,44
|
...
|
J...
|
2007
|
23
|
3.186,34
|
01-09-2011
|
244
|
1.593,17
|
...
|
I...
|
2007
|
24
|
9.039,92
|
|
365
|
4.519,96
|
...
|
U...
|
2007
|
29
|
12.318,05
|
02-04-2012
|
365
|
6.159,03
|
...
|
V...
|
2007
|
25
|
12.993,81
|
|
365
|
6.496,91
|
...
|
W...
|
2007
|
26
|
12.543,30
|
|
365
|
6.271,65
|
...
|
Y...
|
2007
|
28
|
46.777,50
|
|
365
|
6.790,00
|
...
|
K...
|
2007
|
27
|
8.530,46
|
|
365
|
4.265,23
|
...
|
Z...
|
2009
|
33
|
20.480,02
|
|
365
|
6.790,00
|
...
|
AA...
|
2009
|
24
|
15.978,02
|
|
365
|
6.790,00
|
...
|
BB...
|
2009
|
34
|
8.707,65
|
|
365
|
4.353,83
|
...
|
CC...
|
2009
|
30
|
7.985,51
|
|
365
|
3.992,76
|
...
|
DD...
|
2009
|
25
|
8.252,20
|
05-04-2012
|
365
|
4.126,10
|
...
|
EE...
|
2009
|
31
|
3.532,49
|
|
365
|
1.766,25
|
...
|
FF...
|
2009
|
27
|
13.383,58
|
02-04-2012
|
365
|
6.691,79
|
...
|
GG...
|
2009
|
26
|
8.918,64
|
|
365
|
4.459,32
|
...
|
HH...
|
2009
|
31
|
8.443,63
|
|
365
|
4.221,82
|
...
|
II...
|
2009
|
35
|
7.605,72
|
|
365
|
3.802,86
|
|
|
|
|
|
|
Total
|
122.222,74
|
av) As correções efetuadas pelas Inspeção Tributária tiveram por base o lista dos trabalhadores que em 2007 forem considerados como elegíveis ao benefício de criação líquida de emprego;
aw) As trabalhadores da Requerente, admitidas em 2007, com menor rendimento eram a J... e a K...;
ax) O referido beneficio fiscal apurado pela Requerente nos exercícios de 2010 e 2011, na parte imputável às trabalhadoras J... e K..., foi nos montantes de € 2.605,17 e € 5.858,40, respetivamente;
ay) No cômputo da criação líquida de postos de trabalho apurada por referência ao exercício de 2007, a Requerente considerou elegíveis as seguintes entradas e saídas de trabalhadores [cf. PA]:
i) Entradas elegíveis
N.º do colaborador
|
NIF
|
NOME
|
Data de Nascimento
|
Data conversão a contrato sem termo
|
Idade data efetividade
|
Data de saída
|
Escolaridade
|
...
|
...
|
Q...
|
02/04/1979
|
24/05/2007
|
28
|
|
|
...
|
...
|
R...
|
12/09/1985
|
24/05/2007
|
21
|
|
Ensino Secundário
|
...
|
...
|
S...
|
04/02/1978
|
24/05/2007
|
29
|
|
|
...
|
...
|
T...
|
22/10/1982
|
01/04/2007
|
24
|
|
|
...
|
...
|
JJ...
|
22/05/1978
|
24/05/2007
|
29
|
30/06/2008
|
|
...
|
...
|
H...
|
16/06/1979
|
24/05/2007
|
27
|
|
|
...
|
...
|
J...
|
28/03/1984
|
24/05/2007
|
23
|
01/09/2011
|
|
...
|
...
|
I...
|
29/09/1982
|
14/04/2007
|
24
|
|
|
...
|
...
|
U...
|
01/11/1977
|
07/05/2007
|
29
|
02/04/2012
|
|
...
|
...
|
V...
|
27/05/1981
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01/04/2007
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25
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...
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...
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W...
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22/03/1981
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24/05/2007
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26
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...
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...
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X...
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03/04/1984
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24/05/2007
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23
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17/12/2010
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...
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...
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KK...
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10/11/1983
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24/05/2007
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23
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31/01/2008
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...
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...
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Y...
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12/07/1978
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24/05/2007
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28
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...
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...
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LL...
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03/10/1980
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24/05/2007
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26
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31/10/2007
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...
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...
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MM...
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15/06/1983
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24/05/2007
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23
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30/07/2008
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...
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...
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NN...
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19/11/1983
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24/05/2007
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23
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11/12/2009
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...
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...
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K..
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22/08/1979
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24/05/2007
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27
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ii) Saídas elegíveis
N.º do colaborador
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NIF
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NOME
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Data de Nascimento
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Data conversão a contrato sem termo
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Idade data efetividade
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Escolaridade
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...
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...
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F...
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22/11/1978
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07/01/2006
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27
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...
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...
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II...
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07/07/1978
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05/06/1999
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20
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...
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...
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LL...
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03/10/1980
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24/05/2007
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26
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az) JJ... nasceu em 22/05/1978, tendo sido admitida em 01/09/2006 como trabalhadora da Requerente – por contrato de trabalho a termo certo, o qual foi convertido em contrato de trabalho sem termo, em 24/05/2007 – e tendo rescindido o respetivo vínculo contratual em 30/06/2008. [cf. Doc. 13 com a P. I.];
ba) KK... nasceu em 10/11/1983, tendo sido admitida como trabalhadora da Requerente – por contrato de trabalho a termo certo, o qual foi convertido em contrato de trabalho sem termo, em 24/05/2007 – e tendo rescindido o respetivo vínculo contratual em 31/01/2008. [cf. Doc. 14 com a P. I.];
bb) LL... nasceu em 03/10/1980, tendo sido admitido em 18/07/2006 como trabalhador da Requerente – por contrato de trabalho a termo certo, o qual foi convertido em contrato de trabalho sem termo, em 24/05/2007 – e tendo rescindido o respetivo vínculo contratual em 31/10/2007. [cf. Doc. 15 com a P. I.];
bc) MM... nasceu em 15/06/1983, tendo sido admitida em 01/10/2005 como trabalhadora da Requerente – por contrato de trabalho a termo certo, o qual foi convertido em contrato de trabalho sem termo, em 24/05/2007 – e tendo rescindido o respetivo vínculo contratual em 20/07/2008. [cf. Doc. 16 com a P. I.];
bd) NN... nasceu em 19/11/1983, tendo sido admitida em 14/04/2004 como trabalhadora da Requerente – por contrato de trabalho a termo certo, o qual foi convertido em contrato de trabalho sem termo, em 24/05/2007 – e tendo rescindido o respetivo vínculo contratual em 11/12/2009. [cf. Doc. 17 com a P. I.];
be) A coberto das Ordens de Serviço n.ºs 0I2013... e OI2013..., de 1 de maio de 2012, os Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Lisboa realizaram uma ação inspetiva externa à Requerente, de âmbito parcial – IRC – e incidente sobre os exercícios de 2010 e 2011;
bf) Em 12 de novembro de 2013, a Requerente foi notificada do Projeto de Conclusões do Relatório da Inspeção Tributária, nos termos do qual foram propostas as seguintes correcções em sede de IRC [cf. PA]:
bg) Em 28 de novembro de 2013, a Requerente exerceu o direito de audição prévia sobre aquele Projeto de Conclusões, nos termos que aqui se dão por inteiramente reproduzidos. [cf. PA];
bh) As correções ao IRC da Requerente, referente aos exercícios de 2010 e 2011, referidas em bf) foram integralmente mantidas no Relatório da Inspeção Tributária;
bi) No Relatório da Inspeção Tributária, que aqui se dá por inteiramente reproduzido, é, além do mais, referido o seguinte que aqui importa salientar [cf. PA]:
«III.1 – Enquadramento dos suprimentos concedidos pela A...SA à B... SGPS, no ano de 2004
(…)
1.2.2 – Dos factos conhecidos
1 – Estamos perante duas entidades relacionadas [A..., SA e B..., SGPS, SA] que celebraram um contrato de cedência de créditos, (…).
De referir que um contrato de financiamento desta natureza, que estabelece que o pagamento da sua remuneração/juros fica subordinado a condições financeiras da empresa mutuária, não seria, certamente, celebrado por entidades não relacionadas.
Este financiamento efetuado entre entidades em situação de relações especiais, deve obedecer às regras dos preços de transferência, definidas no art. 63.º do CIRC, como, aliás, defende o sujeito passivo.
(…)
2 – O facto do contrato de financiamento estabelecer que a remuneração/juros e o consequente pagamento está subordinado a situações, que de acordo com o sujeito passivo, ainda não ocorreram, não significa que o cedente não tenha adquirido direitos sobre o recebimento de juros, que importa quantificar. (…) Pelo que [atento o disposto no art. 18.º, n.º 1, do CIRC] no caso em análise, deve ser efectuada a periodização dos juros com cálculo anual dos mesmos, tendo por base uma taxa de remuneração de plena concorrência, para a operação.
3 – No ano de 2012, exercício no qual foram registados os juros referentes a 7,5 anos (1/1/2005 a 7/7/2012) no valor de € 2.463.119,79, o sujeito passivo mudou de regime de tributação em sede de IRC, passando do regime geral para o regime especial de tributação de grupos de sociedades – RETGS (arts. 69.º a 71.º do CIRC) –, sendo a sociedade dominante a B...SGPS. Nesse exercício a A... SA apresenta um lucro tributável de € 4.951.303,45, enquanto o grupo composto por seis sociedades, apresenta um lucro tributável de € 2.047.440,83. O reconhecimento de juros por parte do sujeito passivo no exercício de 2012 foi neutralizado com a opção pelo RETGS (…)
Da análise aos elementos facultados pelo sujeito passivo, verifica-se que este solicitou à D..., SA, uma análise de preços de transferência, no sentido de determinar intervalos de taxa de juro considerados de plena concorrência (…).
Da metodologia adoptada e respetivos resultados é de salientar os elementos apresentados:
- Método do preço comprável de mercado;
- Base de dados utilizada: Bloomberg – preço de operações de financiamentos realizados entre entidades independentes consideradas comparáveis;
- Pesquisa de títulos e dívida comparáveis emitidos em 2004;
- Resultados: o intervalo de plena concorrência da YTM ajustadas (Yeld to Maturity) varia entre o valor mínimo de 2,621% e o máximo de 7,142%. O intervalo interquartil (exclui os 25% de observações com valores mais altos e os 25% de observações com valores mais baixos) enquadra-se entre 2,811% e 4,185%, sendo a mediana de 3,709%.
Para cálculo dos juros de 2005/01/01 a 2012/06/30, o sujeito passivo utilizou a taxa de 2,8%, correspondente ao limite inferior indicado pela D...(…).
Pelo exposto (…) consideram estes serviços inspectivos que há lugar a contabilização de juros para os anos em análise – Princípio da especialização – relativamente à cessão de créditos da A... SA para a B... SGPS, no montante de € 11.729.141,85.
No que concerne à taxa a aplicar (…) entendemos que os pressupostos utilizados, o intervalo de taxas apurado [no estudo da D...] e o valor da taxa utilizada pelo sujeito passivo obedecem ao regime dos preços de transferência, pelo que consideramos ser prudente utilizar a mesma taxa, ou seja 2,8%, para cálculo dos juros referentes aos anos de 2010 e 2011.
Para cada um dos exercícios de 2011 e 2011, o sujeito passivo não apurou os juros em questão, o que originou, a omissão dos respetivos proveitos em termos contabilísticos, e teve reflexo em termos fiscais, em sede do apuramento do lucro tributável, no valor de € 328.415,97 (€ 11.729.141,85 x 2,8%) para cada um dos anos em análise, pelo que propomos uma correção à matéria colectável no valor total de € 656.831,94, correspondente a € 328.415,97 para cada um dos anos de 2010 e 2011.
III.2 – Criação líquida de postos de trabalho
(…), o sujeito passivo entregou três declarações de rendimentos Modelos 22 de IRC relativamente ao ano de 2010, na 1.ª declaração entregue em 2011/05/30, no campo 774 do Q07 – Benefícios Fiscais, constava o valor de € 3.300,00 a deduzir no apuramento do lucro tributável, enquanto nas 2.ª e 3.ª declarações entregues em 2012/05/30 e 2013/05/31, respectivamente, consta o valor de € 131.981,31, no referido campo, sendo € 128.382,66 referentes a benefício fiscal da criação líquida de postos de trabalho, de acordo com o estipulado no art. 19.º do EBF (…). No ano de 2011, o valor do benefício inscrito é de € 122.222,74. Pelo que, estes serviços definiram o referido benefício fiscal, como área de análise no âmbito das presentes ordens de serviço.
Na análise aos mapas de apuramento, verificámos que na elaboração dos mesmos não foi respeitado o disposto no art. 19.º do EBF (…)
Nos exercícios em análise o sujeito passivo apurou benefícios fiscais de trabalhadores admitidos em 2006, 2007 e 2009, assim repartidos:
Ano
admissão
|
N.º trab. Majoração
|
Valor majoração (€)
|
2010
|
2011
|
2010
|
2011
|
2006
2007
2009
|
2
13
10
|
2
12
10
|
13.300,00
68.044,48
47.038,18
|
7.040,65
68.187,38
46.994,71
|
Total
|
25
|
24
|
128.382,66
|
122.222,74
|
Considera-se criação líquida de postos de trabalho, para efeitos do EBF, a diferença positiva, num dado exercício económico, entre o número de contratações elegíveis e o número de saídas de trabalhadores que, à data da respectiva admissão, se encontravam nas mesmas condições, sendo a sua aferição feita no final de cada exercício, sobre a aferição vide despacho ministerial de 05-03-99 e acórdão STA n.º 0916/08 de 25/02/2009.
(…)
Nesta análise [às admissões e demissões de trabalhadores nos exercícios de 2006 a 2011], apurámos que o sujeito passivo cometeu algumas irregularidades na quantificação por não respeitar na íntegra os requisitos do artigo 19.º do EBF: classificou como não elegíveis, na saída, trabalhadores que na entrada foram considerados como elegíveis e/ou na data de entrada cumpriam todos os requisitos enunciados no artigo 19.º do EBF, conforme disposto na alínea d) do n.º 2 do artigo 19.º do EBF.
Com efeito, no mapa remetido pelo sujeito passivo das demissões do ano de 2007, verifica-se a existência de dois funcionários que respeitavam os requisitos do artigo 19.º do EBF na data da entrada e como tal devem ser classificados como elegíveis nas demissões (…).
Os dois funcionários em causa: F... e G..., entraram na empresa com 27 anos e 20 anos, respetivamente, e a lei à data incluía como elegíveis os trabalhadores até aos 30 anos.
A criação líquida de postos de trabalho calculada, em 2010 e 2011, respeita ao somatório do valor relativo à majoração, de 50%, dos encargos de 25 e 24 trabalhadores respectivamente, considerados elegíveis pelo sujeito passivo. Como não foram consideradas as saídas relevantes de 2 funcionários em 2007, e uma vez que a criação líquida de postos de trabalho corresponde à diferença entre as entradas elegíveis e as saídas relevantes, o benefício fiscal apurado pelo sujeito passivo vai ser corrigido, sendo de considerar a majoração referente a 23 (25-2) e 22 (24-2) trabalhadores em 2010 e 2011 (…).
Para o seu apuramento vamos considerar os trabalhadores com maior rendimento:
Ano de 2010
(…)
Os trabalhadores com menor rendimento são: J... e K..., que estiveram de baixa vários meses, pelo que são retirados os valores referentes aos 2 funcionários que apresentam menores rendimentos e trabalharam o ano completo: H... e I..., cujo benefício foi de € 4.454,59 e € 4.431,64, respetivamente.
Ano de 2011
No ano de 2011, o benefício calculado pelo sujeito passivo, das 2 funcionárias H... e I..., foi de € 4.931,44 e € 4.519,96, que vão ser retirados.
(…)
Pelo exposto, (…) propomos uma redução à dedução efetuada pelo sujeito passivo no campo 774 do Q07 da Modelo 22 de IRC, nos montantes de € 8.886,23 em 2010 e €€ 9.451,40 em 2011, correspondente à correção da majoração de 50% dos custos suportados com 2 trabalhadores admitidos em 2007.
(…)
III.4 – Resumo das correções propostas para os exercícios de 2010 e 2011
Descrição
|
2010
|
2011
|
Ponto relatório
|
Proveitos omitidos
Benefício fiscal indevido
|
328.415,97
8.886,23
|
328.415,97
9.451,40
|
III.1
|
Total correcções (1)
|
337.302,20
|
337.867,37
|
III.2
|
Lucro tributável declarado (2)
|
1.998.165,67
|
2.274.828,03
|
|
Lucro tributável corrigido (1)+(2)
|
2.335.467,87
|
2.612.695,40
|
|
»
bj) A Requerente foi notificada do Relatório da Inspeção Tributária, em 4 de dezembro de 2013;
bk) Das referidas correcções efectuadas decorreram a liquidação adicional de IRC n.º 2013... referente ao exercício de 2010, bem como a dos correspondentes juros compensatórios, no valor total de € 113.747,45, e a liquidação adicional de IRC n.º 2013..., referente ao exercício de 2011, bem como a dos correspondentes juros compensatórios, no montante total de € 101.595,56.;
bl) Em 14 de dezembro de 2013, a Requerente foi notificada da referenciada liquidação adicional de IRC relativa ao exercício de 2010 e dos correspondentes juros compensatórios;
bm) Em 18 de dezembro de 2013, a Requerente foi notificada da referenciada liquidação adicional de IRC relativa ao exercício de 2011 e dos correspondentes juros compensatórios;
bn) Por não concordar com as correcções efectuadas pelos Serviços de Inspeção Tributária, a Requerente apresentou, em 14 de abril de 2014, reclamação graciosa com vista à anulação daquelas correcções e dos sobreditos atos de liquidação adicional de IRC referentes aos exercícios e 2010 e 2011, a qual foi autuada sob o n.º ...2014..., no Serviço de Finanças de...;
bo) Em 28 de novembro de 2014, a Requerente foi notificada do projeto de decisão de indeferimento da reclamação graciosa, não tendo exercido o respetivo direito de audição prévia. [cf. PA];
bp) Em 6 de janeiro de 2015, a Requerente foi notificada da decisão final de indeferimento da reclamação graciosa, nos termos da qual foram mantidas as aludidas correcções efectuadas pelos Serviços de Inspeção Tributária e os subsequentes atos tributários controvertidos;
bq) Na decisão final da reclamação graciosa, que aqui se dá por inteiramente reproduzida, é, além do mais, referido o seguinte que aqui importa respigar [cf. PA]:
«IV – Análise do pedido/parecer
(…)
55. Em suma, empréstimos de sócios ou suprimentos são ambos empréstimos, são ambos passivos da empresa. O que confere ao empréstimo característica de suprimento é o seu carácter de permanência, de acordo com o artigo 243.º do Código das Sociedades Comerciais.
56. Em termos fiscais, os juros (se houver lugar ao pagamento de juros) desse empréstimo são fiscalmente dedutíveis se a taxa de juro contratada não exceder o valor correspondente à taxa de referência Euribor a 12 meses do dia da constituição da dívida ou outra taxa definida por portaria do Ministério das Finanças que utilize aquela taxa como indexante, de acordo com o artigo 42.º, n.º 1, alínea j) do CIRC.
57. Assim, para efeitos do cumprimento deste preceito, há que saber qual a taxa Euribor a 12 meses em vigor no dia da constituição da dívida; os juros que excedam a aplicação dessa taxa não serão fiscalmente dedutíveis na esfera da sociedade. A Portaria n.º 184/2002, de 4 de Março, veio, por um lado, fixar um spread de 1,5 por cento sobre a taxa Euribor, dando assim cumprimento à parte final do referido preceito do Código do IRC.
58. Por outro lado, veio definir que o mesmo preceito só seria aplicável na ausência de normas relativas aos preços de transferência previstas no artigo 58.º do Código do IRC e na Portaria n.º 1446-C/2001, de 21 de Dezembro, e nas Convenções para evitar a dupla tributação.
59. Assim, sempre que existam relações especiais entre a sociedade participante e a sociedade participada (vg pelo facto desta deter uma percentagem igual ou superior a 10 por cento do capital da sociedade), e neste caso concreto, deve ser dado cumprimento ao disposto no n.º 1 do artigo 58.º, ou seja, nas operações comerciais, incluindo, designadamente, operações ou séries de operações sobre bens, direitos ou serviços, bem como nas operações financeiras, devem ser contratados, aceites e praticados termos ou condições substancialmente idênticos aos que seriam normalmente contratados, aceites ou praticados entre entidades independentes em operações comparáveis.
60. Quer isto significar que, verificando-se relações especiais nos termos do n.º 4 do artigo 58.º e se as partes não observarem as condições que seriam acordadas entre pessoas independentes, há lugar a correcções de forma a repor a tributação de acordo com os valores de mercado ou de plena concorrência.
(…)
66. O CIRC consagra para efeitos fiscais ou tributários, o princípio da especialização de exercícios, segundo o qual todos os proveitos e os custos devem ser contabilizados no ano em que sejam obtidos ou suportados, independentemente do seu recebimento ou pagamento. Deste modo, não pode nenhum sujeito passivo transportar para um ano diferente, aina que tenha pago ou recebido nesse outro ano, qualquer fatura, uma vez que o estabelecido no CIRC sobre a imputação das componentes positivas ou negativas respeitantes a exercícios anteriores apenas poderá ser feita se as mesmas forem imprevisíveis ou desconhecidas na data das contas do exercício a que deveriam ser imputadas. Este entendimento decorre não só da lei (artigo 18.ºdo CIRC), mas também foi reforçado pela jurisprudência (cfr., vg, Ac. do TCAS de 19-02-2008 – Proc. 05439/01).
67. Assim, é claramente vedado a qualquer contribuinte definir a seu bel prazer ou de harmonia com, por exemplo, a sua estratégia comercial ou de gestão, o timing para manifestar custos, proveitos e prejuízos decorrentes da sua actividade comercial ou industrial porquanto a Lei lhe impõe limites ou regras para o efeito, designadamente obrigando-o a imputar esses custos ou proveitos ao exercício a que digam respeito.
68. Este (princípio da especialização de exercícios) é um dos mais importantes princípios contabilísticos, porque faz uma clara distinção entre procedimentos de tesouraria e os procedimentos gestão, isto é, entre pagamentos e recebimentos na óptica financeira e o custo e proveito para a óptica de gestão. Assim sendo, todos os custos e proveitos que sejam reconhecidos em determinada data devem ser registados no exercício a que correspondem de modo a que produza uma imagem fidedigna da posição da empresa para esse período.
69. O n.º 3 do artigo 17.º do CIRC estabelece que, para o apuramento do lucro tributável, a contabilidade deverá estar organizada de acordo com a normalização contabilística (vg, POC, Diretrizes Contabilísticas), mas sem prejuízo das disposições previstas no CIRC. Por outro lado, o art. 115.º do CIRC vai mais longe o estabelecer obrigações contabilísticas às empresas para esse efeito, designadamente quanto aos registos/lançamentos contabilísticos e às regras de escrituração dos livros de contabilidade, registos auxiliares e documentos.
70. O princípio da especialização dos exercícios, ou na terminologia do POC, “Da especialização (ou do acréscimo)”, é sem dúvida o princípio que mereceu mais importância pelo legislador do CIRC, nomeadamente para evitar o diferimento de custos e perdas e de proveitos e ganhos com finalidades de economia e gestão fiscal.
(…)
74. O princípio da especialização é compatível com o princípio da justiça e o princípio da justiça tem consagração ou conformação legal no artigo 226.º, n.º 2, da CRP e no artigo 55.º, n.º 1, da LGT, todavia não decorre do princípio da justiça, um dever jurídico de colmatar ou corrigir atos ou omissões dos contribuintes salvo se tal ocorrer de forma involuntária ou não intencional, doutro modo, estaria sempre encontrada a forma de, à luz de tal princípio, tudo ser permitido.
75. Quanto à duplicação de coleta em 2012, referente aos anos de 2010 e 2011, a reclamante [a Requerente] poderá comprovar o alegado e solicitar revisão da autoliquidação do referido exercício nos termos e prazos legais.
76. Ora, não tendo a reclamante [a Requerente] trazido aos autos, nesta sede, outras provas e/ou a alusão a quaisquer elementos factuais ou jurídico-tributários novos que possam condicionar a Administração Tributária a uma nova abordagem da questão, parece-nos não haver mais nada a acrescentar às razões invocadas pelos serviços da inspeção tributária, para as correções efectuadas e agora em apreço, pelo que continuamos a manifestar a nossa concordância com a fundamentação e argumentação da Inspeção Tributária no Relatório de Inspeção, sendo as correções em causa de manter.
Criação Líquida de Postos de Trabalho
(…)
85. A Reclamante [a Requerente] junta ao processo de reclamação graciosa (…) os elementos referentes aos 5 funcionários do Quadro 3 (…) [Quadro 3 – Funcionários considerados como elegíveis pelo SP e desconhecidos dos SIT: JJ…, KK…, LL…, MM…e NN…] e todos eles têm em comum o facto de terem rescindido os contratos antes do início de 2010, pelo que, nunca poderiam ser entradas elegíveis, as admissões dos referidos funcionários, uma vez que, os anos de 2010 e 2011, já não podia ser considerado o benefício fiscal respeitante a cada um destes funcionários.
86. Ora, não tendo a reclamante [a Requerente] trazido aos autos, nesta sede, outras provas e/ou a alusão a quaisquer elementos factuais ou jurídico-tributários novos que possam condicionar a Administração Tributária a uma nova abordagem da questão, parece-nos não haver mais nada a acrescentar às razões invocadas pelos serviços da inspeção tributária, para as correções efectuadas e agora em apreço, pelo que continuamos a manifestar a nossa concordância com a fundamentação e argumentação da Inspeção Tributária no Relatório de Inspeção, sendo as correções em causa de manter.
87. Pelo acima exposto, concluímos que as correções relativas aos proveitos omitidos (para 2010: € 328.415,97 e 2011: € 328.415,97 – ponto III.1 do relatório) e ao benefício fiscal indevido (para 2010: € 8.886,23 e 2011: € 9.45140 – ponto III.2 do relatório) se mantêm.»;
br) A Requerente não efetuou o pagamento do imposto liquidado na parte relativa às correções ora impugnadas;
bs) Em consequência da falta de pagamento, foi instaurado o processo de execução fiscal n.º .../2014/... relativamente ao IRC de 2010;
bt) Pelo mesmo motivo, foi instaurado o processo de execução fiscal n.º .../2014/... relativamente ao IRC de 2011;
bu) A Requerente, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 169.º do CPPT, e para garantia das dívidas de IRC de 2009 e de 2010, constituiu hipoteca a favor da Fazenda Pública / Autoridade Tributária e Aduaneira / Serviço de Finanças de...;
bv) Em 6 de abril de 2015, a Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral que deu origem ao presente processo. [cf. sistema informático de gestão processual do CAAD].
*
§2. FACTOS NÃO PROVADOS
Não se provou que, aquando da cisão-fusão da Requerente, tenha existido um lapso na não transferência pela Requerente para a B... SGPS, SA, conjuntamente com as participações financeiras, do valor dos suprimentos concedidos a várias sociedades do Grupo C..., pelo que esse crédito permaneceu no balanço da Requerente.
*
§3. MOTIVAÇÃO QUANTO À MATÉRIA DE FACTO
No tocante à matéria de facto provada, a convicção do Tribunal fundou-se nos factos articulados pelas partes, cuja aderência à realidade não foi posta em causa, nos documentos juntos aos autos e no processo administrativo.
Relativamente à factualidade não provada, esta foi assim considerada em resultado da ausência de quaisquer elementos probatórios suscetíveis de, inequivocamente, a comprovarem.
*
III.2. DE DIREITO
Num contencioso de mera legalidade e anulação, como é o previsto no RJAT para os tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, em que se visa apenas a declaração de ilegalidade de actos dos tipos previstos nas alíneas a) e b) do n.º 1 do seu artigo 2.º, tem de se aferir da legalidade do acto impugnado tal como ocorreu, com a fundamentação que nele foi utilizada.
No caso em apreço, a Requerente discorda das correções efetuadas relativas a omissão de proveitos e criação líquida de emprego.
Por isso, as questões que se colocam a este Tribunal Arbitral são as de saber se têm fundamento legal as correções efetuadas.
§1. DA OMISSÃO DE PROVEITOS
Como resulta da matéria de facto fixada, no ano de 2004 teve início o processo de reestruturação do Grupo C..., no âmbito do qual foi constituída a B... SGPS e foi efetuada a fusão por incorporação na Requerente da L..., SA e da M..., Lda., tendo-se procedido à transferência global do património destas sociedades para a Requerente, com a consequente extinção dessas sociedades.
À data da sua fusão por incorporação na Requerente, a L..., SA detinha participações sociais em várias empresas do Grupo C..., bem como suprimentos concedidos às mesmas.
Na decorrência da fusão da L..., SA na Requerente, os elementos ativos e passivos que integravam o património daquela sociedade foram transmitidos para a Requerente, incluindo os referidos suprimentos, no montante de € 11.729.141,85, os quais foram contabilizados numa conta de suprimentos.
A referenciada fusão foi seguida de uma cisão-fusão da Requerente, a qual abrangeu dois ramos de negócio: o ramo de negócio do património imobiliário, que foi destacado e fundido na N..., Lda.; e o ramo de negócio das participações financeiras, que foi destacado e fundido na B..., SGPS, SA.
Esta operação visou a reorganização de participações, com a constituição de um grupo estruturado liderado por uma SGPS, responsável pela gestão das participações do Grupo C... e da relação destas com entidades externas, nomeadamente com as instituições financeiras.
No âmbito da aludida transferência do ramo de negócio das participações financeiras para a B..., SGPS, SA, não foi transferido o valor dos suprimentos concedidos a várias sociedades o Grupo C..., no montante de € 11.729.141,85, tendo o mesmo permanecido no balanço da Requerente.
No dia 30 de dezembro de 2004, foi celebrado, entre a Requerente e a B... SGPS, um contrato denominado pelos outorgantes de cessão de créditos, pelo qual a primeira transferia para a segunda, os suprimentos incorporados no seu património, no montante de € 11.729.141,85.
O mesmo contrato referia que o valor dos suprimentos cedidos, no montante de € 11.729.141,85, seria pago numa única prestação, a realizar em 31 de Dezembro de 2005, sendo, porém, tal prazo automaticamente prorrogável por períodos de um ano.
Foi ainda previsto um “período de carência”, estipulando-se que a remuneração do capital ficava subordinada à verificação de um dos dois seguintes factos, aplicando-se o que se verificasse primeiro:
- Distribuição de dividendos pelas participadas em montante igual ou superior ao valor do financiamento concedido inicialmente pela Requerente;
- Apuramento pela B... SGPS de um rácio de “return on equity” – ROE – igual ou superior a 7.5%.
A Inspeção Tributária refere que a contabilidade da Requerente não evidencia, nos anos de 2010 e 2011, os proveitos relacionados com o financiamento em causa, não tendo por esse facto existido qualquer evidência contabilística quanto ao apuramento dos juros pela remuneração cessão dos suprimentos.
Nestes termos, os serviços de Inspeção Tributária consideram existir uma omissão de proveitos na esfera da Requerente referente aos juros devidos pelo financiamento concedido em 2004 no montante de € 11.729.141,85 que motivaram as correções que estão na origem das liquidações impugnadas no presente processo arbitral.
Entende a Requerente que a correção não é devida, pois esses proveitos foram registados no exercício de 2012.
Importa, assim, analisar se a Requerente deveria, ou não, registar esses proveitos nos exercícios de 2010 e de 2011 e, se, devendo-os registar, os mesmos deveriam ter sido incluídos no lucro tributável da Requerente nos exercícios de 2010 e de 2011.
A este respeito, debrucemo-nos sobre o disposto no artigo 17.º do Código do IRC, na redação em vigor nos exercícios nos exercícios de 2010 e 2011 sobre a determinação do lucro tributável:
“1 — O lucro tributável das pessoas colectivas e outras entidades mencionadas na alínea a) do n.º 1 do artigo 3.º é constituído pela soma algébrica do resultado líquido do período e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo período e não reflectidas naquele resultado, determinados com base na contabilidade e eventualmente corrigidos nos termos deste Código.
2 — (…).
3 — De modo a permitir o apuramento referido no n.º 1, a contabilidade deve:
a) Estar organizada de acordo com a normalização contabilística e outras disposições legais em vigor para o respectivo sector de actividade, sem prejuízo da observância das disposições previstas neste Código;
b) Reflectir todas as operações realizadas pelo sujeito passivo e ser organizada de modo que os resultados das operações e variações patrimoniais sujeitas ao regime geral do IRC possam claramente distinguir-se dos das restantes.”
Efetivamente, como princípio geral, o apuramento do lucro tributável deverá ser determinado com base na contabilidade dos sujeitos passivos, mas e apenas se a contabilidade “reflectir todas as operações realizadas pelo sujeito passivo”.
A contabilidade constitui, por isso, o instrumento principal para quantificar o resultado do exercício. No entanto, a mesma terá de obedecer, na sua estrutura, às normas impostas pelo Código do IRC, conforme determinam as alíneas a) e b) do número 3 do seu artigo 17.º.
Por outro lado, os números 1 e 2 do artigo 18.º do Código do IRC referem ainda quanto à “Periodização do lucro tributável” que:
“1 — Os rendimentos e os gastos, assim como as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao período de tributação em que sejam obtidos ou suportados, independentemente do seu recebimento ou pagamento, de acordo com o regime de periodização económica.
2 — As componentes positivas ou negativas consideradas como respeitando a períodos anteriores só são imputáveis ao período de tributação quando na data de encerramento das contas daquele a que deviam ser imputadas eram imprevisíveis ou manifestamente desconhecidas.”
Nestes termos, parece-nos que em respeito pelo princípio do acréscimo, a Requerente deveria ter imputado a cada um dos exercícios o montante dos juros devidos no âmbito do contrato de cessão de créditos, sob pena das demonstrações financeiras não refletirem a realidade económica/financeira de cada uma das empresas.
No mesmo sentido, entendeu o Tribunal Arbitral na decisão proferida no processo n.º 571/2014-T, cuja fundamentação, por merecer a nossa inteira concordância, damos aqui por reproduzida:
“O Código do Rendimento das Pessoas Colectivas (doravante, Código do IRC ou CIRC) consagra, um modelo de dependência parcial entre a fiscalidade e a contabilidade, de acordo com o qual o lucro tributável é apurado a partir do resultado contabilístico e das variações patrimoniais não refletidas no mesmo, sendo efetuados os ajustamentos extracontabilísticos positivos ou negativos previstos na legislação fiscal.
Deste modo, o tratamento decorrente dos normativos contabilísticos é aplicável (e aceite) para efeitos fiscais sempre que o Código do IRC e eventual legislação complementar não estabeleçam regras próprias que determinem o contrário.
O modelo de dependência parcial entre a Contabilidade e o Direito Fiscal, foi acolhido desde há muito no regime fiscal português. No preâmbulo do Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de novembro, afirma-se que: “sempre que não estejam estabelecidas regras fiscais próprias se verifica o acolhimento do tratamento contabilístico decorrente das normas contabilístico”.
O respeito pelo princípio de dependência parcial do Código do IRC face à contabilidade obriga a que não existindo uma disposição prévia do legislador fiscal se siga para efeitos de apuramento do lucro tributável, o que se encontrar estabelecido nas normas contabilísticas em vigor à data.
No que respeita ao tratamento contabilístico desta questão importa atender ao previsto no Capítulo 4 – Princípios contabilísticos, claramente se afirma que “com o objetivo de obter uma imagem verdadeira e apropriada da situação financeira e dos resultados das operações da empresa (…) necessário se torna respeitar os princípios contabilísticos elencados nesse mesmo capítulo, e um deles (alínea c) do capítulo 4) é o princípio da especialização (ou do acréscimo), onde claramente se estatui que: “os proveitos e os custos são reconhecidos quando obtidos ou incorridos, independentemente do seu recebimento ou pagamento, devendo incluir-se nas demonstrações financeiras dos períodos a que respeitam.”. Na contabilidade é evidente que o princípio do acréscimo ou da periodização económica está subjacente ao apuramento do resultado contabilístico, e afigura-se essencial para obtenção de uma imagem verdadeira e apropriada da situação financeira, do desempenho e das alterações da posição financeira.
O princípio do acréscimo ou da especialização dos exercícios (períodos) conduz a que os efeitos das transações e de outros acontecimentos sejam reconhecidos quando eles ocorram (e não quando caixa ou equivalentes de caixa sejam recebidos ou pagos) sendo registados contabilisticamente e relatados nas demonstrações financeiras dos períodos com os quais se relacionam. O desempenho e a situação de uma entidade medem-se de acordo com um regime de competência económica, em que o resultado contabilístico corresponde à diferença entre todos os proveitos e gastos gerados ou incorridos no período.”
A mesma decisão continua referindo que:
“Assim, quer do ponto de vista contabilístico quer do ponto de vista fiscal, se conclui que para o apuramento do resultado líquido de cada um dos períodos devem concorrer todos os custos/rendimentos gerados em cada um dos períodos. Com efeito, também do ponto de vista fiscal se estatui que para a determinação do lucro tributável se deve obedecer ao regime do acréscimo.
O reconhecimento dos proveitos/rendimentos, na base do acréscimo, deve ser efetuado no período a que dizem respeito os efeitos das transações, e não no período em que ocorram as receitas ou no período em que ocorram os recebimentos.
Não se pode confundir o momento da geração do proveito com o momento do seu recebimento, pois a geração do proveito vai gerar um direito a receber essa importância no mesmo momento ou em momento diferente do tempo. Com o respeito por esse princípio assegura-se do ponto de vista contabilístico uma imagem verdadeira e apropriada do património ou da situação financeira, do desempenho e das alterações da posição financeira. Do ponto de vista fiscal a obrigatoriedade de considerar os custos e os proveitos no exercício em que são gerados/incorridos impede também que os contribuintes difiram os custos e os proveitos com finalidades de gestão fiscal diversas daquelas que o legislador fiscal entendeu privilegiar no sistema fiscal português.
Por isso, de um ponto de vista contabilístico impunha-se o registo dos juros decorrentes do ativo associado à cessão de créditos da Requerente (…), pois não existe qualquer norma no Código do IRC ou demais legislação fiscal complementar que imponha um tratamento fiscal distinto do regime contabilístico, antes ele é confirmado pelo princípio contido no artigo 18.º do CIRC.
Assim, e em obediência ao princípio do acréscimo/especialização, claramente os proveitos devem ser reconhecidos quando obtidos e não quando recebidos. Assim e independentemente das condições constantes do contrato celebrado (…) para o pagamento desses juros, o que é relevante do ponto de vista contabilístico é o momento da geração do proveito/rendimento, e este é necessariamente o período contabilístico em que o capital gerou juros.”
Nestes termos, entende este Tribunal Arbitral coletivo que não podia a Requerente ter deixado de contabilizar como proveito os juros decorrentes dos suprimentos concedidos à B... SGPS, uma vez que essa omissão impede que as suas demonstrações financeiras reflitam a realidade da empresa.
Por outro lado, não estando o lucro tributável da Requerente influenciado pelos proveitos referentes aos juros que deveriam ter sido contabilizados em 2010 e 2011, a Requerente diminui o seu lucro tributável e a matéria coletável dos exercícios em causa, resultando assim violado o disposto no art. 18.º do Código do IRC.
A questão relevante para a análise dos factos invocados assenta, pois, na distinção entre o momento em que se verifica o vencimento dos juros, ou seja, o momento em que o devedor – a B... SGPS – tem a obrigação de pagamento desses juros e o momento em que o direito a receber esses juros deve ser registados na contabilidade da Requerente.
Efetivamente, o que é relevante do ponto de vista contabilístico é o momento da geração do proveito/rendimento, e este é necessariamente o período contabilístico em que o capital gerou juros.
Esse é o princípio que decorre do artigo 18.º do Código do IRC, o qual evidencia, conforme já amplamente referido “o princípio da especialização dos exercícios ou da periodização”. Nos termos deste princípio não restam dúvidas de que os rendimentos e outras componentes positivas do lucro tributável são imputados ao período de tributação em que sejam obtidos, independentemente do seu recebimento.
Este princípio em nada contraria o disposto no número 1 do artigo 17.º do Código do IRC, onde se evidencia a dependência parcial da contabilidade quanto aos critérios de reconhecimento estabelecidos pelos normativos contabilísticos, com a necessária adaptação aí prevista.
A questão que se coloca está precisamente relacionada com a observância, ou não, desses mesmos princípios contabilísticos.
Tal como refere a AT, “a NCRF 20 (Rédito), na linha do que é preconizado pelo parágrafo 81 da Estrutura Conceptual (EC) do Sistema de Normalização Contabilística (SNC) determina que os juros constituem rédito proveniente da utilização por outros de activos da própria entidade e, por isso, devem ser reconhecidos quando:
(i) seja provável que os benefícios económicos associados à operação fluam para a entidade; e
(ii) a quantia do rédito possa ser fiavelmente mensurada.
Por outro lado, segundo o princípio da prudência (cf. parágrafo 37 da EC) “Os preparadores das demonstrações financeiras têm, porém, de lutar com as incertezas que inevitavelmente rodeiam muitos acontecimentos e circunstâncias (…)”. E, ainda, “A prudência é a inclusão de um grau de precaução no exercício dos juízos necessários ao fazer as estimativas necessárias em condições de incerteza, de forma que os activos ou os rendimentos não sejam sobreavaliados e os passivos ou os gastos não sejam subavaliados”.
No caso em apreço, a contabilização dos juros pela Requerente, para além de ser possível era exigível, uma vez que apenas estava em causa o momento do vencimento/pagamento dos juros e não o momento em que os mesmos eram devidos.
Ora, no tocante aos rendimentos de juros gerados pelo empréstimo efetuado pela A... S.A. à B... SGPS, estava perfeitamente definido o caráter oneroso desse empréstimo e, como tal, era exigido que o registo contabilístico tivesse ocorrido em cada um dos exercícios.
Como acertadamente refere a AT, não se estava perante um ativo contingente associado a rendimentos que possam nunca acontecer.
Com efeito, de acordo com a NCRF 21 (Provisões, passivos contingentes e ativos contingentes), o fator contingente associado a um ativo (ou passivo) surge quando a sua existência somente será confirmada pela ocorrência ou não ocorrência de um ou mais eventos futuros incertos não totalmente sob o controlo da entidade, que não nos parece ser o caso.
Ora, sendo uma das situações previstas para o recebimento dos juros, a título meramente exemplificativo, “a distribuição de dividendos pelas sociedades participadas”, e sendo a própria Requerente uma dessas participadas, conclui-se que o recebimento apenas estaria dependente da deliberar sobre a aplicação dos seus próprios resultados, não nos parece poder ser invocado qualquer argumento para a não contabilização dos juros.
Quanto à questão da eventual duplicação de coleta alegada pela Requerente, salienta-se que, a existir, a mesma ocorreria no exercício de 2012 e não relativamente aos exercícios de 2010 e 2011.
No entender da Requerente, o registo contabilístico dos juros em apreço, no ano de 2012, foi efetuado na sequência da anulação do saldo em dívida entre a B... e a Requerente, mediante a aquisição, pela Requerente, da participação detida pela B... SGPS na E..., S.A., realizada no exercício de 2012 no âmbito de um projeto de reestruturação societária. Com o valor da aquisição da participação pela Requerente, a B... SGPS fez a compensação do saldo em dívida.
A Requerente alega ainda que o proveito correspondente aos juros previstos no contrato de cessão de créditos em apreço foi sujeito a tributação em sede de IRC, tendo concorrido para a formação do lucro tributável do exercício de 2012.
No entanto, devendo os juros ter sido contabilizados nos exercícios de 2010 e 2011, a alegada duplicação de coleta nunca poderia ter ocorrido nestes exercícios, mas a existir, a mesma só poderia verificar-se quanto ao ano de 2012 e, mesmo assim, nos termos do número 1 do artigo 205.º do CPPT só poderá considera-se existir duplicação de coleta “(…) quando, estando pago por inteiro um tributo, se exigir da mesma ou de diferente pessoa um outro de igual natureza, referente ao mesmo facto tributário e ao mesmo período de tempo.”
O que significa que a duplicação de coleta exige a verificação cumulativa dos seguintes requisitos:
i) o facto tributário ser o mesmo;
ii) ser idêntica a natureza do imposto já pago integralmente e o que, de novo, se exige; e
iii) referirem-se ambos os impostos ao mesmo período temporal.
Não obstante o acima exposto, esta é uma questão que não se encontra no âmbito dos poderes de cognição deste Tribunal Arbitral, devendo a Requerente, caso assim o entenda, suscitar a questão quanto ao exercício de 2012.
Assim, a correção promovida pelos serviços de Inspeção Tributária ao lucro tributável dos exercícios de 2010 e 2011 não enferma de vício de duplicação de coleta.
Noutra ordem de considerações, cumpre ainda apreciar a questão invocada pela Requerente respeitante ao (alegado) incumprimento do princípio de plena concorrência e do ónus da prova nesta sede.
A este propósito, importa destacar o seguinte segmento do Relatório da Inspeção Tributária:
«Da análise aos elementos facultados pelo sujeito passivo, verifica-se que este solicitou a D..., SA, uma análise de preços de transferência, no sentido de determinar intervalos de taxa de juros considerados de plena concorrência (Anexo 1 Pág. 3 a 11).
Da metodologia adoptada e respetivos resultados é de salientar os elementos apresentados:
- Método do preço comparável de mercado;
- Base de dados utilizada: Bloomberg – preço de operações de financiamentos realizados entre entidades independentes consideradas comparáveis;
- Pesquisa de títulos de dívida comparáveis emitidos em 2004;
- Resultados: o intervalo de plena concorrência de YTM ajustadas (Yeld To Maturity) varia entre o valor mínimo de 2,621% e o máximo de 7,142%. O intervalo interquartil (exclui os 25% de observações com valores mais altos e os 25% de observações com valores mais baixos) enquadra-se entre 2,811% e 4,185%, sendo a mediana de 3,709%;
Para cálculo dos juros de 2005/01/01 a 2012/06/30, o sujeito passivo utilizou a taxa de 2,8%, correspondente ao limite inferior indicado pela D... (Anexo 1 Pág. 12 a 16).
(…) consideram estes serviços inspetivos que há lugar a contabilização de juros para os anos em análise – Princípio da especialização – relativamente à cessão de créditos da A..., SA para a B..., SGPS, no montante de € 11.729.141,85.
No que concerne à taxa a aplicar, e da análise aos pressupostos do estudo facultado pelo sujeito passivo e elaborado por uma empresa credenciada –D...– que procedeu a uma análise de preços de transferência, no sentido de determinar intervalos de taxas de juro consideradas de plena concorrência, relativamente à cessão de créditos da A..., SA para a B..., SGPS, no montante de € 11.729.141,85; que o referido estudo teve em consideração o regime português de preços de transferência definido no art. 63.º do CIRC e na Portaria n.º 1446-C/2001, de 21/12, e da qual se conclui que a remuneração a adoptar entre as partes deveria situar-se entre 2,811% e 4,185%; tendo o sujeito passivo utilizado a taxa de 2,8% ao ano; entendemos que os pressupostos utilizados, o intervalo de taxas apurado e o valor da taxa utilizada pelo sujeito passivo obedecem ao regime dos preços de transferência, pelo que consideramos ser prudente utilizar a mesma taxa, ou seja 2,8%, para cálculo dos juros referentes aos anos de 2011 e 2011.»
Ambas as partes entendem que os termos e condições subjacentes ao financiamento corporizado no contrato de cessão de créditos em apreço, deverão respeitar as regras de preços de transferência, uma vez que é reconhecido, por ambas as partes, estar-se perante uma operação realizada entre entidades relacionadas, para efeitos do disposto no artigo 58.° do Código do IRC (atual artigo 63.°).
Aliás, a própria Requerente reconhece no artigo 113.º do pedido de pronúncia arbitral, que «concorda totalmente com a conclusão supra, razão pela qual foi expressamente estabelecido no contrato de cessão de créditos que a taxa de juro aplicável seria definida de acordo com as regras de preços de transferência, "dentro do intervalo de plena concorrência, considerando financiamentos com nível de risco e período de carência idênticos, com base em informação referente a créditos constante de base de dados financeira internacional."»
Ora, como resulta da citada passagem do Relatório da Inspeção Tributária – e é, aliás, reconhecido pela Requerente –, na determinação do valor da taxa de juro associada ao referido financiamento revelou-se crucial para a Inspeção Tributária a análise do dito relatório elaborado pela D..., tendo aqueles serviços aderido inteiramente à metodologia adotada, aos pressupostos utilizados e ao intervalo de taxas de juro apurado.
Como resulta da matéria de facto assente, a Requerente utilizou a taxa de juro de 2,8%, correspondente ao limite inferior indicado pela D..., tendo sido igualmente essa a taxa considerada pela Inspeção Tributária.
A Requerente contesta a aplicação dessa taxa de juro pela Inspeção Tributária, mas cremos que sem razão. Com efeito, a existir erro na determinação das taxas de juro que seriam praticadas entre entidades independentes no financiamento da Requerente à B... SGPS, esse erro não será lesivo dos direitos da Requerente. Desde logo, porque, como se disse, a taxa de juro aplicada se situa entre os valores determinados como sendo os adequados no parecer da D... (correspondendo, aliás, ao seu limiar mínimo). Acresce que, como resultou provado, no âmbito de um contrato de financiamento de sentido inverso, ou seja, da B... SGPS para a Requerente, as taxas aplicadas pela B... SGPS foram, em 2010, de 3,30% e 2,06% e, no ano de 2011, de 4,7%.
Assim, não se pode considerar demonstrado que as liquidações impugnadas enfermem de erro na aplicação do regime dos preços de transferência, designadamente que os valores dos juros aplicados pela Autoridade Tributária e Aduaneira sejam superiores aos que seriam normalmente acordados entre entidades independentes para financiamentos do tipo dos efetuados pela Requerente à B... SGPS.
Pelo exposto, improcede o arguido vício de violação do regime dos preços de transferência, plasmado no artigo 58.° do Código do IRC (atual artigo 63.°) e na Portaria n.º 1446-C/2001, de 21/12.
Destarte, concluímos que o pedido de pronúncia arbitral deve improceder quanto às correções efetuadas relativas a “omissão de proveitos”, pois aquelas não padecem de qualquer vício invalidante, pelo que devem ser mantidas e, consequentemente, são julgadas válidas, nessa parte, as liquidações adicionais de IRC impugnadas.
§2. DA CRIAÇÃO LÍQUIDA DE EMPREGO
A correção lavada a cabo pela AT quanto aos exercícios de 2010 e de 2011 relativa ao benefício fiscal decorrente da criação líquida de emprego (CLE) teve por base a desconsideração, por parte da Requerente, de duas saídas elegíveis de colaboradores que cessaram os contratos em 2010 e 2011 e que tinham sido incluídos como entradas elegíveis em 2007.
Dos elementos constantes do processo, extrai-se que os Serviços de Inspeção Tributária não obtiveram todos os dados necessários ao cálculo do benefício fiscal correspondente à criação líquida de emprego, uma vez que lhes foi entregue a lista das admissões no ano de 2007 e não os contratos a termo que nesse ano foram convertidos em contratos sem termo, o que coloca em questão se algumas das saídas de trabalhadores ocorridas em 2008 e em 2009 tiveram implicações no cálculo do benefício que foi efetuado pela Requerente.
Em primeiro lugar, analisemos o artigo 19.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), cuja redação em vigor em 2011 estatuía o seguinte:
“1 - Para a determinação do lucro tributável dos sujeitos passivos de IRC e dos sujeitos passivos de IRS com contabilidade organizada, os encargos correspondentes à criação líquida de postos de trabalho para jovens e para desempregados de longa duração, admitidos por contrato de trabalho por tempo indeterminado, são considerados em 150 % do respectivo montante, contabilizado como custo do exercício.
2 - Para efeitos do disposto no número anterior, consideram-se:
a) 'Jovens' os trabalhadores com idade superior a 16 e inferior a 35 anos, inclusive, aferida na data da celebração do contrato de trabalho, com excepção dos jovens com menos de 23 anos, que não tenham concluído o ensino secundário, e que não estejam a frequentar uma oferta de educação-formação que permita elevar o nível de escolaridade ou qualificação profissional para assegurar a conclusão desse nível de ensino;
b) 'Desempregados de longa duração' os trabalhadores disponíveis para o trabalho, nos termos do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de Novembro, que se encontrem desempregados e inscritos nos centros de emprego há mais de 9 meses, sem prejuízo de terem sido celebrados, durante esse período, contratos a termo por período inferior a 6 meses, cuja duração conjunta não ultrapasse os 12 meses;
c) «Encargos» os montantes suportados pela entidade empregadora com o trabalhador, a título da remuneração fixa e das contribuições para a segurança social a cargo da mesma entidade;
d) «Criação líquida de postos de trabalho» a diferença positiva, num dado exercício económico, entre o número de contratações elegíveis nos termos do n.º 1 e o número de saídas de trabalhadores que, à data da respectiva admissão, se encontravam nas mesmas condições.
3 - O montante máximo da majoração anual, por posto de trabalho, é o correspondente a 14 vezes a retribuição mínima mensal garantida.
4 - Para efeitos da determinação da criação líquida de postos de trabalho, não são considerados os trabalhadores que integrem o agregado familiar da respectiva entidade patronal.
5 - A majoração referida no n.º 1 aplica-se durante um período de cinco anos a contar do início da vigência do contrato de trabalho, não sendo cumulável, quer com outros benefícios fiscais da mesma natureza, quer com outros incentivos de apoio ao emprego previstos noutros diplomas, quando aplicáveis ao mesmo trabalhador ou posto de trabalho.
6 - O regime previsto no n.º 1 só pode ser concedido uma única vez por trabalhador admitido nessa entidade ou noutra entidade com a qual existam relações especiais nos termos do artigo 63.º do Código do IRC.”
A redação que vigorava em 2010 determinava que “O regime previsto no n.º 1 só pode ser concedido uma vez em relação ao mesmo trabalhador, qualquer que seja a entidade patronal.” Para além disso, por via do disposto no artigo 115.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de abril, durante o ano de 2010, o benefício fiscal previsto no artigo 19.º do EBF podia ser cumulável com outros incentivos de apoio ao emprego previstos noutros diplomas, quando aplicáveis ao mesmo trabalhador ou posto de trabalho.
Em ambos os exercícios as alterações legais ocorridas não são relevantes para a apreciação da situação sub judice.
Considera-se, assim, “criação líquida de postos de trabalho” a diferença positiva, num dado exercício económico, entre o número de contratações elegíveis (ou seja, de jovens e desempregados de longa duração) e o número de saídas de trabalhadores que, à data da respetiva admissão, se encontravam nas mesmas condições.
Nestes termos, para efeitos de determinar a criação líquida de postos de trabalho, na redação legal em vigor, tanto em 2010 como em 2011, torna-se necessário determinar como saídas, também elegíveis, os colaboradores que cessaram os postos de trabalho, desde que, à data em que foram contratados, ou em que os contratos a termo se converteram em contratos sem termo, também eram elegíveis para efeitos de aplicação do benefício.
A mesma norma impõe como limitação que, no apuramento da criação líquida de emprego, as saídas contemplem os trabalhadores que, não obstante terem uma idade igual ou superior a 35 anos, na data em que foram admitidos reuniam as condições de acesso ao benefício.
Por outro lado, sendo o benefício aplicável durante um período de 5 anos, caso o trabalhador venha a cessar o contrato de trabalho antes do final do período, terá como consequência a desconsideração da majoração a partir do momento em que ocorre a rescisão.
Convém referir que a lei não estabelece qualquer critério para selecionar os colaboradores que reúnam as condições de elegibilidade e a cujos encargos se aplique a majoração. Assim, dentro do valor da criação líquida de emprego existente num determinado exercício, podem ser selecionados os colaboradores a quem se aplica o benefício, até ao limite do valor da criação líquida de emprego.
Deste modo, entendemos que a seleção desses trabalhadores não poderá ser imposta, sendo legítimo que a empresa escolha, de entre os trabalhadores elegíveis, os que possam ser majorados com vista à obtenção do máximo benefício possível.
Nestes termos e residindo o dissídio entre a Requerente e a AT no cálculo do benefício fiscal da criação líquida de emprego aplicável aos exercícios de 2010 e 2011, relativamente aos trabalhadores que foram igualmente elegíveis ao benefício fiscal no ano de 2007, iremos então analisar em que medida deveriam os mesmos ter sido considerados.
Para o efeito, importará determinar quais os trabalhadores que, estando nos Quadro da Requerente em 2010 e em 2011, reuniam, à data da respetiva admissão (2007), as condições de elegibilidade ao benefício, ou seja reuniam os requisitos previstos no artigo 19.º do EBF.
Como resultou provado, nos exercícios em análise, a Requerente apurou benefícios fiscais de trabalhadores admitidos em 2006, 2007 e 2009, repartidos por anos de admissão ou de conversão do contrato a termo em contrato sem termo, nos seguintes montantes:
Ano admissão
|
Valor majoração (Euros)
|
2010
|
2011
|
2006
|
13.300,00
|
7.040,65
|
2007
|
68.044,48
|
68.187,38
|
2009
|
47.038,18
|
46.994,71
|
Total
|
128.382,66
|
122.222,74
|
Tendo este Tribunal Arbitral de se pronunciar sobre os montantes correspondentes ao benefício da criação líquida de trabalho de 2010 e de 2011, relativamente aos trabalhadores que em 2007 reuniam as condições de elegibilidade, iremos centrar-nos apenas neste conjunto de trabalhadores.
Assim e tendo por base os elementos constantes do processo e a matéria de facto assente, podemos concluir – em consonância, aliás, com as posições concordantes de Requerente e Requerida nesse sentido –, relativamente a 2007, no seguinte:
§ existiram 18 entradas elegíveis e 3 saídas também elegíveis,
§ sendo a criação líquida de emprego de 15.
Deste modo, a divergência reside na listagem dos trabalhadores que foram considerados, à data, ou seja, em 2007, como trabalhadores elegíveis, bem como os que foram incluídos nessa listagem como trabalhadores que, tendo rescindido o contrato de trabalho, nesse ano, também eram elegíveis na saída.
Uma vez que o artigo 19.º do EBF não impõe ao sujeito passivo, conforme já referido, um critério específico para a seleção, entre os trabalhadores que são elegíveis ao benefício, os que correspondem ao número de postos de trabalho da criação líquida de um determinado exercício, entendemos ser de aceitar a listagem que a Requerente identificou como sendo a que foi aplicável ao cálculo do benefício.
Por outro lado, optámos por basear o enquadramento do benefício fiscal nos quadros que constam do Relatório de Inspeção Tributária e constantes dos artigos 108.º (para o ano de 2010) e 110.º (para o ano de 2011) da Resposta da AT, para efeitos de apuramento das correções, colocando a sombreado os que foram elegíveis em 2007.
Assim para 2010, temos:
N.º
|
NOME
|
Ano Adm. sem termo
|
Idade efetiva
|
Encargos
|
Data de Demissão
|
Dias de trabalho
|
Beneficio considerado 2010
|
...
|
O...
|
2006
|
27
|
14.310,52
|
31-01-2011
|
365
|
6.650,00
|
...
|
P...
|
2006
|
26
|
25.987,50
|
17-12-2011
|
365
|
6.650,00
|
...
|
Q...
|
2007
|
28
|
30.318,50
|
|
365
|
6.650,00
|
...
|
R...
|
2007
|
21
|
14.726,31
|
|
365
|
6.650,00
|
...
|
S...
|
2007
|
29
|
9.281,43
|
|
365
|
4.640,72
|
...
|
T...
|
2007
|
24
|
13.800,60
|
|
365
|
6.650,00
|
...
|
H...
|
2007
|
27
|
8.909,17
|
|
365
|
4.454,59
|
...
|
J...
|
2007
|
23
|
1.537,02
|
01-09-2011
|
365
|
768,51
|
...
|
I...
|
2007
|
24
|
8.863,29
|
|
365
|
4.431,65
|
...
|
U...
|
2007
|
29
|
12.297,75
|
02-04-2012
|
365
|
6.148,88
|
...
|
V...
|
2007
|
25
|
12.993,80
|
|
365
|
6.496,90
|
...
|
W...
|
2007
|
26
|
12.543,32
|
|
365
|
6.271,66
|
...
|
X...
|
2007
|
23
|
15.780,77
|
17-12-2010
|
351
|
6.394,93
|
...
|
Y...
|
2007
|
28
|
46.777,50
|
|
365
|
6.650,00
|
…
|
K...
|
2007
|
27
|
3.673,31
|
|
365
|
1.836,66
|
...
|
Z...
|
2009
|
33
|
20.097,00
|
|
365
|
6.650,00
|
...
|
AA...
|
2009
|
24
|
16.084,29
|
|
365
|
6.650,00
|
...
|
BB...
|
2009
|
34
|
7.491,41
|
|
365
|
3.745,71
|
...
|
CC...
|
2009
|
30
|
8.348,10
|
|
365
|
4.174,05
|
...
|
DD...
|
2009
|
25
|
8.373,69
|
05-04-2012
|
365
|
4.186,85
|
...
|
EE...
|
2009
|
31
|
5.842,20
|
|
365
|
2.921,10
|
...
|
FF...
|
2009
|
27
|
13.383,58
|
02-04-2012
|
365
|
6.650,00
|
...
|
GG...
|
2009
|
26
|
8.332,48
|
|
365
|
4.166,24
|
...
|
HH...
|
2009
|
31
|
8.995,73
|
|
365
|
4.497,87
|
...
|
II...
|
2009
|
35
|
6.792,75
|
|
365
|
3.396,38
|
|
|
|
|
|
|
Total
|
128.382,66
|
Para 2011, temos:
N.º
|
NOME
|
Ano Adm. sem termo
|
Idade efetiva
|
Encargos
|
Data de Demissão
|
Dias de trabalho
|
Beneficio considerado 2011
|
...
|
O...
|
2006
|
27
|
1.022,18
|
31-01-2011
|
31
|
511,09
|
...
|
P...
|
2006
|
26
|
24.378,75
|
17-12-2011
|
351
|
6.529,56
|
...
|
Q...
|
2007
|
28
|
30.318,81
|
|
365
|
6.790,00
|
...
|
R...
|
2007
|
21
|
15.332,68
|
|
365
|
6.790,00
|
...
|
S...
|
2007
|
29
|
17.325,00
|
|
365
|
6.790,00
|
...
|
T...
|
2007
|
24
|
14.894,55
|
|
365
|
6.790,00
|
...
|
H...
|
2007
|
27
|
9.862,88
|
|
365
|
4.931,44
|
...
|
J...
|
2007
|
23
|
3.186,34
|
01-09-2011
|
244
|
1.593,17
|
...
|
I...
|
2007
|
24
|
9.039,92
|
|
365
|
4.519,96
|
...
|
U...
|
2007
|
29
|
12.318,05
|
02-04-2012
|
365
|
6.159,03
|
...
|
V...
|
2007
|
25
|
12.993,81
|
|
365
|
6.496,91
|
...
|
w...
|
2007
|
26
|
12.543,30
|
|
365
|
6.271,65
|
...
|
Y...
|
2007
|
28
|
46.777,50
|
|
365
|
6.790,00
|
...
|
K...
|
2007
|
27
|
8.530,46
|
|
365
|
4.265,23
|
...
|
Z...
|
2009
|
33
|
20.480,02
|
|
365
|
6.790,00
|
...
|
AA...
|
2009
|
24
|
15.978,02
|
|
365
|
6.790,00
|
...
|
BB...
|
2009
|
34
|
8.707,65
|
|
365
|
4.353,83
|
...
|
CC...
|
2009
|
30
|
7.985,51
|
|
365
|
3.992,76
|
...
|
DD...
|
2009
|
25
|
8.252,20
|
05-04-2012
|
365
|
4.126,10
|
...
|
EE...
|
2009
|
31
|
3.532,49
|
|
365
|
1.766,25
|
...
|
FF...
|
2009
|
27
|
13.383,58
|
02-04-2012
|
365
|
6.691,79
|
...
|
GG...
|
2009
|
26
|
8.918,64
|
|
365
|
4.459,32
|
...
|
HH...
|
2009
|
31
|
8.443,63
|
|
365
|
4.221,82
|
...
|
II...
|
2009
|
35
|
7.605,72
|
|
365
|
3.802,86
|
|
|
|
|
|
|
Total
|
122.222,74
|
Conforme a informação disponibilizada pela própria Requerente, “muito embora tivesse a Requerente apurado 18 entradas elegíveis, apenas 15 destas entradas corresponderam a colaboradores passíveis de usufruir no período de 2007 do benefício fiscal relativo à CLPT, tendo sido preteridos os colaboradores KK... (n.º...), LL... (n.º...) e MM... (n.º...)”.
Esses colaboradores saíram, um ainda em 2007 e os outros dois em 2008.
A Requerida defende que mesmo considerando a listagem apresentada pela Requerente relativa aos 5 novos colaboradores, essa situação não afeta a correção efetuada pelos Serviços de Inspeção Tributária. Mas, afigurando-se-nos ser esta a questão fulcral, entendemos ser útil recuperar aqui a fundamentação da AT:
“Com efeito, no exercício do direito de audição, a Requerente vem apresentar um mapa com 18 entradas elegíveis no ano de 2007 do qual constam 5 novos funcionários para os quais não tinha sido dada qualquer informação aos SIT no decorrer dos atos inspectivos, sendo que os mesmos não constavam nem no mapa de CLPT que consta da página 1 do Anexo 2 ao RIT, nem no mapa de admissões de 2007, que consta da página 5 do Anexo 2 ao RIT.
No entanto, como se disse, mesmo apresentando agora os documentos justificando a elegibilidade destes 5 funcionários, estas entradas de 2007, não têm qualquer impacto na CLPT em 2010 e 2011 apurada pelos SIT, uma vez que se trata de funcionários cuja data de saída da empresa ocorreu em 2007/8/9, conforme resulta da documentação fornecida pela própria Requerente, e que se resume nos quadros constantes do artigo 316º da Resposta da AT.”
|
|
2007
|
Entradas elegíveis
|
(1)
|
18
|
Saídas elegíveis
|
(2)
|
3
|
Saldo para CLPT
|
(3) = (1) - (2)
|
15
|
|
|
2008
|
Saldo 2007
|
(1)
|
15
|
Saídas ano 2008
|
(2)
|
3
|
Saldo 2007 p/ CLPT
|
(3) = (1) - (2)
|
12
|
|
|
2009
|
Saldo 2008
|
(1)
|
12
|
Saídas ano 2009
|
(2)
|
1
|
Saldo 2007 p/ CLPT
|
(3) = (1) - (2)
|
11
|
A questão é que considerando que da listagem dos 15 que foram escolhidos pela Requerente para aplicação do benefício em 2007, não estão incluídos a KK... que saiu em 31 de Janeiro de 2008 e a MM... que saiu em 30 de Julho de 2008, também estas não poderão ser consideradas nas saídas elegíveis de 2008, originando que o saldo da criação líquida de emprego que transita para 2010 seja de 13, e não 11, conforme indicado no quadro da AT.
Desse modo, apenas JJ..., que saiu em 30 de Junho de 2008, e NN..., que saiu em 11 de Dezembro de 2009 poderiam ser consideradas como saídas elegíveis no saldo que transitou para 2010.
Nesta parametria, o benefício correspondente à criação líquida de emprego de 2010 e de 2001, seria, assim, apurado relativamente às entradas elegíveis de 2007:
N.º
|
Entradas elegíveis em 2007
|
Ano Adm.
sem termo
|
Idade efetiva
|
Encargos
|
Data de Demissão
|
Dias de trabalho
|
Beneficio considerado 2010
|
Beneficio considerado 2011
|
...
|
Q...
|
2007
|
28
|
30.318,50
|
|
365
|
6.650,00
|
6.790,00
|
...
|
R...
|
2007
|
21
|
14.726,31
|
|
365
|
6.650,00
|
6.790,00
|
...
|
S...
|
2007
|
29
|
9.281,43
|
|
365
|
4.640,72
|
6.790,00
|
...
|
T...
|
2007
|
24
|
13.800,60
|
|
365
|
6.650,00
|
6.790,00
|
...
|
H...
|
2007
|
27
|
8.909,17
|
|
365
|
4.454,59
|
4.931,44
|
...
|
J...
|
2007
|
23
|
1.537,02
|
01-09-2011
|
365
|
768,51
|
1.593,17
|
...
|
I...
|
2007
|
24
|
8.863,29
|
|
365
|
4.431,65
|
4.519,96
|
...
|
U...
|
2007
|
29
|
12.297,75
|
02-04-2012
|
365
|
6.148,88
|
6.159,03
|
...
|
V...
|
2007
|
25
|
12.993,80
|
|
365
|
6.496,90
|
6.496,91
|
...
|
W...
|
2007
|
26
|
12.543,32
|
|
365
|
6.271,66
|
6.271,65
|
...
|
X...
|
2007
|
23
|
15.780,77
|
17-12-2010
|
351
|
6.394,93
|
-
|
...
|
Y...
|
2007
|
28
|
46.777,50
|
|
365
|
6.650,00
|
6.790,00
|
...
|
K...
|
2007
|
27
|
3.673,31
|
|
365
|
1.836,66
|
4.265,23
|
Total
|
68.044,50
|
68.187,39
|
Nestes termos, sem necessidade de maiores considerações, entendemos assistir razão à Requerente, pelo que, quanto a este aspeto, as correções efetuadas pela AT padecem de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto e de direito quanto ao disposto no art. 19.º do EBF, vício invalidante esse que inquina as liquidações adicionais de IRC controvertidas, as quais devem pois ser declaradas ilegais e, consequentemente, anuladas, o que se decide.
§3. DOS VÍCIOS DE INCONSTITUCIONALIDADE
A Requerente aponta diversos vícios de inconstitucionalidade que, no seu entender, inquinam os atos tributários controvertidos.
Passamos, seguidamente, a apreciar cada um deles.
§3.1. DA FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
A Requerente entende que se verifica este vício, ínsito, segundo a Requerente, no artigo 268.º, n.º 3, da CRP, relativamente ao afastamento pela AT das regras de preços de transferência por ela praticados.
A fundamentação dos atos tributários é imposta pelo artigo 77.º da LGT.
A jurisprudência e a doutrina administrativistas têm vindo a entender uniformemente que a fundamentação do ato administrativo é um conceito relativo que varia conforme o tipo de ato e as circunstâncias do caso concreto, mas que a fundamentação só é suficiente quando permite a um destinatário normal aperceber-se do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do ato para proferir a decisão, isto é, quando aquele possa conhecer as razões por que o autor do ato decidiu como decidiu e não de forma diferente, de forma a poder desencadear os mecanismos administrativos ou contenciosos de impugnação.
No caso concreto, a longa fundamentação que consta do Relatório da Inspeção Tributária revela perfeitamente o itinerário seguido pela AT para praticar o ato, designadamente quanto à aplicação das regras de preços de transferência, que foram inequivocamente aplicadas.
Por isso, os atos impugnados não enfermam de vício de falta de fundamentação, o qual a verificar-se originaria vício de ilegalidade e não de inconstitucionalidade.
§3.2. DA VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE
A Requerente preconiza que há violação deste princípio, invocando o artigo 103.º, n.º 2, da CRP.
Esta norma estabelece que “os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes”.
No caso em apreço, todas as normas em causa foram criadas por lei, em sentido próprio ou decreto-lei baseado em autorização legislativa, pelo que não se descortina qualquer violação daquela norma constitucional e, portanto, deste princípio.
§3.3. DA VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA TRIBUTAÇÃO DO RENDIMENTO REAL
A Requerente preconiza que existe violação do princípio enunciado no artigo 104.º, n.º 2, da CRP, que estabelece que “a tributação das empresas incide fundamentalmente sobre o seu rendimento real”.
Para além de esta norma enunciar um princípio que admite exceções (como decorre da expressão “fundamentalmente”), no caso sub judice, ao imputar-se à Requerente os proveitos dos juros em causa está a aplicar-se essa regra, como a própria Requerente reconheceu, ao incluir os montantes dos juros na sua contabilidade relativa ao ano de 2012.
Acontece que, como acima se referiu, atentas as regras fiscais e contabilísticas aplicáveis, não é a esse ano que os proveitos têm de ser imputados, mas sim aos anos de 2010 e 2011.
Dessa forma, a Requerente não deixa de ser tributada com base no seu rendimento real, determinado da forma prevista na lei.
Assim sendo, não se mostra violada esta norma constitucional, nem o princípio nela contido.
§4. DA INDEMNIZAÇÃO POR GARANTIA INDEVIDA
A Requerente afirma que não efetuou o pagamento do imposto liquidado na parte relativa às correções em apreço, por entender que o mesmo não é devido.
Consequentemente, como consta dos factos provados, foi instaurado o processo de execução fiscal n.º .../2014/..., relativamente ao IRC de 2010, e o processo de execução fiscal n.º .../2014/..., relativo ao IRC de 2011.
Também como resulta da matéria de facto assente, a Requerente, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 169.º do CPPT e para garantia da dívida de IRC de 2009 e de 2010, constituiu uma hipoteca sobre um imóvel de que é proprietária.
Por entender que, no caso concreto, houve erro imputável aos serviços, a Requerente formula um pedido de indemnização por garantia indevidamente prestada.
Cumpre apreciar.
De harmonia com o disposto na alínea b) do art. 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exatos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito».
Na autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, concedida pelo art. 124.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de abril, proclama-se, como diretriz primacial da instituição da arbitragem como forma alternativa de resolução jurisdicional de conflitos em matéria tributária, que «o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária».
Embora o art. 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão «declaração de ilegalidade» para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD e não faça referência a decisões constitutivas (anulatórias) e condenatórias, deverá entender-se, em sintonia com a referida autorização legislativa, que se compreendem nas suas competências os poderes que em processo de impugnação judicial são atribuídos aos tribunais tributários em relação aos atos cuja apreciação de legalidade se insere nas suas competências.
Apesar de o processo de impugnação judicial ser essencialmente um processo de mera anulação (arts. 99.º e 124.º do CPPT), pode nele ser proferida condenação da administração tributária no pagamento de juros indemnizatórios e de indemnização por garantia indevida.
Com efeito, apesar de não existir qualquer norma expressa nesse sentido, tem vindo pacificamente a entender-se nos tribunais tributários que pode ser cumulado em processo de impugnação judicial pedido de condenação no pagamento de juros indemnizatórios com o pedido de anulação ou de declaração de nulidade ou inexistência do ato, por o direito a juros indemnizatórios surgir quando, em reclamação graciosa ou processo judicial, a administração seja convencida de que houve erro de facto imputável aos serviços. Este regime foi generalizado no Código de Processo Tributário, que estabeleceu no n.º 1 do seu art. 24.º que «haverá direito a juros indemnizatórios a favor do contribuinte quando, em reclamação graciosa ou processo judicial, se determine que houve erro imputável aos serviços», a seguir, na LGT, em cujo art. 43.º, n.º 1, se estabelece que «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» e, finalmente, no CPPT em que se estabeleceu, no n.º 2 do art. 61.º (a que corresponde o n.º 4 na redação dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».
Relativamente ao pedido de condenação no pagamento de indemnização por prestação de garantia indevida, o art. 171.º do CPPT estabelece que «a indemnização em caso de garantia bancária ou equivalente indevidamente prestada será requerida no processo em que seja controvertida a legalidade da dívida exequenda» e que «a indemnização deve ser solicitada na reclamação, impugnação ou recurso ou em caso de o seu fundamento ser superveniente no prazo de 30 dias após a sua ocorrência».
Assim, é inequívoco que o processo de impugnação judicial abrange a possibilidade de condenação no pagamento de garantia indevida e até é, em princípio, o meio processual adequado para formular tal pedido, o que se justifica por evidentes razões de economia processual, pois o direito a indemnização por garantia indevida depende do que se decidir sobre a legalidade ou ilegalidade do acto de liquidação.
O pedido de constituição do tribunal arbitral tem como corolário passar a ser no processo arbitral que vai ser discutida a «legalidade da dívida exequenda», pelo que, como resulta do teor expresso daquele n.º 1 do referido art. 171.º do CPPT, é também o processo arbitral o adequado para apreciar o pedido de indemnização por garantia indevida.
Aliás, a cumulação de pedidos relativos ao mesmo ato tributário está implicitamente pressuposta no art. 3.º do RJAT, ao falar em «cumulação de pedidos ainda que relativos a diferentes actos», o que deixa perceber que a cumulação de pedidos também é possível relativamente ao mesmo ato tributário e os pedidos de indemnização por juros indemnizatórios e de condenação por garantia indevida são suscetíveis de ser abrangidos por aquela fórmula, pelo que uma interpretação neste sentido tem, pelo menos, o mínimo de correspondência verbal exigido pelo n.º 2 do art. 9.º do Código Civil.
O regime do direito a indemnização por garantia indevida consta do art. 53.º da LGT, que estabelece o seguinte:
Artigo 53.º
Garantia em caso de prestação indevida
1. O devedor que, para suspender a execução, ofereça garantia bancária ou equivalente será indemnizado total ou parcialmente pelos prejuízos resultantes da sua prestação, caso a tenha mantido por período superior a três anos em proporção do vencimento em recurso administrativo, impugnação ou oposição à execução que tenham como objecto a dívida garantida.
2. O prazo referido no número anterior não se aplica quando se verifique, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços na liquidação do tributo.
3. A indemnização referida no número 1 tem como limite máximo o montante resultante da aplicação ao valor garantido da taxa de juros indemnizatórios prevista na presente lei e pode ser requerida no próprio processo de reclamação ou impugnação judicial, ou autonomamente.
4. A indemnização por prestação de garantia indevida será paga por abate à receita do tributo do ano em que o pagamento se efectuou.
No caso em apreço, os atos de liquidação adicional de IRC e juros compensatórios padecem, como já vimos, de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito quanto ao disposto no art. 19.º do EBF, que invalida parcialmente as liquidações adicionais controvertidas.
Ademais, as liquidações adicionais de imposto controvertidas foram da exclusiva iniciativa da Administração Tributária, sendo que a Requerente em nada contribuiu para que elas fossem efetuadas e, muito menos, nos termos em que o foram.
Acontece que o art. 53.º, n.º 1, da LGT ao referir-se a “garantia bancária ou equivalente” está a excluir a hipoteca.
Com efeito, nas palavras de JORGE DE SOUSA[2], “Equivalente à garantia bancária”, para efeitos do art. 171.º do CPPT, “serão todas as formas de garantia que impliquem para o interessado suportar uma despesa cujo montante vai aumentando em função do período de tempo durante o qual aquela é mantida”. E o mesmo autor aponta, a seguir, como exemplo, o “seguro- caução”. No mesmo sentido, ver o acórdão do CAAD, de 9 de outubro de 2013, proferido no processo n.º 48/2013-T.
Ora, no caso, como vimos, resulta do probatório que a Requerente constituiu uma hipoteca sobre imóvel de que é proprietária para suspender a execução fiscal, o que significa a improcedência do pedido de indemnização por garantia indevidamente prestada, sem prejuízo de lhe assistir o direito a ser indemnizada, nos termos gerais. Neste sentido, ver o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 24 de outubro de 2012, proferido no processo n.º 0528/12, assim sumariado: “I - No caso concreto dos autos, em que a garantia prestada para suspender a execução, foi uma hipoteca, esta garantia real não pode ser entendida como uma garantia equivalente à garantia bancária para efeitos do art. 171.º do CPPT. II - Com efeito, esta hipoteca voluntária, em princípio só terá custos emolumentares, de constituição e registo. Assim, não pode dizer-se que estejamos perante uma garantia equivalente à garantia bancária. III - Também não podia, ser requerida a fixação da indemnização ao abrigo da norma quantificadora do art. 53.º, n.º 3, da LGT pois esta é inaplicável ao caso dos autos. IV - É no entanto certo que o recorrido pode ter outros danos para além dos prejuízos decorrentes do pagamento de emolumentos. Assim é de admitir a possibilidade de o pedido indemnizatório ser efectuado em processo autónomo onde se possam averiguar com mais acuidade os danos que o interessado possa ter sofrido (este deve especificar os concretos prejuízos) à semelhança do que estipula o art. 53.º, n.º 3 da LGT para a garantia bancária e seguro caução.”
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IV. DECISÃO
Nos termos expostos, este Tribunal Arbitral decide:
a) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral, na parte relativa às correções à matéria coletável de IRC respeitantes ao benefício fiscal de “criação líquida de postos de trabalho”, nos montantes de € 8.886,23, para o exercício de 2010, e de € 9.451,40, para o exercício de 2011, e, nessa exata medida:
- declarar parcialmente ilegais as liquidações adicionais de IRC impugnadas nestes autos, com a sua consequente anulação parcial, o mesmo sucedendo com as correspondentes liquidações de juros compensatórios;
- declarar ilegal o ato de indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra as liquidações adicionais de IRC em apreço, com a sua consequente anulação parcial;
b) Julgar improcedente o pedido de indemnização por garantia indevidamente prestada, absolvendo a Requerida do mesmo;
c) Condenar ambas as Partes no pagamento das custas do processo, na proporção do decaimento.
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VALOR DO PROCESSO
Em conformidade com o disposto nos arts. 306.º, n.º 2, do CPC, 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, é fixado ao processo o valor de € 206.873,56.
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CUSTAS
Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, o montante das custas é fixado em € 4.284,00 (quatro mil duzentos e oitenta e quatro euros), nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo de Requerente e Requerida, na proporção, respetivamente, de 97% e de 3%.
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Lisboa, 19 de fevereiro de 2016.
Os Árbitros,
(Maria Fernanda Maçãs)
(Filomena Salgado de Oliveira)
(Ricardo Rodrigues Pereira)
[1] Apesar de na alínea a) do n.º 1 do art. 2.º do RJAT apenas se fazer referência explícita à competência dos tribunais arbitrais para declararem a ilegalidade de atos de liquidação, essa competência é extensível a atos de segundo e terceiro grau que apreciem a legalidade desses atos primários, designadamente, como é o caso, atos de indeferimento de reclamações graciosas.
[2] Cfr. Código de Procedimento e de Processo Tributário, 6ª ed., Áreas Editora, 2011, p. 242.