Decisão Arbitral
I - RELATÓRIO
A -PARTES
A…, sociedade por quotas com o número único de matrícula e de pessoa coletiva …, com sede na Av. …, …, …-… ..., doravante designada de Requerente ou sujeito passivo.
AUTORIDADE TRIBUTARIA E ADUANEIRA (que sucedeu à Direcção-Geral dos Impostos, por meio do Decreto-Lei n.º 118/2011, de 15 de Dezembro) doravante designada por Requerida ou AT.
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Pretende do CAAD, e o Tribunal Arbitral foi regularmente constituído, no dia 28-10-2015, para apreciar e decidir o objeto do presente processo, e automaticamente notificado a Autoridade Tributaria e Aduaneira no dia 28-10-2015.
A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico, designou o Exmo. Dr. Paulo Ferreira Alves, tendo a nomeação sido aceite nos termos legalmente previstos.
Em 28-09-2015 as partes foram devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos do artigo 11.º n.º 1, alínea a) e b), do RJAT e dos Artigos 6.º e 7º do Código Deontológico.
Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral singular fica regularmente constituído em 28-10-2015.
Ambas as partes concordam com a realização da dispensa da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, mas apresentaram alegações escritas.
O tribunal arbitral encontra-se regularmente constituído. É materialmente competente, nos termos dos art.ºs 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se legalmente representadas (art.ºs 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art.º 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O processo não enferma de vícios que o invalidem.
B – PEDIDO
O ora Requerente pretende a declaração de ilegalidade Liquidação de Imposto de Selo (verba 28.1 da TGIS), referente ao ano de 2012, que fixou um imposto global a pagar de € 9.758,55 (nove mil setecentos e cinquenta e oito euros e cinquenta e cinco cêntimos) respeitante aos atos n.ºs 2012 ….
C – CAUSA DE PEDIR
A fundamentar o seu pedido de pronúncia arbitral, a Requerente alegou, com vista a declaração de ilegalidade dos atos tributários de liquidação em sede de Imposto de Selo, já descritos no ponto 1 deste Acórdão, síntese, o seguinte:
A Requerente é proprietária plena do terreno para construção, sito na Rua …, Lugar …, …-… ..., da freguesia de …, concelho de ..., inscrito na respectiva matriz urbana sob o artigo …
Defende a requerente, que terreno para construção foi inscrito no ano de 2009, avaliado em 2009/05/04 com o Valor patrimonial (IMI) de € 1.951.710,00, actualizado no ano de 2012 para 2.024.899,13 €; no ano de 2014 para € 1.577.050,00 €; e no ano de 2015 para 967.637,00 €.
O Serviço de Finanças de … relativamente ao prédio em causa e ano de imposto 2012 notificou a requerente da liquidação do IS em 2012-11-08 do prédio urbano Município/Freguesia/artigo (…/…/ U – …), Verba TGIS 28,1, Valor Patrimonial 1.951,71 €, taxa 0,50% = Colecta 9.758,55 € – arts. 4.º e 6.º/1/f/i da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro.
A requerente apresentou Reclamação Graciosa, que foi indeferida, e apresentou Recurso Hierárquico, que também foi indeferido.
Defende a Requerente que o prédio é um terreno destinado a construção, não loteado.
Alega que a AT, com base nessa verba 28, tributou a Requerente, na qualidade de proprietária de um prédio urbano com o valor patrimonial superior a € 1.000.000,00 pela incidência da uma taxa de 0,50% - própria dos prédios com afetação habitacional – sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeitos do IMI.
Esse ato de liquidação é ilegal, por o terreno, sendo destinado a construção, não pode ser considerado à data da liquidação, como um prédio com afectação habitacional.
O prédio em causa não está licenciado nem tinha à data da liquidação do IS licença como destino normal a habitação.
O prédio da requerente foi inscrito (Modelo 1 IMI, entregue em 04/03/2009) como terreno para construção.
Não se estando perante um prédio com afectação habitacional actual, não pode incidir sobre esse prédio o Imposto do Selo previsto na verba 28.1 da TGIS.
E tributar a requerente nas preditas circunstâncias é um erro de Direito e um uma injustiça por fata de previsão legal.
Por isso, a liquidação em causa – ano 2012 –, cuja declaração de ilegalidade se requer, sofre de vício de violação de lei, da verba n.º 28.1 da Tabela Geral do IS, por erro sobre os pressupostos de direito, que justifica a declaração da sua ilegalidade e anulação (artigo 163.º, ex- 135.º do CPA).
Termina a requerente sustentado que além de se pronunciar sobre a ilegalidade do IS em causa, deverá ainda condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira na devolução à Requerente das quantias indevidamente pagas ou que venha a pagar, incluindo os juros de mora, nos caso em que foram pagos e custas de execução, acrescidas de juros indemnizatórios, bem como as despesas da prestação da garantia para suspensão das execuções, antes da anulação das liquidações e consequente liberação tributária da requerente, no que ao caso sub judice diz respeito.
Termina a Requerente, alegando pela a anulabilidade do ato tributário de liquidação em sede de Imposto Municipal sobre os Imoveis por violação de lei, na qualificação do facto tributário, tendo sido erradamente aplicada a verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo, na redação vigente no ano de 2013, o que constitui fundamento de impugnação judicial e de anulação dos atos impugnados (art. 99.º do CPPT - ex vi art. 10.º, n.º 2, al. c) do RJAT).
D- DA RESPOSTA DA REQUERIDA
1. A Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou tempestivamente a sua resposta na qual, em síntese abreviada, alegou o seguinte:
2. Defende a requerida que a Lei n.º 55-A/2012, de 29/10/2012 veio alterar o art. 1.º do CIS, e aditar à TGIS a verba 28, com esta alteração legislativa, o IS passaria a incidir também sobre a propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI) seja igual ou superior a €1.000.000,00.
3. O imposto do selo incidiria assim sobre todos os atos, contratos, documentos, títulos, papéis e outros factos ou situações jurídicas previstos na tabela geral, incluindo as transmissões gratuitas de bens.
4. Não existindo em sede de IS definição do que se entende por ‘prédio urbano’, ‘terreno para construção’ e ‘afetação habitacional’ é necessário recorrer subsidiariamente ao CIMI para obter uma definição que permita aferir da eventual sujeição a IS, de acordo com o previsto no artigo 67º, n.º 2 do CIS na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 55-A/2012, de 29/10.
5. A Requerida defende, nos termos da referida disposição legal, às matérias não reguladas no Código, respeitantes à verba n.º 28.º da TGIS aplica-se subsidiariamente o disposto no CIMI.
6. A noção de afetação do prédio urbano encontra assento na parte relativa à avaliação dos imóveis, o que bem se compreende porquanto a avaliação do imóvel (finalidade) incorpora valor ao imóvel, constituindo um facto de distinção determinante (coeficiente) para efeitos de avaliação.
7. A requerida alega que o legislador optou por determinar a aplicação da metodologia de avaliação dos prédios em geral à avaliação dos ‘terrenos para construção’, como resulta da expressão ‘valor das edificações autorizadas’ a que se refere o artigo 45º, n.º 2 do CIMI e aplicando-lhe por conseguinte o coeficiente de afetação que vem previsto no artigo 41º do CIMI.
8. Mais defende a requerida, que para efeitos de determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção é clara a aplicação do coeficiente de afectação em sede de avaliação, pelo que a sua consideração para efeitos de aplicação da verba 28 da TGIS não pode ser ignorada, valendo neste sentido esta ordem de considerações: a) Na aplicação da lei aos casos concretos importa determinar o exacto sentido e alcance da norma, de modo a que se revele a regra nela contida, condição indispensável para que possa ser aplicada, de acordo com o disposto no art. 9.º do CC, ex vi art. 11.º da LGT; b) O art. 67.º n.º 2 do CIS manda aplicar subsidiariamente o disposto no CIMI; c) A afectação do imóvel (aptidão ou finalidade) é um coeficiente que concorre para a avaliação do imóvel, na determinação do valor patrimonial tributário, aplicável aos terrenos para construção; d) A própria verba 28 TGIS remete para a expressão “prédios com afectação habitacional”, apelando a uma classificação que se sobrepõe às espécies previstas no n.º 1 do art. 6.º do CIMI.
9. Sustenta a requerida, que a mera constituição de um direito de potencial construção faz aumentar imediatamente o valor do imóvel em causa, daí a regra constante do art.45.º do CIMI que manda separar as duas partes do terreno.
10. Não se podendo ignorar que o alvará de licença para a realização de operações urbanísticas deverá conter, entre outros elementos, o número de lotes e a indicação da área de localização, finalidade, área de implantação, área de construção, número de pisos de número de fogos de cada um dos lotes, com especificação dos fogos destinados a habitações a custos controlados, quando previstos, nos termos da alínea a) do art. 77.º do RJUE;
11. E ainda que o art. 77.º do RJUE contém especificações obrigatórias, desde logo para os alvarás de operação de loteamento ou obras de urbanização, e para as obras de construção. Também os Planos Diretores Municipais estabelecem a estratégia de desenvolvimento municipal, a política municipal de ordenamento do território e de urbanismo e as demais políticas urbanas. Integra e articula as orientações estabelecidas pelos instrumentos de gestão territorial de âmbito nacional e regional e estabelece o modelo de organização espacial do território municipal.
12. E nesses termos, muito antes da efetiva edificação do prédio, é possível apurar e determinar a afetação do terreno para construção.
13. Termina a Requerida sustentando a sua posição no sentido de a liquidação em crise consubstancia uma correta interpretação e aplicação do direito aos factos, não padecendo de vício de violação de lei, seja da CRP ou do CIS, devendo, em consequência, julgar-se improcedente a pretensão aduzida e absolver-se a Entidade Requerida do pedido.
E- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
14. Antes de entrar na apreciação destas questões, cumpre apresentar a matéria factual relevante para a respetiva compreensão e decisão, efetuou-se com base na prova documental, e tendo em conta os factos alegados.
15. Em matéria de facto relevante, dá o presente tribunal por assente os seguintes factos:
A requerente é proprietária do lote de terreno para construção sito na Rua …, Lugar …, …-… ..., da freguesia de …, concelho de ..., inscrito na respectiva matriz urbana sob o artigo …, com o valor patrimonial de 1.951.710,00€ para efeitos de tributação de Imposto de Selo.
O Serviço de Finanças de … relativamente ao prédio em causa e ano de imposto 2012 notificou a requerente da liquidação do IS em 2012-11-08 do prédio urbano Município/Freguesia/artigo (…/…/ U – …), Verba TGIS 28,1, Valor Patrimonial 1.951,71 €, taxa 0,50% = Colecta 9.758,55 € – arts. 4.º e 6.º/1/f/i da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro.
16. A requerente procedeu a reclamação graciosa do ato de liquidação de imposto de selo, a qual foi atribuído o número …2013…, a qual foi indeferida.
17. A requerente procedeu à apresentação do recurso hierárquico o qual foi atribuído o número …2013…, o qual foi indeferido.
F- FACTOS NÃO PROVADOS
18. Dos factos com interesse para a decisão da causa, constantes da impugnação, todos os objetos de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita.
G- QUESTÕES DECIDENDAS
19. Atenta às posições das partes assumidas nos argumentos apresentados, constitui questão central dirimenda a seguinte, a qual cumpre, pois, apreciar e decidir:
a. A alegada pela Requerente, declaração de ilegalidade dos atos tributários de liquidação adicional de Imposto de Selo n.º 2012 ….
b. Ao pagamento de juros indemnizatórios, pelo pagamento indevido do imposto.
c. Ao pagamento das despesas com a constituição de garantia idónea, para suspensão da execução fiscal.
H- MATÉRIA DE DIREITO
20. Atendendo às posições das partes assumidas nos articulados apresentados, a questão central a dirimir por este tribunal arbitral consiste em decidir se o ato de liquidação de imposto do selo n.º 2012 …, no montante de € 9.758,55 relativo lote de terreno para construção sito na Rua …, Lugar …, …-… ..., da freguesia de …, concelho de ..., inscrito na respectiva matriz urbana sob o artigo …, com o valor patrimonial tributário de €1.951.710,00, padece dos vícios formais, especificamente o suscitado pela requerida quanto à falta de fundamentação, e de violação de lei, pela errónea interpretação e aplicação da verba 28.1 da TGIS e do artigo 6.º, n.º 1, alínea f), i) da citada Lei n.º 55-A/2012, de 29 de outubro.
21. A matéria de facto está fixada e provada, razão pela qual vamos agora determinar o direito aplicável aos factos controvertidos, uma vez que estamos perante matéria de facto fixada, três terrenos para construção sem qualquer estrutura erguida ou construída, é assim aplicado o mesmo regime e a mesma matéria de direito a todos.
22. Os vícios de lei por erro sobre os pressupostos do direito de liquidação, quanto à questão do enquadramento de terrenos para construção no âmbito de incidência do artigo 28º n.º 1 da TGIS, introduzida pelo Regime da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro.
23. A alteração do regime quanto à sujeição a imposto do selo dos prédios com afetação habitacional pelo aditamento da verba 28 da Tabela Geral do Imposto do Selo, efetuada pelo artº 4º da Lei 55-A/2012, de 29/10, passou a tipificar os seguintes factos tributários, através da seguinte redação:
"28 – Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1.000.000 – sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:
28.1 – Por prédio com afetação habitacional – 1 %;
28.2 – Por prédio, quando os sujeitos passivos que não sejam pessoas singulares sejam residentes em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças – 7,5 %."
24. Constam do artigo 6.º da Lei n.º 55-A/2012, as disposições transitórias que, estabeleceram-se as regras atinentes à liquidação do imposto, previsto naquela verba:
" 1 – Em 2012, devem ser observadas as seguintes regras por referência à liquidação do imposto do selo previsto na verba n.º 28 da respetiva Tabela Geral:
O facto tributário verifica-se no dia 31 de outubro de 2012;
O sujeito passivo do imposto é o mencionado no n.º 4 do artigo 2.º do Código do Imposto do Selo na data referida na alínea anterior;
O valor patrimonial tributário a utilizar na liquidação do imposto corresponde ao que resulta das regras previstas no Código do Imposto Municipal sobre Imóveis por referência ao ano de 2011;
A liquidação do imposto pela Autoridade Tributária e Aduaneira deve ser efetuada até ao final do mês de novembro de 2012;
O imposto deverá ser pago, numa única prestação, pelos sujeitos passivos até ao dia 20 de dezembro de 2012;
As taxas aplicáveis são as seguintes:
Prédios com afetação habitacional avaliados nos termos do Código do IMI: 0,5 %;
ii) Prédios com afetação habitacional ainda não avaliados nos termos do Código do IMI: 0,8 %;
iii) Prédios urbanos quando os sujeitos passivos que não sejam pessoas singulares sejam residentes em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças: 7,5 %.
2 – Em 2013, a liquidação do imposto do selo previsto na verba n.º 28 da respetiva Tabela Geral deve incidir sobre o mesmo valor patrimonial tributário utilizado para efeitos de liquidação de imposto municipal sobre imóveis a efetuar nesse ano.
3 – A não entrega, total ou parcial, no prazo indicado, das quantias liquidadas a título de imposto do selo constitui infração tributária, punida nos termos da lei."
25. Sobre a interpretação deste diploma já se pronunciou o acórdão 53/2013-T, o qual escreve "Utilizou-se na referida verba 28.1 e nas subalíneas i) e ii) da alínea f) do n.º 1 do artigo 6.º da º 55-A/2012, um conceito que não é utilizado em qualquer outra legislação tributária nestes preciso termos que é o de “prédio com afetação habitacional”. Designadamente no CIMI, que em várias normas do CIS nos recursos introduzidas por aquela Lei é indicado como diploma de aplicação subsidiária relativamente ao tributo previstos na referida verba n.º 28 [artigos 2.º, n.º 4, 3.º, n.º 3, alínea u), 5.º, alínea u), 23.º, n.º 7, e 46.º e 67.º do CIS], não é utilizado um conceito definido naqueles termos." Sobre este assunto já decidiram os acórdãos do Tribunal Arbitral do CAAD, n.º 42/2013-T, 48/2013-T, 49/2013-T, 189/2013-T, 207/2013-T, 247/2013, 284/2013-T, 288/2013-T, 308/2013-T, 31/2014-T, 202/2014-T, 310/2014-T.
26. Quanto ao conceito de “prédios”, é para tal necessário recorrer aos conceitos de “prédios” utilizados no CIMI, no qual enumeram-se as espécies de prédios nos seus artigos 2.º a 6.º, o qual se transcreve:
Artigo 2.º
Conceito de prédio
1. Para efeitos do presente Código, prédio é toda a fração de território, abrangendo as águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com carácter de permanência, desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou coletiva e, em circunstâncias normais, tenha valor económico, bem como as águas, plantações, edifícios ou construções, nas circunstâncias anteriores, dotados de autonomia económica em relação ao terreno onde se encontrem implantados, embora situados numa fração de território que constitua parte integrante de um património diverso ou não tenha natureza patrimonial.
2. Os edifícios ou construções, ainda que móveis por natureza, são havidos como tendo carácter de permanência quando afetos a fins não transitórios.
3. Presume-se o carácter de permanência quando os edifícios ou construções estiverem assentes no mesmo local por um período superior a um ano.
4. Para efeitos deste imposto, cada fração autónoma, no regime de propriedade horizontal, é havida como constituindo um prédio.
Artigo 3.º
Prédios rústicos
1 – São prédios rústicos os terrenos situados fora de um aglomerado urbano que não sejam de classificar como terrenos para construção, nos termos do n.º 3 do artigo 6.º, desde que:
Estejam afetos ou, na falta de concreta afetação, tenham como destino normal uma utilização geradora de rendimentos agrícolas, tais como são considerados para efeitos do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS);
Não tendo a afetação indicada na alínea anterior, não se encontrem construídos ou disponham apenas de edifícios ou construções de carácter acessório, sem autonomia económica e de reduzido valor.
2 – São também prédios rústicos os terrenos situados dentro de um aglomerado urbano, desde que, por força de disposição legalmente aprovada, não possam ter utilização geradora de quaisquer rendimentos ou só possam ter utilização geradora de rendimentos agrícolas e estejam a ter, de facto, esta afetação.
3 – São ainda prédios rústicos:
Os edifícios e construções diretamente afetos à produção de rendimentos agrícolas, quando situados nos terrenos referidos nos números anteriores;
As águas e plantações nas situações a que se refere o n.º 1 do artigo 2.º
4 – Para efeitos do presente Código, consideram-se aglomerados urbanos, além dos situados dentro de perímetros legalmente fixados, os núcleos com um mínimo de 10 fogos servidos por arruamentos de utilização pública, sendo o seu perímetro delimitado por pontos distanciados 50 m do eixo dos arruamentos, no sentido transversal, e 20 m da última edificação, no sentido dos arruamentos.
Artigo 4.º
Prédios urbanos
Prédios urbanos são todos aqueles que não devam ser classificados como rústicos, sem prejuízo do disposto no artigo seguinte.
Artigo 5.º
Prédios mistos
1 – Sempre que um prédio tenha partes rústica e urbana é classificado, na íntegra, de acordo com a parte principal.
2 – Se nenhuma das partes puder ser classificada como principal, o prédio é havido como misto.
Artigo 6.º
Espécies de prédios urbanos
1 – Os prédios urbanos dividem-se em:
Habitacionais;
Comerciais, industriais ou para serviços;
Terrenos para construção;
Outros.
2 – Habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços são os edifícios ou construções para tal licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal cada um destes fins.
3 – Consideram-se terrenos para construção os terrenos situados dentro ou fora de um aglomerado urbano, para os quais tenha sido concedida licença ou autorização, admitida comunicação prévia ou emitida informação prévia favorável de operação de loteamento ou de construção, e ainda aqueles que assim tenham sido declarados no título aquisitivo, excetuando-se os terrenos em que as entidades competentes vedem qualquer daquelas operações, designadamente os localizados em zonas verdes, áreas protegidas ou que, de acordo comos planos municipais de ordenamento do território, estejam afetos a espaços, infra-estruturas ou equipamentos públicos. (Redação da Lei n.º 64-A/08, de 31-12)
4 – Enquadram-se na previsão da alínea d) do n.º 1 os terrenos situados dentro de um aglomerado urbano que não sejam terrenos para construção nem se encontrem abrangidos pelo disposto no n.º 2 do artigo 3.º e ainda os edifícios e construções licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal outros fins que não os referidos no n.º 2 e ainda os da exceção do n.º 3.
27. Sobre a interpretação das normas tributárias, para o caso sub júdice, diz-nos o artigo 11.º da Lei Geral Tributária, o qual estabelece as regras essenciais da interpretação das leis tributárias, o que o faz nos seguintes termos:
Artigo 11.º
Interpretação
Na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam, são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis.
Sempre que, nas normas fiscais, se empreguem termos próprios de outros ramos de direito, devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm, salvo se outro decorrer diretamente da lei.
Persistindo a dúvida sobre o sentido das normas de incidência a aplicar, deve atender-se à substância económica dos factos tributários.
As lacunas resultantes de normas tributárias abrangidas na reserva de lei da Assembleia da República não são suscetíveis de integração analógica.
28. A este preceito, é necessário igualmente recorrer aos princípios gerais da interpretação das leis, para que remete o n.º 1 do artigo 11.º da LGT, são estabelecidos no artigo 9.º do Código Civil, que estabelece o seguinte:
Artigo 9.º
Interpretação da lei
A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.
Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.
Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.
29. Face à fundamentação de direito já exposta, e atendendo aos artigos transcritos e enunciados, surgem as seguintes hipóteses de interpretação do conceito de «prédio com afetação habitacional», quanto ao Conceito de «prédio com afetação habitacional» como reportando-se aos prédios habitacionais, e quanto ao Conceito de «prédio com afetação habitacional» como conceito distinto de «prédios habitacionais».
30. Os artigos 2.º a 6.º CIMI supra transcritos, não são utilizados pelo legislador, na classificação dos prédios o conceito de «prédio com afetação habitacional». Igualmente não se encontra este conceito, com esta terminologia, em qualquer outro diploma.
31. A falta de correspondência terminológica exata do conceito de «prédio com afetação habitacional» com qualquer outro utilizado noutros diplomas, podem originar várias hipóteses interpretativas.
32. O texto da lei, sendo o ponto de partida para a interpretação da expressão «prédios com afetação habitacional», sendo com base nele que há que reconstituir o «pensamento legislativo», como impõe o n.º 1 do artigo 9.º do Código Civil, aplicável por força do disposto no artigo 11.º, n.º 1, da LGT, já transcritos.
33. Sobre a interpretação do conceito de «prédio com afetação habitacional», é importante citar o acórdão 53/2013-T o qual já se pronunciou sobre esta matéria. Acórdão esse que igualmente sustenta duas hipóteses interpretativas ao conceito de «prédio com afetação habitacional», respetivamente no mesmo sentido da presente decisão, quanto ao conceito de «prédio com afetação habitacional» como reportando-se aos prédios habitacionais, e quanto ao Conceito de «prédio com afetação habitacional» como conceito distinto de «prédios habitacionais»
34. Escreve o acórdão 53/2013-T, sobre o conceito de «prédio com afetação habitacional» como reportando-se aos prédios habitacionais:
35. "O conceito mais próximo do teor literal desta expressão utilizada é manifestamente o de «prédios habitacionais», definido no n.º 2 do artigo 6.º do CIMI como abrangendo «os edifícios ou construções» licenciados para fins habitacionais ou, na falta de licença, que tenham como destino normal fins habitacionais.
36. A entender-se que a expressão «prédio com afetação habitacional» coincide com o de «prédios habitacionais», é manifesto que as liquidações enfermarão de erro sobre os pressupostos de facto e de direito, pois todos os prédios relativamente aos quais foi liquidado o Imposto do Selo ao abrigo da referida verba n.º 28.1 são terrenos para construção, sem qualquer edifício ou construção, exigidos para se preencher aquele conceito de «prédios habitacionais».
37. Por isso, a adotar-se a interpretação de que «prédio com afetação habitacional» significa «prédio habitacional», as liquidações cuja declaração de ilegalidade é pedida serão ilegais, por não haver em qualquer dos terrenos qualquer edifício ou construção.
38. No entanto, a não coincidência dos termos da expressão utilizada na verba n.º 28.1 da TGIS com a que se extrai do n.º 2 do artigo 6.º do CIMI, aponta no sentido de não se ter pretendido utilizar o mesmo conceito."
39. Sobre a interpretação da segunda hipótese: Conceito de «prédio com afetação habitacional» como conceito distinto de «prédios habitacionais», volta-se a citar o acórdão 53/2013-T, no qual escreve:
"A palavra «afetação», neste contexto de utilização de um prédio, tem o significado de «ação de destinar alguma coisa a determinado uso». ( [1] )
«Quando, como é de regra, as normas (fórmulas legislativas) comportam mais que um significado, então a função positiva do texto traduz-se em dar mais forte apoio a ou sugerir mais fortemente um dos sentidos possíveis. É que, de entre os sentidos possíveis, uns corresponderão ao significado mais natural e direto das expressões usadas, ao passo que outros só caberão no quadro verbal da norma de uma maneira forçada, contrafeita. Ora, na falta de outros elementos que induzam à eleição do sentido menos imediato do texto, o intérprete deve optar em princípio por aquele sentido que melhor e mais imediatamente corresponde ao significado natural das expressões verbais utilizadas, e designadamente ao seu significado técnico-jurídico, no suposto (nem sempre exato) de que o legislador soube exprimir com correção o seu pensamento». ( [2] )
A relevância do texto da lei é especialmente acentuada em matéria de interpretação de normas de incidência do Imposto do Selo, que se reconduzem a uma amálgama, sob uma denominação comum, de um conjunto incongruente de tributos de naturezas completamente distintas (sobre o rendimento, sobre a despesa, sobre o património, sobre atos, etc.), que não deixa margem apreciável para aplicação do critério interpretativo primordial, que é a unidade do sistema jurídico, que reclama a sua coerência global.
A reconhecida falta de coerência do Imposto do Selo é particularmente exuberante no caso desta verba n.º 28.1, apressadamente incluída à margem do Orçamento Geral do Estado, por um legislador fiscal sem orientação fiscal global percetível, que vai implementando sucessivamente normas de agravamento fiscal à medida dos revezes da execução orçamental, das imposições dos credores institucionais internacionais (representados pela «troika») e da fiscalização do Tribunal Constitucional.
Na verdade, embora na «Exposição de Motivos» da Proposta de Lei n.º 96/XII/2.ª ( [3] ), em que se baseou a Lei n.º 55-A/2012, se faça referência à louvável preocupação do Governo de «reforçar o princípio da equidade social na austeridade, garantindo uma efetiva repartição dos sacrifícios necessários ao cumprimento do programa de ajustamento» e ao seu empenho «em garantir que a repartição desses sacrifícios será feita por todos e não apenas por aqueles que vivem do rendimento do seu trabalho», é manifesto, por um lado, que essas razões de equidade, decerto existentes, não começaram a valer em meados de 2012, já existindo no início do ano, quando entrou em vigor o Orçamento Geral do Estado e, por outro lado, que o alcance da verba n.º 28.1, ao tributar acrescidamente os prédios com afetação habitacional e não também os prédios que a não têm, deixa entrever que as preocupações de equidade social e a proclamada intenção de repartição dos sacrifícios por todos, atinge muito mais alguns do que propriamente todos.
Neste contexto, não existindo elementos interpretativos seguros que permitam detetar coerência legislativa na solução adotada na referida verba n.º 28.1 ou o acerto ou desacerto da solução adotada (relevante para efeitos interpretativos à face do n.º 3 do artigo 9.º do Código Civil), o teor do texto legal tem de ser o elemento primacial da interpretação, em conformidade com a presunção, imposta pelo mesmo n.º 3 do artigo 9.º, de que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.
À face daqueles significados das palavras «afetação» e «afetar», que são «dar destino» ou «aplicar», a fórmula utilizada naquela verba n.º 28.1 da TGIS, abrange, manifestamente, os prédios que já estão aplicados a fins habitacionais, pelo que importa indagar se abrangerá também os prédios que, apesar de não estarem ainda aplicados a fins habitacionais, estão a estes destinados e aqueles cujo destino é desconhecido.
À face do teor literal da verba n.º 28.1, é de afastar do âmbito de incidência do Imposto do Selo aí previsto os terrenos para construção de algumas Requerentes que ainda não têm definido qualquer tipo utilização, pois ainda não estão aplicados nem destinados a fins habitacionais. Isto é, os terrenos para construção que não tem utilização definida não podem ser considerados prédios com afetação habitacional, pois não têm ainda nenhuma afetação nem outro destino que não seja a construção de tipo desconhecido. Uma interpretação no sentido de que a verba n.º 28.1 se reporta a prédios cuja afetação é desconhecida não tem o mínimo de correspondência verbal na letra daquela norma, pelo que um hipotético pensamento legislativo desse tipo não pode ser considerado pelo intérprete da lei, em face da proibição que consta do n.º 2 do artigo 9.º do Código Civil.
Mas, isto não basta para esclarecer a situação daqueles terrenos para construção que, não estando ainda aplicados a fins habitacionais, já têm um destino determinado, designadamente, na licença de loteamento, o que é o caso dos prédios referidos nas alíneas z) a dd) da matéria de facto fixada.
Por isso, haverá que esclarecer quando é que se pode entender que um prédio está afetado a fim habitacional, designadamente se é quando lhe é fixado esse destino num ato de licenciamento ou semelhante, ou apenas quando a efetiva atribuição desse destino é concretizada.
Desde logo, o confronto da verba n.º 28.1 da TGIS com n.º 2 do artigo 6.º do CIMI, que define o conceito de prédios habitacionais, aponta manifestamente, no sentido de ser necessária uma afetação efetiva.
Na verdade, um edifício ou construção licenciado para habitação ou, mesmo sem licença, mas que tenha como destino normal a habitação, é, à face do n.º 2 daquele artigo 6.º um prédio habitacional.
Por isso, no pressuposto de que o legislador da Lei n.º 55-A/2012 soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (como impõe o artigo 9.º, n.º 3, do Código Civil que se presuma), se pretendesse reportar-se a esses prédios já licenciados para habitação ou que tenham a habitação como destino normal, decerto teria utilizado o conceito de «prédios habitacionais», que expressaria perfeita e claramente o seu pensamento, à face da definição dada por aquele n.º 2 do artigo 6.º do CIMI.
Consequentemente deve presumir-se que o uso de uma expressão diferente tem em vista uma realidade distinta, pelo que, em boa hermenêutica, «prédio com afetação habitacional», não poderá ser um prédio apenas licenciado para habitação ou destinado a esse fim (isto é, não bastará que seja um «prédio habitacional»), tendo de ser um prédio que tenha já efetiva afetação a esse fim.
Que é este o sentido da expressão «afetação», no mesmo contexto de classificação de prédios que faz o CIMI, confirma-se pelo artigo 3.º em que, relativamente aos prédios rústicos, se faz referência aos que «estejam afetos ou, na falta de concreta afetação, tenham como destino normal uma utilização geradora de rendimentos agrícolas», que evidencia que a afetação é concreta, efetiva. Na verdade, como se vê pela parte final deste texto, um prédio pode ter como destino uma determinada utilização e estar ou não afeto a ela, o que evidencia que a afetação é, a nível da ligação de um prédio a determinada utilização, algo mais intenso que o mero destino e que pode ou não ocorrer, a jusante deste e não a montante. ( [4] )
De resto, o texto da lei ao adotar a fórmula «prédio com afetação habitacional», em vez de «prédios urbanos de afetação habitacional», que aparece na referida «Exposição de Motivos», aponta fortemente no sentido de que se exige que a afetação habitacional já esteja concretizada, pois só assim o prédio estará com essa afetação.
No que concerne ao artigo 45.º do CIMI, não tem qualquer relação com a classificação de prédios apenas indicando os fatores a ponderar na avaliação de terrenos para construção. O que se pondera aí, ao fazer referência ao «edifício a construir» é a ponderação do destino do terreno, que, como se viu, é algo que, no contexto do CIMI, não implica afetação e ocorre antes desta.
A correção desta interpretação no sentido de que só prédios que estejam efetivamente afetos à habitação se inserem no âmbito de incidência da verba n.º 28.1 da TGIS é também confirmada pela ratio legis percetível da restrição do campo de aplicação da norma aos prédios com afetação habitacional, no contexto das «circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada», que o artigo 9.º, n.º 1, do Código Civil também erige em elementos interpretativos. ( [5] ).
Desde logo, a limitação da tributação em Imposto do Selo aos «prédios com afetação habitacional» deixa perceber que não se pretendeu abranger no âmbito de incidência do imposto os prédios com afetação a serviços, indústria ou comércio, isto é, os prédios afetos à atividade económica, o que se compreende num contexto em que, como é notório, a economia se encontra em espiral recessiva, publicamente proclamada ao mais alto nível, com as taxas de desemprego a atingir níveis máximos históricos, com avalanche de encerramento de empresas derivado de insustentabilidade económica.
Tendo em mente esta situação e sendo consabido e público que a reanimação da atividade económica e o aumento das exportações são as portas de saída para a crise, compreende-se que não se tomassem legislativamente medidas que dificultassem a atividade económica, designadamente o agravamento da carga fiscal que a dificulta e afeta a competitividade em termos internacionais.
Por isso, é de concluir que os elementos interpretativos disponíveis, inclusivamente as «circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada», apontam claramente no sentido de não se ter pretendido abranger no âmbito de incidência da verba n.º 28.1 as situações de prédios que ainda não estão afetos à habitação, nomeadamente os terrenos para construção detidos por empresas. ( [6] )"
40. Resulta do exposto que a aplicação do regime à situação da Requerente, quanto ao prédio urbano correspondente a um “terreno para construção”, que não se verifica no presente caso, perante um prédio com afetação habitacional atual, pelo que não incide sobre esses prédios o Imposto do Selo previsto na verba 28.1 da TGIS.
41. Desta forma, a liquidação sub Júdice, cuja declaração de ilegalidade é pedida enfermam de vício de violação daquela verba n.º 28.1, por erro sobre os pressupostos de direito, que justifica a declaração da sua ilegalidade e anulação (artigo 135.º do CPA).
J - QUESTÃO DA INCONSTITUCIONALIDADE
42. Quanto a questão da inconstitucionalidade da norma de incidência contida na verba 28.1 da TGIS, se interpretada no sentido de abranger os terrenos para construção, em face do princípio constitucional
43. Considerando-se procedente a arguição de ilegalidade das liquidações impugnadas por erro nos pressupostos de direito da aplicação da verba 28.1 da TGIS, torna-se supérfluo analisar a questão da inconstitucionalidade da mesma norma quando interpretada no sentido de abranger os terrenos para construção.
L - DOS JUROS INDEMNIZATÓRIOS.
44. Peticiona ainda a requerente o pagamento de juros indemnizatórios.
45. Perante o exposto, a liquidação do IS, na parte abrangida pela anulação, que se decretará, resultam de erros de facto e de direito imputáveis exclusivamente à Administração Fiscal, na medida em que a Requerente cumpriu o seu dever de declaração e foram por aquela cometidos e não poderia a mesma desconhecer entendimentos diferentes.
46. Na verdade, estando demonstrado que a requerente pagou o imposto impugnado na parte superior ao que é devido, por força do disposto nos art.ºs 61.º do CPPT e 43.º da LGT, tem a Requerente direito aos juros indemnizatórios devidos, juros esses a serem contados desde a data do pagamento do imposto indevido (anulado) até à data da emissão da respetiva nota de crédito, contando-se o prazo para esse pagamento do início do prazo para a execução espontânea da presente decisão (art.º 61.º, n.ºs 2.ºa 5, do CPPTRIB), tudo à taxa apurada de harmonia com o disposto no n.º 4.ºdo artigo 43.º da LGT.
47. Dá-se provimento ao pedido da requerente.
M- DA INDEMNIZAÇÃO POR GARANTIA INDEVIDAMENTE PRESTADA
48. Peticiona ainda a requerente a indemnização por garantia indevidamente prestada, nos termos do artº 53º da LGT e do artigo 169.º do CPPT, com o intuito de suspender os processos de execução fiscal relativos à cobrança das dívidas fiscais a que se refere a presente pronúncia arbitral.
49. De acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 53.º da Lei Geral Tributária, o devedor que, para suspender a execução, ofereça garantia bancária ou equivalente será indemnizado total ou parcialmente pelos prejuízos resultantes da sua prestação, caso a tenha mantido por período superior a três anos em proporção do vencimento em recurso administrativo, impugnação ou oposição à execução que tenham como objeto a dívida garantida.
50. Conforme decorre do n.º 2 do citado artigo, são indemnizados, sem dependência do referido prazo, todos os prejuízos suportados com a prestação das garantias prestadas para suspender a execução no caso de vencimento total em ação em que se verifique ter havido erro imputável aos serviços na liquidação do tributo.
51. Por seu lado, estabelece o artigo 171.º do CPPT que "a indemnização em caso de garantia bancária ou equivalente indevidamente prestada será requerida no processo em que seja controvertida a legalidade da dívida exequenda» e que «a indemnização deve ser solicitada na reclamação, impugnação ou recurso ou em caso de o seu fundamento ser superveniente no prazo de 30 dias após a sua ocorrência"
52. O processo de impugnação judicial, em que se decide sobre a legalidade do acto tributário, constitui, pois, meio processual adequado para formular o pedido de indemnização por garantia indevida.
53. Conforme reiterada jurisprudência arbitral, " O pedido de constituição do tribunal arbitral tem como corolário passar a ser no processo arbitral que vai ser discutida a «legalidade da dívida exequenda», pelo que, como resulta do teor expresso daquele n.º 1 do referido artigo 171.º do CPPT, é também o processo arbitral o adequado para apreciar o pedido de indemnização por garantia indevida."
54. Perante o exposto, a liquidação do IS, na parte abrangida pela anulação, que se decretará, resultam de erros de facto e de direito imputáveis exclusivamente à Administração Fiscal, na medida em que a Requerente cumpriu o seu dever de declaração e foram por aquela cometidos e não poderia a mesma desconhecer entendimentos diferentes.
55. Contudo no presente caso não lhe assiste a requerente o direito a indemnização por prestação de garantia indevida, nos termos dos artigos 53º da LGT e do artigo 169.º do CPPT, uma vez que a requerente no decorrer da presente ação fez prova da prestação de garantia peticionada.
56. Perante o exposto o presente tribunal não dá provimento ao pedido da requerente.
N- DECISÃO
57. Destarte, atento a todo o exposto, o presente Tribunal Arbitral, decide-se:
Julgar procedentes o pedido de declaração de ilegalidade do ato tributário de liquidação em sede de Imposto de Selo, que definiu uma coleta a pagar de € 9.758,55 (nove mil setecentos e cinquenta e oito euros e cinquenta e cinco cêntimos), e a consequente anulação ao ato tributário de liquidação n.º 2012 …, por vício de violação de lei quanto a norma constante na verba 28º n.º1º, por erro sobre os pressupostos de direito, que justifica a declaração da sua ilegalidade e anulação, que fixou um imposto global a pagar de € 9.758,55 (nove mil setecentos e cinquenta e oito euros e cinquenta e cinco cêntimos), por vício de violação de lei quanto a norma constante na verba 28º n.º1º, por erro sobre os pressupostos de direito, que justifica a declaração da sua ilegalidade e anulação.
Condenar a Requerida, a restituir à requerente essa quantia indevidamente liquidada e paga, acrescida do pagamento de juros indemnizatórios já vencidos relativos ao período que mediou entre a data de liquidação do imposto e a data de restituição do imposto indevidamente liquidado, bem como no pagamento dos juros indemnizatórios vincendos a contar desta última data, tudo nos termos dos n.ºs 2.ºa 5.ºdo art.º 61.º do CPPT e à taxa apurada de harmonia com o disposto no n.º 4.ºdo art.º 43.º da LGT até integral reembolso.
Fixa-se o valor do processo em € 9.758,55 (nove mil setecentos e cinquenta e oito euros e cinquenta e cinco cêntimos) do valor da liquidação atendendo ao valor económico do processo aferido pelo valor das liquidações de imposto impugnadas, e em conformidade fixa-se as custas, no respetivo montante em 918,00€ (novecentos e dezoito euros), a cargo da requerida de acordo com o artigo 12.º, n.º 2 do Regime de Arbitragem Tributária, do artigo 4.ºdo RCPAT e da Tabela I anexa a este último – n.º 10 do art.º 35º, e n.º 1, 4 e 5 do art.º 43º da LGT, art.ºs 5.º, n.º1, al. a) do RCPT, 97.º-A, n.º 1, al. a) do CPPT e 559.º do CPC).
Notifique.
Lisboa, 22 de Janeiro de 2016
O Árbitro
Paulo Ferreira Alves
[1] Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea da Academia das Ciências de Lisboa, I volume, página 102.
[2] BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, página 182.
[3] A Proposta de Lei n.º 99/XII/2.ª está disponível em http://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=37245
[4] Outras normas do CIMI deixam perceber que o termo «afetação» é utilizado para referenciar situações já existentes e não meramente futuras, mesmo que previsíveis, como o «destino». É o caso do artigo 9.º do CIMI, que, depois de estabelecer que «o imposto é devido a partir» «do 4.º ano seguinte, inclusive, àquele em que um terreno para construção tenha passado a figurar no inventário de uma empresa que tenha por objeto a construção de edifícios para venda» ou «do 3.º ano seguinte, inclusive, àquele em que um prédio tenha passado a figurar no inventário de uma empresa que tenha por objeto a sua venda» [alíneas d) e e) do n.º 1], determina que «para efeitos do disposto nas alíneas d) e e) do n.º 1, devem os sujeitos passivos comunicar ao serviço de finanças da área da situação dos prédios, no prazo de 60 dias contados da verificação do facto determinante da sua aplicação, a afetação dos prédios àqueles fins». A «afetação dos prédios àqueles fins», no contexto deste artigo 9.º, reconduz-se à atribuição concreta aos prédios do fim «para venda», materializado pela sua inventariação, não bastando que tenham sido construídos ou adquiridos tendo em vista a sua venda.
[5] Não se tem em mente, nesta abordagem, os casos especiais previstos na verba n.º 28.2, de titularidade dos prédios por pessoas coletivas residentes em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças a que, como em outras normas, se atribui forte penalização tributária, por se tratar de situações normalmente associadas a evasão fiscal.
[6] Fora dos casos especiais previstos na verba n.º 28.2.