Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 407/2015-T
Data da decisão: 2015-12-15  Selo  
Valor do pedido: € 1.224,00
Tema: IS – Verba 28 da TGIS – Propriedade vertical
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Decisão Arbitral

 

 

 

I – RELATÓRIO

 

 

1 –A..., CF[1]... residente na Rua..., nº ... –... Dtº Lisboa, na qualidade de usufrutuária, apresentou em 02/07/2015 um pedido de constituição do tribunal arbitral, ao abrigo do disposto na alínea a) do nº1 do artigo 2º,do nº 1 do artigo 3º e da alínea a) do nº 1 do artigo 10º, todos do RJAT[2], sendo requerida a AT[3], com vista à apreciação da legalidade dos atos tributários de liquidação do IS[4], referentes ao ano de 2014 incidente sobre um prédio com andares e divisões com utilização independente sito na Rua ... nº ... da, freguesia de..., inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo..., área ... Serviço de Finanças de Lisboa

2 – O pedido de constituição do tribunal arbitral foi feito sem exercer a opção de designação de árbitro, vindo a ser aceite pelo Exmº Senhor Presidente do CAAD[5] e automaticamente notificado à AT em 06/07/2015.

3 – Nos termos e efeitos do disposto no nº1 do artigo 6º do RJAT, por decisão do Exmº Senhor Presidente do Conselho Deontológico, devidamente comunicada às partes, nos prazos legalmente aplicáveis, foi designado Arlindo José Francisco, na qualidade de árbitro, que comunicou ao Conselho Deontológico e ao Centro de Arbitragem Administrativa a aceitação do encargo no prazo regularmente estipulado.

4 - O tribunal foi constituído em 11/09/2015 de harmonia com as disposições contidas na alínea c) do nº 1 do artigo 11º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228º da Lei nº 66-B/2012 de 31 de dezembro

5 – Com o seu pedido visa, a requerente, a declaração de ilegalidade dos atos tributários de liquidação da verba 28 da TGIS[6] que incidiram sobre o valor patrimonial das partes ou unidades independentes do prédio já identificado com afetação habitacional, tudo como melhor consta a fls. 1 e 2 do pedido.

 6- Invoca para o efeito, em síntese, na qualidade de usufrutuária do imóvel, o seguinte:

6.1- O imóvel foi alvo da avaliação prevista na Lei 60-A/2011 com notificação à requerente, dos valores patrimoniais apurados, em Janeiro de 2013 e nenhum dos andares que compõem o prédio em questão tem VPT[7] igual ou superior a € 1 000 000,00 e os mesmo variam, individualmente, entre os € 95 520,00 e € 221 050,00

6.2 Na sua perspetiva as liquidações aqui postas em crise sofrem do vício de violação da Lei, fazendo errónea interpretação e aplicação da verba 28.1 da TGIS, ao mesmo tempo que violarão o princípio constitucional da igualdade fiscal, ínsito no artigo 13º da CRP[8] e ainda haverá a violação do artigo 120º do CIMI[9], aplicável ex vi do nº 5 do artigo 44º do CIS[10]

6.3 – Considera que, para efeitos de IMI[11] os imóveis em propriedade vertical com partes suscetíveis de utilização independente obedecem às mesmas regras dos prédios em propriedade horizontal, sendo, em ambos os casos, o IMI calculado individualmente a cada parte suscetível de utilização independente, na propriedade vertical, ou fração, na propriedade horizontal.

 6.4 – O IS contestado foi apurado sobre o VPT de cada um dos andares ou divisões independentes com afetação habitacional, individualmente, tal como verdadeiras frações autónomas de propriedade horizontal, não tendo o legislador da verba 28 da TGIS feito qualquer distinção entre os andares ou divisões independentes da propriedade vertical e as frações autónomas da propriedade horizontal

6.5- Pese embora, na propriedade vertical, exista apenas um único prédio, o legislador impõe a tributação autónoma de cada uma das partes suscetíveis de utilização independente, para efeitos de tributação em IMI.

6.6 – Cita ainda algumas decisões dos tribunais arbitrais formados que vão no sentido, por si defendido.

7 – Por sua vez a AT entende:

7.1- Que não assiste razão à requerente uma vez que é relevante para a incidência do IS o VPT total do prédio urbano e não o VPT de cada parte que o comportam ainda que suscetíveis de utilização independente

7.2- Refere ainda a AT que, um imóvel em propriedade total e um imóvel em propriedade horizontal têm diferente valoração e tributação donde decorre diferentes efeitos jurídicos; enquanto na propriedade horizontal há uma divisão da propriedade total e autonomia de cada uma das frações, no prédio em propriedade total há uma única realidade jurídica;

7.3 - Cada parte suscetível de utilização independente não é autónoma, por matriz, possuindo uma discrição do prédio na sua totalidade;

7-4 – Conclui que a verba 28.1 da TGIS incide sobre os prédios urbanos com afetação habitacional, que o prédio em questão tem valor superior a € 1 000 000,00, pelo que as liquidações aqui postas em crise não sofrem de qualquer ilegalidade e deverão ser mantidas

 

I – SANEAMENTO

 

 

O tribunal foi regularmente constituído e é competente em razão da matéria, de acordo com o artigo 2º do RJAT.

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas e encontram-se regularmente representadas de harmonia com os artigos 4º e 10º nº2 do RJAT e artigo 1º da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de Março.

Na sua resposta, a AT, considerou estar apenas em causa uma questão de direito requereu a dispensa da realização da reunião do artigo 18º do RJAT bem como a produção de alegações.

O tribunal, por despacho de 19 de Outubro de 2015, concedeu um prazo de 10 dias para a requerente se pronunciar sobre o pedido, o que veio a fazer em 30 do mesmo mês, dizendo que prescindia da reunião do artigo 18º do RJAT, mas pretendia produzir alegações

Na mesma data o tribunal proferiu despacho a dispensar a reunião do artigo 18º do RJAT e a conceder um prazo de 10 dias para a produção de alegações para a requerente e requerida, com trato sucessivo, por esta ordem e fixou data de 15 de Dezembro de 2015 para a decisão

Produzidas as mesmas, as partes, no essencial, mantem os respetivos pontos de vistas quanto à matéria controvertida. A requerida juntou Acórdão do TC[12] (nº 590/2015) no qual se decidiu que a norma contida na verba 28 da TGIS, não viola os princípios da igualdade tributária, da capacidade contributiva, nem o da proporcionalidade.

Não padecendo o processo de nulidades, não tendo sido suscitadas questões que obstem à apreciação do mérito da causa, consideramos reunidas as condições para ser proferida a decisão.

 

III – FUNDAMENTAÇÃO

 

1 – Questão a dirimir nos presentes autos

 

Saber se a verba 28.1 da TGIS se aplica ao somatório dos VPT das partes ou divisões suscetíveis de utilização independente, destinadas à habitação quando ele seja igual ou superior a € 1 000 000,00, ou, apenas se aplica, sobre o VPT individual de cada uma delas quando o mesmo seja igual ou superior a € 1 000 000,00, tal como acontece no caso dos prédios em propriedade horizontal.

 

2 – Matéria de facto

 

A matéria de facto relevante e provada com base nos elementos juntos aos autos é a seguinte:

a)      A requerente é usufrutuária de um prédio urbano em propriedade total, com partes ou divisões suscetíveis de utilização independente destinadas à habitação, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ... sob o artigo ... da área do serviço de finanças de Lisboa... .

b)      O prédio é constituído, segundo a matriz, por 14 andares ou divisões suscetíveis de utilização independente com afetação habitacional cujo VPT total é de € 2 309 640,00

c)      Nenhum dos andares ou divisões suscetíveis de utilização independente tem VPT igual ou superior a € 1 000 000,00 e que se encontra individualmente apurado na respetiva matriz e oscilando entre € 95 520,00 e € 221 050,00.

d)     A requerente foi notificada para o pagamento do IS no montante de € 23 096,40, em Maio de 2015 referente a 2014, apurado individualmente por cada andar ou divisão suscetível de utilização independente, conforme documentos de cobrança remetidos e juntos aos autos.

e)      Deles se constata que a AT calculou o IS individualmente a cada um dos andares ou divisões suscetíveis de utilização independente, e que nenhum deles tem valor igual ou superior a € 1 000 000,00

f)       Porém, considerou que o VPT total do prédio ultrapassava aquele valor e fez, então, o somatório do imposto apurado individualmente e chegou à tributação aqui posta em crise.

3 – Do Direito

 

 

 

a)      A questão a resolver é saber se de acordo com o disposto na verba 28.1 da TGIS se deverá ou não considerar o somatório do VPT de cada uma das partes ou divisões suscetíveis de utilização independente, uma vez que nenhuma delas tem valor igual ou superior a €1 000 000,00 ou, se deveremos atender ao seu VPT, individual, para efeitos de tributação em IS.

b)      Tendo em conta que o CIS remete para o CIMI a regulação do conceito de prédio e das matérias não reguladas quanto à verba 28 da TGIS (nº 6 do artigo 1º e nº2 do artigo 67º ambos do CIS),é no CIMI que teremos de observar os conceitos que nos permitam dirimir a questão.

c)      O conceito generalista de prédio consta no artigo 2º do CIMI, no artigo 3º do mesmo diploma o legislador, usando critérios de afetação e localização estabeleceu o conceito de prédios rústicos, vindo depois, numa classificação pela negativa, no seu artigo 4º, estabelecer que prédios urbanos serão todos os que não devam ser classificados como rústicos.

d)     O artigo 6º do citado CIMI divide os prédios urbanos em habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços, terrenos para construção e outros.

e)      No caso concreto estamos em presença de prédio urbano com partes ou divisões suscetíveis de utilização independente com afetação habitacional.

f)       Cada uma das partes ou divisões suscetíveis de utilização independente que compõem o imóvel em questão preenche o conceito de prédio estabelecido no artigo 2º do CIMI, na medida em que elas são física e economicamente independentes e fazem parte do património de pessoa singular ou coletiva, no caso em apreço, trata-se de uma usufrutuária.

g)      Nos termos do nº 4 do artigo 2º do CIMI cada fração autónoma, no regime de propriedade horizontal é havida como constituindo um prédio, mas não existe nada na lei que permita fazer a discriminação entre prédios em propriedade horizontal e vertical, relativamente à sua identificação como prédios urbanos habitacionais.

h)      A AT ao fazer a tributação em IS fez o seu cálculo sobre o VPT de cada uma das partes ou divisões com utilização independente com afetação habitacional, só que a final considerou o VPT global e verificando ser superior a € 1000 000,00, somou os valores de IS apurados unitariamente.

i)        Mas este procedimento não tem suporte legal, uma vez que, nenhuma das partes ou divisões com utilização independente com afetação habitacional, preenchendo, cada uma delas, o conceito de prédio enunciado no artigo 2º do CIMI, tem um VPT igual ou superior a € 1 000 000,00, requisito exigível para haver tributação em IS.

j)        Nem se diga que há uma diferente valoração e tributação de um imóvel em propriedade total com partes ou divisões suscetíveis de utilização independente, face a um imóvel em propriedade horizontal. Na verdade ela não existe em IMI tal como não poderá existir em IS, uma vez que, a legislação aplicável é a mesma, com as devidas adaptações.

k)      O critério de tributação tem que ser uniforme, isto é, se uma fração habitacional de um prédio em propriedade horizontal só é tributada em IS se o seu VPT for igual ou superior a € 1 000 000,00, igualmente um andar ou parte de prédio suscetível de utilização independente de um prédio em propriedade vertical com afetação habitacional só será tributada em IS se o seu VPT for igual ou superior a € 1 000 000,00.

l)        Como já se disse o andar ou parte de prédio suscetível de utilização independente de um prédio em propriedade vertical reúne o conceito de prédio estabelecido no Código do IMI, tal como as frações autónomas dos prédios em propriedade horizontal.

m)    Nesta perspetiva e considerando que nenhuma das partes ou divisões suscetíveis de utilização independente com destino ou afetação habitacional tem VPT igual ou superior a € 1000 000,00 forçoso é concluir que os atos de liquidação do IS são ilegais por não ter sido observado as condições definidas na verba 28 da TGIS.

n)      O critério usado pela AT ao considerar o somatório dos VPT das partes ou divisões suscetíveis de utilização independente, argumentando que o prédio não está constituído em propriedade horizontal, carece de sustentação legal, sendo o contrário que resulta da aplicação das normas do CIMI, aplicável por remissão.

o)      Do ponto de vista do tribunal, independentemente da questão da constitucionalidade já  decidida no acórdão junto do TC, o que está errado é a aplicação da norma feita pela AT, ao tributar individualmente valores patrimoniais inferiores a € 1 000 000,00, situação contrária à previsão da norma.

 

V – DISPOSITIVO

 

 

Face ao exposto o tribunal decide o seguinte:

 

a)      Declarar procedente o pedido de pronúncia arbitral com a consequente anulação dos atos de liquidação do IS aqui impugnados respeitantes ano de 2014 no montante global de € 23 096,40

b)      Fixar o valor do processo em € 23 096,40, considerando as disposições contidas no artigos 299º nº1 do CPC[13],97-A do CPPT[14] e artigo 3º nº 2 do RCPAT[15].

c)      Custa a cargo da requerida, ao abrigo do nº 4 do artigo 22º do RJAT, fixando o seu montante em € 1 224,00 de harmonia com a tabela I do RCPAT.

 

 

 

 

Notifique.

 

 

 Lisboa, 15 de Dezembro de 2015

 

 

Texto elaborado por computador, nos termos do artigo 131º nº 5 do CPC, aplicável por remissão do artigo 29º nº 1, alínea e) do RJAT, com versos em branco e por mim revisto.

 

 

 

O árbitro singular,

 

Arlindo José Francisco

 

 



[1] Acrónimo de Contribuinte Fiscal

[2] Acrónimo de Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária

[3] Acrónimo de Autoridade Tributária e Aduaneira

[4] Acrónimo de Imposto do Selo

[5] Acrónimo de Centro de Arbitragem Administrativa

[6] Acrónimo de Tabela Geral do Imposto do Selo

[7] Acrónimo de Valor Patrimonial Tributário

[8] Acrónimo de Constituição da República Portuguesa

[9] Acrónimo de Código de Imposto Municipal sobre Imóveis

[10] Acrónimo de Código do Imposto do Selo

[11] Acrónimo de Imposto Municipal sobre Imóveis

[12]  Acrónimo de Tribunal Constitucional

[13] Acrónimo de Código de Processo Civil

[14] Acrónimo de Código de Procedimento e de Processo Tributário

[15] Acrónimo de Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária