Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 478/2015-T
Data da decisão: 2015-12-19  Selo  
Valor do pedido: € 13.845,90
Tema: IS - Indemnização por garantia
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Decisão Arbitral

 

I.              RELATÓRIO

 

A…, S.A., NIPC…, com sede na Av…, n.º … –…, em Lisboa (doravante apenas designados por Requerente), apresentou, em 24-07-2015, um pedido de constituição do tribunal arbitral singular, nos termos dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por RJAT), em conjugação com a alínea a) do art. 99.º do CPPT, em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada apenas por Requerida).

O Requerente pede a declaração de ilegalidade dos actos de liquidação de Imposto do Selo (“IS”) da verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo (“TGIS”), devido por referência ao prédio urbano inscrito sob o artigo … na matriz urbana da freguesia do…, concelho de Lisboa, no montante total de € 13.845,90. A final, a Requerente pede, também, a condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira ao pagamento de indemnização por prestação de garantia indevida, nos termos do art. 53.º da Lei Geral Tributária (“LGT”).

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD em 27-07-2015 e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira nessa mesma data.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico designou como árbitro do tribunal arbitral singular a ora signatária, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 21-09-2015 foram as Partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o tribunal arbitral singular foi constituído em 07-10-2015.

Na resposta apresentada a Requerida suscitou a excepção de incompetência material deste tribunal para conhecimento do pedido deduzido.

Notificada para o efeito, a Requerente apresentou resposta escrita à excepção invocada pela Requerida, concluindo pela improcedência da mesma.

Por despacho de 17-11-2015 foi dispensada a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, bem como a apresentação de alegações, orais ou escritas.

 

O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é competente.

As partes gozam de capacidades tributária e judiciária e são legítimas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de nulidades.

 

II.           DO PEDIDO DA REQUERENTE

 

A Requerente alega, sucintamente, a ilegalidade das liquidações que deram origem às guias de cobrança das primeiras e segundas prestações de IS da verba 28.1 da TGIS com referência ao prédio em propriedade vertical sito na Av…, n.º…, da freguesia…, em Lisboa, inscrito na matriz predial urbana da referida freguesia sob o artigo…, porquanto tomaram como pressuposto de incidência o valor patrimonial total do prédio e não os valores individuais de cada uma das partes independentes afectas a habitação. Por remissão expressa da lei, a base de incidência do Imposto do Selo da verba 28.1 da TGIS deveria ser a mesma do Imposto Municipal sobre Imóveis (“IMI”). Nessa medida, estando em causa prédio em propriedade vertical composto por unidades susceptíveis de utilização independente “(…) o valor a considerar para efeitos de aplicação da verba n.º 28 da TGIS sempre terá que ser o que consta na matriz de cada uma das unidades independentes que compõem o prédio e não o valor global deste, resultante do somatório daqueles valores tidos como parcelares” (cfr. art. 33.º da p.i.). Isto mesmo resultaria do facto de em sede de IMI não haver qualquer distinção entre prédios em propriedade horizontal e em propriedade vertical, estando todos sujeitos às mesmas regras de inscrição na matriz, de avaliação e de liquidação.

A Requerente entende, ainda, que as normas que estão na base da liquidação do imposto ora contestado, na interpretação dada pela Requerida, serão inconstitucionais por violação dos princípios da igualdade, proporcionalidade e capacidade contributiva, nos termos dos arts. 13.º, 18.º e 104.º, n.º 3, da CRP.

A Requerente conclui, então, resumidamente que:

a) as liquidações de Imposto do Selo ora impugnadas – trazidas ao conhecimento da Requerente por intermédio das 33 notificações de liquidação do Imposto do Selo supra identificadas em 6.º e 7.º do presente requerimento – são ilegais, por violação da norma de incidência prevista na verba n.º 28 da TGIS, conjugadas com os artigos 2.º, 4.º, 6.º, n.º 1, al. a), 6.º, n.º 2, e 12.º, n.º 3, todos do CIMI (aplicáveis por foram do n.º 2 do artigo 67.º do CIS);

b) a verba n.º 28 da TGIS é inconstitucional, por violação dos princípios da igualdade e capacidade contributiva, ínsitos nos artigos 13.º e 104.º, n.º 3 da CRP;

c) a interpretação da AT no sentido de que as liquidações do Imposto do Selo previsto na verba n.º 28 da respectiva Tabela Geral, relativamente ao ano de 2014, possa ser feita sem atender ao valor patrimonial de cada divisão com utilização independente é também inconstitucional, por ofensa dos princípios da igualdade e capacidade contributiva, ínsitos nos artigos 13.º e 104.º, n.º 3 da CRP;

d) Impõe-se a declaração de ilegalidade da referida norma de incidência e a consequente anulação dos actos de liquidação do Imposto do Selo ora impugnados, em virtude da autoridade do caso julgado da decisão arbitral proferida no processo n.º 480/2014-T desse CAAD.

            A final, a Requerente solicita, também, a condenação da Requerida ao pagamento de indemnização por prestação de garantia indevida, nos termos do art. 53.º da LGT, por considerar que as liquidações de IS ora contestadas resultam de erro imputável à Requerida.

 

III.        DA RESPOSTA DA REQUERIDA

 

Na resposta deduzida, a Requerida invoca, em primeira linha, a excepção da incompetência material deste tribunal por considerar que o pedido deduzido pela Requerente tem por objecto as notas de cobrança das primeiras e segundas prestações do IS da verba 28.1 da TGIS, e não um verdadeiro acto tributário. Nessa medida, ao abrigo das regras de competência dos tribunais arbitrais, fixadas pelos arts. 2.º e 10.º do RJAT, haveria que concluir pela incompetência deste tribunal para apreciar o pedido deduzido pela Requerente.

Sem conceder, a Requerida considera que o pedido da Requerente não merece provimento porquanto nos prédios não sujeitos a propriedade horizontal, as unidades susceptíveis de utilização independente não têm qualquer autonomia; a autonomização para efeitos de inscrição matricial e avaliação não contende com a respectiva natureza jurídico-tributária, determinando a lei que o valor do prédio corresponderá, necessariamente, à soma do valor das diversas unidades independentes. As unidades de utilização independente não podem ser consideradas como “prédios” de acordo com a definição legal pelo que não podem relevar para efeitos de incidência da verba 28.1 da TGIS. Para efeitos desta norma, haverá pois que ter em conta o valor patrimonial do prédio em propriedade vertical que corresponderá, nos termos da lei, ao somatório dos valores de cada unidade susceptível de utilização independente. Alega, ainda, a Requerida que a interpretação defendida pela Requerente implicará a inconstitucionalidade da verba 28 da TGIS por violação do princípio da legalidade imposto pelo art. 103.º da CRP na medida em que se traduziria na aplicação analógica das regras previstas para os prédios em propriedade horizontal aos prédios em propriedade total sem que, sequer, se considere existir uma verdadeira lacuna na lei (embora a redacção do artigo 41.º da resposta concluir exactamente o oposto, este tribunal considera ter sido um mero lapso de escrita, tendo em conta tudo o que vem alegado na resposta apresentada).

Pugnando pela improcedência do pedido da Requerente, conclui, assim, a Requerida que:

A) A verba 28.1. da Tabela Geral do Imposto de Selo incide sobre os prédios urbanos com afectação habitacional.

B) O valor patrimonial tributário igual ou superior a € 1.000.000,00 de que depende a aplicação dessa norma legal é, como resulta expressamente da sua letra, o valor patrimonial de cada prédio e não das suas partes distintas, ainda que susceptíveis de utilização independente.

C) A unidade do prédio urbano em propriedade vertical composto por vários andares ou divisões não é, no entanto, afectada pelo facto de todos ou parte desses andares ou divisões serem susceptíveis de utilização económica independente.

D) Outra interpretação viola o princípio da legalidade inscrito no art. 103º, nº 2, da C.R.P..

E) Os princípios da igualdade tributária e da capacidade contributiva, proíbem apenas as discriminações arbitrárias ou não justificadas, mas não as discriminações eventualmente justificadas pelo carácter mais evoluído dos institutos ou pela coerência do sistema fiscal.

F) Não representando a Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro, qualquer violação da proibição da irretroactividade fiscal.

G) Assim, o acto tributário em causa não violou, qualquer preceito legal ou constitucional, devendo, assim, ser mantido no ordenamento jurídico.

 

IV.        DA RESPOSTA À EXCEPÇÃO

 

Notificada para se pronunciar sobre a excepção aduzida pela Requerida, a Requerente pugnou pela improcedência da mesma uma vez que o pedido da Requerente se dirige aos actos de liquidação de IS da verba 28.1 da TGIS do ano de 2014 que deram origem às notas de cobrança identificadas nos autos e não às notas de cobrança emitidas, como a Requerida conclui.

Mais refere a Requerente que, uma vez que a AT não notifica os contribuintes dos actos de liquidação de IS, mas apenas dos documentos de cobrança, “(…) as referidas “Notas de Cobrança” foram identificadas e juntas ao Requerimento Inicial apenas com o propósito de identificar todos os elementos factuais subjacentes aos actos de liquidação que – esses sim – constituem o objecto do pedido de pronúncia arbitral e, também, para documentar a única e paupérrima notificação de que a Requerente, enquanto sujeito passivo, havia sido destinatária.”.

A interpretação que a Requerida faz do pedido de pronúncia arbitral resulta de uma interpretação infundada da petição inicial e sustenta-se na decisão arbitral proferida no processo n.º 726/2014-T que nada tem que ver com a questão em apreço nos presentes autos, na medida em que em tal processo se discutia a legalidade dos actos de liquidação referentes às segundas prestações de Imposto do Selo do ano de 2013.

Deverá, por isso, improceder a excepção invocada pela Requerida.

 

V.          MATÉRIA DE FACTO

 

                        A. Factos provados

 

Consideram-se provados os seguintes factos:

1.             A Requerente é uma sociedade comercial que tem por objecto a realização de investimentos imobiliários.

2.             A 31 de Dezembro de 2014, a Requerente era proprietária do prédio urbano sito na Av…., n.º…, em Lisboa, inscrito na matriz predial urbana da freguesia…, sob o artigo…, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o n.º … da freguesia de….

3.             O prédio referido no ponto anterior tem 19 unidades susceptíveis de utilização independente.

4.             Das unidades susceptíveis de utilização independente, 17 são afectas a habitação.

5.             Nenhuma das unidades susceptíveis de utilização independente tem valor patrimonial superior a € 1.000.000,00.

6.             Em Abril e Junho de 2015, a Requerente foi notificada para proceder ao pagamento das primeiras e segundas prestações do IS da verba 28.1 da TGIS, do ano de 2014, num total de € 9.230,60.

7.             Dos documentos de cobrança emitidos resulta que as liquidações do imposto foram efectuadas a 20 de Março de 2015, tendo a Requerida apurado os seguintes valores de colecta:

a)    U-…-RCD – Valor Patrimonial € 66.820,00 – Colecta: € 668,20;

b)   U-…-RCE – Valor Patrimonial € 66.820,00 – Colecta: € 668,20;

c)    U-…-1D – Valor Patrimonial € 68.770,00 – Colecta: € 687,70;

d)   U-…-1E – Valor Patrimonial € 68.770,00 – Colecta: € 687,70;

e)    U-…-2D – Valor Patrimonial € 68.770,00 – Colecta: € 687,70;

f)    U-…-2E – Valor Patrimonial € 68.770,00 – Colecta: € 687,70;

g)   U-…-3D – Valor Patrimonial € 69.460,00 – Colecta: € 694,60;

h)   U-…-3E – Valor Patrimonial € 69.460,00 – Colecta: € 694,60;

i)     U-…-4D – Valor Patrimonial € 69.460,00 – Colecta: € 694,60;

j)     U-…-4E – Valor Patrimonial € 69.460,00 – Colecta: € 694,60;

k)   U-…-5D – Valor Patrimonial € 112.190,00 – Colecta: € 1.121,90;

l)     U-…-5E – Valor Patrimonial € 112.190,00 – Colecta: € 1.121,90;

m) U-…-6D – Valor Patrimonial € 112.190,00 – Colecta: € 1.121,90;

n)   U-…-6E – Valor Patrimonial € 112.190,00 – Colecta: € 1.121,90;

o)   U-…-7D – Valor Patrimonial € 99.920,00 – Colecta: € 999,20;

p)   U-…-7E – Valor Patrimonial € 99.920,00 – Colecta: € 999,20;

q)   U-…-8E – Valor Patrimonial € 49.430,00 – Colecta: € 494,30.

8.             O total do Imposto do Selo do ano de 2014 liquidado com referência ao prédio identificado no ponto 2. supra ascende, assim, a um total de € 13.845,90.

 

B. Factos não provados

 

Não se provaram outros factos com relevância para a decisão arbitral, nomeadamente a prestação de qualquer processo executivo e a prestação de garantia bancária ou similar com vista à sua suspensão.

 

C. Fundamentação da matéria de facto

 

A matéria de facto dada como provada assenta na prova documental apresentada e não contestada.

 

VI.         MATÉRIA DE DIREITO

 

A. Da incompetência material do tribunal arbitral

 

Para uma adequada apreciação da excepção invocada, cumpre, antes de mais, determinar e delimitar em concreto o objecto do pedido de pronúncia arbitral.

Assim, nos termos do pedido apresentado, conclui-se que a Requerente pretende a anulação dos actos de liquidação de IS da verba 28 da TGIS que originaram os documentos de pagamento identificados.

Isso mesmo resulta do texto da petição inicial apresentada em que, resumidamente, a Requerente declara que pretende que seja “(…) declarada a ilegalidade e inconstitucionalidade da referida norma de incidência e providenciada a consequente anulação dos actos tributários de liquidação do Imposto do Selo sobre a propriedade do imóvel supra referido, referente ao ano de 2014, no valor global de € 13.845,90 (treze mil oitocentos e quarenta e cinco euros e noventa cêntimos), com a consequente anulação dos respectivos documentos de cobrança/guias de pagamento referentes às primeiras e segundas prestações, já emitidos, bem como os referentes às terceiras prestações, caso venham a ser emitidos” (cfr. artigo 64.º da p.i.).

Resulta, também, de forma inequívoca do pedido final deduzido em que a Requerente declara expressamente pretender “(...) pronúncia sobre a ilegalidade dos actos de liquidação do Imposto do Selo objecto da presente impugnação e sua consequente anulação, com todas as legais consequências”.

Contrariamente ao que a Requerida parece concluir, a Requerente não solicitou a anulação das notas de cobrança identificadas nos autos – embora essa anulação seja uma consequência da procedência da declaração de ilegalidade dos actos de liquidação impugnados – mas sim a anulação das liquidações de imposto que estão na sua origem. Tanto quanto este tribunal pode concluir do pedido da Requerente, o que está em causa é a ilegalidade da liquidação subjacente às notas de cobrança das prestações de IS identificadas e não a ilegalidade dos documentos de cobrança propriamente ditos.

No entender deste tribunal, a interpretação que a Requerida faz do pedido deduzido pela Requerente não tem qualquer sustentação – sequer literal – nas peças processuais produzidas, pelo que não poderá proceder.

O objecto da presente acção é, pois, no entender deste tribunal, o conjunto dos actos de liquidação que estiveram na origem das notas de cobrança juntas aos autos. E como actos de liquidação que são, podem ser objecto de impugnação judicial ao abrigo da alínea a) do n.º 2 do art. 95.º da LGT e alínea a) do n.º 1 do art. 97.º do CPPT, ou de pedido de pronúncia arbitral ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do art. 2.º do RJAT, com vista à apreciação da sua legalidade.

Face ao exposto, por considerar que o objecto do presente pedido de pronúncia arbitral são efectivos actos de liquidação, conclui-se pela improcedência da excepção de incompetência suscitada pela Requerida.

           

B. Da ilegalidade das liquidações de Imposto do Selo

 

A questão essencial a decidir no presente litígio prende-se com a determinação da base de incidência de Imposto do Selo, verba 28.1 da TGIS, quando esteja em causa um prédio não constituído em propriedade horizontal e cujas unidades susceptíveis de utilização independente se destinem a habitação.

Em concreto, cumpre decidir se o valor patrimonial relevante como critério de incidência de imposto corresponderá (i) ao somatório do valor de cada das unidades susceptíveis de utilização independente, como pretende a Requerida, ou (ii) ao valor patrimonial individual de cada uma dessas unidades susceptíveis de utilização independente, consideradas autonomamente e por si só, como defende a Requerente.

            A dúvida resulta da interpretação das verbas 28 e 28.1 da TGIS, cuja redacção em vigor a 31 de Dezembro de 2014 era a seguinte:

28. Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1.000.000 - sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:

28.1 Por prédio habitacional ou por terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI – 1%

O legislador não cuidou em fixar o conceito legal de “prédio habitacional”, tendo previsto expressamente que a todas as matérias não reguladas no Código do Imposto do Selo com referência à dita verba 28. da TGIS seriam aplicáveis subsidiariamente as disposições do CIMI (Cfr. n.º 2 do art. 67.º do Código do Imposto do Selo). Cumpre, então, procurar no CIMI tal conceito para, daí, se poder concluir pela base de incidência da verba 28.1 da TGIS.

A definição legal de “prédio” consta do art. 2.º do CIMI, esclarecendo-se no n.º 4 que “Para efeitos deste imposto, cada fracção autónoma, no regime de propriedade horizontal, é havida como constituindo um prédio”.

            Da leitura deste artigo, e em especial, do mencionado n.º 4, seriamos levados a concluir que, para efeitos de IMI, uma fracção autónoma de prédio em propriedade horizontal assume a natureza de “prédio” ao passo que uma unidade susceptível de utilização independente de um prédio em propriedade vertical ou total não assumirá tal natureza, não tendo autonomia jurídico-tributária.

            Em resultado desta diferença de enquadramento, seria defensável que, para efeitos da verba 28.1 da TGIS, cada fracção autónoma deveria ser considerada como um “prédio” pelo que só haveria lugar ao pagamento de tal imposto se, destinando-se a habitação, a mesma tivesse um valor patrimonial tributário superior ao indicado. No caso de prédio em propriedade total, o valor patrimonial a considerar para efeitos de determinação da incidência resultaria do somatório dos valores patrimoniais de cada unidade independente afecta a habitação – cfr. alínea b) do n.º 2 do art. 7.º do CIMI. Esta é a posição da Requerida.

Sucede, contudo, que numa análise comparativa do regime de IMI aplicável às fracções autónomas de prédio em propriedade horizontal e às unidades susceptíveis de utilização independente de prédio em propriedade vertical se conclui não haver qualquer diferença. Com efeito, não obstante a natureza jurídico-formal ser distinta, o regime tributário destas figuras é exactamente o mesmo. Materialmente, a lei não estabelece qualquer diferença, senão vejamos:

(i) os prédios em propriedade horizontal e em propriedade total estão sujeitos às mesmas regras de inscrição na matriz, prevendo-se expressamente no n.º 3 do art. 12.º do CIMI que as partes susceptíveis de utilização independente são consideradas separadamente na inscrição matricial que discriminará o respectivo valor patrimonial;

(ii) os prédios em propriedade horizontal e em propriedade total estão sujeitos às mesmas regras e procedimentos de avaliação, determinando-se expressamente na alínea b) do n.º 2 do art. 7.º do CIMI que, caso as partes que compõem o prédio em propriedade total sejam economicamente independentes, cada parte é avaliada por aplicação das correspondentes regras.

Esta identidade de regime vai ainda mais longe, tendo repercussões relevantes ao nível da própria liquidação do imposto porquanto o legislador determinou que a liquidação do IMI deverá ser feita com discriminação dos prédios, suas partes susceptíveis de utilização independente e respectivo valor patrimonial tributário – cfr. n.º 1 do art. 119.º do CIMI. É, pois, o legislador a determinar que a liquidação de imposto deve ser feita individualizadamente, considerando cada realidade económica (unidades susceptíveis de utilização independente) e não cada realidade jurídica (prédio ou fracção autónoma de prédio em propriedade horizontal).

Daqui se conclui que, para efeitos de IMI, as fracções autónomas de prédio em propriedade horizontal e as partes susceptíveis de utilização independente que compõem um prédio em propriedade total têm exactamente o mesmo tratamento tributário. Mas mais relevante que isso: para efeitos de IMI, a base de incidência do imposto é determinada exactamente da mesma maneira, correspondendo ao valor próprio e individual de cada fracção autónoma ou parte independente, fixado em sede de avaliação e constante da matriz; a liquidação é feita de forma individualizada e autónoma em função de cada uma das partes independentes o prédio, sejam ou não fracções autónomas.

No caso de prédios em propriedade total, o IMI não é liquidado em função do valor patrimonial total do prédio, mas em função do valor patrimonial individual de cada unidade autónoma que o compõe; a colecta total devida corresponde ao somatório das colectas individuais por cada unidade autónoma, determinadas em função dos respectivos valores patrimoniais individuais. Tudo se processa exactamente nos mesmos moldes que os aplicados para as fracções autónomas de prédio em propriedade horizontal.

Acresce que, nos termos da verba 28.1 da TGIS, só estão sujeitos a tributação os “prédios habitacionais”. Ora, nos prédios compostos por unidades independentes com destinos e utilizações diferentes - como se verifica nos presentes autos, (comércio e habitação, como resulta do doc. n.º 2 da p.i.) - a determinação da afectação só pode ser efectuada em função de cada um dessas unidades e não em função do prédio enquanto um todo. Isso mesmo resulta da alínea b) do n.º 2 do art. 7.º do CIMI. Sobre este aspecto, cumpre referir J. Silvério Mateus e L. Corvelo de Freitas, Os Impostos sobre o Património Imobiliário – O Imposto do Selo, Anotados e Comentados, Engifisco, 1.ª Edição, 2005, pág. 121, nota 5, que entendem que “As regras previstas neste n.º 2, relativas à determinação do valor patrimonial dos prédios urbanos com mais do que uma afectação, têm a ver com a diversidade de alguns dos elementos de avaliação previstos nos artigos 38.º e seguintes do CIMI, nomeadamente (….). Por outro lado, este preceito está em consonância com o princípio da autonomização das partes independentes de um prédio urbano, mesmo que não esteja constituído em propriedade horizontal, previsto no n.º 3 do artigo 12.º”. (negrito nosso)

Numa situação como esta, como é que se concluiria que o prédio seria habitacional, havendo partes do mesmo afectos a outros fins?

Na verdade, de acordo com as regras de avaliação previstas no CIMI, o que tem afectação não é o prédio enquanto edifício no seu todo mas as unidades autónomas que o compõem, sejam elas fracções autónomas ou não. É com base na utilização efectiva e material que se determina a afectação de cada unidade independente ou fracção autónoma, não prevendo a lei uma afectação específica para o prédio, enquanto edifício. Cada unidade independente – seja ou não fracção autónoma – tem, pois, a sua afectação própria que não “contamina” a afectação do prédio no seu todo.

Assim sendo, não se pode defender que “prédio habitacional” corresponda ao conceito estrito e próprio do art. 2.º do CIMI (abrangendo apenas, para o efeito que pretendemos, edifícios e fracções autónomas de prédios em propriedade horizontal) porquanto, como demonstrado, não teria aplicabilidade prática concreta (como referido, um prédio em propriedade vertical pode ter mais do que uma afectação ou destino). Em nosso entender, ao utilizar esta expressão o legislador quis referir-se ao prédio enquanto realidade susceptível de afectação, logo às partes independentes que compõem cada prédio, tenham ou não a natureza jurídica de fracções autónomas.

Conclui-se, pois, que, para efeitos de aplicação da verba 28.1 da TGIS, as unidades susceptíveis de utilização independente que integram um prédio em regime de propriedade total e fracções autónomas são, em substância, realidades idênticas e que, por isso, estão sujeitas ao mesmo regime de incidência.

Nessa medida, a parte final da verba 28. da TGIS, ao determinar que o imposto incidirá “(…) sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:” remete expressamente para o valor individual de cada parte independente que compõe o prédio em propriedade total e não para o valor total do prédio (correspondente à soma dos valores patrimoniais individuais), uma vez que é este valor individual que é considerado em IMI, para todos os efeitos.

Acresce que, nos termos do já referido n.º 7 do art. 23.º do Código do Imposto do Selo, a liquidação do imposto devido nos termos da verba 28 da TGIS é liquidado, anualmente, de acordo com as regras previstas no CIMI. E foram exactamente estas regras que levaram a que a Requerida liquidasse o imposto individualmente por cada unidade autónoma e considerando o respectivo valor patrimonial individual. Daí terem sido emitidas diversas notas de cobrança.

A proceder aqui o entendimento da Requerida, haveria apenas uma liquidação de Imposto do Selo por prédio e não tantas liquidações quantas as unidades susceptíveis de utilização independente.

Por fim, cumpre referir que esta matéria tem sido objecto de diversas decisões do CAAD, todas neste mesmo sentido, transcrevendo-se aqui, a título de exemplo, a decisão arbitral proferida no proc. 50/2013-T, na parte que aderimos:

Ora, sendo assim, considerando que a inscrição na matriz de imóveis em propriedade vertical, constituídos por diferentes partes, andares ou divisões com utilização independente, nos termos do CIMI, obedece às mesmas regras de inscrição dos imóveis constituídos em propriedade horizontal, sendo o respectivo IMI, bem como o novo IS, liquidados individualmente em relação a cada uma das partes, não oferece qualquer dúvida que o critério legal para definir a incidência do novo imposto tem de ser o mesmo.

Aliás, a AT admite que este é o critério, razão pela qual a própria liquidação emitida é muito clara nos seus elementos essenciais, donde resulta o valor de incidência ser o correspondente ao VPT do 2º andar e a liquidação individualizada sobre a parte do prédio correspondente a esse mesmo andar.

Logo, se o critério legal impõe a emissão de liquidações individualizadas para as partes autónomas dos prédios em propriedade vertical, nos mesmos moldes em que o estabelece para os prédios em propriedade horizontal, claramente estabeleceu o critério, que tem de ser único e inequívoco, para a definição da regra de incidência do novo imposto.

Assim, só haveria lugar a incidência do novo imposto de selo se alguma das partes, andares ou divisões com utilização independente apresentasse um VPT superior a € 1.000.000,00.

Não pode, assim, a AT considerar como valor de referência para a incidência do novo imposto o valor total do prédio, quando o próprio legislador estabeleceu regra diferente em sede de CIMI, e este é o código aplicável às matérias não reguladas no que toca à verba 28 da TGIS.

O critério pretendido pela AT, de considerar o valor do somatório dos VPT atribuídos às partes, andares ou divisões com utilização independente, com o argumento do prédio não se encontrar constituído em regime de propriedade horizontal, não encontra sustentação legal e é contrário ao critério que resulta aplicável em sede de CIMI e, por remissão, em sede de IS.

Ao que acresce o facto da própria lei estabelecer expressamente, na parte final da verba 28 da TGIS, que o IS a incidir sobre os prédios urbanos de valor igual ou superior a €1.000.000,00 – “sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI.”

Assim, a adoção do critério defendido pela AT viola os princípios da legalidade e da igualdade fiscal, bem assim como, o da prevalência da verdade material sobre a realidade jurídico-formal.”

No mesmo sentido, refira-se a decisão proferida no proc. 132/2013-T, de que transcrevemos a parte que subscrevemos integralmente:

Com efeito, não faz sentido distinguir na lei aquilo que a própria lei não distingue (ubi lex non distinguit nec nos distinguere debemus). Acresce que distinguir, neste contexto, entre prédios constituídos em propriedade horizontal e em propriedade total seria uma "inovação" sem um suporte legal associado, até porque, como se tem aqui afirmado, nada denúncia, nem na verba n.º 28, nem no disposto no CIMI, uma justificação para essa particular diferenciação. Note-se, exemplarmente, o que diz o art. 12.º, n.º 3, do CIMI: "cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina também o respectivo valor patrimonial tributário."

O critério uniforme que se impõe é, assim, o que determina que a incidência da norma em causa apenas tenha lugar quando alguma das partes, andares ou divisões com utilização independente de prédio em propriedade horizontal ou total com afectação habitacional, possua um VPT superior a €1.000.000,00. Fixar como valor de referência para a incidência do novo imposto o VPT global do prédio em causa, como pretendia a ora requerida, não encontra base na legislação aplicável, que é o CIMI, dada a remissão feita pelo citado art. 67.º, n.º 2, do CIS.

Por último, como já se lembrou em diversas Decisões Arbitrais (vd. DA n.º 48/2013-T e DA n.º 50/2013-T), não se vislumbra, nos trabalhos relativos à discussão da proposta de lei n.º 96/XII na Assembleia da República, a invocação de um ratio interpretativa distinta da aqui apresentada. Com efeito, justificou-se tal medida, apelidada de "taxa especial sobre os prédios urbanos habitacionais de mais elevado valor", com a necessidade de cumprir com os princípios da equidade social e da justiça fiscal, onerando mais significativamente os titulares de propriedades com elevado valor destinadas a habitação, e, nessa medida, fazendo incidir a nova "taxa especial" sobre as "casas de valor igual ou superior a 1 milhão de euros."

Ora, se tal lógica parece fazer sentido quando aplicada a «habitação» - seja ela «casa», «fracção autónoma» ou «parte de prédio com utilização independente» / «unidade autónoma» -, porque se supõe uma capacidade contributiva acima da média e, nessa medida, se justifica a necessidade de realização de um esforço contributivo adicional, pouco sentido faria passar a desconsiderar os apuramentos "unidade a unidade" quando só através do somatório dos VPTs das mesmas (porque detidas pelo mesmo indivíduo) é que se superaria o milhão de euros.

Acresce, ainda, que admitir a diferenciação de tratamento poderia produzir resultados incompreensíveis do ponto de vista jurídico e atentatórios dos objectivos que o legislador dizia ter para aditar a verba n.º 28. A título exemplificativo, suponha-se a seguinte hipótese, que parece plausível à luz da interpretação que foi feita pela ora requerida: um cidadão que é proprietário de um prédio constituído em propriedade total destinado a habitação, sendo o valor global das unidades autónomas igual ou superior a €1.000.000,00 e o VPT de cada uma inferior a €1.000.000,00, sujeita-se a uma tributação anual de 1% desse valor (como sucedeu na situação em análise); já um outro cidadão que detenha um prédio com as mesmas exactas características do anterior mas que tenha sido constituído em propriedade horizontal, sendo, igualmente, o valor global das fracções autónomas igual ou superior a €1.000.000,00 e o VPT de cada uma inferior a €1.000.000,00, não será sujeito a tributação nos termos da mencionada verba n.º 28.

Por outro lado, poder-se-ia perguntar: se tais fracções têm o mesmo proprietário, por que é que não faz sentido agregar, para efeitos de tributação, os respectivos VPTs? A resposta pode ser ilustrada através de uma outra hipótese: um cidadão que é proprietário de um prédio em propriedade horizontal, em que cada uma das suas 20 fracções possui um VPT inferior a €1.000.000,00, seria sujeito a tributação se – caso se admitisse tal agregação – o VPT global ultrapassasse aquele valor; já um outro cidadão com idênticas 20 fracções distribuídas por 5, 10 ou 20 prédios não estaria sujeito a qualquer tributação nos termos da referida verba n.º 28.

Se esta linha de raciocínio faz sentido – justificando-se, portanto, a não agregação dos VPTs das fracções de prédios em propriedade horizontal –, não se vê razão plausível para que a mesma não seja aplicada às unidades autónomas de prédios em propriedade total.

Observando, agora, o caso em análise, constata-se que os VPTs dos andares (unidades autónomas) do prédio com afectação habitacional variam entre €104.140,00 e €113.780,00, pelo que qualquer um deles é inferior a €1.000.000,00. Daqui se conclui, em resultado do que foi referido, que sobre os mesmos não pode incidir o imposto do selo a que se refere a verba n.º 28 da TGIS, sendo, portanto, ilegais os actos de liquidação impugnados pelo requerente.

Mais recentemente, o Supremo Tribunal Administrativo, chamado a pronunciar-se sobre o tema, veio confirmar o que vinha sendo o entendimento dos árbitros do Centro de Arbitragem Tributária, através do acórdão de 09-09-2015, proferido no proc. n.º 047/15 (disponível em www.dgsi.pt), em que conclui que: “I. Relativamente aos prédios em propriedade vertical, para efeitos de incidência do Imposto do Selo (Verba 28.1 da TGIS, na redacção da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro), a sujeição é determinada pela conjugação de dois factores: a afectação habitacional e o VPT constante da matriz igual ou superior a € 1.000.000. II. Tratando-se de um prédio constituído em propriedade vertical, a incidência do IS deve ser determinada, não pelo VPT resultante do somatório do VPT de todas as divisões ou andares susceptíveis de utilização independente (individualizadas no artigo matricial), mas pelo VPT atribuído a cada um desses andares ou divisões destinadas a habitação.

Face a tudo o que vem exposto, conclui este tribunal que a interpretação da lei ora proposta é conforme à Constituição na medida em que assegura a igualdade de tratamento fiscal entre realidades idênticas, dando prevalência à substância sobre a forma – um imperativo interpretativo imposto pelo n.º 3 do art. 11.º da LGT, sem necessidade de qualquer aplicação analógica.

Na verdade, tratando-se de um imposto sobre o património, a capacidade contributiva de cada sujeito passivo deverá ser aferida em função do valor do respectivo património imobiliário destinado a habitação, independentemente do seu regime jurídico. Admitir como válida a interpretação da Requerida levaria a situações em que para um mesmo valor total de património imobiliário, por exemplo, € 1.200.000,00 composto por 6 apartamentos de € 200.000,00, haveria lugar a imposto ou não consoante o prédio estivesse ou não em regime da propriedade vertical. Nesta hipótese, em que difere a capacidade contributiva de um sujeito passivo que tem 6 apartamentos de € 200.000,00 cada num prédio não sujeito a propriedade horizontal, da de um sujeito passivo que tem 6 apartamentos de € 200.000,00 cada num prédio em propriedade horizontal. Globalmente, o património não vale exactamente o mesmo?

Como refere José Casalta Nabais, O Dever Fundamental de Pagar Impostos, 2004, Almedina, pág. 436, o princípio constitucional da igualdade obriga o legislador a “(…) não fazer discriminações ou igualizações arbitrárias ou carecidas de justificação ou fundamento material ou racional, a não fazer discriminações assentes em critérios subjectivos ou em critérios objectivos, mas aplicados em termo subjectivos e a respeitar os direitos subjectivos de igualdade (ou seja, a tratar igualmente o que é constitucionalmente igual e desigualmente o que é constitucionalmente desigual)”. Continua, ainda, este A. (cfr. pág. 442) defendendo que “(…) podemos dizer que o princípio da igualdade fiscal exige que o que é (essencialmente) igual, seja tributado igualmente, e o que é (essencialmente) desigual, seja tributado desigualmente na medida dessa desigualdade. Mas a comparação do que é igual ou desigual implica um critério ou um termo de comparação (tertium comparationis). E este é identificado com a ideia de capacidade contributiva.”.

Assim sendo, não se admite que a mera organização jurídico-formal do património imobiliário – constituído ou não em propriedade horizontal – possa ser justificação constitucionalmente válida para tratamento diferenciado de contribuintes.

Face ao exposto, dúvidas não restam de que a interpretação defendida pela Requerente e aqui acolhida por este tribunal é a que assegura a conformidade constitucional das verbas 28 e 28.1 da TGIS, face aos art. 13.º e n.º 3 do art. 103.º da CRP, na medida em que permite “tratar igualmente o que é constitucionalmente igual e desigualmente o que é constitucionalmente desigual”, como referido pelo A. supra identificado.

Improcede, por isso, o pedido da Requerida no sentido de prolação de um juízo de inconstitucionalidade das referidas normas legais, por violação dos princípios constitucionais da igualdade e legalidade.

Face a tudo o que vem exposto supra, o tribunal conclui que para efeitos de aplicação da verba 28 da TGIS aos prédios em propriedade total aplicam-se as mesmas regras do CIMI que aos prédios em propriedade horizontal, pelo que o valor patrimonial tributário a considerar para efeitos de incidência será o valor individual próprio de cada unidade susceptível de utilização independente.

A substância material é a que se impõe como critério determinante da capacidade contributiva e não a mera realidade jurídico-formal do prédio pelo que, materialmente, o regime tributário aplicável a prédios em propriedade total é exactamente o mesmo que o aplicado aos prédios em regime de propriedade horizontal.

Nenhuma das unidades independentes que compõem o prédio identificado e propriedade da Requerente apresenta valor superior a € 1.000.000 pelo que não se verifica o pressuposto quantitativo mínimo para efeitos de incidência da verba 28.1 da TGIS.

Por tudo isto, este tribunal considera procedente o pedido da Requerente, concluindo que os actos de liquidação de Imposto do Selo devido nos termos da verba 28.1 da TGIS, com referência ao ano de 2014, constantes dos documentos juntos aos autos enfermam do vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto e de direito, o que justifica a sua anulação [artigo 135.º do Código do Procedimento Administrativo, aplicável por força do disposto no artigo 2.º, alínea c), da LGT].

Mais se considera improcedente a alegação da inconstitucionalidade da verba 28.1 da TGIS, por violação dos princípios da igualdade e da legalidade previstos nos arts. 13.º e n.º 3 do art. 103.º da CRP, respectivamente, efectuada por parte da Requerida, nos termos supra descritos.

 

C. Do pedido de indemnização por garantia indevida

 

A Requerente formula, a final, o pedido de condenação da Requerida ao pagamento de indemnização pelos custos incorridos com a prestação de garantia, nos termos do art. 53.º da LGT, por considerar que houve erro imputável aos serviços. 

Sucede que, resulta do elenco dos factos provados, que não se provou que tivesse sido instaurada execução fiscal para cobrança do imposto liquidado, nem que a Requerente tivesse prestado qualquer garantia. 

Assim, não tendo sido alegado e provado que foi prestada garantia, tem de ser julgado improcedente o pedido de reconhecimento do direito a indemnização, sem prejuízo de esse direito poder vir a ser reconhecido inclusivamente em execução de julgado, caso tal prestação ocorra.

 

 

VI.         DECISÃO

 

De harmonia com o exposto, este Tribunal Arbitral decide:

A) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral, quanto ao pedido de anulação das liquidações de Imposto do Selo com referência ao ano de 2014 impugnadas pela Requerente;

B) Anular as referidas liquidações, num total de € 13.845,90;

C) Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral na parte em que é pedida a indemnização por garantia, absolvendo a Autoridade Tributária e Aduaneira do pedido nesta parte.

 

Valor do processo: De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária corrige-se o valor do processo para € 13.845,90, correspondente ao total dos actos de liquidação de Imposto do Selo do ano de 2014 com referência ao prédio identificado nos autos.

 

Custas: Nos termos do n.º 4 do art. 22.º do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 918,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

Registe-se e notifique-se esta decisão arbitral às partes.

 

Lisboa, 19-12-2015

 

O Árbitro Singular

 

 

(Maria Forte Vaz)