Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 294/2015-T
Data da decisão: 2016-01-21  IRS  
Valor do pedido: € 10.400,29
Tema: IRS – Impugnação das liquidações adicionais de IRS de 2010 a 2013, no total de € 10.400,29, incluindo juros compensatórios, resultantes de correções nas deduções aos rendimentos prediais da categoria F
Versão em PDF

Decisão Arbitral

 

A..., com o NIF ... e B..., com o NIF..., residentes em..., ..., MC ..., Mónaco, representados fiscalmente em Portugal pela Sociedade C..., Lda., com NIPC ..., com sede na Rua ..., … ..., ... ...-... Albufeira, tendo sido notificados de liquidações adicionais de IRS respeitantes aos anos de 2010 a 2013, no montante total a pagar de € 10.400,29, incluindo juros compensatórios (conf. liquidações que constituem o doc. 1), vêm, nos termos e para efeitos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º e n.ºs 15.º e seguintes, todos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (“Regime Jurídico da Arbitragem Tributária”) deduzir IMPUGNAÇÃO ARBITRAL contra aquele atos de liquidação de IRS.

__

 

As liquidações adicionais de IRS impugnadas, respeitantes aos anos de 2010 a 2013 e respetivos juros compensatórios, nos montantes, respetivamente de € 3.155,65, € 3.038,50, € 2.925,39 e € 1.280,75, no total de € 10.400,29, foram notificada aos Requerentes em 05/01/2015, relativamente à liquidação adicional de 2010, e em 08/01/2015, relativamente às restantes liquidações, cujas datas limite de pagamento foram respetivamente as seguintes: 2010 – 04/02/2015, 2011 – 11/02/2015, 2012 – 11/02/2015 e 2013 – 11/02/2015.

A Requerente apresentou o seu Recurso Arbitral em 05/05/2015, aceite pelo CAAD em 07/05/2015, pelo que é tempestivo, face ao disposto no artigo 10.º, n.º 1, al. a) do RJAT. 

É Requerida a (AT) - Autoridade Tributária e Aduaneira.

Os Requerentes optaram por não designar árbitro, tendo o CAAD procedido à designação do Dr. José Rodrigo de Castro.

O tribunal arbitral ficou constituído em 22/07/2015.

As partes são legítimas e encontram-se devidamente representadas, o processo é próprio e não existem nulidades ou exceções de que cumpra conhecer previamente.

A AT apresentou, oportunamente, a sua Resposta.

Foi dispensada a realização da Reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT e não houve alegações. 

 

I – Relatório

 

Os Requerentes são proprietários do Conjunto Turístico D..., usualmente designado por E..., a que corresponde o prédio urbano inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ... e ... sob o n.º... .

 

Os Requerentes, não residentes, transferiram, por contrato de Exploração Turística, de 01/01/2006, para a F..., S.A., com o NIPC ..., a exploração turística do empreendimento, por um período de 3 anos, sucessiva e automaticamente renovado, salvo denúncia do mesmo, de que se realçam os seguintes aspetos mais relevantes:

 

- direito exclusivo de exploração turística da referida E..., através de arrendamentos turísticos de curta duração;

 

- Os Requerentes têm o direito de ocupar e ou permitir que outra pessoa por eles indicada, ocupem a propriedade, mediante pagamento da taxa aplicável à respetiva ocupação, consoante o período em que ocorrer - alta, média ou baixa - mediante notificação da entidade contraente exploradora com a antecedência de 8 meses, sob pena de poder não ser considerada a reserva;

 

- A F... contraente exploradora, pagará anualmente aos Requerentes, para licença de exploração turística da propriedade, um montante equivalente a 75% da receita total, líquida de IVA, sendo os restantes 25% destinados à F..., a título de taxa de administração; 

 

- Os proprietários Requerentes serão responsáveis pelo pagamento das despesas de condomínio, devido numa base anual, bem como pelas despesas normais de manutenção, reparação e conservação, que sejam decorrentes do uso normal ou causadas por qualquer risco que deve ser coberto pelo seguro da propriedade, que deve cobrir riscos de incêndio, explosão, vandalismo, manifestações, agitação, tremores de terra, tempestades, inundações, colisão ou roubo e desde que não sejam causadas pelos funcionários da F...;

 

- São também da responsabilidade dos proprietários Requerentes quaisquer contribuições, taxas e impostos e encargos fiscais ou parafiscais resultantes do contrato de exploração e da propriedade;

 

- Os Requerentes obrigam-se a manter a propriedade e todos os móveis, utensílios e equipamentos em alto padrão de qualidade inerente à classificação turística de um estabelecimento de 5 estrelas.

 

Os Requerentes procederam à entrega das respetivas declarações de rendimentos modelo 3 de IRS, relativamente aos anos de 2010 a 2013, os que estão agora em causa.

 

Nessas declarações foram indicados no Anexo F, relativo aos rendimentos prediais, os seguintes elementos:

 

DESCRIÇÃO

ANO DE 2010

ANO DE 2011

ANO DE 2012

ANO DE 2013

RENDAS (R.ILÍQ.) CAT F

€ 35.915,08

€ 76.779,79

€ 51.024,53

€ 84.583,73

DESPESAS – CATEG. F

€ 28.200,12

€ 37.943,07

€  22.111,87

€ 20.536,85

REND. LÍQUIDO

€ 7.714,96

€ 38.836,72

€ 28.912,36

€ 64.046,88

 

A AT, no âmbito de uma ação inspetiva realizada a coberto das OI2014..., OI2014..., OI2014..., todas de 13/10/2013 e OI2014..., de 17/11/2014, iniciada em 23/09/2014 e concluída em 18/11/2014, realizou diversas correções, que a seguir serão discriminadas.

 

A AT corrigiu os encargos e despesas declaradas para os seguintes valores:

 

DESCRIÇÃO

ANO DE 2010

ANO DE 2011

ANO DE 2012

ANO DE 2013

RENDAS (R.ILÍQ.) CAT F

€ 35.915,08

€ 76.779,79

€ 51.024,53

€ 84.583,73

DESP/ENC. APÓS COR.

€ 9.559,18

€ 19.239,81

€ 5.172,31

€ 15.938,22

REND.COL.CORRIG.DO

€ 26.355,90

€ 57.539,98

€ 45.852,26

€ 68.645,51

 

A AT justifica as correções das despesas e encargos para menos, por duas ordens de razões, a saber:

 

a.       Por não ter havido uma ocupação plena do empreendimento nas 52 semanas do ano, para o que apurou, as seguintes taxas de ocupação anuais:

 

                                                  i.      Ano de 2010 – 79 noites de ocupação/365 dias = 21,6438%

                                                ii.      Ano de 2011 – 153 noites de ocupação/365 dias = 37%,8082%

                                              iii.      Ano de 2012 – 95 noites de ocupação/366 dias = 25,9563%

                                              iv.      Ano de 2013 – 133 noite de ocupação/365 dias = 36,4384%

 

b.      Por não terem sido totalmente consideradas enquadráveis no âmbito do artigo 41.º do CIRS, relativo às deduções da Categoria F do IRS, designadamente algumas das despesas e encargos, com fundamento de que, no conceito da Requerida, "não têm qualquer correlação coma manutenção e conservação da..., necessárias e indispensáveis à obtenção de rendimentos da categoria F em sede IRS", relativos a:

 

- Despesas de gestão relativas ao Contract Propoerty Management, na parte respeitante ao "reenvio do correio, contabilidade do imóvel e preferência de serviços adicionais, etc. - € 39,00 mensais" por dizerem respeito unicamente ao contrato de exploração turística celebrado com a F..., S.A.;

 

- Despesas relativas a "serviços de limpeza, sendo que o s.p. paga mensalmente €157,00 se o imóvel não estiver ocupado por clientes, e € 64,50, por noite, se o imóvel estiver ocupado por clientes";

 

- Despesas relativas a "serviços de manutenção, nomeadamente, relatório anual de manutenção, verificação do estado de conservação de portas, janelas, canalizações, et. - € 120,00 mensais";

 

A AT justifica as correções efetuadas nos seguintes termos:

 

" Analisando os vários tipos de despesas, conclui-se pela não aceitação das despesas relativas a Contract Property Management - Management, Housekeeping and Maid Services (ou Contract Housekeeping), a Cleaning Owners e a Laundry Owners. No que diz respeito às despesas relativas a Contract Property Management - Management a sua não aceitação prende-se com o facto de as despesas de gestão não se enquadrarem nas despesas e encargos dedutíveis a que se refere o artigo 41,º do CIRS. Nas restantes, as mesmas não serão aceites por não se considerar que estão relacionadas com a obtenção do rendimento, sendo despesas referentes a períodos em que o imóvel não está ocupado, no caso de House keeping, ou até particulares dos s.p., no caso de Cleaning e Laundry (Limpeza e Lavandaria referente aos Proprietários)".  

 

Os Requerentes insurgem-se contra as correções das deduções no âmbito da categoria F, que influenciaram o rendimento líquido desta categoria e, em consequência, o rendimento coletável de IRS dos referidos anos de 2010 a 2013 e determinaram atos de liquidações adicionais de IRS para os anos em causa, nos montantes, respetivamente de € 3.155,65, € 3.038,50, € 2.925,39 e € 1.280,75, no total de € 10.400,29, de IRS a pagar, incluindo juros compensatórios, conf. doc. 1.

 

Os Requerentes contestam desde logo a aplicação do "coeficiente de ocupação" para cada um dos anos, porquanto a AT "restringiu a aceitação do valor dos encargos e despesas declarados ao produto deste pelos ditos coeficientes de ocupação que apurou".

 

Por outro lado, esclarecem os Requerentes que o Empreendimento E... "não foi entre 2010 e 2013 objeto de uso privado ou de ocupação própria pelos ora Impugnantes, tendo antes constituído um investimento imobiliário destes que consistiu em detê-lo para obter o maior rendimento possível que o empreendimento turístico dela conseguisse extrair ao longo das 52 semanas em cada ano".

Mais esclarecem os Requerentes que as despesas que foram efetuadas e que suportaram, tais como a pintura periódica do imóvel, o IMI, a água e eletricidade são custos fixos inerentes ao imóvel, quer esteja ocupado, quer desocupado, pelo que não faz qualquer sentido a aplicação de qualquer "coeficiente de ocupação".

 

E os Requerentes citam, a título exemplificativo, a situação dos hotéis, em que a dedutibilidade dos seus gastos operacionais não pode estar condicionada por uma qualquer taxa de ocupação.

 

O mesmo se passa, realçam, a título exemplificativo, os Requerentes, com a manutenção da piscina do empreendimento turístico, que tem de ser feita, independentemente da taxa de ocupação, por uma questão de salubridade relativamente aos que utilizam o E... .

 

Realçam ainda que os encargos e despesas corrigidos são imprescindíveis para conservar a E... em estado de aptidão para prestar serviços de alojamento turístico, por força do contrato celebrado e das exigências legais, mais alegando que aqueles não variam, em regra, em função do uso ou da ocupação efetiva que dela se faça.

 

 

II – Factos provados

 

Com interesse para a boa decisão da causa, mostram-se provados documentalmente os seguintes factos:

 

1. Os Impugnantes são proprietários do prédio urbano inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ... e ...  sob o n.º..., conf. doc. 2, que se encontra inserido no Conjunto Turístico D..., usualmente designado como E... .

 

2.      Os valores resultantes da cessação de exploração turística E..., considerados como rendimentos prediais da categoria F, foram respetivamente os seguintes e não foram postos em causa:

 

a.       Ano de 2010 - € 35.915,08

b.      Ano de 2011 - € 76.779,79

c.       Ano de 2012 - € 51.024,53

d.      Ano de 2013 - € 84.583,73, conf. doc. n.º 5.

 

3.       As despesas e encargos suportados e declarados foram os seguintes:

 

a.       Ano de 2010 - € 28.200,12

b.      Ano de 2011 - € 37.943,07

c.       Ano de 2012 - € 22.111,87

d.      Ano de 2013 - € 20.536,85, conf. doc. 5.

 

4.      Donde, o rendimento líquido da categoria F apurado e declarado pelos Requerentes foi o seguinte:

DESCRIÇÃO

ANO DE 2010

ANO DE 2011

ANO DE 2012

ANO DE 2013

RENDAS (R.ILÍQ.) CAT F

€ 35.915,08

€ 76.779,79

€ 51.024,53

€ 84.583,73

DESPESAS – CATEG. F

€ 28.200,12

€ 37.943,07

€ 22.111,87

€ 20.536,85

REND. LÍQUIDO

€ 7.714,96

€ 38.836,72

€ 28.912,36

€ 64.046,88

 

5.      A AT, no âmbito de uma ação inspetiva já antes referida, realizou diversas correções, com os fundamentos já antes referidas e que totalizam:

 

DESCRIÇÃO

ANO DE 2010

ANO DE 2011

ANO DE 2012

ANO DE 2013

DESPESAS DECL.– CATEG. F

€ 28.200,12

€ 37.943,07

€ 22.111,87

€ 20.536,85

DESP/ENC. APÓS COR.

€ 9.559,18

€ 19.239,81

€ 5.172,31

€ 15.938,22

 VALOR CORREÇÕES

         € 8.640,94

        €18.703,26

       € 16.939,56

        €  4.598,63

   

6.      Uma parte das correções efetuadas respeitam, por um lado, a despesas e encargos efetivamente realizados no edifício em causa, cuja realidade dos documentos que os suportam não foram postos em causa, mas reduzidos em função da taxa de ocupação anual, conf. doc. 5.

 

7.      Outras correções têm a ver com despesas e encargos considerados pela Requerida como não enquadrados no âmbito do artigo 41.º do CIRS - Código do IRS, conforme artigo 3.º das Alegações e das relações das despesas e encargos nele incluídas e nos termos e com os fundamentos já antes referidos.

 

8.      Os Requerentes fizeram prova das despesas e encargos declarados e por si pagos através da empresa contratada, cuja veracidade dos documentos não foi posta em causa.

 

9.      Os encargos e despesas foram imputados aos Requerentes, embora realizados pela F..., S.A., com o NIPC..., para quem foi contratualmente transferido o exclusivo da exploração turística.

 

10.  As correções efetuadas pela AT, com ambos os fundamentos antes referidos, com ressalva das situações respeitantes a algumas correções relativas a valores pagos indevidamente e de que foram emitidas notas de crédito (caso do Seguro) e também por não pertencerem ao imóvel em causa ou não serem indispensáveis para a formação do rendimento, concretizaram-se nos seguintes termos, conforme pormenor das relações de justificação do artigo 11.º da Resposta da Requerida:

 

a.       Ano de 2010 – Declarados € 28.200,12 – Corrigidos para € 9.559,18

b.      Ano de 2011 – Declarados € 37.943,07 – Corrigidos para € 19.239,81

c.       Ano de 2012 – Declarados € 22.112,17 – Corrigidos para € 5.172,31

d.      Ano de 2013 – Declarados € 20.536,85 – Corrigidos para € 15.938,22   

 

11.  De todo o exposto, resultaram os seguintes valores:

 

DESCRIÇÃO

ANO DE 2010

ANO DE 2011

ANO DE 2012

ANO DE 2013

RENDAS (R.ILÍQ.) CAT F

€ 35.915,08

€ 76.779,79

€ 51.024,53

€ 84.583,73

DESPESAS – CATEG. F

€ 9.559,18

€ 19.239,81

€ 5.172,31

€ 15.938,22

REND.COL.CORRIG.DO

€ 26.355,90

€ 57.539,98

€ 45.852,26

€ 68.645,51

REND.COL.ANTERIOR

€ 7.714,96

€ 38.836,72

€ 28.912,36

€ 64.046,88

ACRÉSC.REND.COLET.

€ 18.640,94

€ 18.703,26

€ 16.939,86

€ 4.598,63

 

III – Factos não provados

 

Não foram apresentados nem pelos Requerentes nem pela Requerida os documentos a que se referem os valores declarados e objeto de análise e correção pela Requerida, mas que, face ao Relatório da Inspeção Tributária, foram todos objeto de verificação e análise.

 

Não ficou provada a ocupação de qualquer apartamento pelos proprietários Requerentes ou de pessoas por si recomendadas, durante os anos em causa, apesar de, contratualmente, apenas ser exigível à F... a sua reserva, desde que feita com a devida antecedência, nem sequer ficando dispensados do correspondente pagamento, em função da época da sua utilização.

 

IV – Do Direito aplicável

 

A questão objeto dos presentes autos tem a ver com a aplicação do disposto no artigo 41.º do CIRS, cuja redação é a seguinte, inserido na Secção V – Rendimentos Prediais, relativamente aos anos de 2010 a 2013, com ajustamentos para este último ano:

 

“Artigo 41.º - Deduções

1 – Aos rendimentos brutos referidos no artigo 8.º deduzem-se as despesas de manutenção e de conservação que incumbam ao sujeito passivo, por ele sejam suportadas e se encontrem documentalmente provadas, bem como o imposto sobre imóveis e o imposto do selo que incide sobre o valor dos prédios ou parte dos prédios cujo rendimento seja objeto de tributação no ano fiscal[1].

2 – No caso de fração autónoma de prédio em regime de propriedade horizontal, deduzem-se também os encargos de conservação, fruição e outros que, nos termos da lei civil, o condomínio deva obrigatoriamente suportar, por ele sejam suportados, e se encontrem documentalmente provados.

3 – Na sublocação, a diferença entre a renda recebida pelo sublocador e a renda paga por este não beneficia de qualquer dedução”.

 

O direito aplicável resulta da disposição legal citada, sendo de salientar os pressupostos legais exigíveis no preceito, para consideração das despesas e encargos efetuados, a saber:

 

a) Despesas de manutenção e conservação que incumbam ao sujeito passivo;

b) Despesas efetivamente suportadas e documentalmente provadas;

c) IMI incidente sobre o valor do prédio arrendado, cujo rendimento seja objeto de tributação no ano fiscal, ou seja, pago no ano dos rendimentos a tributar em IRS.

 

Está aqui em causa uma relação de custo indispensável à obtenção do rendimento, quando documental comprovado e efetivamente suportado pelo titular do bem.

 

De referir que este tribunal arbitral efectuou uma pesquisa da jurisprudência dos tribunais superiores e da doutrina administrativa da AT (incluindo informações vinculativas obrigatoriamente publicadas pela AT, nos termos do nº 19 do artigo 68º da LGT), e não localizou qualquer decisão judicial ou administrativa com contornos minimamente semelhantes à questão ora em apreciação, o que parece indiciar que se trata de uma posição inovadora da Inspecção Tributária.

 

De notar que a redacção do nº 1 do artigo 41º do CIRS permanece praticamente inalterada desde a entrada em vigor deste código no final dos anos 80 do século passado, pelo que é ainda mais de estranhar que só agora a Inspecção Tributária adopte uma interpretação tão singular desta norma.

 

Com efeito a regra de dedutibilidade dos custos da categoria F sempre este associada aos custos de manutenção necessários para a obtenção dos rendimentos prediais tributáveis, que o legislador nunca, nem sequer a título exemplificativo, tipificou.

 

A primeira questão a analisar é a de saber se tem qualquer relevância fiscal, para a questão em análise, o facto de os Requerentes terem celebrado um contrato de gestão do Conjunto Turístico em causa, designado por E..., com uma pessoa coletiva residente em território português, mediante remuneração, conforme contrato de exploração que constitui o doc. 3.

 

Ora, sabendo que os proprietários são não residentes, não tinham possibilidade de rentabilizar o empreendimento em causa e de o manter em condições de utilização, sem ser por este usual meio contratual ou outro semelhante, como aliás é regra nas habitações integradas em aldeamentos turísticos, mesmo que detidas por sujeitos passivos residentes.

 

É, pois, à F..., S.A. a quem incumbe, contratualmente, realizar todas as despesas inerentes à manutenção e conservação do imóvel, mantendo-o em condições normais de arrendamento.

Todas estas despesas, designadamente, pequenas reparações, incluindo pinturas, manutenção de utilização da piscina, despesas de condomínio, prémio de seguro, IMI, entre outras, não podem deixar de ser consideradas como enquadradas no âmbito do artigo 41.º do CIRS, desde que devidamente comprovadas e suportadas pelos sujeitos passivos.

 

E a Requerida não pôs em causa a existência de tais despesas e encargos, bem como a exigência do pagamento das mesmas pela empresa contratada.

 

Por outro lado, também o facto de existir um contrato de exploração turística, obviamente oneroso, não pode este encargo deixar de ser considerado uma despesa obrigatória e indispensável à formação do rendimento, pelo que não poderá deixar de ser considerado como abrangido pelo letra e espírito da norma do artigo 41.º do CIRS.

 

Já relativamente aos encargos com despesas de contabilidade, que, aliás, não são contratualmente imputáveis aos Requerentes, mas uma responsabilidade da F..., no âmbito da sua função de exploração do empreendimento, não poderão ser considerados como enquadrados no âmbito do artigo 41.º do CIRS, tanto mais que tratando-se de uma Sociedade Anónima terá obrigatoriamente de organizar a sua contabilidade, para prestação de contas ao seu cliente.

 

Aliás, o pagamento à F... por força das disposição contratuais, de 25% das receitas, não poderá deixar de incluir não só o encargo de zelar pela manutenção em condições de funcionamento do empreendimento turístico, como também a prestação de contas aos contraentes Proprietários.

 

No que respeita às despesas de correio, registos e outros contactos, dando conta aos Proprietários das ocorrências que exigirem contactos por qualquer desses meios, não havendo disposição contratual que as regule, também se reconhece que não poderão enquadrar-se no âmbito das despesas de manutenção previstas no artigo 41.º do CIRS, por se incluírem nas funções e obrigações da F... , como é normal e habitual.

 

No que se refere à redução das despesas e encargos mediante aplicação de um "coeficiente de ocupação", não pode tal procedimento ser aceite, porquanto todas as despesas realizadas, tais como, limpeza das habitações e da piscina e respetivo tratamento de salubridade, água, luz, seguro, IMI e outros, terão sempre que ser suportadas, independentemente da taxa de ocupação.   

 

Tal "coeficiente de ocupação", como se referiu, um fundamento “sui generis” que aparentemente não tinha até agora sido utilizado pela Inspecção, não tem, no entender deste tribunal, qualquer base legal.

 

 

V - Decisão

 

Face ao exposto, o Tribunal decide nos seguintes termos:

 

a) Anular parcialmente as liquidações adicionais impugnadas, que devem ser reformuladas nos seguintes termos:

 

            a.1) - Aceitação de todas as despesas e encargos constantes das contas da F... e da             responsabilidade dos Requerentes e, portanto, suportadas pelos mesmos, por       considerados abrangidos no âmbito do artigo 41.º do CIRS;

 

            a.2) - Não consideração no âmbito do artigo 41.º do CIRS e, portanto, não          consideração dos encargos inerentes à contabilidade da F..., bem como das   despesas de comunicação com os Requerentes, tais como, correios, registos e       outras formas de contacto, por serem da responsabilidade da mesma, no âmbito             das suas funções, e não dos Requerentes.

 

b) Condenar a Requerida, Administração Tributária e Aduaneira, ao pagamento dos juros compensatórios indevidamente pagos pelos Requerentes em 05/02/2015 e ainda ao pagamento de juros indemnizatórios a calcular sobre o IRS indevidamente pago, nos termos do artigo 43.º da Lei Geral Tributária, na proporção do imposto anulado e desde a data em que esse imposto foi indevidamente pago, até à data em que o sujeito passivo for ressarcido desse imposto, à taxa legalmente devida.  

       

VI – Do valor do processo

 

Fixa-se o valor da ação em € 10.400,29, conforme resulta dos autos e dos documentos anexos, nos termos do disposto no artigo 306.º, n.º 2 do CPC e 97.º-A, n,º 1, alínea a) do CPPT, aplicável ex-vi artigo 29.º, n.º 1, alínea a) do RJAT.

 

VII – Das custas

Nos termos dos artigos 12.º, n.º 2 e 22.º, n.º 4, do RJAT e artigo 4.º da Tabela I do Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, custas a pagar pelos Requerentes e Requerida, na parte em decaíram, cujos valores o Tribunal considera ficarem 5% a cargo dos Requerentes e 95% da Requerida.

 

Notifique-se as Partes.

Lisboa, 21 de janeiro de 2016.

                                                                      

O Árbitro,

 

 

 

                                                            (José Rodrigo de Castro)



[1] Em 2010, 2011 e 2012, o CIRS ainda se referia a contribuição autárquica, por desatualização. No OE 2013 (Lei 66.º-B/2012, de 31/12) foi feita a atualização para IMI e I. do SELO, alterando a parte em itálico.