Decisão Arbitral
I – Relatório
1.1. A...– Sociedade Gestora de Participações Sociais, S.A., com sede na ..., n.º ...-A, ...-... Lisboa, com o NIPC..., (doravante designada por «requerente»), tendo sido notificada do acto de liquidação adicional de IRC, no montante de €5.189,72, com o n.º de identificação 2015..., relativo ao período de tributação de 2010, e não se conformando com o mesmo, apresentou, em 24/6/2015, pedido de constituição de tribunal arbitral e de pronúncia arbitral, nos termos do disposto no artigo 2.º, n.º 1, al. a), do Dec.-Lei n.º 10/2011, de 20/1 (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante designado por «RJAT»), em que é requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), com o qual requer que seja “declarada a ilegalidade da liquidação adicional de IRC e respectivos juros compensatórios” e “determinado o pagamento à Requerente de juros indemnizatórios, nos termos do n.º 1 do artigo 43.º da LGT.”
1.2. Em 22/9/2015 foi constituído o presente Tribunal Arbitral Singular.
1.3. Nos termos do art. 17.º, n.º 1, do RJAT, foi a AT citada, enquanto parte requerida, para apresentar resposta. A AT apresentou a sua resposta em 28/10/2015, tendo argumentado no sentido da total improcedência do pedido da requerente.
1.4. Por despacho de 4/1/2016, o Tribunal considerou, nos termos do art. 16.º, als. c) e e), e 19.º, ambos do RJAT, ser dispensável a reunião a que alude o art. 18.º do RJAT, bem como a produção de prova testemunhal, e que o processo estava pronto para decisão. Foi, ainda, fixada a data de 11/1/2016 para a prolação da decisão arbitral.
1.5. O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído, é materialmente competente, o processo não enferma de vícios que o invalidem e as Partes têm personalidade e capacidade judiciárias, configurando-se legítimas.
II – Alegações das Partes
2.1. Vem a ora requerente alegar, na sua petição inicial, que: a) “a única questão controvertida neste processo respeita à interpretação e aplicação do disposto no n.º 3 do artigo 45.º do CIRC, quanto às perdas resultantes da variação do justo valor em instrumentos financeiros, que relevem para a formação do lucro tributável nos termos da alínea a) do n.º 9 do seu artigo 18.º. Interpretação essa que deu origem ao acto de liquidação adicional objecto do presente pedido de pronúncia arbitral.”; b) “no caso sub judice, a administração fiscal bastou-se com uma interpretação literal do n.º 3 do artigo 45.º do CIRC, extraindo conclusões que não são coerentes com o modelo de tributação em sede de IRC”; c) “na ratio do n.º 3 do artigo 45.º do CIRC está a limitação da dedução de encargos que se consideram suportados, decorrentes de transmissões, que geram resultados não reversíveis. Isto é, que se consolidaram na ordem jurídica, no seu aspecto quantitativo. Não é, manifestamente, o caso das perdas decorrentes da redução do justo valor em partes de capital. Estas são, por natureza, reversíveis, tudo dependendo da evolução das respectivas cotações bolsistas”; d) “a inclusão das reduções de justo valor na previsão do n.º 3 do artigo 45.º do CIRC, no limite, só poderia ser feita por aplicação analógica se houvesse analogia entre perdas efectivamente suportadas e meras perdas potenciais decorrentes de flutuações da cotação dos valores mobiliários. O que não é manifestamente o caso”; e) “incluir as reduções de justo valor na previsão do n.º 3 do artigo 45.º do CIRC, como pretende a administração fiscal, acarreta distorções em termos de determinação do lucro tributável, claramente incompatíveis com a tributação sobre o rendimento real e viola o princípio da tributação de acordo com a capacidade contributiva, ferindo, ainda, os princípios da reserva de lei, da igualdade e da proporcionalidade”; f) “[aplicar a norma do art. 45.º, n.º 3, do CIRC] no quadro do SNC e aos casos em que a variação da cotação passou a ser relevante para efeitos fiscais em determinadas circunstâncias (vide artigos 18.º, n.º 9, alínea a), 20.º, n.º 1, alínea f), e 23.º, n.º 1, alínea j), do CIRC) é que se prefigura contrário e susceptível de violar princípios basilares do nosso sistema fiscal – v.g., igualdade, legalidade e justiça material, constantes do n.º 2 do artigo 5.º da LGT”; g) “a prevalecer a interpretação da administração fiscal, as reduções de valor das acções decorrentes da aplicação do modelo do justo valor [...] concorreriam para a formação do lucro tributável em metade do seu valor. No entanto, os aumentos de justo valor [...] seriam tributados na íntegra [...]. [...] em consequência da interpretação feita, a aplicação daquele normativo [art. 45.º, n.º 3, do CIRC] viola, de modo intolerável, o princípio da igualdade, na sua dimensão de igualdade perante a lei [visto que] estamos [...] perante a interpretação de uma norma em moldes tais que, da sua aplicação em concreto, a mesma realidade pode ser tributada de formas absolutamente diferentes, pelo que não pode estar de acordo com a sua ratio legis. [...]. [...] a única interpretação apropriada, plausível e que não viola os princípios da igualdade, da proporcionalidade, da reserva de lei e da justiça material é aquela que conduza a idênticos resultados fiscais, independentemente da utilização do método do custo ou do método do justo valor. Tal interpretação é a que limita o âmbito do n.º 3 do artigo 45.º do CIRC às perdas realizadas decorrentes de transmissões onerosas, excluindo-se, naturalmente, do seu âmbito as perdas potenciais, como é o caso das perdas decorrentes dos ajustamentos de justo valor”; h) “[a supra referida norma não pode], como se pretende, incluir na sua previsão perdas meramente potenciais”; i) “as reduções de justo valor – que não consubstanciam perdas efectivas e resultam de meras flutuações de cotações em bolsa – não podem estar abrangidas pela previsão do n.º 3 do artigo 45.º do CIRC. Uma interpretação da lei que tenha em conta a lógica e coerência do modelo de tributação dos rendimentos em sede de IRC só pode chegar a esta conclusão, sob pena de se legitimar a não dedutibilidade, de forma irreversível, de perdas que são reversíveis e, como se demonstrou no exemplo acima, de tributar rendimentos meramente potenciais, que não foram efectivamente obtidos”; j) “deve concluir-se pela ilegalidade da liquidação efectuada por violação dos princípios constantes do n.º 2 do art. 5.º da LGT e, ainda, por violação do n.º 3 do artigo 45.º do CIRC, já que na sua previsão não se incluem os gastos resultantes da aplicação do justo valor em instrumentos financeiros, que relevem para a formação do lucro tributável nos termos da alínea a) do n.º 9 do artigo 18.º [do CIRC]”; l) “Tal liquidação é violadora dos princípios da igualdade, legalidade e justiça material, consagrados no já referido n.º 2 do art. 5.º da LGT, do princípio da legalidade tributária, tutelado no art. 103.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), violando, consequentemente, conforme foi já dito, o próprio n.º 3 do art. 45.º do CIRC.”
2.2. Pede a requerente que, com os fundamentos supra expostos: a) seja “declarada a ilegalidade da liquidação adicional de IRC e respectivos juros compensatórios”; e b) seja “determinado o pagamento à Requerente de juros indemnizatórios, nos termos do n.º 1 do artigo 43.º da LGT.”
2.3. Por seu lado, a AT vem alegar, na sua contestação, que: a) “por força do mencionado artigo 18.º, n.º 9, do CIRC, os ajustamentos que ocorram por aplicação do justo valor concorrem para a formação do lucro tributável, sempre que respeitando a instrumentos financeiros reconhecidos pelo justo valor através de resultados, i) tenham um preço formado em mercado regulamentado e, ii) o sujeito passivo não detenha, direta ou indiretamente, uma participação de capital superior a 5% do respetivo capital social”; b) “não obstante a opção de acolher o modelo do justo valor, ainda que em situações muito restritas face ao previsto nas normas contabilísticas [c. requisitos exigidos no artigo 18.º, n.º 9, alínea a) do CIRC)], entendeu o legislador criar mecanismos transitórios que acautelassem o impacto que a alteração no sistema de mensuração provocaria nos capitais próprios das empresas”; c) “o artigo 18.º, n.º 9, alínea a), fornece a única regra aplicável para as realidades aí previstas, por isso, quando muito poderia ser considerado como um regime particular de imputação temporal de rendimentos/ganhos e gastos/perdas que resulta da mensuração pelo critério do justo valor em determinadas situações precisas”; d) “carece também de sentido a tentativa de defender que a previsão do artigo 45.º, n.º 3, do Código do IRC visa «a limitação de dedução de encargos suportados decorrentes de transmissões não reversíveis, sendo que as perdas decorrentes da redução do justo valor em partes de capital são reversíveis» [visto que] tal argumentação parece esquecer que a dedução em metade da diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas e de outras perdas e variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital abrangidas pelo artigo 45.º, n.º 3, sempre se aplicou tanto aos casos em que aquelas menos-valias, bem como outras perdas e variações patrimoniais negativas, resultavam de operações realizadas em mercados regulamentados (bolsas de valores) como fora desses mercados”; e) “a desaplicação do artigo 45.º, n.º 3, do CIRC às situações particulares previstas no artigo 18.º, n.º 9, alínea a), do CIRC redundaria numa situação de injustiça dado que conferiria um tratamento mais desfavorável às situações em que não se aplicasse tal norma, ainda que se tratassem de participações sociais mensuradas ao justo valor nos termos das respetivas normas contabilísticas, dado que a menos-valia verificada nessa alienação efetiva será considerada para efeitos fiscais em apenas metade; ao passo que a perda verificada nas participações sociais mensuradas ao justo valor, mas contempladas na previsão do artigo 18.º, n.º 9, alínea a) do CIRC, de acordo com a tese da Requerente, não sofreria qualquer limitação, sendo totalmente considerada para efeitos de apuramento da matéria coletável”; f) “se o legislador não estabeleceu qualquer diferença entre operações realizadas em mercados regulamentados ou em mercados não regulamentados, com que legitimidade se pode construir uma interpretação do artigo 45.º, n.º 3 que excluísse do respetivo âmbito, as menos-valias, bem como outras perdas e variações patrimoniais negativas apuradas em operações com instrumentos de capital próprio, realizadas em mercados regulamentados?”; g) “o legislador ao [dar ao art. 45.º, n.º 3, do CIRC] uma redação abrangente e genérica, optou por não incluir, na sua previsão, qualquer ponderação de circunstâncias particulares das operações concretas que originam as menos-valias, bem como outras perdas e variações patrimoniais negativas [...], não consentindo, pois, que o intérprete se arrogue o direito de subtrair do seu âmbito quaisquer menos-valias ou outras perdas ou variações patrimoniais negativas, em função do modo e local de realização das operações concretas que lhe tenham dado origem”; h) “é inegável que subjacente à redação dada ao artigo 45.º, n.º 3 do CIRC estiveram considerações e preocupações relacionadas com a prevenção de práticas evasivas, cujo âmbito foi evoluindo no sentido da sua ampliação, por forma a não excluir operações e situações que, envolvendo igualmente partes de capital ou outras componentes do capital próprio, pudessem produzir os mesmos efeitos das inicialmente contempladas. Assim, a posição preconizada pela Requerente no pedido de pronúncia arbitral resulta de uma leitura descontextualizada do normativo do artigo 45.º, n.º 3, que inevitavelmente conduz a uma interpretação redutora do âmbito da norma”; i) “em atenção o sistema de tributação em IRC, não obstante as mais e menos valias potenciais ou latentes estarem, de facto, excluídas de tributação, ainda que quando expressas na contabilidade, certo é que os ajustamentos decorrentes da aplicação do justo valor são fiscalmente relevantes quando respeitem os requisitos prescritos no artigo 18.º, n.º 9, al. a), por força do disposto nos artigos 20.º, n.º 1, alínea f), 23.º, n.º 1, i) e 45.º, n.º 3, todos do CIRC, não podendo, por isso, e tão-só pelo motivo das menos valias potenciais estarem excluídas de tributação, o mesmo suceder com estas perdas, desde logo porque as mesmas têm efetivamente relevância fiscal e o regime de tributação que lhes é aplicado configura uma exceção ao aludido princípio enformador do sistema de tributação dos rendimentos das pessoas coletivas”; j) “o legislador, ao referir-se a «outras perdas relativas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital», não as tipificou, deixando uma porta aberta para que aqui se subsumissem todas as perdas, incluindo os gastos/perdas resultantes da mensuração ao justo valor”; l) “Das disposições em análise resulta, pois, claríssimo que não há, entre o artigo 18.º, n.º 9, al. a), e o artigo 45.º, n.º 3 do CIRC, qualquer contradição ou mútua exclusão”; m) “[o] entendimento [da Requerente segundo o qual] «na previsão do n.º 3 do artigo 45.º do Código do IRC não se incluem os ajustamentos decorrentes da aplicação do justo valor em instrumentos financeiros, que relevem para a formação do lucro tributável nos termos da alínea a) do n.º 9 do seu artigo 18.º» [...] é insusceptível de ser acolhida, porquanto consusbstancia, desde logo, uma inobservância da norma constante da parte final do n.º 3 do artigo 45.º do CIRC [...]. No caso em apreço, e como é bom de ver, não estamos perante uma situação com cabimento na primeira parte da norma, mas sim na segunda, isto é, perdas resultantes da variação do justo valor, e decorrentes da depreciação da cotação das ações, no ano de 2010, que teriam de ser acrescidas no Campo 737 do Quadro 07 da declaração periódica da Requerente, em metade do valor”; n) “ao contrário do que pretende a Requerente, não há qualquer interpretação analógica, dado que expressamente se prevê na segunda parte da norma que as perdas apuradas, relativas a partes de capital, concorrem para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor”; o) “os rendimentos/ganhos e gastos/perdas a que se refere o artigo 18.º, n.º 9, alínea a), têm inevitavelmente de ser confrontados com o tratamento que lhes é concedido pelo disposto nos artigos 20.º, 23.º e 45.º do CIRC, respetivamente. Reputando-se de absolutamente irrelevante uma hipotética questão semântica fabricada à volta da dicotomia entre o termo «perdas» utilizado no artigo 45.º, n.º 3, e o termo «gastos» usado no artigo 23.º e no artigo 18.º, n.º 9, alínea a), do CIRC. [...] o termo «gastos» utilizado tanto na epígrafe dada ao artigo 23.º, no âmbito das alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de julho, como na redação da alínea i) do n.º 1 desse preceito [...] tem necessariamente de ser entendido em sentido amplo, i.e., cobrindo, em substância, os gastos propriamente ditos e as perdas. Ou seja, embora cada um daqueles termos tenha um significado próprio, aquela dicotomia entre «gastos» e «perdas» só pode qualificar-se como uma imprecisão terminológica do legislador sem consequências ao nível da interpretação daqueles preceitos”; p) “o legislador fez uma clara opção no que se refere às perdas verificadas nas partes de capital previstas na alínea a) do n.º 9 do artigo 18.º do CIRC, a qual consistiu na atribuição de relevância fiscal, independentemente da sua realização efetiva, consubstanciando tal opção, no que a este assunto diz respeito, um claro afastamento do princípio da realização”; q) “Quanto ao facto de a subsunção ao regime de dedução parcial previsto no artigo 45.º, n.º 3, dos gastos/perdas apurados nos termos e condições referidos no artigo 18.º, n.º 9, alínea a), do CIRC, não ser acompanhado de um tratamento simétrico para os rendimentos/ganhos, e da potencial injustiça que daí possa resultar, na verdade, inexiste um dispositivo legal que permita a consideração de apenas metade do seu valor no cálculo do lucro tributável. E se o legislador, nem antes nem depois de 2010, introduziu qualquer disposição a consagrar uma solução simétrica para os rendimentos/ganhos e gastos/perdas decorrentes da aplicação do justo valor, nos termos e condições a que se refere o art. 18.º, n.º 9, alínea a), também não pode o intérprete, seja a AT ou o sujeito passivo, substituir-se-lhe nessa tarefa.”; r) “[não existe a alegada violação de princípios constitucionais porque] a Administração Fiscal, ao interpretar o artigo 45.º, n.º 3 do CIRC, fê-lo em observância do preceituado no artigo 9.º do Código Civil, aplicável por força do n.º 1 do artigo 11.º da LGT [e porque] a própria Constituição da República Portuguesa legitima a aplicabilidade de regimes especiais, não obrigando a exclusividade da tributação segundo o rendimento real [...], sendo aqui de recordar que nem todas as situações mensuradas ao justo valor estão contempladas no artigo 18.º, n.º 9, alínea a), do CIRC, como sejam as situações em que há uma valorimetria das participações sociais ao justo valor, mas o sujeito passivo detém mais de 5% do capital ou detém menos de 5% mas opta pela contabilização dos ajustamentos resultantes das alterações no justo valor em contas de capital próprio. Desta forma, a exigência formulada no artigo 45.º, n.º 3 do CIRC, não pode por isso constituir violação ao princípio de tributação pelo lucro real ou da capacidade contributiva”; s) “também é de descartar uma hipotética violação do princípio da igualdade, uma vez que o mesmo, preceituado no n.º 1, do artigo 13.º da CRP consagra a observância de uma igualdade material, que não meramente formal [e, no] caso sub judice, o regime legalmente previsto e vigente à data dos factos no n.º 3 do artigo 45.º do CIRC, leva-nos a considerar que o propósito do legislador foi, precisamente, alargar o âmbito de aplicação da supracitada norma, de forma a abarcar outras realidades (para além da transmissão onerosa de partes sociais), suscetíveis de levar ao aproveitamento, por parte dos sujeitos passivos, de expedientes capazes de potenciar alguma espécie de «planeamento fiscal», justificando-se assim o recurso ao referido tratamento fiscal.”
2.4. Conclui, por fim, a AT que “o presente pedido de pronúncia arbitral [deve] ser julgado improcedente, por manifestamente infundado, com as legais consequências.”
III – Factualidade Provada, Não Provada e Respectiva Fundamentação
3.1. Consideram-se provados os seguintes factos:
i) A ora Requerente é uma sociedade gestora de participações sociais que, no exercício da sua actividade, detém várias sociedades participadas, entre as quais se inclui a B..., S.A., com sede na ..., n.º..., ...-... ..., pessoa colectiva n.º..., sendo esta uma sociedade dominada pela ora Requerente a 100%.
ii) Nos presentes autos, está em causa liquidação adicional de IRC respeitante ao período de tributação de 2010, na parte relativa à correcção relacionada com o enquadramento fiscal de gastos decorrentes dos ajustamentos por variação do justo valor na sociedade dominada acima identificada. A acção inspectiva que originou a referida liquidação tinha sido realizada ao abrigo da ordem de serviço n.º OI2011…, da DF de Lisboa, por despacho de 10/11/2014.
iii) Concretamente, a AT entendeu que a ora Requerente não acresceu, “[na linha 737 do] quadro 07 [da declaração de rendimentos mod. 22 de IRC do ano de 2010], o valor correspondente a 50% das perdas por redução do justo valor, apuradas em acções, atendendo ao disposto no n.º 9 do artigo 18.º, conjugado com o n.º 3 do artigo 45.º do Código do IRC” (vd. Anexo II ao RIT apenso aos autos). O que implicou uma correcção meramente aritmética no valor de €74.617,36 em sede de IRC, tendo, em consequência, sido alterada a matéria colectável de €155.582,07 para €230.199,43.
iv) Estando a mencionada sociedade dominada abrangida pelo RETGS, a correcção aritmética efectuada ao resultado tributável individual da mesma reflectiu-se no resultado tributável do grupo no exercício de 2010, por força do artigo 70.º do CIRC, passando de €10.619.275,81 para €10.693.893,17 (vd. RIT apenso aos autos).
v) Inconformada com a referida correcção e correspondente liquidação adicional de IRC, no montante de €5.189,72, com o número de identificação 2015..., a ora Requerente apresentou o presente pedido de pronúncia arbitral em 24/6/2015.
3.2. Não há factos não provados relevantes para a decisão da causa.
3.3. Os factos considerados pertinentes e provados (v. 3.1) fundamentam-se na análise das posições expostas pelas partes e da prova documental junta aos autos.
IV – Do Direito
No presente caso, a questão essencial de direito que se coloca é a de saber se foi feita correcta interpretação e aplicação do n.º 3 do art. 45.º do CIRC, quanto às perdas resultantes da variação do justo valor em instrumentos financeiros, que relevem para a formação do lucro tributável nos termos da al. a) do n.º 9 do artigo 18.º, também do CIRC.
Vejamos, então.
Atenta a argumentação exposta pelas partes, bem como demais elementos constantes dos presentes autos, verifica-se que assiste razão à ora Requerente, pelas razões que infra se assinalam e que reflectem, no essencial, o entendimento já exposto em DA proferidas nos processos n.º 108/2013-T, de 25/11/2013, e n.º 59/2015-T, de 5/10/2015 (que em seguida se cita), que versaram idêntica questão de direito e com cuja fundamentação se concorda:
“Trata-se aqui de questão já foi objecto de acórdãos do CAAD, nomeadamente, o proferido no processo 108/2013-T, que seguiremos de perto. Dispunha o art. 45.º, n.º 3, CIRC, que «a diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital, bem como outros componentes do capital próprios, designadamente, prestações suplementares concorrem para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor.»
Haverá antes de mais que ter presente que o supracitado art. 45.º, n.º 3, CIRC, decorre de uma alteração legislativa que se guiou, de acordo com o Relatório do Ministério das Finanças para o Orçamento de Estado de 2003, por «duas prioridade, a saber, o combate à fraude e evasão fiscais e o alargamento da base tributável», enquadrando-se a alteração que aqui interessa no âmbito do «Alargamento da base tributável e medidas de moralização e neutralidade».
A redacção da norma em análise resultou da alteração implementada pela Lei n.º 60-A/2005 de 30 de Dezembro, sendo que nos termos do correspondente Relatório do Ministério das Finanças, a medida em causa se enquadrou no âmbito do «Combate à Evasão e Fraude Fiscais e Outras Medidas Direccionadas à Consolidação Orçamental».
Assim, a norma passou a ter, com a Lei n.º 60-A/2005, de 30/12, uma redacção mais ampla, abrangendo, na limitação das perdas em 50%, não apenas a «diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital», mas também «outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, designadamente prestações suplementares». [...].
Um olhar crítico sobre o art. 45.º, n.º 3, que admitisse, no seu âmbito, não só as perdas (definidas no art. 23.º) mas também as variações patrimoniais negativas (tal como definidas no art. 24.º), assim como os custos (tal como definidos no art. 23.º), levaria a que, por exemplo, o custo de aquisição de partes de capital apenas concorresse em metade do respectivo valor para o apuramento do lucro tributável, o que seria, obviamente, inconcebível, num legislador minimamente razoável. Por «perdas» deve-se entender os factos qualificáveis como tal à luz do CIRC e por «variações patrimoniais negativas» deve-se entender variações patrimoniais negativas não reflectidas no resultado líquido do exercício, tal como definidas no art. 24.º.
Deve então conceber-se, perante o panorama exposto, que o Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de julho, veio introduzir, no que respeita à parte abrangida pela aceitação da aplicação do modelo do justo valor em instrumentos financeiros, um regime especial de relevância para o cômputo do lucro tributável, justificado quer pela sua objectividade própria quer pela confessada intenção de aproximação da contabilidade à fiscalidade. Esta alteração não poderá ser desconsiderada quando se analise a questão jurídica a dirimir.
Ora, face à actual redacção do CIRC, aquela afirmação não gera dúvidas, como se verifica, designadamente, pela redacção dos arts. 20.º, n.º 1, al. f) e h), 23.º, n.º 1, al. i) e l), e, em especial art. 46.º, n.º 1, al. b), face aos quais se evidencia de uma forma clara a intenção do legislador em afastar os ajustamentos decorrentes da aplicação do critério do justo valor em instrumentos financeiros, nos termos reconhecidos pelo CIRC, do regime das mais e menos-valias. Não obstante, a situação mostra-se diversa quando se trata do antigo art. 45.º, n.º 3, CIRC, surgindo este artigo como uma antítese daquela congruência de normas que o rodeiam.
Ou seja: no regime para o qual foi pensada e instituída a norma do artigo 45.º, n.º 3, a realização de menos-valias, e demais situações elencadas, estava dependente de uma actuação voluntária correspondente à realização das mesmas. Ora, neste quadro, será compreensível que o legislador institua mecanismos de desincentivo a uma actuação susceptível de ser considerada como desvaliosa, no caso a realização de menos-valias ou outras variações patrimoniais negativas. Ao dispor que tais situações apenas relevarão em 50% do montante contabilizado, o legislador fiscal está, objectivamente, a condicionar as actuações abrangidas pela previsão legal, impondo um incentivo negativo às mesmas.
Por outro lado, e estando em causa instrumentos financeiros de valor não objectivamente quantificável, a desconsideração em 50% das variações patrimoniais negativas verificadas, teria também uma função de «compensar» a natural tendência dos operadores económicos para, ao nível fiscal, inflacionarem os prejuízos.
Contudo, o mesmo já não se poderá concluir nas situações abrangidas pelo art. 18.º, n.º 9, al. a) – como as do presente caso. Aqui, estando-se perante ajustes decorrentes da contabilização do justo valor, determinado por critérios objectivos (com «um preço formado num mercado regulamentado»), não há qualquer dúvida ou intervenção da vontade do sujeito passivo na verificação do ajustamento patrimonial negativo ou positivo. Ou seja, estes ocorrerão, ou não, independentemente da actuação e da vontade do sujeito passivo.
Ora, penalizar, nestes casos, o sujeito passivo com uma desconsideração de 50% do gasto incorrido, seria de todo injustificado, quer de um ponto de vista económico quer de um ponto de vista jurídico, e muito menos, ao nível contabilístico.
Posto que, no regime do defunto art. 45.º, n.º 3, a realização de menos-valias, e demais situações previstas, estava dependente de uma actuação voluntária correspondente à realização das mesmas. Perante esta factualidade, será compreensível que o legislador institua mecanismos de desincentivo a uma atuação susceptível de ser considerada como desvaliosa, no caso a realização de menos-valias ou outras variações patrimoniais negativas. Ao dispor que tais situações apenas relevarão em 50% do montante contabilizado, o legislador fiscal está, objectivamente, a condicionar as atuações abrangidas pela previsão legal, impondo um desincentivo às mesmas.
A não aplicação do art. 45.º, n.º 3, CIRC, aos gastos e, concretamente, aos «Gastos resultantes da aplicação do justo valor em instrumentos financeiros», com a consideração plena das repercussões patrimoniais verificadas, sejam positivas ou negativas, leva a uma congruência da tributação qualquer que seja a altura em que se verifique a alienação do instrumento financeiro.
Ao invés, se se aplicar a norma do art. 45.º, n.º 3, CIRC, como pretende a AT, a partir do momento em que se verifique uma alteração patrimonial negativa, haverá uma disparidade entre a relevância fiscal das variações patrimoniais negativas e positivas, sem qualquer fundamentação. Parece claro que resultados aleatórios e sem qualquer fundamento substancial que os sustente não podem ter sido queridos por um legislador razoável.
É certo que a solução alternativa, que exclui a aplicação do art. 45.º, n.º 3, CIRC, leva a que, no caso de se verificar, a final, uma menos-valia, esta acabe por ter sido considerada a 100%, e não a 50%, como ocorreria ao abrigo do princípio da realização. Contudo, esta discriminação positiva (ou melhor, não discriminação negativa) pela opção pelo critério do justo valor, poderá justificar-se, desde logo, porquanto no regime do art. 18.º, n.º 9, al. a), deixa de fazer sentido qualquer desincentivo à realização de menos-valias, uma vez que as mesmas relevarão fiscalmente independentemente da sua efectiva realização. Não se deverá desconsiderar igualmente que, por um lado, a contabilização pelo justo valor é considerada mais conforme à aproximação entre a contabilidade e a fiscalidade, finalidade confessadamente prosseguida pelo legislador do Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de Julho, e, por outro, a circunstância de estarmos perante realidades objectivamente avaliadas, sem que haja margem significativa para manipulações fiscalmente convenientes. Ou seja, como se havia adiantado já, não se verificam as razões de combate à fraude e evasão fiscal, nem as razões de consolidação orçamental, que demonstradamente estiveram na génese da norma do art. 45.º, n.º 3, do CIRC. [...].
Em consequência do exposto, e em obediência às imposições hermenêuticas do art. 9.º, CCiv., entende-se ser de interpretar o art. 45.º, n.º 3, CIRC, no sentido de na sua previsão não se incluírem os gastos resultantes da aplicação do justo valor em instrumentos financeiros que relevem para a formação do lucro tributável, nos termos da alínea a) do n.º 9 do art. 18.º.
Atendendo à organização lógica, sistemática e racional do enquadramento jurídico da norma constante no art. 45.º, n.º 3, do CIRC, no conjunto normativo em que a mesma se insere e que foi explanado anteriormente, denota-se uma clara incongruência entre a aplicação estrita deste preceito, conforme pretende a AT, e os resultados implícitos (e erróneos) a que essa aplicação conduz. Nomeadamente, operando-se uma aplicação rigorosa do art. 45.º, n.º 3, do CIRC, temos uma violação clara do princípio da equidade.” [Fim de citação.]
No mesmo sentido da Decisão Arbitral supra citada, veja-se, ainda, o seguinte excerto da recente DA n.º 208/2015-T, de 25/9/2015: “a questão a resolver nos autos [é] a de saber se a perda contabilística resultante da aplicação retrospectiva do método do justo valor e as perdas contabilísticas verificadas nos exercícios de 2010 e 2011, decorrentes da depreciação da cotação das acções, devidamente contabilizada de acordo com o critério aplicável do justo valor, e reconhecida em resultados, deverão ser atendidas na totalidade, ou apenas em 50%.
[...]. [Deve] considerar[-se] que o Decreto-Lei 159/2009, de 13 de Julho, veio introduzir, no que respeita à parte abrangida pela aceitação da aplicação do modelo do justo valor em instrumentos financeiros, um regime especial de relevância para o cômputo do lucro tributável, justificado quer pela sua objectividade própria quer pela confessada intenção de aproximação da contabilidade à fiscalidade.
Esta circunstância não é, face à redacção actual do CIRC, susceptível de gerar qualquer tipo de dúvidas, como se verifica, designadamente, pela redacção dos artigos 20.º, n.º 1, alíneas f) e h), 23.º, n.º 1, alíneas i) e l), e, em especial 46.º, n.º 1, alínea b), face aos quais se evidencia de uma forma clara a intenção do legislador afastar os ajustamentos decorrentes da aplicação do critério do justo valor em instrumentos financeiros, nos termos reconhecidos pelo CIRC, do regime das mais-valias e menos-valias.
Já o regime resultante da conjugação dos artigos 45.º, n.º 3, e 46.º do CIRC, apenas faz sentido na perspectiva da atendibilidade das variações patrimoniais em causa sob o prisma do referido princípio da realização.
É que, estando em causa, face a tal princípio, a aferição da variação patrimonial em função de uma transacção, haverá sempre um factor voluntário em relação àquela.
Ou seja, no regime para o qual foi pensada e instituída a norma do artigo 45.º, n.º 3, a realização de menos-valias, e demais situações elencadas estava dependente de uma actuação voluntária correspondente à realização das mesmas. Ora, neste quadro, será compreensível que o legislador institua mecanismos de desincentivo a uma actuação susceptível de ser considerada como desvaliosa, no caso a realização de menos-valias ou outras variações patrimoniais negativas. Ao dispor que tais situações apenas relevarão em 50% do montante contabilizado, o legislador fiscal está, objectivamente, a condicionar as actuações abrangidas pela previsão legal, impondo um incentivo negativo às mesmas.
Por outro lado, e estando em causa instrumentos financeiros de valor não objectivamente quantificável, a desconsideração em 50% das variações patrimoniais negativas verificadas, teria também uma função de «compensar» a natural tendência dos operadores económicos para, ao nível fiscal, inflacionarem os prejuízos.
Contudo, aqueles aspectos não se verificarão já nas situações abrangidas pelo artigo 18.º, n.º 9, alínea a). Aqui, estando-se perante ajustes decorrentes da contabilização do justo valor, determinado por critérios objectivos (com «um preço formado num mercado regulamentado»), não há qualquer dúvida ou intervenção da vontade do sujeito passivo na verificação do ajustamento patrimonial negativo ou positivo. Ou seja, estes ocorrerão ou não, independentemente da actuação e da vontade do sujeito passivo.
Ora, penalizar, nestes casos, o sujeito passivo com uma desconsideração de 50% do gasto incorrido, seria de todo injustificado, quer de um ponto de vista económico, quer de um ponto de vista jurídico. [...]
A não aplicação da norma do artigo 45.º, n.º 3, do CIRC, aos gastos, e concretamente aos «Gastos resultantes da aplicação do justo valor em instrumentos financeiros», com a consideração plena das repercussões patrimoniais verificadas, sejam positivas ou negativas, leva a uma coerência da tributação qualquer que seja a altura em que se verifique a alienação do instrumento financeiro. Ou seja, em qualquer altura que se escolha para proceder à alienação do instrumento financeiro, as alterações patrimoniais positivas e negativas compensam-se, de modo que, a final, o sujeito passivo apenas tenha acrescentado ou diminuído ao seu lucro tributável a diferença entre o valor de aquisição e o valor de venda.
Já se se aplicasse a norma do artigo 45.º, n.º 3, do CIRC, como pretende a Autoridade Tributária e Aduaneira, a partir do momento em que se verifique uma alteração patrimonial negativa, haverá uma discrepância entre a relevância fiscal das variações patrimoniais negativas e positivas, sem qualquer justificação, como se disse, uma vez que aquelas variações ocorrem de forma objectiva e independente da actuação ou vontade do sujeito passivo. [...].
Parece claro que tais resultados, meramente aleatórios e sem qualquer justificação substancial que os sustente, não poderão ter sido queridos por um legislador razoável, que, por imperativo do artigo 104.º, n.º 2, da CRP, tem de fazer assentar a tributação das empresas fundamentalmente sobre o seu rendimento real. [...]. [...] entende-se ser de interpretar o artigo 45.º, n.º 3, do CIRC, no sentido de na sua previsão não se incluírem os gastos resultantes da aplicação do justo valor em instrumentos financeiros, que relevem para a formação do lucro tributável nos termos da alínea a) do n.º 9 do artigo 18.º.” [Fim de citação.]
Em síntese, e em plena concordância com a argumentação das DA supra citadas, conclui-se, também, no presente caso, que: i) o art. 45.º, n.º 3, do CIRC, deve ser interpretado no sentido de, na sua previsão, não se incluírem os gastos resultantes da aplicação do justo valor em instrumentos financeiros, que relevem para a formação do lucro tributável nos termos da al. a) do n.º 9 do art. 18.º do CIRC; ii) tal interpretação está em consonância com as regras interpretativas do art. 9.º do C.Civil e é a que se adequa à ratio do n.º 3 do art. 45.º do CIRC; iii) o Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13/7, veio introduzir, no que diz respeito à parte abrangida pela aceitação da aplicação do modelo do justo valor em instrumentos financeiros, um regime especial de relevância para o cômputo do lucro tributável, justificado pela sua objectividade própria e pela sua intenção de aproximação da contabilidade à fiscalidade; iv) a aplicação da norma do art. 45.º, n.º 3, do CIRC, às situações abrangidas pelo art. 18.º, n.º 9, al. a), do CIRC, mostra-se irrazoável nos seus resultados (dado criar discrepâncias na relevância fiscal das variações patrimoniais positivas e negativas) e afasta-se, sem justificação atendível, da ratio subjacente ao conjunto normativo em que a primeira norma se insere.
V – Sobre o Pedido de Pagamento de Juros Indemnizatórios
À luz do disposto no n.º 5 do art. 24.º do RJAT – na parte em que se diz que “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário” –, tem-se entendido que tal norma permite o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios em processos arbitrais.
Justifica-se, pelo exposto, a análise do pedido de pagamento de juros indemnizatórios à Requerente.
São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, ter havido erro imputável aos serviços do qual resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido (vd. art. 43.º, n.º 1, da LGT).
É, por isso, condição necessária para a atribuição dos referidos juros a demonstração da existência de erro imputável aos serviços. Nesse sentido, vd., por ex., os seguintes arestos: “O direito a juros indemnizatórios previsto no n.º 1 do art. 43.º da LGT [...] depende de ter ficado demonstrado no processo que esse acto está afectado por erro sobre os pressupostos de facto ou de direito imputável à AT.” (Ac. do STA de 30/5/2012, proc. 410/12); “O direito a juros indemnizatórios previsto no n.º 1 do artigo 43.º da Lei Geral Tributária pressupõe que no processo se determine que na liquidação «houve erro imputável aos serviços», entendido este como o «erro sobre os pressupostos de facto ou de direito imputável à Administração Fiscal»” (Ac. do STA de 10/4/2013, proc. 1215/12).
Ora, tendo havido, como decorre do que se disse em IV, erro imputável aos serviços, conclui-se pela procedência do pedido de pagamento de juros indemnizatórios à Requerente.
***
VI – Decisão
Em face do supra exposto, decide-se:
- Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral, com a consequente anulação, com todos os efeitos legais, da liquidação adicional impugnada e respectivos juros compensatórios, e o reembolso da importância indevidamente paga.
- Julgar procedente o pedido também na parte que diz respeito ao reconhecimento do direito a juros indemnizatórios a favor da requerente.
Fixa-se o valor do processo em €5189,72 (cinco mil cento e oitenta e nove euros e setenta e dois cêntimos), nos termos do disposto no art. 32.º do CPTA e no art. 97.º-A do CPPT, aplicáveis por força do disposto no art. 29.º, n.º 1, als. a) e b), do RJAT, e do art. 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT).
Custas a cargo da requerida, no montante de € 612,00 (trezentos e seis euros), nos termos da Tabela I do RCPAT, em cumprimento do disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e do disposto no art. 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.
Notifique.
Lisboa, 11 de Janeiro de 2016.
O Árbitro
(Miguel Patrício)
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Texto elaborado em computador, nos termos do disposto
no art. 131.º, n.º 5, do CPC, aplicável por remissão do art. 29.º, n.º 1, al. e), do RJAT.
A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990.